• Nenhum resultado encontrado

branco um a nav alha de ponta e m ola, de cabo negro cintilante, mecânica impecável, lâmina fina mas longa, afiada, polida,

No documento Teoria King Kong - Virginie Despentes (páginas 35-38)

brilhante. Uma navalha de que eu sacava com a maior das

facilidades nesses tempos globalmente confusos. Tinha-me

afeiçoad o a ela e, à m inha man eira, aprendera a u sá-la . N essa

noite, ficou no meu bolso, e o único pensamento que tive a

respeito daq uela lâm ina foi: oxalá não a encon trem e não se

pon ham a brincar com ela. N em me pa ssou pela cabeça u ti

lizá-la. De sde o m om ento em que percebi o que nos estava a

acontecer, tive consciencia de que eles eram os mais fortes. Uma questão mental. Mais tarde, convenci-me de que, se a questão tivesse sido eles quererem roubar-nos os blusões, a minha reacção teria sido diferente. Eu não era temerária, mas bastante inconsciente. Porém, nesse momento preciso,

senti-me mulher, miseravelmente mulher, como nunca o ha via sentido, como nun ca me viria a sentir depois. Defen der

a minha pele não me permitia ferir um homem. Creio que teria reagido da mesma maneira se houvesse apenas um rapaz contra mim. Era a perspectiva da violação que fazia outra vez de m im um a mulher, alguém e ssencialm ente vu l nerável. A s m eninas são am estradas para nunca fazerem m al aos hom ens, e as mulheres são cham adas à pedra sem pre que infringem essa regra. N inguém gosta de saber até que ponto é cobarde. N inguém tem vontade de o ficar a saber n a carne. Não estou zangada comigo por não ter ousado matar um deles. Estou zangada com um a sociedade que me educou sem  ja m a is m e e n sin ar a ferir u m h o m em se ele m e abrir as p ern a s à força, enquanto essa m esm a sociedade me inculcou a ideia de que a violação era um crim e de.que. nunca m e iria re co m  por. E estou absolutamente furiosa por, perante três homens

e um a carabina, e presa num a floresta de onde seria im p o ssí  vel fugir a correr, me sentir ain d a hoje culp ada po r n ão te r tido

coragem de nos defender com u m a pequena n avalha.

Finalmente, um que encontra a faca e m ostra -a ao s outros, sinceramen te admirado por eu não a ter usado. «E ntão é po r que ela estava a gostar.» Para dizer a verdade, os hom ens igno  ram a que ponto o d ispositivo de castração Idas rap ariga s é imp arável, a que ponto tudo está escrupu losam ente o rganizado para garantir que eles vencem, sem arriscar muito, quando atacam as mulheres. Acreditam, inocentemente, que a sua

superi

superiorioridade advém dade advém da sua forda sua força. Não se iça. Não se incomncom odam odam nada emnada em ter

ter umum a la luta de carabina contra uta de carabina contra navalha. Connavalha. Con sideram, sideram, os ditoos dito sos cretinos, qu

sos cretinos, que esse coe esse co mm bate é bate é igualitárigualitário. E io. E esse o segredo esse o segredo dada sua tr

sua tranquanqu iliilidaddad e de espírito.e de espírito.

Parece impossível que, em 2006, quando tanta gente se Parece impossível que, em 2006, quando tanta gente se passeia com minúsculos computadores portáteis, máqui passeia com minúsculos computadores portáteis, máqui nas fotográficas, telefones, agendas e leitores de música, não nas fotográficas, telefones, agendas e leitores de música, não exis

exista nenhum ta nenhum objobjectecto que o que se possse poss a enfia enfiar na rar na rata quanata quando do sasa íí m

m os pos p ara dar umara dar um a a volta, capaz de desfazvolta, capaz de desfazer a er a pila do pripila do primm eiroeiro saca

saca na que na que a quisesse lá ma quisesse lá m etereter. Ta. Tallvez vez não não seja desejável seja desejável toto rr nar o sex

nar o sexo feminino o feminino inacinac essívessív el pela el pela forforça. ça. A A mm ulher ulher tem tem dede ficar

ficar abeabe rta e rta e temtem erosa. erosa. Se não fosse Se não fosse assimassim , o , o que definirque definiria aia a masculinidade?

masculinidade?

Depois da violação, a única atitude tolerada da mulher Depois da violação, a única atitude tolerada da mulher con

con siste em virar a siste em virar a viovio lênlên cia contra scia contra si. Por i. Por exemplo, engordarexemplo, engordar  v

 vinin tte e qq uu iilolo ss. . SS aa iir r ddo o mm eerrccaadd o o sseexxuu aal, l, ppoor jr j á á tteer r ssiiddo o eessttrraagg aadd aa,, excluir-se voluntariamente do desejo. Em França, não se excluir-se voluntariamente do desejo. Em França, não se m

m ata as muata as mu lherlheres es violadaviolada s, mas s, mas espeespe ra-se delra-se delas quas que e tenhamtenham a

a decdec ência de ência de se apresense apresen tarem tarem como mcomo m ercadoria ercadoria deterideteriorada,orada, poluída. Putas

poluída. Putas ou desfeadas, devem sair ou desfeadas, devem sair espontaneamespontaneam ente doente do  v

 v iivveeirir o o dd aas s aapp ttaas s pp aa rra a o o ccaassaamm eenn ttoo ..

Com efeito, é a violação que fabrica as melhores putas. Com efeito, é a violação que fabrica as melhores putas. Uma vez abertas à força, elas conservam por vezes à flor da Uma vez abertas à força, elas conservam por vezes à flor da pele um emurchecimento que os homens apreciam, qualquer pele um emurchecimento que os homens apreciam, qualquer coisa de desesperado

coisa de desesperado e de see de sedutordutor. A viol. A violação ação é com frequêné com frequên cia inici

cia iniciática, corta nática, corta n a carne a carne papa ra tornar a mulher ora tornar a mulher o ferferecida,ecida, e nunca se vai voltar a fechar completamente. Estou certa de e nunca se vai voltar a fechar completamente. Estou certa de que há como que um odor, qualquer coisa que os machos que há como que um odor, qualquer coisa que os machos detectam

detectam e qe que os excitue os excita especialmena especialmen te.te.

Insistimos em comportarmo-nos como se a violação fosse Insistimos em comportarmo-nos como se a violação fosse uma coisa rara e periférica, alheia à sexualidade, evitável. uma coisa rara e periférica, alheia à sexualidade, evitável.

No documento Teoria King Kong - Virginie Despentes (páginas 35-38)