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CAPÍTULO 2. REVISÃO DE LITERATURA

2.2 Sistema de ensino

2.2.1 Breve retrospetiva da evolução do ensino obrigatório em Portugal

da evolução do sistema educativo português, dando especial atenção à sua estrutura e cultura. Importa, aqui, equacionar a forma como se foram configurando os vários ciclos do ensino básico e, em particular, o 1.º e 2.º ciclos do ensino básico.

De acordo com os normativos existentes, distinguimos quatro períodos que considerámos como principais: o Período Liberal, a 1.ª República, o Estado Novo e o Pós 25 de Abril. O período liberal inclui uma diversidade de reformas do ensino em Portugal. Apesar da instabilidade política e social vivida nessa época ter dificultado a implantação dessas reformas, foram tomadas diversas medidas que tiveram um grande impacto no sistema educativo português.

Fazendo uma retrospetiva legislativa, nesse período, há a destacar a publicação do Decreto do Governo n.º 220, de 28 de setembro, de 1844, emanado do Governo de António Bernardo da Costa Cabral, que instituiu a escolaridade obrigatória para as crianças com idades compreendidas entre os 7 e os 15 anos. O citado diploma legal criou em Coimbra um Conselho Superior de Instrução Pública, estruturado em três secções de ensino - primária, secundária e superior - com objetivos, no âmbito de direção, regimento e inspeção. Na sequência desta reforma, a Instrução Primária ficou organizada em dois graus:

No 1.º grau ensina-se a ler, a escrever, a contar, os princípios gerais de moral, a doutrina cristã e civilidade, os exercícios gramaticais e a história portuguesa; no 2.º grau estes saberes são alargados a outras áreas como a gramática portuguesa, desenho linear, geografia e história geral, história sagrada do novo e antigo testamento, aritmética e geometria com aplicação à indústria, escrituração (Almeida, Leite, & Fernandes, 2009, p. 2).

Uma grande viragem na história da educação e do ensino em Portugal deu-se com a implantação da República, a 5 de Outubro de 1910. Neste segundo período, o da I República, teve lugar o grande incremento da reforma do ensino. Esta reforma, nas palavras de Stoer (1982) tinha como objetivos “a descentralização da instrução primária, a extensão desta aos meios rurais, o aumento salarial dos professores e o desenvolvimento geral de todos os sectores da educação. Em resumo, as oportunidades educacionais eram estendidas a camadas cada vez mais vastas da população” (p. 26).

Neste novo regime, foi publicada diversa legislação que trouxe alterações significativas para a educação. Com a reforma do ensino primário, datada de 1911, a estrutura de ensino passou a ser constituída por três graus: o elementar, com a duração de três anos e de frequência obrigatória para todas as crianças entre os sete e os catorze anos de idade, o complementar, com a duração de dois anos e o superior que possibilitava aos alunos saídas profissionais ou ainda a prossecução dos estudos, com a duração de três anos. Passados oito anos, em 1919, assistiu-se a uma nova alteração.

Foi publicado o Decreto n.º 6:137, de 29 de Setembro, que no art. 33.º refere que o ensino primário geral será obrigatório e gratuito para todas as crianças de um e outro sexo dos 7 os 12 anos de idade, sendo o ensino primário geral de 5 anos e o ensino superior de 2 anos. (Almeida et al., 2009, p. 3).

Em 1926, o golpe de estado de 28 de maio deu origem à mudança de regime e ao início da ditadura. Neste terceiro período - O Estado Novo - o ensino irá sofrer grandes alterações, sobretudo de caráter ideológico.

Neste novo contexto político, segundo Stoer (1982, p. 26) “encerrou-se dramaticamente o período republicano”. António de Oliveira Salazar é, então, “mandado chamar para tomar medidas drásticas, de acordo com linhas económicas clássicas, de modo a «resolver» a crise económica contínua provocada pelo período republicano” (Ibid.). Após o seu percurso político, como Ministro das Finanças, entre 1926 e 1932, Salazar torna-se o instituidor do Estado Novo (1933-1974).

Este aparelho foi mantido através de duas instituições muito distintas, a escola primária e o liceu nacional. A transição de uma, para outra instituição, além de implicar enormes esforços individuais e familiares, incluindo a superação de duas provas nacionais distintas, representava também uma clivagem profunda entre estatutos sociais.

No ano de 1927, assiste-se a uma nova reorganização do ensino primário fundamentada no Decreto n.º 13619, de 17 de maio. A instrução primária passa a ser constituída por três níveis: infantil dos 4 aos 7 anos para ambos os sexos; primário elementar, dos 7 aos 11 anos, ensino obrigatório para ambos os sexos lecionado em regime separado e dividido por quatro classes; primário complementar para ambos os sexos dos 11 aos 13 anos. Passados três anos, decorre uma nova alteração no campo educativo, na medida em que o ensino primário elementar é dividido em dois graus, sendo o primeiro de três classes e o segundo de uma classe, a 4ª classe (Almeida et al., 2009).

A Política Educativa do Estado Novo consagrou o prolongamento da obrigatoriedade da escolaridade primária elementar, de três para quatro anos, através de um procedimento diferenciado para cada um dos sexos, que se processou em duas fases distintas. O Decreto- Lei n.º 40964, de dezembro de 1956, regulamenta a instrução primária de caráter obrigatório até aprovação do exame de 4.ª classe, para todos os menores do sexo masculino. Posteriormente, só em 1960, é que a frequência da 4.ª classe se torna obrigatória para o sexo feminino. O Decreto-Lei n.º 45810, de 09/07, de 1964, determinou que a escolaridade obrigatória passaria para seis anos, sendo gratuita para ambos os sexos, organizada em dois ciclos, o elementar de quatro anos e o complementar de dois anos (Ibid.).

Após a publicação do Decreto-Lei n.º 47480/67, de 02/01, no ano letivo de 1968/69, é implementado o Ciclo Preparatório do Ensino Secundário. Na perspetiva de Ferreira (2003), esta inovação foi “(…) objecto de reflexão durante uma dezena de anos, desde que o Ministro Leite Pinto , em 14 de Marco de 1958, nomeou uma comissão encarregada dos estudos para a unificação do 2.º Ciclo do Ensino Liceal e do Ciclo Preparatório do Ensino Técnico até que o Ministro Galvão Teles do ainda Governo de Salazar o criaram” (p. 13). A criação do Ciclo Preparatório permitiu, por um lado, que os jovens das classes sociais desfavorecidas se mantivessem no sistema depois dos primeiros quatro anos, e por outro lado, não os impelia a recusar imediatamente a via liceal e académica.

No início dos anos 70, surgiu em Portugal “uma importante e decisiva reforma educacional, conhecida como a reforma de Veiga Simão” (Stoer, 1982, p. 28), publicada através da Lei n.º 5/73, 25/07. Esta reforma foi “o indicador concreto do colapso da ideologia educacional dominante da era de Salazar” (Ibid). Nos princípios fundamentais da Lei nº 5/73, 25/07, podemos ler que compete ao Estado, além de assegurar a todos os portugueses o direito à educação, “tornar efectiva a obrigatoriedade de uma educação básica generalizada como pressuposto indispensável da observância do princípio fundamental da igualdade de oportunidades para todos”.

Neste contexto, a escolaridade obrigatória alargou-se por um período de oito anos, que se subdividiram por quatro anos de ensino primário e outros quatro anos ministrados em escolas preparatórias, sendo os postos de Telescola considerados úteis, enquanto não fosse possível assegurar a todos os alunos o ensino direto.

Stoer (1982) refere que, no essencial, as reformas de Veiga Simão tinham como objetivos o aumento da escolaridade obrigatória de seis para oito anos, reformas do ensino superior, reforma respeitante à formação de professores através da criação de escolas superiores de formação e de departamentos universitários de ciências da educação. No entanto, devido à revolução de 1974, esta Lei não chegou a ser implementada na totalidade.

A revolução de abril de 1974 trouxe inúmeras mudanças no campo educativo. De acordo com Stoer (1982), a democratização do ensino em Portugal foi-se consolidando “criando, (…) formas de escolaridade democrática que tiveram como efeito estender e aprofundar as noções de democracia contidas na Reforma de Veiga Simão, iniciando (…) campanhas de educação das massas em nome da igualdade de oportunidades educativas” (Ibid., p. 42).

No quarto período, pós 25 de abril, entre a diversidade de legislação produzida, no tocante ao ensino primário, foram aprovados novos programas que integravam, pela primeira vez, áreas como o Meio Físico e Social, Música, Movimento e Drama e Saúde e foi proposta uma nova organização pedagógica, cujas diretrizes assentavam na substituição do regime de classes pelo regime de fases de aprendizagem, de dois anos cada.

Na década de 1970, através do Decreto-Lei n.º 538/79, foi decretada “a universalidade, a obrigatoriedade e a gratuitidade do ensino básico com duração de 6 anos e que engloba as crianças com idades compreendidas entre os 6 e os 14 anos” (Almeida et al, 2009, p. 6). A propósito da Reforma Curricular do Ciclo Preparatório em 1974 e 1975, Ferreira (2003) refere que esta “(…) teve o principal defeito de ter destruído o conceito de conjunto lectivo (…)” , na medida em que “(…) deixou de haver vinculo entre ser professor de Português/Estudos Sociais/História ou entre Matemática/Ciências da Natureza e o número de Professores de cada turma foi aumentando até chegar ao número deplorável de onze” (p. 45). O autor comparando a estrutura deste nível de ensino com o regime de monodocência do 1.º Ciclo do Ensino Básico, acrescenta que “para quem teve, durante quatro anos, como modelo, um professor, convenhamos que deve ser um grande factor de perturbação e, fundamentalmente, de seletividade” (Ibid.).

No final dos anos 80, uma nova reforma educativa veio integrar os três ciclos no ensino básico, dotando-os formalmente de unidade e de universalidade. A Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE), Lei n.º 46/86, de 14 de outubro, destacava a unidade do ensino básico de nove anos. Os princípios enunciados nesta Lei foram reforçados, posteriormente, por uma reorganização curricular e organizativa na viragem do milénio.

Na segunda metade dos anos 90, assistiu-se à expansão e diversificação da rede escolar. O Governo de então encetou várias medidas, cujo intuito foi o desenvolvimento da educação pré-escolar, a promoção da autonomia dos professores na gestão das escolas e dos currículos, a criação de territórios de intervenção prioritária e vias alternativas de completar a escolaridade obrigatória, a introdução de áreas curriculares não disciplinares, a Formação Cívica, a Área de Projeto e o Estudo Acompanhado.

2.2.2. Organização do sistema educativo português

De acordo com o art.º 4.º da LBSE, o sistema educativo compreende três subsistemas diferenciados e com finalidades próprias: a educação pré-escolar, a educação escolar e a educação extraescolar.

Figura 1. Organização do Sistema Educativo Português

Fonte: Eurydice, 2007

A educação pré-escolar, de grande expansão nos anos 90, destina-se a crianças com idades compreendidas entre os três anos e a idade de ingresso no ensino básico (6 anos) e deve realizar-se em estreita cooperação com a família, sendo a sua frequência facultativa.

A educação escolar ou formal desenvolve-se, sequencialmente, em três níveis: o ensino básico, o ensino secundário e o ensino superior.

“O ensino básico é universal, obrigatório e gratuito e tem a duração de nove anos” (n.º 1, do artigo 6.º, da Lei n.º 46/86, de 14 de outubro). A obrigatoriedade de frequência aplica-se a crianças entre os 6 e os 15 anos de idade e pode ser cumprida em escolas públicas, escolas particulares ou cooperativas.

Os objetivos do ensino básico encontram-se plasmados no artigo 7.º, da LBSE e visam: assegurar uma formação geral de base comum a todos os alunos; assegurar a inter-relação entre o conhecimento teórico e prático, a cultura escolar e a cultura do quotidiano; proporcionar o desenvolvimento físico e motor; encorajar as atividades manuais e promover a educação artística; ensinar uma primeira língua estrangeira e iniciar uma segunda; proporcionar a aquisição de conhecimentos básicos que permitam aos alunos prosseguir os seus estudos ou serem admitidos em cursos de formação profissional; desenvolver o conhecimento e o apreço pelos valores específicos da identidade, língua, história e cultura portuguesa; desenvolver atitudes autónomas; proporcionar às crianças com necessidades educativas específicas condições adequadas ao seu desenvolvimento; criar condições de promoção do sucesso escolar e educativo de todos os alunos.

O ensino básico organiza-se em três ciclos sequenciais:

• 1.º Ciclo, com a duração de quatro anos (dos 6 aos 10 anos de idade); • 2.º Ciclo, com a duração de dois anos (dos 10 aos 12 anos de idade); • 3.º Ciclo, com a duração de três anos (dos 12 aos 15 anos de idade).

Relativamente ensino secundário, a LBSE define-o como um ciclo único de ensino pós- obrigatório, com a duração de três anos, organizado segundo formas diferenciadas, orientadas quer para o prosseguimento de estudos, quer para a vida ativa, devendo ser assegurada a permeabilidade entre estas duas vias.

O ensino superior compreende o ensino universitário e o ensino politécnico. O ensino universitário visa assegurar uma sólida preparação científica e cultural e proporcionar uma formação técnica que habilite para o exercício de atividades profissionais e culturais, fomentando o desenvolvimento das capacidades de conceção, de inovação e de análise crítica. O ensino politécnico visa proporcionar uma sólida formação cultural e técnica de nível superior, desenvolver a capacidade de inovação e de análise crítica e ministrar conhecimentos científicos de índole teórica e prática com vista ao exercício de atividades profissionais.

Na sequência da alteração da LBSE, o Governo aprovou o Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de março, que procedeu às alterações relativas ao novo modelo de organização do ensino superior no que respeita aos ciclos de estudos e sua duração, em conformidade com os princípios da Declaração de Bolonha.

A educação extraescolar integra-se numa perspetiva de educação permanente e de formação contínua, permitindo a cada indivíduo desenvolver os seus conhecimentos e potencialidades, em complementaridade da formação escolar recebida ou em suprimento das lacunas e omissões provocadas pela sua carência.

São domínios da educação extraescolar: a alfabetização e a educação básica de adultos, atividades de reconversão e aperfeiçoamento profissional, o desenvolvimento das aptidões tecnológicas e de saber técnico, ocupação criativa dos tempos livres.

Interessa, neste cenário, fazer uma abordagem mais particularizada à organização dos dois primeiros ciclos do ensino básico.

O 1.º CEB tem a duração de quatro anos e é ministrado, em regime misto, em escolas básicas do 1.º ciclo (EB1), ou escolas básicas integradas (EBI), dos setores público ou particular e cooperativo.

A LBSE define como principais objetivos para o 1.º ciclo: o desenvolvimento da linguagem oral e a iniciação e progressivo domínio da leitura e da escrita, das noções essenciais da aritmética e do cálculo, do meio físico e social, das expressões: plástica, dramática, musical e motora.

O ensino é globalizante, da responsabilidade de um professor único, que pode ser coadjuvado por outros professores em áreas especializadas, nomeadamente Música, Língua Estrangeira, Educação Física. As turmas devem ser constituídas, no máximo, por 25 alunos, devendo o mesmo professor acompanhar o grupo de alunos ao longo dos 4 anos que compõem o 1.º ciclo. O tempo letivo é gerido pelo professor, tendo em conta as caraterísticas do grupo, o horário escolar e os intervalos, acordados em conselho de docentes.

O 2.º CEB tem a duração de dois anos e é ministrado, em regime misto, em escolas públicas, de iniciativa privada ou cooperativa. As escolas públicas podem corresponder a diferentes tipologias: escola básica - 1.º e 2.º ciclos (EB1, 2); escola básica - 2.º e 3.º ciclo (EB2, 3); escola básica integrada (EBI); escola básica e secundária – 2.º, 3.º ciclos e secundário (EBS).

De acordo com a LBSE, os objetivos específicos do 2.º CEB incidem na formação humanística, artística, física e desportiva, científica e tecnológica, e na educação moral e cívica, visando habilitar os alunos a assimilar e interpretar crítica e criativamente a informação, de modo a possibilitar a aquisição de métodos, de instrumentos de trabalho e de conhecimento que permitam a sequência da sua formação, numa perspetiva do desenvolvimento de atitudes ativas e conscientes perante a comunidade.

O 2.º CEB funciona em regime de pluridocência, está organizado por áreas de estudo de caráter pluridisciplinar, sendo desejável que a cada área corresponda um/dois professores. O número de alunos por turma varia entre 24, número preferencial, e um máximo de 28. O horário semanal corresponde a 17 tempos letivos em cada um dos anos, organizados em períodos de 90 minutos. Em situações justificadas, a escola pode distribuir a carga horária semanal dos alunos de forma diversa, respeitando os totais por ciclo e por ano de escolaridade.