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4 DISCRIMINAÇÃO RACIAL: DANO MORAL E ÔNUS DA PROVA

5 INSTRUMENTOS INTERNACIONAIS E O DIREITO AO TRABALHO SEM DISCRIMINAÇÃO RACIAL

5.1 Breves considerações

Uma declaração inclui princípios morais e éticos que buscam nortear os povos, estabelecendo uma ética universal, segundo Flávia Piovesan251 e, por essa razão, deve ser adotada por todos os países democráticos. A Declaração Universal dos Direitos Humanos serve de parâmetro para a comunidade internacional deslegitimar os Estados que costumam desrespeitar os princípios previstos naquele documento.

A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados,252 de 1969, define Tratado Internacional como: “acordo internacional celebrado por escrito entre Estados e regido pelo direito internacional, quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação particular” (artigo 2º, § 1º, a). Por serem documentos baseados no direito internacional público, esses tratados geram efeitos jurídicos para os signatários.

Tratado internacional também pode ser conceituado como um ato jurídico, em que dois ou mais países concordam sobre a criação, modificação ou extinção de algum direito.253

Valerio de Oliveira Mazzuoli254 leciona que:

[...] Os tratados e convenções internacionais são atos, em princípio, solenes, cuja conclusão requer a observância de uma série de formalidades rigorosamente distintas e sucessivas. São quatro as fases pelas quais têm de passar os tratados solenes, até sua conclusão: a) a das negociações preliminares; b) a da assinatura ou adoção, pelo Executivo; c) a da aprovação parlamentar (referendum) por parte de cada Estado interessado em se tornar parte no tratado; e, por fim, d) a da ratificação ou adesão do texto convencional, concluída com a troca dos instrumentos que a

251 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. 1ª ed. São Paulo: Max Limonad, 1998.

252 A Convenção de Viena de 1969 começou a vigorar internacionalmente em 1980. Foi complementada pela

Convenção de 1986 sobre Direitos dos Tratados entre Estados e Organizações Internacionais ou entre estas. No Brasil, em 22 de abril de 1992, o Poder Executivo encaminhou para apreciação do Congresso Nacional. A matéria ficou pendente desde 1995 até ser ratificada em 25 de setembro de 2009 (com ressalvas para os artigos 25 e 66) e promulgada pelo Decreto 7.030, de 14 de dezembro de 2009.

253 SILVA, De Plácido E. Vocabulário Jurídico. 26ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 1429.

254 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Os Tratados Internacionais de Proteção dos Direitos Humanos e sua Incorporação no Ordenamento Brasileiro, dez/2005. Disponível em: <http:// www.mt.trf1.gov.br/judice/jud13/tratados.htm>. Acesso em: 20/05/2011.

consubstanciam. Esta última formalidade, como explica Marotta Rangel, tem a finalidade de vincular juridicamente os signatários, de tal sorte que, a partir dela, deve o tratado internacional ser observado estritamente, nos limites de seus termos, pelas partes contratantes.

Todos os direitos e obrigações expressos no ato internacional, antes da ratificação, ficam restritos às relações mútuas dos signatários, ainda não tendo se incorporado no ordenamento jurídico interno desses mesmos contratantes.255

No Brasil, mesmo após a ratificação do acordo, deverá haver sua promulgação através de decreto do Presidente da República e publicado no Diário Oficial da União, para assim, ter aplicabilidade e executoriedade internas.256

Segundo Flávia Piovesan257, os tratados e convenções internacionais, em atendimento ao disposto no parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição da República,258 têm hierarquia de norma constitucional e, por consequência, aplicabilidade imediata.

A dignidade humana e os direitos fundamentais são princípios constitucionais que reúnem as exigências de justiça e dos valores éticos, servindo como base para todo o sistema jurídico brasileiro. Nesse sentido, Flávia Piovesan,259 levando em consideração o referido dispositivo constitucional, ensina que podem os direitos fundamentais ser organizados em três grupos: a) o dos direitos expressos na Constituição; b) o dos direitos implícitos decorrentes do regime de princípios adotados pelo Texto Maior e c) o dos direitos expressos nos tratados internacionais adotados pelo Brasil. Ao realizar a incorporação dos direitos previstos nos tratados e convenções, a Constituição da República atribui aos direitos internacionais uma hierarquia especial e diferenciada, qual seja a de norma constitucional.

Cumpre salientar que, em que pese a defesa dos doutrinadores pela hierarquia constitucional e aplicabilidade imediata dos direitos e garantias fundamentais previstos nos tratados e convenções internacionais, a nossa Corte suprema tem entendido que:

255 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Os Tratados Internacionais de Proteção dos Direitos Humanos e sua Incorporação no Ordenamento Brasileiro, dez/2005. Disponível em: <http:// www.mt.trf1.gov.br/judice/jud13/tratados.htm>. Acesso em: 20/05/2011.

256 Ibidem.

257 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. 1ª ed. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 28.

258 “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos

princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

[...] É irrecusável que os tratados e convenções internacionais não podem transgredir a normatividade subordinante da Constituição da República nem dispõem de força normativa para restringir a eficácia jurídica das cláusulas constitucionais e dos preceitos inscritos no texto da Lei Fundamental (ADI 1.480/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno). - Revela-se altamente desejável, no entanto, "de jure

constituendo", que, à semelhança do que se registra no direito constitucional

comparado (Constituições da Argentina, do Paraguai, da Federação Russa, do Reino dos Países Baixos e do Peru, v.g.), o Congresso Nacional venha a outorgar hierarquia constitucional aos tratados sobre direitos humanos celebrados pelo Estado brasileiro [...].260

[...] O exame da vigente Constituição Federal permite constatar que a execução dos tratados internacionais e a sua incorporação à ordem jurídica interna decorrem, no sistema adotado pelo Brasil, de um ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação de duas vontades homogêneas: a do Congresso Nacional, que resolve, definitivamente, mediante decreto legislativo, sobre tratados, acordos ou atos internacionais (CF, art. 49, I) e a do Presidente da República, que, além de poder celebrar esses atos de direito internacional (CF, art. 84, VIII), também dispõe - enquanto Chefe de Estado que é - da competência para promulgá-los mediante decreto. O iter procedimental de incorporação dos tratados internacionais - superadas as fases prévias da celebração da convenção internacional, de sua aprovação congressional e da ratificação pelo Chefe de Estado - conclui-se com a expedição, pelo Presidente da República, de decreto, de cuja edição derivam três efeitos básicos que lhe são inerentes: (a) a promulgação do tratado internacional; (b) a publicação oficial de seu texto; e (c) a executoriedade do ato internacional, que passa, então, e somente então, a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno [...].261

Valerio Mazzuoli262 esclarece que os direitos internacionais oriundos de acordos internacionais, diante da cláusula de não exclusão do parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição Federal, passam a incluir-se no chamado “bloco de constitucionalidade” e não no texto constitucional propriamente dito.

Os tratados ratificados e promulgados pelo Brasil, atinentes a direitos humanos, mesmo antes da Emenda Constitucional nº 45, de dezembro de 2004, eram considerados como normas de hierarquia constitucional, tendo em vista que, quando a Constituição da República, em seu art. 5º, §§ 1º e 2º, dispõe que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata” e “os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros direitos decorrentes dos tratados internacionais”, acabava

260 STF, HC 81319, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 24/04/2002, DJ 19-08-

2005 PP-00005 EMENT VOL-02201-02 PP-00186 RJSP v. 53, n. 335, 2005, p. 136-137

261 STF, ADI 1480 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 04/09/1997, DJ 18-

05-2001 PP-00429 EMENT VOL-02031-02 PP-00213.

262 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Os Tratados Internacionais de Proteção dos Direitos Humanos e sua Incorporação no Ordenamento Brasileiro, dez/2005. Disponível em: <http:// www.mt.trf1.gov.br/judice/jud13/tratados.htm>. Acesso em: 20/05/2011.

por incluir no catálogo dos direitos constitucionalmente protegidos, os direitos previstos nos tratados internacionais em que o Brasil seja signatário.263

A referida emenda acrescentou o parágrafo 3º ao artigo 5º da Carta Magna, segundo o qual: “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.”

Assim, entende-se que os tratados e convenções internacionais passariam a ser incorporados ao texto constitucional e não apenas considerados com hierarquia constitucional como outrora.

Essa inserção veio para encerrar com a discussão sobre a hierarquia das normas internacionais de direitos humanos e sua aplicabilidade quando em confronto com outros direitos fundamentais enunciados na Constituição Federal.