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O câncer é definido como um grupo de doenças crônicas que se caracteriza pelo crescimento tissular patológico, originado por uma proliferação contínua de células anormais com capacidade de expansão local e por seu potencial de emersão e destruição dos tecidos adjacentes ou a distância. É causado por diferentes agentes: físicos, químicos, orgânicos, genéticos, ou ainda relacionados ao meio ambiente e aos hábitos ou costumes próprios de um ambiente social e cultural146. Os cânceres de pulmão, boca, laringe e bexiga, por exemplo, estão diretamente relacionados com o uso do cigarro147, por conter substâncias cancerígenas. Nas mulheres o câncer de mama e da área genital são os tipos mais comuns, enquanto nos homens é o câncer de próstata, que pode ocorrer, sobretudo, acima dos 50 anos. Entre as crianças, o câncer mais comum é a leucemia148. Todos esses tipos de câncer, se detectados precocemente e tratados adequadamente, podem ser curados, perdendo assim o estigma de doença terminal.

Observa-se que nos países em desenvolvimento são diagnosticados cerca de cinco milhões e meio de novos casos anuais de câncer, de acordo com Guerra & Gallo (2005). Esses números alarmantes estão relacionados ao processo de expansão e fortalecimento do capitalismo, efetivado com o desenvolvimento da indústria e das cidades, desencadeando dois fatores: o primeiro refere-se à redefinição de padrões de vida com “uniformização” das condições de trabalho (saída do campo para a cidade), nutrição e consumo, a utilização de agrotóxicos na agricultura, a poluição provocada pelos gases na atmosfera, o estresse, as mudanças alimentares etc. O segundo está diretamente relacionado ao aumento da expectativa de vida e envelhecimento populacional, devido à redução nas taxas de mortalidade e natalidade, o que proporcionou uma significativa alteração na demografia mundial.

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BRASIL, 2004b. 147

Segundo Pinto (2008), “[...] o tabagismo é responsável por 200 mil mortes por ano no Brasil, em média, 23 por hora. Doença que afeta 16% dos brasileiros, o fumo está associado a 25% das doenças vasculares, incluindo derrame cerebral, e a 25% das mortes causadas por angina e infarto do miocárdio. Causa também 90% dos casos de câncer de pulmão e responde por 30% das mortes decorrentes de câncer de laringe, faringe, boca, esôfago, pâncreas, rim, bexiga e colo do útero”. Em suas pesquisas a autora afirma que anualmente são gastos cerca de R$ 338,6 milhões pelos cofres públicos com doenças provocadas pelo tabagismo na rede pública de saúde brasileira. 148

A leucemia é uma doença maligna dos glóbulos brancos (leucócitos), de origem, na maioria das vezes, não conhecida; em outras palavras, as leucemias são cânceres das células do sangue. De acordo com Dobbin, a principal característica desta doença “[...] é o acúmulo de células jovens (blásticas) anormais na medula óssea, que substituem as células sanguíneas normais”. A medula é o local de formação das células sangüíneas, e nelas são encontradas as células precursoras, que originam os elementos figurados do sangue: glóbulos brancos, glóbulos vermelhos (hemácias ou eritrócitos) e plaquetas. Os principais sintomas da leucemia decorrem do acúmulo dessas células na medula óssea, prejudicando ou impedindo a produção dos glóbulos vermelhos, dos glóbulos brancos e das plaquetas. DOBBIN, J. Leucemia Aguda. Texto sem data de publicação, disponível em <http://www.inca.gov.br/conteudo_view.asp?id=344> Acesso em 25 de setembro de 2008.

Conseqüentemente a esta reorganização global, verifica-se uma grande modificação nos padrões de saúde-doença no mundo, conhecida como transição epidemiológica, caracterizada pela mudança no perfil de mortalidade, com a diminuição da taxa de doenças infecciosas e o aumento concomitante de doenças crônico-degenerativas149, especialmente as doenças cardiovasculares e as neoplasias150.

Nos países da América Latina, é possível observar um aumento na ocorrência de doenças crônico-degenerativas como o câncer, doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, doença de Alzheimer, e a permanência de um elevado índice de doenças infecciosas e de doenças transmissíveis por vetor biológico, como a malária e a dengue, além da presença de outros agravos relacionados aos fatores nutricionais como o envelhecimento, a obesidade e a desnutrição151.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o número de novos casos de câncer aumentará de 10 milhões para 15 milhões em 20 anos, e 60% ocorrerão nos países em desenvolvimento. Segundo o Instituto Nacional de Câncer – INCA, as estimativas para o ano 2008 são de 466.730 casos novos de câncer no Brasil, mantendo-se no ranking em segundo lugar em causas de mortes no país, com mais de 130 mil óbitos anuais, o que corresponde a 13% do total das causas de mortes, perdendo apenas para as mortes causadas pelas doenças cardiovasculares. Estes números são mais alarmantes quando comparados com a AIDS, pois trata-se de um universo de pacientes maior do que o total de brasileiros infectados pelo vírus HIV nos últimos 24 anos152.

Com o advento de novos conhecimentos da etiopatogenia relacionados à genética e estudos imunohistoquímicos, surgiram novas drogas, com esquemas terapêuticos muitas vezes individualizados, de alto custo. Esses fatores tornaram o tratamento de câncer bastante oneroso aos cofres públicos. Conforme Santini (2007), nos últimos seis anos o governo federal aumentou os gastos com assistência oncológica em cerca de “[...] 121%, passando de R$ 570 milhões para mais de R$ 1,20 bilhão”. Atrelado a isso, destaca-se que a falta de prevenção e/ou falta de detecção precoce e seguimento adequado, bem como a falta de controle da doença demandam uma assistência médico-hospitalar de custo sempre crescente, em razão da permanente e necessária incorporação tecnológica. Com o aumento e o

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A nomenclatura câncer – associada à morbidez – foi transformada na terminologia menos comprometida: “doenças crônico-degenerativas”.

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Cf. GUERRA & GALLO, 2005. 151

Op. cit. 152

envelhecimento da população, estima-se que os casos de câncer nos próximos anos se ampliarão, e surgirão drogas específicas para cada tipo histopatológico de câncer e tratamento. Segundo o autor, calcula-se que no Brasil os tratamentos à base de quimioterápicos realizados pelo SUS chegaram a 450% nos últimos anos; em números isto representa um salto de R$ 18 milhões para R$ 82 milhões153.

A historiografia do combate ao câncer revela-nos que na Europa e nos EUA é desde a virada do século XIX para o século XX, período marcado pelo alto índice de mortalidade ocasionada principalmente por três doenças: a tuberculose, a sífilis e o câncer154, todas já conhecidas, que a partir de então passam a ser compreendidas como calamidades sociais. Logo após a PrimeiraGuerra Mundial começaram a surgir medidas de atenção médica e social visando o controle dessas doenças nesses países.

Segundo Sanglard (2005), a luta contra o câncer até então não tinha “[...] equivalentes na história, pois pela primeira vez se elegeria como flagelo uma doença não- controlada pela ação da higiene, sendo a cirurgia e a radioterapia as únicas ações profiláticas sobre ela”. Neste aspecto, a luta contra o câncer apresentava dois aspectos principais: “[...] de um lado, a terapêutica do câncer adequava-se cada vez menos às práticas individualizantes da medicina de então; de outro, a necessidade do diagnóstico precoce forçava uma maior interação entre médico e o paciente. A partir destes dois eixos, o controle do câncer viria alterar a estrutura hospitalar existente desde o início do século XIX” (PINELL 1992 p. 11-12, apud SANGLARD, 2005, p. 171).

2.2 A ATENÇÃO ONCOLÓGICA NA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL: