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E aos centos, em multidão... com os olhos postos numa felicidade: a visibilidade da emigração na imprensa, 1890-1920 / Domingos José Alves Caeiro. - Lisboa : [s.n.], 2002.

orientador: Maria Beatriz Rocha-Trindade

http://hdl.handle.net/10400.2/2419

Tese de Doutoramento em Ciências Sociais e Humanas na especialidade de História

Emigração portuguesa / Brasileiros / Regresso / Propaganda / Século XIX / 1920 / Investimento / Política das migrações / Imprensa / Sociologia das migrações / Brasil

Resumo: Abrangendo todo o século XIX e primeiro terço do XX, a pesquisa abarcou um período que levanta particulares dificuldades a uma visão de conjunto e a um conhecimento rigoroso da massa dos nossos jornais e em que, ao mesmo tempo, estes passam a desempenhar uma relevante função social, constituindo uma fonte histórica de primeira importância. Desta forma, representando a imprensa, neste período, uma função crucial de ligação entre a tribuna e a rua, de informação e de comunicação, afigurou-se-nos, não é de mais repeti-lo, que a intelecção do tema da “visibilidade da emigração portuguesa na imprensa periódica”, no período atrás definido, passava irremediavelmente, por um levantamento, tão exaustivo quanto possível, da imprensa periódica com dimensão nacional, porque todo esse universo de notícias desvenda um panorama do fenómeno migratório e da forma como este foi vivenciado e debatido em certos sectores. Portugal esteve longe de ser um caso isolado na engrenagem dos fluxos migratórios europeus, e parece-nos que nem tão pouco se pode afirmar que Portugal teve um comportamento migratório distinto ou individualizado, excepção, talvez, no que diz respeito à invariabilidade do país de destino da emigração – o Brasil. Por tudo isto, tornou-se imprescindível situar o caso de Portugal no seu conjunto, à luz da historiografia internacional, e fazer um esforço de avaliação e aferição de hipóteses explícitas.

A análise das características mais marcantes do movimento emigratório permitiu constatar que Portugal apresentou um comportamento emigratório semelhante ao de outros países europeus, em particular os da Europa do Sul, como a Espanha e a Itália. Destacando-se duas particularidades:

• a sua quase exclusiva e constante orientação em direcção ao Brasil;

• e a sua maior concentração a partir dos finais da década de oitenta de oitocentos até ao início da Primeira Grande Guerra.

O Brasil, foi sem dúvida o destino preferencial da corrente emigratória portuguesa neste período. A existência de contactos frequentes a nível económico e a manutenção dos laços históricos e culturais desde a época colonial, foram importantes para a manutenção desta preferência. No que respeita à composição por sexos e idades, a emigração portuguesa participou das características básicas e essencialmente selectivas de todos os movimentos emigratórios: forte presença masculina e revelando uma maior concentração nas faixas etárias mais produtivas. Por sua vez, dada a estrutura da economia portuguesa neste período, a maioria dos emigrantes eram agricultores e jornaleiros; embora à medida que cronologicamente avançamos e se regista também um aumenta do fluxo emigratório, constatase a presença de outros grupos socio-profissionais distintos dos de agricultor. Outra das características da emigração portuguesa na sua comparação com outros países europeus – Espanha e Itália – é a grande concentração nos anos 1911 a 1913. Outro aspecto significativo a destacar foi o facto de ter existido em Portugal uma verdadeira preocupação pela emigração, primeiro por parte de intelectuais e depois a partir de meados da primeira década de novecentos, quando a emigração começa a atingir magnitudes que chamaram a atenção dos contemporâneos, foi, então, a imprensa o espaço privilegiado para o debate. Todavia, a emigração, com excepção de uns poucos, foi considerada por intelectuais e políticos, como um mal e, sobretudo, como um sinal de decadência para Portugal. A maior intensidade do movimento emigratório teve início, precisamente, num período em que se questionavam os grandes temas da sociedade portuguesa, coincidindo também com o descrédito do regime monárquico e posteriormente com a fase de implantação do regime republicano. A Lei de 1907 (Lei dos Passaportes) não resolveu nada, a não ser mais alguns proventos para o Estado. A Lei de 1919 foi muito tardia, comparada com a legislação nesta matéria por parte de outros países europeus, e o seu carácter tutelar não fez mais do que reflectir a preocupação restritiva que esteve sempre presente em toda a legislação portuguesa até aí publicada, isto

é, tentar evitar as saídas clandestinas e os abusos. Com o objectivo de pretender analisar o comportamento específico da emigração portuguesa na sua vertente cronológica, tentou-se explorar as possíveis conexões entre determinadas variáveis macro-económicas e a emigração. Neste âmbito, prestou-se alguma atenção ao fenómeno da crise agrária “finisecular”, bem como o seu impacto na sociedade rural. Da análise realizada pode-se concluir que a relação entre a emigração e os indicadores da economia portuguesa neste período, em particular os indicadores do crescimento do produto agrícola e os níveis de produtividade agrícola nalgumas culturas, assim como os níveis de produtividade de mão-de-obra, mostra- se ambígua, nomeadamente em relação às suas flutuações, em especial nas últimas décadas do século XIX. No século XX, até à Primeira Grande Guerra, a aceleração da emigração portuguesa é paralela à dos indicadores da actividade económica. No entanto, a variável que demonstra ter uma maior incidência nas flutuações da emigração é a protecção à agricultura portuguesa (proteccionismo cerealífero) desde os finais do século XIX, revelando-se um poderoso travão a um maior crescimento da emigração. Como não podia deixar de ser, tentou-se mostrar que a conjunção dos factores internos e externos marcaram também o curso da emigração. Pode-se afirmar que os indicadores gerais da economia portuguesa em certos períodos tiveram um papel quase secundário face à procura e às solicitações, bem como á agressividade da política imigratória brasileira, que pareceram ser mais poderosas e desempenharam neste âmbito um papel importante. Em suma, os factores de atracção mostraram também uma grande influência, a par das características específicas da economia portuguesa, porém, dentro destas últimas, provavelmente, poder-se-á afirmar que se não tivesse existido, nesta época, semelhante nível de protecção à agricultura, a emigração portuguesa teria sido ainda maior. No fundo, pode- se arriscar a dizer que, nessa altura, tinham emigrado os antepassados daqueles que acabariam por fazê-lo nos anos sessenta do século XX.