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A MÚSICA DA COMPANHIA CINEMATOGRÁFICA VERA CRUZ

CANÇÕES E A PRESENÇA DO RÁDIO

A canção sempre esteve presente na narrativa cinematográfica. No Brasil, houve uma relação muito estreita entre o cinema e o rádio. Como vimos, os compositores de música que atuaram no rádio passaram a atuar no cinema e posteriormente na televisão. Em 1933, o rádio e o cinema sonoro se concatenaram ao carnaval e foram produzidos os filmes chamados de “musico-carnavalescos”, pela Cinédia52. Destacando a figura de Humberto Mauro e também de Adhemar Gonzaga, que utilizavam no cinema artistas conhecidos, os quais já possuíam algum sucesso no rádio. Esse gênero de filme tinha o modelo parecido ao de shows de cassino e de revista: canções de carnaval e atores- cantores de rádio. Atuaram nesse período Carmem Miranda, Francisco Alves e Lamartine Babo.

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Em meados da década de 40, a chanchada, uma mistura de comédia e canções de carnaval, parodiava filmes clássicos conhecidos do grande público, destacando os atores-comediantes que se tornaram astros do cinema, com isso obteve grande sucesso junto ao público. A trilha musical desse período se baseava em composições para espetáculos musicais e tinha uma ligação muito forte com o teatro de revista. Em conseqüência disso, durante os anos 30 e 40, o Rio de Janeiro teve uma maior produção cinematográfica53 e se verificou muito interesse no comércio e exibição dos filmes nacionais.

Percebemos que, assim como em outros países também a canção no Brasil teve uma grande importância no cinema. Principalmente para que este se firmasse como comercial e industrial. Pois, o filme apresentava uma canção de boa aceitação, esta era veiculada ao rádio e a venda de discos aumentava, com isso o filme conseguiria maior projeção, então seria mais visto e por consegüinte, venderia mais.

A canção é diferente da música instrumental, que permite uma gama de possibilidades de interpretação. Carrasco conclui, que sem letra, a inserção da música em filmes “tem o poder de penetrar no universo da narrativa e coexistir com a ação,

sem que isso seja prejudicial à clareza e a inteligibilidade dessa ação.”54 Pontuamos

que o fato da música possuir letra, torna a inserção da composição na narrativa fílmica mais delicada, pois o poder descritivo é maior e há a associação do discurso musical e o texto poético. Portanto, a canção inserida no cinema deve ser muito bem articulada, para que o diretor não tenha surpresas quanto à recepção do público posteriormente.

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GOMES, Paulo Emílio Sales. Cinema: Trajetória no Subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980. CATANI, Afrânio Mendes. “Cinema Paulista”. In: RAMOS, Fernão. História do cinema brasileiro. São Paulo: Art, 1987.

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A canção tem interferência ativa na narrativa e pode ocorrer nas cenas de caráter épico ou dramático. No caso de cenas com caráter épico, este tipo é o mais delicado de ser abordado pelo compositor, pois a canção deve apresentar uma característica dupla. Ela deve ser notada por estar se referindo à ação representada e ao mesmo tempo, não pode suplantar a ação de modo que o espectador preste mais atenção na letra da música ao filme. Contudo, há a regra básica, usada com freqüência: se quisermos que a canção interfira diretamente a colocamos em 1º plano, ao contrário, a inserimos em 2º plano.

Por um outro lado, existe a canção já inserida na narrativa, referimo-nos a canção como intervenção naturalista, ou seja, ela faz parte do contexto e o espectador a percebe. Este tipo de uso de canções é facilmente encontrado nos filmes da Companhia Vera Cruz, pois 77 % dos filmes utilizaram a canção deste modo. Percebemos que essa intervenção se faz notar por duas maneiras: o cantor é acompanhado de uma pequena orquestra ou é acompanhado por um instrumento solo. Comumente, no caso do cantor se apresentar com orquestra, esta inserção é realizada com a introdução de um número musical em boate ou dancings. Observamos, que esses números musicais eram entremeados à apresentação da própria orquestra, esta enfatizava a música instrumental e utilizava o ritmo do samba interligado ao jazz americano. A utilização deste padrão rítmico rendeu-nos uma investigação.

Ao longo da história da música urbana brasileira, o samba, ritmo mais popular brasileiro, foi sofrendo influências dos gêneros de música que eram sucesso em cada época, advindos de outros países e que aqui chegavam como novidade. No período de 1920, os EUA iniciavam uma grande corrida industrial pós-guerra. A indústria investia

em novidades, o êxodo da população da periferia e dos imigrantes para os grandes centros, possibilitava a demanda e os artigos europeus soavam ultrapassados. Estes artigos novos somados ao apoio da publicidade, conferem uma mudança no modo de vida das pessoas. O Brasil, influenciado, passou a adotar as novidades norte- americanas como modelo, repercutindo em várias formas de cultura, bem como na música popular. Foi o período de surgimento das pequenas orquestras de música de dança no Rio de Janeiro, também conhecidas como jazz-bands.55 Logo, os bailes do tipo gafieira, freqüentados pela população negra e mestiça, incorporaram esse novo tipo de orquestra. Em meados de 1930, o repertório destas era composto por sambas, maxixes, fox-blues e valsas. Nesse período, Pixinguinha foi criticado por utilizar os recursos da música norte-americana para a música brasileira. Também nesse período foi significativo o uso do naipe de metais nas orquestrações para esses grupos musicais.

Tinhorão esclarece que a “influência da música norte-americana só se faria sentir

de certa maneira sobre as variedades de sambas orquestrados para atender ao gosto

da classe média”56, daí as várias denominações samba-canção, samba orquestral,

sambolero e outros. Após esse período, a influência da música norte americana minimiza-se por aproximadamente quinze anos. Contudo, com a política de boa vizinhança adotada por volta de 1942, na qual o Brasil exportava suas matérias primas e recebia artigos dos EUA, eram consolidadas aqui indústrias fonográficas norte americanas. Por sua vez, as indústrias garantiram no Brasil o mercado americano de discos, havendo uma retomada da influência da música norte americana na música

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TINHORÃO, José Ramos. História social da música popular brasileira. São Paulo: Ed. 34, 1998.

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brasileira. A música americana nesse período desenvolveu o be-bop, estilo que modificou o jazz tradicional e o Brasil incorporou esse estilo em sua música.

Durante a década de 40 e início de 50, houve uma proliferação das boates no bairro de Copacabana no Rio de Janeiro. Estas necessitavam oferecer a seus clientes, como turistas estrangeiros e os representantes do café society brasileiro, um tipo de dança mais disciplinada e universal. Essa exigência, incentivou a formação de pequenos conjuntos de piano, violão elétrico, contrabaixo, saxofone, trompete e bateria, que se especializaram em um tipo de ritmo misto de jazz e de samba.

Nos filmes da Companhia Vera Cruz, observamos que várias seqüências remetem-nos à esse período da música popular no país, conforme assinalamos nos exemplos:

Exemplo 49: Veneno Informações sobre a narrativa

Hugo e seus amigos vão à um restaurante-boate administrado por chineses.

Informações técnicas

Cena interna.

Ambientação: boate-restaurante com pista de dança e mesas.

Personagens: Hugo, seus colegas de trabalho, dançarinas da boate e dono do restaurante.

Primeira tomada de câmera parada com a fachada do restaurante. Posteriormente, cenas internas do mesmo, das meninas e dos senhores, amigos de Hugo em sua maioria em planos americano e geral do restaurante com mesas ocupadas.

Informações sobre a trilha musical

Inserção musical diegética.

Formação de piano, bateria, sax e clarinete. Composição ao ritmo de samba utilizando tipo de orquestração americana.

Nessa seqüência de Veneno, Hugo vai com seus amigos do trabalho a uma

boate. Nesta, ouvimos a intervenção musical de um pequeno conjunto composto por instrumentos de orquestra, como o trombone e clarinete. A composição apresenta o ritmo de samba com características do jazz americano, portanto incorporando

improvisações. Nota-se que as improvisações são todas executadas ao piano, enquanto o naipe de madeiras faz o ritmo de samba. Outra inserção semelhante, ocorre no exemplo do filme É proibido beijar, no qual um conjunto de instrumentação similar aparece em uma boate.

Exemplo 50: É proibido beijar Informações sobre

a narrativa

Suzy vai à uma boate com Harry. Lá encontram Steve que tira a moça para dançar e tenta convencê-la a lutar por seu amor. Logo após, chega Eduardo, este por sua vez, tenta convencê-la de que estava apenas ajudando June.

Informações técnicas

Cena interna. Ambientação: boate.

Personagens: Harry, Suzy, Steve, músicos e pessoas que estão na boate.

Seqüência composta vários planos. A câmera alterna planos médios de Suzy dançando com Steve e de Suzy conversando com Eduardo.

Informações sobre a trilha musical

Inserção musical diegética.

Mesmo estilo musical do exemplo anterior.

Com essas pequenas orquestras, surge o que Tinhorão denominou de “a era dos orquestradores”. O autor a classifica como sendo formada pelos músicos semi-

eruditos a serviço das fábricas gravadoras57. Os orquestradores trabalhavam com a

harmonização da música popular ao gosto da classe a quem era destinada esse tipo de música, a que comprava os discos, mas que estava presa a tradição das músicas norte americanas. Os arranjos desta fase priorizaram a instrumentação de metais para fazer o ritmo e deixavam de lado os instrumentos de percussão para essa função, como vimos no tópico anterior a respeito das orquestrações de Radamés Gnattali.

O samba, incorporou uma riqueza orquestral e isso adequava-se aos sambas canções. O samba canção – portanto, gênero musical predominante na classe média

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da década de 40 e início de 50 - possuía letra sentimental e interpretação de cantores com timbres próximos à ópera, como Vicente Celestino, Araci Côrtes e Orlando Silva. A Companhia Vera Cruz segue a tradição do cinema brasileiro de apresentar em seus filmes cantores da velha guarda e ídolos do rádio, os quais possuíam um timbre de voz empostado e utilizavam a técnica tradicional de canto. A aparição desses profissionais serviu também para alargar a projeção do filme, como se fazia no Rio de Janeiro com a Cinédia e as chanchadas da Atlântida, na décadas de 30 e 40. Como observamos a canção tem um poder muito grande a favor do reconhecimento da obra cinematográfica por parte do público.

Alguns autores, dentre eles Lenharo, comentam sobre a aparição de cantores no cinema. Por ocasião dessas inserções há comentários sobre Jorge Goulart ter sido testado para contracenar em filmes. Lenharo diz que não era preciso muito esforço e talento de ator para esses cantores. Porque “(...) as encenações não passavam de

meros desdobramentos de um clima esperado: o momento do número musical.58”

Nesse sentido concordamos com o autor, os cantores que participaram dos filmes da Vera Cruz, não tinham experiência como atores e apenas cantavam em um determinado momento do filme e depois não apareciam mais. Lenharo cita que o cinema pedia que o artista emprestasse sua imagem e seu prestígio pessoal para assegurar a presença do público. Todavia, lembremos que não só o cinema lucra com a exposição do artista nos filmes. Para o cantor, também era importante apresentar-se em um filme, assim como fazer parte do elenco de uma gravadora de renome, ser

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LENHARO, Alcir. Cantores do rádio – a trajetória de Nora Ney e Jorge Goulart e o meio artístico de seu tempo. Campinas, SP: Ed. da UNICAMP, 1995.

contratado de uma rádio famosa e cantar nas melhores boates; tudo isso significava sucesso garantido.

Nos filmes da Vera Cruz, sintonizada com o que havia de melhor e mais atual, há várias inserções de samba-canção. A instrumentação foi variada, apresentou acompanhamentos no naipe de violinos e piano e além da instrumentação de metais, guitarra, piano, bateria, percussão e contrabaixo.

Observamos no filme Na senda do crime, a orquestra acompanhando a cantora Isaura Garcia. Isaura conhecida como “a personalíssima” - apelido dado a ela por Blota Jr. - iniciou sua carreira aos treze anos cantando no programa ‘Na peneira’ da Rádio Cultura, mas foi eliminada. No ano seguinte, participou do programa ‘Qua Qua Qua Quarenta’, de Otávio Gabus Mendes, da Rádio Record, no qual venceu com o samba “Camisa listrada” de Assis Valente e foi contratada. Depois disso, trabalhou em várias boates e programas de rádio consagrando-se como cantora, sendo responsável por muitos sucessos na época. Em 1953, Isaura ou Isaurinha como a chamavam os fãs, foi eleita a Rainha do Rádio Paulista, tornando-se uma das cantoras mais populares do Brasil. Seu sucesso ”Mensagem” (“Quando o carteiro chegou...”), a tornou campeã de venda de discos da gravadora Continental. Com esse sucesso, incorporou outros títulos: Rainha da Noite, Rainha dos Taxistas, Rainha dos Carteiros. Isaurinha Garcia foi a primeira cantora de São Paulo a ganhar projeção nacional. Possuía um estilo romântico de cantar e os sambas-canções foram o ponto forte de sua carreira. Isaurinha trabalhou na Rádio Record até 1970 e sempre morou em São Paulo, embora tivesse feito alguns trabalhos no Rio de Janeiro, na Rádio Nacional59. Faleceu em 1993 e dez

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anos após sua morte (março de 2003) foi montado em sua homenagem um espetáculo sobre sua vida. Como percebemos, Isaurinha foi uma das cantoras paulistas que obtiveram mais projeção na época. Sua participação em Na senda do crime foi mais um atrativo da Vera Cruz para o público conferir. O filme foi lançado em 1954, ano do auge de sua carreira.

Isaura Garcia interpreta a canção “Neblina” no filme Na senda do crime

Exemplo 51: Na senda do crime Informações sobre

a narrativa

Sérgio e Margot estão na boate. Lá assistem a um número musical com cantora.

Informações técnicas

Cena interna. Iluminação em foco na cantora. Ambientação: boate.

Personagens: cantora, Margot, Sérgio e freqüentadores da boate.

O plano começa com close na mão do pianista e faz uma panorâmica até a cantora. A câmera acompanha a cantora em plano americano e vai para o plano de Sérgio e Margot. Em fusão, volta para a cantora e a acompanha em plano americano por duas vezes.

Informações sobre a trilha musical

Inserção musical diegética.

Introdução ao piano e após incorporação de cordas e madeira.

No exemplo abaixo, a atriz Leonora Amar, brasileira e conhecida por atuar em filmes mexicanos (no total de dezesseis) foi o atrativo da Companhia. Leonora interpreta uma canção cuja a letra faz alusão ao título do filme Veneno - “...você foi na

a mesma canção é apresentada no naipe de cordas e ao longo do filme, torna-se

leitmotiv do casal Hugo e Diana.

Leonora Amar dubla a canção “Veneno”

Exemplo 52: Veneno Informações sobre a narrativa

Hugo vai à uma boate com amigos do trabalho e lá ouve Diana cantar.

Informações técnicas

Cena interna. Ambientação: boate.

Personagens: Diana, Hugo e freqüentadores da boate.

Mesma tomada de câmera do exemplo anterior: 1º plano ao piano e depois a câmera abre-se para a cantora e o palco.

Informações sobre a trilha musical

Inserção musical diegética.

Introdução ao piano, depois intervenção nos instrumentos de cordas.

Outra cantora que atuou em filmes na Companhia Vera Cruz foi Inesita Barroso. Inesita iniciou sua carreira em 1950 na Rádio Bandeirantes e em seguida participou da inauguração da TV Tupi. Atuou na Rádio Nacional de São Paulo e posteriormente na Rádio Record. Em 1953, Inesita Barroso recebeu o prêmio Roquete Pinto de melhor cantora de rádio da música popular brasileira e o prêmio Guarany como melhor cantora de discos. Desde o início de sua carreira, Inesita esteve ligada ao folclore nacional e ao cinema. Em seu primeiro LP, gravou composições de Mário de Andrade e Zé do Norte. Em seguida, gravou mais três LPs com músicas brasileiras. Depois gravou mais dois,

um deles, com composições do folclore baiano, mineiro e paulista. Em 1955, ganhou novamente o prêmio Roquete Pinto e o prêmio Saci por sua participação no cinema. A partir daí, participou de várias conferências sobre folclore na USP, lançando livros sobre violão e folclore. Em 1969, lançou um LP com clássicos da música caipira e ganhou o troféu do I Festival de folclore sul-americano no Uruguai. Em 1970, lançou um LP sobre modinhas e também representou o Brasil no Japão no Festival de documentários Expo- 70. Posteriormente, continuou lançando LPs sobre a música caipira no Brasil e em 1975 lançou uma obra com músicas folclóricas recolhidas da Bahia, Mato Grosso, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Desde 1980, comanda o programa ‘Viola, minha viola’ na TV Cultura em 1990, fez a direção musical folclórica do programa ‘Estrela da manhã’ na rádio Cultura AM de São Paulo60. Na Companhia Vera Cruz, Inesita Barroso atuou em

Ângela e É proibido beijar. Entretanto, participou de outros filmes em outras

companhias cinematográficas. Constam em sua filmografia: Destino em apuros,

Mulher de verdade, O craque e Carnaval em lá maior.

Exemplo 53 – É proibido beijar Informações sobre

a narrativa

A cantora Suzi, namorada de Eduardo, ensaia em uma boate.

Informações técnicas

Cena interna.

Ambientação: palco de uma boate. Personagens: Eduardo, Suzi e músicos.

Plano geral no palco. No momento em que Eduardo chega, a câmera o aponta em plano americano. Ao focalizar Suzy, o plano é médio e conserva-se assim durante a conversa dos dois personagens que caminham em direção à câmera.

Informações sobre a trilha musical

Inserção musical diegética.

Conjunto musical formado por voz, piano, guitarra, saxofone, trombone, bateria e zabumba e assobios, cantam “João Baião” A canção está em tonalidade Maior, em ritmo de baião e tem côro masculino para entoar o refrão.

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Neste exemplo Inesita canta e a mesma formação de pequena orquestra é observada. Notamos que a letra da canção refere-se ao ritmo do baião. A letra diz: “o

meu xodó é valente, brigão”, “é o maior do sertão”, seu nome é “João Baião” e que

bastam “duas oiada prá nóis se enamorá”. Podemos compreender que o autor quis fazer uma alusão ao ritmo do baião, que estava no auge do sucesso e sendo bem aceito pelo público.

Inesita Barroso canta “João Baião” em É proibido beijar

Sobre a inclusão do ritmo do baião ao gosto da classe média, Tinhorão traça uma panorâmica sobre o momento político e social o qual o país atravessava61. O autor aponta que o ritmo do baião surge no momento da política de boa vizinhança, na qual tanto o Brasil quanto os EUA mostravam-se interessados no intercâmbio cultural. Temos como exemplo a boa aceitação de Carmem Miranda pelos norte-americanos. Porém, a troca era realizada em diferentes proporções, o Brasil era bombardeado pela propaganda cultural dos EUA. Chegavam até aqui os filmes de Hollywood, as histórias em quadrinhos, os discos, revistas e jornais norte-americanos e as escolas de cursos do idioma inglês. O quadro social do país mudava a cada dia. A economia investiu no

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setor imobiliário. O autor coloca que o deslocamento da população da zona central e sul para as áreas da zona norte e morros, modificaram os valores sociais e a mudança por sua vez, afetava o modelo do tipo de música popular, até então em voga. Portanto, a nova classe média ocupou seu lugar, admirava e adquiria o produto cultural vindo dos EUA e só admitia a música brasileira se esta fosse regional e exótica. O mercado de discos em São Paulo ampliou-se. Tinhorão afirma que haviam pesquisas para encontrar o que mais agradava ao público e assim destinar-lhe o produto musical. Nessas condições, a classe média assimilou muito bem o ritmo do baião. Luiz Gonzaga, em 1949, gravou de sua autoria “Baião” e difundiu o ritmo de mesmo nome para o Brasil inteiro, pois foi um dos discos mais vendidos no país na época. A consolidação do gênero do baião – dança muito popular no nordeste no século XIX – efetuou-se então, a partir de 1949. Cita Câmara Cascudo:

“(...) o grande sanfoneiro pernambucano Luís Gonzaga divulgou pelas estações de rádio do Rio de Janeiro, o baião, modificando-o com a inconsciente influência local dos sambas e das congas