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2. ECONOMIA DO MEIO AMBIENTE, UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E

2.2. Economia Ambiental e Ecoturismo

2.2.2. Conservação de Recursos e Máximo Rendimento Sustentável

2.2.2.1. Capacidade de Carga

Na atividade econômica do Turismo o conceito de capacidade de carga surgiu em meados da década de 1960 com a publicação de uma monografia sobre os impactos recreativos em unidades de conservação. O conceito foi então emprestado do manejo de pastagens e adaptado na busca de um número ideal de visitantes. A capacidade de carga recreativa foi definida por Wagar (1964 apud

TAKAHASHI, 1998): “o nível de utilização que uma área pode suportar enquanto fornece

uma qualidade sustentada de recreação”.

O próprio autor em 1974 publicou uma reconsideração, destacando que o empréstimo do conceito não foi uma escolha inteligente, uma vez que a recreação em áreas naturais é, antes de tudo, uma experiência psicológica (WAGAR, 1974 apud TAKAHASHI, 1998).

“A capacidade de carga recreacional é um conceito complexo e problemático que incorpora princípios de ordem social, físico e biológico. E a inexistência de um número mágico determinado pela capacidade de carga resulta da adoção ou não do resultado como aceitável da área baseado em julgamentos administrativos e na própria experiência ” (LIME, 1976 apud TAMBORIM e MAGRO, 2000, p.280).

O conceito evoluiu na base científica dos estudos biológicos com o objetivo de determinar a capacidade dos recursos naturais da área, estabelecendo o grau de uso admissível pelo meio ambiente e regulamentando o acesso aos recursos. Essa base científica então explicaria o apelo da capacidade de carga como conceito de administração de turismo e recreação (STANKEY, 1991 apud WEARING e NEIL, 2001).

Esse apelo do conceito para a administração de uma evolução dinâmica vai ao encontro da conclusão de uma comissão de altíssima qualidade científica, organizada pelo Instituto Beijer em 1994, coordenada por Keneth Arrow (Prêmio Nobel de Economia) e composta por seis economistas e cinco cientistas ambientais

e que se valeu da noção de resiliência23 para melhor caracterizar a capacidade de

23 Resiliência: “propensão de um sistema reter a sua estrutura organizacional face a perturbações”. (MUELLER, 2007,

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suporte24 no conceito econômico (ARROW et al, 1994, p.521 apud MULLER, 2001,

p.267).

Accioly (2004, p.16) em seu estudo sobre o uso da capacidade de suporte ecoturística como ferramenta de gestão ambiental traz a definição de VILLALOBOS (1991 apud SEABRA, 2000, p.5) para este conceito como sendo a capacidade de sustentação das áreas recreativas nos aspectos físico, biológico, social e psicológico sem alteração da qualidade ambiental ou da satisfação dos turistas. Segundo a autora este conceito foi inovador ao incorporar em seu contexto o bem- estar do consumidor.

A primeira metodologia que buscou traduzir este conceito em um indicador quantitativo a ser utilizado para o controle do número máximo de visitantes em uma área ambiental foi proposta por Cifuentes em 1992, na qual considera três níveis de

cálculo: Capacidade de Carga Física – CCF, Capacidade de Carga Real – CCR e

Capacidade de Carga Efetiva – CCE (WWF/BRASIL, 2004 apud ACCIOLY, 2004). A

metodologia é baseada na relação de números de visitas, tempo e sítio, sendo muito utilizada como ferramenta de manejo, pois a capacidade de carga é dinâmica e dependente de situações diversas e combinadas, envolvendo objetivos da área e questões sociais, econômicas e políticas (Cifuentes, 1992 apud TAMBORIM e MAGRO, 2000, p.282).

A Capacidade de Carga Física (CCF) fornece o limite máximo de visitas que um espaço definido pode receber, considerando que uma pessoa requer 1m² para mover-se livremente numa superfície, o tempo em função do horário de visita e o tempo real necessário para visitar o sítio.

Logo:

(1) CCF = Visitantes X Superfície disponível X tempo visita

Área ocupada p.uso público para uso público

A Capacidade de Carga Real (CCR) corrige a CCF quando submetido a fatores de correção (FC) em função das características do sítio, podem ser fatores físicos, ambientais, ecológicos, sociais.

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Logo:

(2) FC = Magnitude limitante da variável X 100 Magnitude Total da variável

(3) CCR = CCF X 100 – FC1 X 100 – FC2 X 100 – FCn

100 100 100

A Capacidade de Carga Efetiva (CCE) obtém-se adaptando o limite real de visitação proporcionado pela área em consideração às condições de implementação de manejo, resultando no limite máximo de visitas que se permite à trilha dada a capacidade para manejá-las.

A capacidade de manejo é a soma de condições necessárias para se administrar ou gerir com qualidade uma área protegida, engloba, portanto, variáveis como: respaldo turístico, políticas, equipamentos, dotação de pessoal, financiamento, dentre várias outras (COSTA, 2002).

Similiar a este conceito foi apresentado pela OMT a Capacidade de Acolhida Turística como: “o nível de exploração turística que uma área pode suportar asssegurando máxima satisfação ao visitante e mínima repercussão sobre os recursos” (OMT, 1992 apud COSTA, 2002, p.68). O que pressupõe limites de uso e intervenção ambiental, social e de gestão. Uma fórmula proposta por Boullón (1985 apud COSTA, 2002, p.69) para o cálculo engloba um estudo das áreas utilizadas incorporando no mínimo três variáveis de capacidade: materiais, psicológicas e ecológicas; para então chegar a

uma área utilizada geralmente estipulada em m2 por pessoa. E a partir deste número

calcula-se a capacidade de acolhida turística (que será neste estudo considerado, devido a sua similaridade, como capacidade de manejo) e o total de visitas diárias que serão dados por:

(4) Capacidade de Manejo = Área utilizada pelos turistas__

Média individual

(5) Total Visitas Diárias = Capacidade de Manejo x Coeficiente de rotação (6) Coeficiente de Rotação = Nº horas diárias de abertura aos turistas Tempo médio de visita

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Logo:

(7) CCE = CCR X Capacidade de Manejo 100

O conceito de capacidade de carga restringiu-se à aplicação prática de manejo25 e passou a ser utilizado como ferramenta principalmente em trilhas. Um exemplo é o trabalho de Tamborim e Magro (2000) onde aplicaram o conceito em uma trilha no Parque Estadual da Serra do Mar. Os autores concluem seu estudo afirmando ser inócuo o uso do método de capacidade de carga em uma área planejada quando não existem pesquisas anteriores indicando a potencialidade de impacto para o determinado recurso natural, pois dessa forma não se tem conhecimento dos fatores limitantes.

O conceito de capacidade de carga não foi tão útil quanto se esperava. A precisão esperada da “quantidade adequada” foi substituída por “estimativas bastante variadas de capacidade” em relação aos níveis e tipos de uso (STANKEY, 1991 apud WEARING e NEIL, 2001).

Segundo McCOOL (1996 apud TAKAHASHI, 1998) várias pesquisas mostravam que o uso recreativo e seus problemas não estavam relacionados a uma capacidade ecológica máxima do meio ambiente, mas sim estreitamente relacionados ao comportamento dos visitantes e não necessariamente ao número destes, ou seja, que a interação do turismo com o meio ambiente é mais complexa e mais dependente de qualidade do que de quantidade. O que levou o paradigma da capacidade de carga fracassar na década de 80. Apesar do fracasso do conceito de capacidade de carga associado somente à quantidade de visitantes, este foi o ponto

de partida para as pesquisas26 subsequentes em busca de um limite à exploração

predatória do turismo.

O ROS – Recreational Opportunity Spectrum (Espectro de

Oportunidades de Recreação) - foi a técnica subseqüente, abrindo os horizontes na direção do zoneamento, mas ainda ficando a desejar no estabelecimento de metas para o manejo do ambiente e na identificação de problemas (HAUFF,2000).

25 No Apêndice 3, item 1, encontra-se uma exemplo de aplicação do conceito de capacidade para manejo de trilhas. 26 No Apêndice 3, item 2, encontra-se um histórico da evolução do conceito de capacidade de carga e um detalhamento de

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O sistema LAC – Limits of Acceptable Change (Limites Aceitáveis de Câmbio)

surgiu juntando os dois conceitos anteriores e enfatizando, por meio da utilização de indicadores e padrões, a definição dos tipos de oportunidades do ambiente (AHN,

LEE e SHAFER, 2002). Já a técnica: VIM – Visitor Impact Management (Manejo

do Impacto de Visitantes), também baseada em indicadores e padrões, surgiu com ênfase na avaliação das prováveis causas dos impactos (VIEIRA, PASSOLD e

MAGRO, 2000). Seguiu-se após esta a metodologia VERP – Visitor Experience

And Resource Protection (Proteção do Recurso e da Experiência do Visitante)

que juntando os conceitos do VIM e do LAC propôs um modelo iterativo entre nove elementos, chegando-se então à conclusão de que os limites interagem o tempo todo, como um sistema, e por isso a metodologia tem que ser dinâmica e iterativa

(NATIONAL PARK SERVICE – YOSEMITE, 2001). As técnicas evoluíram de forma

crescente, uma englobando a outra de maneira que os conceitos foram se acumulando, o que mostra a necessidade de interação de todos eles.

Para Lawson (2000) a capacidade de carga deve ser considerada como um fator estável somente como estratégia no caso de ser ainda desconhecida (e neste caso deve-se utilizar uma estimativa segura e vigiada), na impossibilidade de mudanças na infra-estrutura ou na área da Unidade de Conservação, ou ainda quando o objetivo é somente preservação – veja gráfico da letra (a), na Figura 8. Neste caso a demanda ficará restrita à limitação da capacidade de carga. De acordo com o autor, a partir do acompanhamento contínuo das respostas ambientais, dois tipos de modificações podem ser feitas de forma a ampliar a quantidade de visitantes garantindo a manutenção da qualidade da visitação e a integridade do meio ambiente:

 Modificações no produto:

o Zoneamento (criando zonas mais intensivas ao turismo e outras de

preservação);

o Escalas diferenciadas de taxas de visitação: De acordo com a origem e classe de turismo. Na alta temporada a elasticidade da demanda aumenta significativamente, o que permite uma folga maior na manipulação de preços;

o “Site-hardening” measures (Medidas de Ajustes Sustentáveis no Sítio de Visitação), ou seja, estabelecimento de facilidades, serviços, etc. de forma que a localidade possa acomodar um maior número de visitantes sem

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comprometer a sua integridade ambiental. Tais como: pavimentação de trilhas com pedras naturais da área, construção de passarelas de madeiras, construção de mirantes, treinamento de guias para acompanhar e orientar grupos, restrição de áreas de acesso, etc.

 Modificações no mercado:

o Educação ou preparo do turista para a visitação ou uso da UC, o que possibilitará menos externalidades negativas na visitação;

o Preparos e exigências para as companhias agenciadoras de turistas.

A partir das modificações no produto, a capacidade de carga pode ser ajustada na sequência. Se este processo for dinâmico, e sempre nesta ordem, então a capacidade de carga se torna flexível, e a sustentabilidade permanece como o gráfico da letra (b) na Figura 8. Seguindo-se a ordem inversa não se garante a sustentabilidade, pois o ambiente já estará danificado e os custos de recuperação serão elevados e iniciar-se-á um ciclo de crescimento insustentável.

Porém a capacidade de carga estável e a capacidade de carga flexível podem operar conjuntamente, gerando assim a capacidade de carga com crescimento periódico, como no gráfico (c) da Figura 8, onde a capacidade de carga irá crescer periodicamente como resposta a uma mudança relativa na gestão da área, produzindo um efeito de degraus de uma escada.

Figura 8 – LIMITES ESTÁVEIS E FLEXÍVEIS DA CAPACIDADE DE CARGA DE UC’s

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A partir do ano 2000 a capacidade de carga turística recuperou sua credibilidade científica perdida na década de oitenta, não sendo mais vista como um número mágico e sim como “uma aproximação científica rigorosa por meio de um conjunto de indicadores que refletem os componentes essenciais da sustentabilidade e permitem estabelecer um patamar de saturação, acima do qual correm perigo todos os valores essenciais de qualquer destino turístico e, com eles, o nível de satisfação da demanda” (FERNÁNDEZ e PÉREZ, 2006, p.350).

Além dos conceitos de resiliência ecológica e capacidade de carga turística, outro conceito importante no desenvolvimento do turismo sustentável é o de pegada ecológica do produto turístico que é o inverso do conceito de capacidade de carga de um destino turístico. Refere-se à: “quantidade de território produtivo necessário para abastecer de bens e serviços turísticos a população (residentes e visitantes) de um destino turístico” (FERNÁNDEZ e PÉREZ, 2006, p.350).