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4.3 AS CAPACIDADES DINÂMICAS NO CONTEXTO DA ESCALABILIDADE

4.3.1 A Capacidade de Sensing

A capacidade de detecção de oportunidades é percebida neste estudo como fundamental para o processo de escalabilidade da inovação social, já que a detecção de oportunidades, bem como a de ameaças, fez com que o Projeto Pescar pudesse perceber as necessidades ou possibilidades de mudança e se atualizar ao longo dos anos, atendendo às demandas dos públicos de interesse. A seguir, são elencados os principais microprocessos identificados e associados à capacidade dinâmica de sensing:

- Pesquisa para acesso à inovação em instituições referência e benchmarking: a busca por padrões externos de qualidade tornou-se fundamental para o desenvolvimento da inovação social. No início dos anos 90, quando no Brasil ainda não haviam muitos modelos de fundações e institutos, os responsáveis pela gestão realizaram uma pesquisa em instituições sociais norte-americanas que lhes trouxessem alternativas para moldar a gestão da inovação social de acordo com referências de sucesso.

De acordo com relatos dos entrevistados, a busca por modelos de referência e trocas com outras instituições seguiu sendo uma prática do Pescar que ajuda na percepção de pontos de melhorias, possibilidades de inovação e ganhos de eficiência. Esta prática é mantida pelo vínculo com instituições sociais de outros segmentos, bem como pela parceria com pessoas e organizações de diferentes áreas. Possivelmente, o que mais se aproxima deste item na literatura são os microprocessos apontados por Teece (2007) como processos internos de P&D e seleção de novas tecnologia e processos para acessar a inovação de fornecedores e complementares. Contudo, pela especificidade do caso, entendeu-se como necessária a criação de uma nomenclatura que pudesse melhor elucidar o microprocesso desenvolvido.

- Processos para identificar segmentos de mercado alvo (TEECE, 2007): para iniciar o processo de escalabilidade, tornou-se necessário identificar quem seriam os possíveis apoiadores. Nas fases iniciais, identificou-se que empresas que tivessem interesse em engajamento social seriam o público que apoiaria a sobrevivência da inovação social. Este movimento apoiou o processo de scaling out ao aumentar o número de apoiadores da inovação social. Nas fases seguintes, identificou-se a influência em scaling up, já que outras instituições sociais, órgãos públicos e comunidades também poderiam ser segmentos

favoráveis à implementação, o que serviu para disseminar a ideia de forma mais abrangente para governos e indivíduos.

- Identificação do público alvo: a identificação de quem seriam os beneficiários da inovação social aparentemente surgiu antes mesmo da implantação da inovação social, já que a ideia que a originou partiu da necessidade de atender a um grupo específico de pessoas: os jovens em situação de vulnerabilidade social. O foco neste grupo de possíveis beneficiários permanece inalterado ao longo da história e o fato de ser uma grande população passível de se beneficiar faz com que a inovação social siga perseguindo esse atendimento, o que também se torna um dos grandes motivadores à busca de todos os tipos de escalabilidade, em especial de scaling out, já que a replicação de unidades se torna o caminho mais curto para acesso ao público alvo.

- Práticas para troca e recepção de informações, conhecimento, captação de ideias e acompanhamento da execução da inovação social: observa-se que no decorrer dos anos foram sendo criados uma série de espaços para captação de ideias e troca de informações entre os atores envolvidos. Alguns exemplos são: encontros nacionais de educadores sociais, encontros de articuladores, reuniões de dirigentes, encontros regionais de jovens, assembleias, reuniões do conselho e da diretoria, formações entre os integrantes da rede.

Atualmente, o uso de tecnologias tem apoiado esses processos, facilitando a comunicação e as trocas, independentemente da localidade em que os participantes se encontram. Assim, as trocas virtuais, apoiam a fluidez de informações e a difusão das melhores práticas.

- Estudo sistematizado da legislação, suas alterações e incentivos: com apoio de uma diretoria e voluntários de área jurídica, através do estudo da legislação, é possível buscar benefícios para a solução que a torna mais atrativa para mais parceiros. Alguns destes são: habilitação para cota de aprendizagem, habilitação para receber doações de diversas formas de pessoas físicas ou jurídicas, habilitação para realização de parcerias com órgãos públicos e atendimento aos requisitos das alterações na legislação que impactam o setor social, exemplos estão nomeados na seção 4.1 (Lei da aprendizagem, Lei do voluntariado, Estatuto da Criança e do Adolescente, Marco regulatório das OSCs, etc.). A regularidade e o cumprimento das questões legais são tidas como um atrativo para investidores, especialmente nos casos de grandes empresas com processos de transparência bem estruturados.

- Processos para identificação das necessidades dos parceiros: com a atuação de supervisores regionais nas unidades, é possível que a gestão receba ideias de oportunidades que podem ser replicadas a outras unidades, de necessidades e interesses destes parceiros.

Outras formas de identificação são os encontros realizados anualmente com os dirigentes das unidades, seus articuladores e educadores, além das informações trazidas pelos próprios conselheiros e diretores voluntários (normalmente vinculados a organizações de segmentos variados) e pelo coordenador de expansão, que conhece a realidade de potenciais parceiros.

Entende-se que a identificação de necessidades dos parceiros apoia o processo de tomada de decisão da inovação social, impactando na sobrevivência das unidades existentes e no processo de escalabilidade, já que acaba influenciando o atendimento a um número maior de beneficiários.

- Pesquisa de tecnologias que suportem as necessidades de entrega: através de comitês formados por gestores e profissionais ligados à inovação social, portanto conhecedores do processo, torna-se possível a busca e a escolha de tecnologias que facilitem o trabalho e reduzam custos, além da obtenção de mais informações, com maior agilidade, de todas as unidades, o que se torna válido especialmente pelas variadas localizações onde a inovação social está presente, apoiando a tomada de decisão com indicadores mais precisos e reduzindo custos ao eliminar e otimizar processos.

- Manutenção da atualização e influência de outros atores pela participação em órgãos deliberativos: no decorrer dos anos, a inovação social preparou alguns atores chaves para representação em órgãos deliberativos como conselhos nacionais, fóruns municipais. Esta atuação possibilita a ampla percepção do cenário nacional e de tendências, assim como oportuniza disseminar ideias e influenciar na formação de políticas públicas, que, por sua vez, poderão impactar o sistema de forma mais significativa.

- Práticas de identificação de oportunidades e ameaças: a identificação de oportunidades e ameaças é realizada de diversas formas. Além do planejamento estratégico, que envolve um grande número de atores de diversos segmentos, o trabalho de diretorias voluntárias, que tenham atuação no mercado, responsáveis por cada grande área, ajuda na captação de informações importantes e na orientação da execução de ações. A análise periódica de indicadores das unidades e da economia como um todo ajuda a gestão na tomada de decisão e na correção de estratégias.

As oportunidades e ameaças identificadas servem para nortear as ações com foco na escalabilidade. A participação de diversos atores torna-se uma das principais formas de perceber estas oportunidades e ameaças ao trazer diferentes percepções e análises complementares para inovação social.

- Leitura de contextos e abordagens customizadas: principalmente pela atuação de profissionais responsáveis pelo processo de expansão e implantação da inovação social, torna-

se possível propor alternativas para a criação de novas unidades. Com as experiências vividas inúmeras vezes em outras unidades e pelo conhecimento dos caminhos possíveis, pode-se adaptar a inovação social à realidade de determinada organização ou comunidade. Essa aproximação e o entendimento dos diferentes contextos enriquecem a inovação social por tornar possível adaptá-la a diferentes contextos, que passam a ser mais próximos e conhecidos, bem como facilita sua disseminação por meio de soluções e apoios customizados a cada realidade.

- Processos de captação de economias e de apoios financeiros para continuidade e melhoria da inovação social: a busca por apoios e economias é uma das formas de manter a atualização sem aumentar os custos. Uma destas é a constante busca por editais de instituições privadas ou públicas que acabam apoiando especialmente em processos de melhorias. Além disto, o apoio de consultorias especializadas é procurado frequentemente e garante que economias importantes sejam realizadas sem que as atualizações necessárias deixem de ocorrer. Embora este microprocesso também esteja associado a seizing, percebe-se que sem as pesquisas e buscas por oportunidades a captação das economias e apoios não é efetivada.

- Processos de captação e sensibilização de novos contatos: são diversas as formas de buscas de novos contatos, algumas são relacionadas a pesquisas de mercado e abordagens do responsável pela expansão, outras obtidas através de indicações de parceiros atuais ou, ainda, pela intervenção de alguns dos diretores voluntários, que fomentam os contatos dentro da sua rede de contatos. A atenção aos movimentos do mercado e ao perfil dos possíveis investidores é um fator destacado nas entrevistas, assim como a sensibilização dos potenciais parceiros. A visitação de unidades ou participação em eventos, são percebidas como essenciais e citadas como uma das formas de conseguir, mesmo em momentos de crise, sensibilizar para abertura de novas unidades.

Sendo estes os principais microprocessos identificados para sensing, destaca-se esta capacidade dinâmica como uma forma de perceber as mudanças no contexto em que a inovação social se insere e se antecipa em relação às oportunidades e ameaças possíveis, fazendo com que adaptações e ajustes necessários possam ser realizados, o que, por sua vez, impacta na sobrevivência e na escalabilidade da inovação social.