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5. A Sociedade de Participantes

5.5 Capital Inicial ou Renda Mínima?

“Questões políticas geram controvérsias. Questões de política econômica parecem provocar polêmicas maiores. Redistribuição de renda é um dos temas mais explosivos que conhecemos”.

O ideário da política aqui proposta tem muitos pontos em comum com o programa de renda mínima e o de renda básica19. Eles reconhecem que o cidadão tem direito de participar da riqueza da comunidade onde vive e são liberais quanto ao uso do recurso para a pessoa buscar seu bem-estar. Estas políticas buscam reduzir a desigualdade e a pobreza, e permitir a inclusão social de classes alijadas. Se estas políticas têm tanto em comum, e se a renda mínima já está enraizada no Brasil graças ao trabalho do Prof. Eduardo Suplicy, por que propor uma nova política desconhecida? Como a renda mínima é mensal, não seria ela mais segura para o cidadão do que lhe dar todo o dinheiro de uma só vez? E se o indivíduo perder seu capital inicial em uma aplicação mal sucedida? Existe alguma vantagem na política proposta? Antes de discutirmos estas questões, vamos estudar brevemente a política de garantia de renda mínima.

O embasamento filosófico da renda mínima, renda básica e da Sociedade de Participantes, aqui proposta, é praticamente o mesmo, e encontra-se na linha de justiça distributiva que busca maior equidade econômica dentro de uma sociedade, tema que foi amplamente discutida no capítulo 3, inclusive do ponto de vista histórico. O Prof. Suplicy (1996, p. 20) afirma que a primeira experiência de renda mínima ocorreu no século XVI: “Juan Luís Vives, em 1526, fez a primeira proposta de renda mínima para a cidade flamenga de Bruges, em “De Subventione Pauperum”, que foi implementada”. Rita Leal (1999), em sua dissertação de mestrado orientada pelo Prof. Suplicy, faz uma retrospectiva da idéia de renda mínima, descrevendo as linhas de pensamento ao longo da história até chegar a Milton Friedman com sua proposta na qual as pessoas com renda inferior a um determinado limite deveriam receber uma complementação do Estado, sob a forma de um imposto de renda negativo. A autora também discute as idéias de James Meade e Hermione Parker, que defendem a renda mínima como parte das políticas para se reduzir o desemprego e melhorar a distribuição de renda, e Philip Van Parijs que propõe a emancipação do cidadão por meio de uma renda básica incondicional. A idéia do imposto de renda negativo é complementar a renda dos mais pobres por meio de uma tabela, semelhante à do imposto de renda, por meio da qual a pessoa receberia repasse de dinheiro escalonado, evitando assim tirar o incentivo para trabalhar e procurando afetar ao mínimo a eficiência econômica. No Brasil, o primeiro a propor esta idéia no meio acadêmico foi Antônio Maria da Silveira em um artigo de 1975.

19 O programa de renda básica permite que o cidadão tenha um padrão de vida digno, e deve distribuir um valor, segundo Van Parijs, “o maior possível”, enquanto o programa de renda mínima em estudo no Brasil propõe um valor de subsistência, abaixo de US$2,00 por dia.

Alertando para o crescimento da pobreza do Brasil na época, e que a caridade não é um sistema de redistribuição adequado, Silveira propõe um sistema de transferência monetária proporcional entre a renda auferida por uma família e um mínimo a ser determinado. Assim, o autor sugere uma política de redistribuição por meio do imposto de renda negativo para aliviar a pobreza, colocando-se contra a idéia vigente na época de esperar o bolo crescer para depois distribuí-lo.

No entanto, os programas para socorrer parcelas da população em dificuldade devido à insuficiência de renda já estavam se espalhando pelo mundo ao longo do século XX. Lavinas e Varsano (1998, p. 50s) fazem um breve histórico de programas de renda mínima: “No pós- guerra, reacende-se, na Inglaterra e nos Estados Unidos o debate sobre a oportunidade de se garantir uma renda mínima às famílias desassistidas (com vida abaixo da linha de pobreza), muito embora alguns países precursores já tivessem implantado programas afins (Dinamarca, 1933). Paulatinamente, surgem experiências localizadas e até mesmos nacionais (Inglaterra, 1948; Alemanha, 1961; Holanda, 1963), até que a fórmula se expande à maior parte dos países membros da União Européia (Bélgica, em 1974; Irlanda, em 1977; Luxemburgo, em 1986; e França, em 1988; a Carta Social adotada, à exceção da Inglaterra, em 1989, preconiza a extensão da renda mínima garantida – RMG a todos os países membros) e da OCDE”. Cada programa tem características específicas, mas a base comum é proteger o cidadão contra a pobreza por meio de uma renda complementar. Os autores salientam que estes programas são limitados como política contra o aumento da desigualdade (op. cit., p. 54). Canadá e Estados Unidos possuem diversos programas de complementação de renda para famílias carentes, entre os quais se destacam o da província de Quebec e o do Alasca. Outros programas nos Estados Unidos incluem o Earned Income Tax Credit, semelhante ao imposto de renda negativo, o Food Stamps, cupons para a compra de produtos alimentícios e de primeira necessidade, o Aids to Family with Dependent Children, e o Suplementary Security Income, entre outros.

Enquanto isto, no Brasil, o papel redistributivo do Estado foi muito limitado, conforme aponta Marcelo Medeiros, em “Trajetória do Welfare State no Brasil: Papel Redistributivo das Políticas Sociais dos Anos 1930 aos Anos 1990”, afirmando: “a combinação de autoritarismo com forte segmentação no mercado de trabalho, presente em boa parte da história recente do país, limitou a capacidade de os movimentos de trabalhadores influenciarem positivamente a sistematização de programas sociais generalizados a toda a população e sem caráter populista (...) após a fase de consolidação inaugurada pelos governos militares de 1964, o modelo de Welfare State perdeu o caráter populista e assumiu duas linhas definidas, uma de caráter

compensatório e outra de caráter produtivista. A primeira buscava minorar os impactos de um modelo de desenvolvimento baseado na concentração da riqueza e a segunda visava contribuir com as condições necessárias para o crescimento econômico como, por exemplo, a qualificação de mão-de-obra. Entretanto, ambas apresentavam como características a centralização política e financeira no governo federal, a forte fragmentação institucional e o caráter regressivo nos gastos sociais”. Finalmente, o autor conclui: “Não existe uma indicação clara, portanto, de que as mudanças na estrutura institucional das políticas sociais brasileiras ocorridas ao longo da década de 1990 estejam representando uma ruptura de tendência na trajetória do Welfare State brasileiro na direção de um modelo mais distributivo” (Medeiros, 2001, p. 20).

O programa de renda mínima foi introduzido na agenda política do Brasil pelo Professor e Senador Eduardo M. Suplicy. Em 1991, ele aprovou por unanimidade no Senado seu projeto de garantia de renda mínima, uma forma de imposto de renda negativo. Na justificação do projeto o Senador Suplicy (1992, p.51) escreve: “A Constituição da República Federativa do Brasil, no artigo 3º, expressa que um dos seus objetivos fundamentais é erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades sociais e regionais. O projeto de lei que ora submeto à apreciação dos ilustres parlamentares objetiva cumpri-la”. Assim, com o objetivo de combater a pobreza, implementar a distribuição, e ao mesmo tempo preservar o incentivo ao trabalho, o programa prevê a transferência de dinheiro, sob a forma de imposto de renda negativo, para os indivíduos acima de 25 anos e renda inferior a um determinado patamar, preservando assim a liberdade de cada um na busca de maximizar seu bem-estar. No entanto, este programa nunca foi implantado na forma de sua aprovação no Senado, mas tornou-se a base para diversos programas de transferência de recursos que foram implementados durante a década de 1990 e consolidados posteriormente.

Neste momento, outros países latino-americanos começavam uma nova experiência para implementar a justiça social, os programas de transferência de renda condicionados. A experiência mais divulgada internacionalmente foi a do México, com o Progresa, mais tarde Oportunidades, coordenados pelo Ministério de Desenvolvimento Social (Sedesol). O programa iniciou-se com um projeto piloto em 1992, que se expandiu para toda área rural em 1997, chegando à região urbana em 2002. A transferência, indexada à inflação, é condicionada à freqüência escolar, varia conforme a série e o sexo do estudante, e é integrada a um programa de saúde e nutrição. A estratégia dos programas de transferência condicionada de recursos desenvolve-se em três pontos do tempo por meio de ações múltiplas. Primeiro, as pessoas estão morrendo devido à pobreza, portanto é necessário o repasse imediato de

recursos em uma política de rede de segurança. Segundo, estas pessoas para evoluírem e romperem o ciclo de pobreza precisam ter acesso aos serviços públicos, principalmente saúde e educação, além de terem seus direitos de propriedade, acesso à justiça e demais serviços e direitos preservados. O Estado precisa, portanto, desenvolver uma política de médio prazo para tanto. Terceiro, políticas para fortalecer a representatividade e a participação (empowerment) destes grupos menos favorecidos devem ser desenvolvidas, promovendo sua inclusão na vida social e política. Conforme escrevem Spink e Camarotti (2003): “Any democratically elected national government is responsible for the social consequences of its policies and actions in all areas and for their impact on living conditions, on individual and collective rights, and on the exercise of citizenship. Social issues cannot be reduced to a specific area of governmental policy or action, but must be considered as permeating any and all action, including those in the economic field”. Programas de transferência de renda condicionados ao ensino se espalharam pelo mundo, e o Quadro 5.1 mostra suas principais características em alguns países que os adotaram.

O programa de renda mínima do Prof. Suplicy somou-se à experiência internacional de transferência condicionada de recursos, e deu origem a diversos programas subnacionais, que ficaram conhecidos como Bolsa Escola. Conforme Suplicy (1998a), o programa, que transfere renda para família de crianças carentes condicionada à freqüência na escola, foi efetivamente implantado em 1995 em dois locais: Campinas no estado de São Paulo, no governo José Magalhães Teixeira (PSDB) sob o título de Programa de Garantia de Renda Familiar Mínima, e no Distrito Federal, no governo Cristovam Buarque (PT), denominando-se Bolsa Escola. Destes pontos difundiu-se para todo o Brasil, tornando-se um programa nacional em 2001, no governo Fernando Henrique Cardoso. O programa, inicialmente denominado “Renda Mínima Associado à Educação”, se expandiu e buscou também atender às famílias com filhos fora da faixa etária de atendimento escolar proposta. Ao contrário do programa mexicano, que devido à farta e acurada coleta de dados tornou-se objeto de estudos intensivos da comunidade acadêmica internacional, o programa brasileiro não foi acompanhado de um levantamento quantitativo pré e pós-implantação que permitissem estudos mais aprofundados. Mesmo informações básicas, como o controle de freqüência escolar, faltavam. Segundo o ministro da educação de Fernando Henrique Cardoso, Paulo Renato Souza, no final de 2002, mais de cinco milhões de famílias, e quase nove milhões de alunos, eram beneficiados pelo programa, mas dos 5.545 municípios brasileiros que integravam o programa, apenas cerca de 1.500 informavam a freqüência dos alunos beneficiários do Bolsa Escola (Souza, 2005, p. 110).

Quadro 5.1 – Programas de Transferência Condicional de Recursos em Outros Países

Programa Início Abrangência Objetivos Condicionalidade Avaliação Orçamento

Bangladesh Food for

Education 1993 2.4 milhões de crianças (2000)

1.Escolaridade 2. Reduzir trabalho infantil

85% freq. escolar 9-17% aumento

matrículas US$ 77 mi (2000) Honduras Programa de Asignacion Familiar 1990, PRAFII 2000 4,7 % população 1.Escolaridade 2.Nutrição 3.Saúde Menos de 7 faltas/semestre Visita centro saúde e palestras 0,019% PIB Chile Subsidio Unitario Familiar 1998 954.000 indivíduos 1. Erradicar pobreza extrema

Contrato de Adesão. 0,1% PIB

(1998) Colômbia Familias em Accion 2001 362.403 domicílios (2002) 1.Escolaridade 2.Renda 80% freq. escolar Visita centro saúde

5-13% aumento matrículas Redução subnutrição em crianças Aumento vacinação 0,12% PIB (2004) Jamaica Programme of Advancement through Health and Education 2002 236.000 indivíduos 1.Escolaridade 2.Renda 3. Reduzir trabalho infantil 85% freq. escolar Visita centro saúde

0,29% PIB (2003)

México PROGRESA Oportunidades 1992 3,38% população (2003) 1.Escolaridade 2.Nutrição 3.Saúde 85% freq. escolar Visita centro saúde e palestras 3,5-9,3% aumento matrículas 70% melhora nutrição Redução doenças e aumento peso em crianças Melhora saúde adultos 0,32% PIB (2000) Nicarágua Red de Proteccion Social 2000 1,21% população 1.Escolaridade 2.Nutrição 3.Saúde 4.Renda 5. Reduzir trabalho infantil Menos de 6 faltas em 2 meses

Visita centro saúde e palestras 22% aumento matrículas 8,8% redução trabalho infantil 0,021% PIB (2002)

Turquia Social Fund 2002 22.000 indivíduos (piloto)

1.Escolaridade

2.Saúde Freqüência escolar Visita centro saúde 0,06% PIB (2004)

Bourguignon, Ferreira e Leite (2002), utilizando técnicas de microssimulação e modelagem econômica, fizeram uma avaliação ex-ante deste programa quanto a resultados em matrículas escolares e redução da pobreza. Os resultados obtidos por estes autores indicam que o programa seria efetivo para aumentar o número de crianças matriculada na escola e diminuir a desistência, expectativa esta que se cumpriu, conforme levantamentos divulgados posteriormente. Segundo Souza (2005, p. 113), a porcentagem de crianças entre sete e quatorze anos matriculadas na escola subiu de 88% para 97%, beneficiando principalmente os filhos de famílias mais pobres, pois no último quintil de renda, antes do programa, uma entre quatro crianças não freqüentava a escola. No entanto, o programa tem pouco resultado na redução da pobreza. Segundo os autores, a proporção de crianças trabalhando e freqüentando escola cresce, mas muitas deixam de trabalhar, o que reduz a renda destas famílias. Como o montante transferido por criança é pequeno, o impacto do programa na redução de pobreza é baixo. As séries históricas mostram que somente aumentar a renda do pobre não aumenta o número de crianças matriculadas na escola, mas condicionar a transferência de renda à matrícula tem efeito positivo sobre esta. Um relatório do NEPP (Núcleo de Estudos de Políticas Públicas) da Unicamp avaliando o programa implantado em Campinas, citado pelo Prof. Suplicy (1998a), informa que a maior dificuldade está na focalização do programa, quanto ao controle e fiscalização da renda recebida pelas famílias. Este relatório também aponta que a renda transferida chega a três vezes o recurso das famílias recipientes, e este valor foi principalmente usado para a compra de gêneros de primeira necessidade (45,8%), como alimentação, material de higiene e limpeza; gastos em roupas e calçados (10,4%), e o restante em produtos e serviços diversos, como transporte para as crianças irem à escola, pequenos eletrodomésticos, etc.

Os programas de transferência de renda condicionados à educação aumentam a escolaridade da população, mas apenas aliviam a pobreza. Como os demais projetos no formato de imposto de renda negativo, ou de renda mínima, os resultados destes programas não levam à erradicação da pobreza. Em um artigo transcrito em Suplicy (1992, p. 245) Og Francisco Leme do Instituto Liberal afirma que: “É importante colocar-se claramente que (o Programa de Renda Mínima) não se trata de medida para acabar com a pobreza, e sim para abrandar as suas conseqüências, ou parte delas”. Na Conferência Internacional sobre Renda Mínima, realizada em 1998 em Brasília, o Prof. Ricardo Henriques afirmou: “O Programa de Renda Mínima, apesar de ser um programa com alguma capacidade redistributiva, de forma alguma pode ser apresentado como um instrumento que viabilize a erradicação da pobreza. (...) Ele é só um elemento que participa do combate à pobreza, mas não poderia internalizar

nele um poder de erradicação da pobreza” e “a renda mínima tem que ser pensada como um problema compensatório, devendo estar articulada com outros programas de política social que sejam investimentos de longo prazo” (Suplicy (org.) 1998b p.149 e 155 – grifo nosso).

A experiência do México, que implantou e acompanha estes programas de transferência de renda condicionada à educação desde os meados da década de 1990, mostra um aumento substancial de jovens completando o ensino médio, mas sem ter uma colocação profissional após se formarem. O projeto da Sociedade de Participantes busca complementar estes programas dando um capital inicial para que os jovens tenham como iniciar suas vidas profissionais e incentivando o crescimento da economia. Além disso, sendo o capital inicial vinculado ao término do ensino médio, incentiva-se uma maior escolaridade, pelo menos até o final do segundo grau, ou a faculdade, para os que optarem para usar o capital recebido para financiá-la. Vinculá-lo a não estar o jovem cumprindo pena criminal serve também como incentivo para manter o adolescente afastado de atividades ilícitas, em sua maioria perigosas e mal remuneradas. O programa proposto diminui a diferença de oportunidades existente na sociedade brasileira e promove a meritocracia, tornando os jovens responsáveis pelos resultados que vierem a obter.

O indivíduo passa a participar da economia de mercado, e a distribuição de riqueza deve aumentar a eficiência deste mercado, visto cada um ter maior incentivo para se esforçar e obter o melhor resultado possível. A maior força deste programa está no princípio básico da economia de que pessoas respondem a incentivo. No médio e longo prazo, o jovem com maior escolaridade e dono de um ativo, seu capital inicial, terá maior participação na vida social e política do país, fortalecendo sua representatividade, reivindicando seus direitos e finalmente rompendo o ciclo de pobreza. O programa permite que os ocupantes da base da pirâmide social se transformem em agentes ativos do desenvolvimento, ou nas palavras de Celso Furtado (1981, p. 133s) analisando políticas de desenvolvimento regionais: “Desigualdades de níveis de renda por habitante existem por toda parte. O que se deve buscar não é tanto eliminar as diferenças de nível de renda, se bem que isso seja em certa medida necessário, e sim transformar a sociedade nordestina a fim de que o desenvolvimento beneficie efetivamente a massa da população. (...) O objetivo estratégico deveria ser abrir espaço para os que estão realmente embaixo na escala social se transfigurem em agentes ativos do desenvolvimento. Esse primeiro impulso, visando romper as estruturas que aprisionam os que estão mais embaixo, somente virá à luz como fruto de uma decidida vontade política” (grifo nosso).

No entanto, no ponto central do programa proposto está a maior fonte de críticas. Carole Pateman (2003, p.134ss) afirma que a principal razão pela qual programas de renda básica são preferíveis aos de capital inicial é que este capital pode ser desperdiçado ou perdido muito facilmente, deixando a pessoa nas mesmas condições econômicas de antes de receber o dinheiro. A autora realça que o capital inicial pode ser perdido não só por pessoas irresponsáveis em bebida ou drogas, mas também por pessoas trabalhadoras em aplicações mal sucedidas. Podemos acrescentar que o índice de mortalidade infantil de empresas no Brasil é altíssimo, a despeito do esforço de seus proprietários. A renda básica, paga mensalmente ao cidadão, permite um modesto, porém digno padrão de vida, além de ter um papel de seguro contra gastos inapropriados. O máximo que a pessoa poderá perder, em drogas, bebidas, ou um mau investimento, será o valor recebido naquele mês, e mesmo que assim o faça, seu recebimento do mês subseqüente estará garantido. Ainda segundo a autora, a renda básica garante ao cidadão liberdade para se aventurar em um empreendimento próprio, ou em busca de um emprego mais satisfatório, de uma forma segura, sem que um eventual insucesso o faça perder tudo o que possui.

Robert Goodin (2003, p. 68ss) aprofunda as críticas de Pateman sobre o resultado da perda do capital inicial. Ele argumenta que programa proposto por Ackerman e Alstott de capital inicial não é imune a más escolhas de aplicação, ou a boas escolhas que dêem errado. Desta forma, sempre haverá uma porcentagem da população que estará aquém da linha de pobreza, demandando serviços do Estado. Este não poderá ignorar tais apelos, e, além de já ter gasto com o capital inicial entregue ao indivíduo, será obrigado a aumentar suas despesas para socorrer estas pessoas. Tais gastos aumentarão a força dos que se opõem a programas assistenciais, dando-lhes argumentos contra tais. Goodin propõe então um capital inicial condicional: uma pessoa desempregada por pelo menos doze meses proporia um projeto para o governo, que o examinaria, e caso aceitasse, concederia o capital para sua implementação. Assim, um marceneiro desempregado poderia solicitar o capital para comprar o equipamento necessário para montar uma oficina própria, ou, uma costureira, capital para comprar uma máquina e montar uma loja, e assim por diante.

Ambos os programas, o de fornecer uma renda básica mensal a todos os indivíduos e o de dar um capital inicial para o jovem adulto começando sua vida, têm dois princípios básicos em comum. Primeiro, todos os cidadãos têm direito a uma parcela da riqueza amealhada pela