• Nenhum resultado encontrado

5 DISCUSSÃO

5.2 Características clínicas

Em relação às características clínicas, observou-se que quase a totalidade dos idosos informou ter algum problema de saúde que foi de 92,3% (n=361), porcentagem muito superior à média nacional. No Brasil, segundo dados do IBGE, o número de idosos que declararam ter pelo menos uma doença crônica foi de 78,7%, em 1998, passando para 75,5% em 2003, sendo que 64,4% tinham mais de uma patologia (BRASIL, 2008b).

Essa elevada prevalência de comorbidades evidenciada neste estudo pode ser justificada pela própria característica da população rastreada, que englobou idosos sabidamente usuários do serviço de saúde no momento da entrevista, contribuindo para o incremento das estatísticas.

A presença de comorbidades nos idosos é muito comum. Proporcionalmente, o idoso tende a apresentar mais episódios de doenças, em geral crônicas, levando ao aumento nos gastos com a saúde, já que o custo com o idoso tende a ser maior do que com as pessoas de outras faixas etárias (CHAIMOWICZ, 1997). A incidência de tais doenças, além de gerar gastos para sua prevenção, tratamento e recuperação, também traz a conotação da invalidez. Com isso, consequentemente, ser possuidor de uma doença crônica pode ser motivo, também, de isolamento e/ou afastamento do convívio social (ALVAREZ, 2001).

No entanto, ressalta-se que a presença de uma ou mais enfermidades crônicas nem sempre significa que o idoso não possa conservar sua autonomia e realizar atividades de maneira independente, estando ela sob controle e com um adequado acompanhamento de saúde (SILVESTRE; COSTA NETO, 2003).

Não foi possível confirmar a literatura que relata maior sobrecarga de comorbidades entre os idosos com idade mais avançada (CHEN; DEWEY; AVERY, 2001; LINJAKUMPU et al., 2002).

Sobre as comorbidades relatadas, os dados estão de acordo com as tabelas de frequência das principais doenças informadas pelos idosos, sendo, a hipertensão arterial, indiscutivelmente a morbidade mais comum nesse segmento populacional, seguida pelo diabetes mellitus (VASCONCELOS et al., 2005).

Destaca-se que, neste estudo, a depressão e as doenças da tireoide e osteoarticulares foram mais prevalentes entre as mulheres do que nos homens, sendo estatisticamente significativas (p<0,05). Particularmente, as doenças osteoarticulares são mais frequentes entre as idosas devido ao efeito protetor do hormônio sobre a cartilagem, que reduz substancialmente após a menopausa em decorrência da queda nos níveis de estrogênio (CARBONI, 2009).

Este estudo ainda corroborou a literatura sobre o uso frequente de medicamentos, principalmente os anti-hipertensivos e diuréticos, justificado pelo fato da hipertensão ser a condição crônica autorreferida mais frequente entre os idosos (LOYOLA FILHO et al., 2005; LOYOLA FILHO; UCHOA; LIMA-COSTA, 2006; VASCONCELOS et al., 2005).

Entretanto, a prevalência estimada do uso de medicamentos na amostra estudada foi superior à encontrada em estudo realizado na Região Metropolitana de Belo Horizonte, que foi igual a 72,1% (LOYOLA FILHO; UCHOA; LIMA-COSTA, 2006). Inclusive, não foi possível constatar diferença significativa entre o uso de medicação por sexo, que tende a ser maior entre as mulheres, o que é amplamente evidenciado na literatura (LOYOLA FILHO; UCHOA; LIMA-COSTA, 2006).

Nesses casos, o mais provável é que uma maior utilização de medicamentos pelas mulheres idosas possa estar ligada a outras questões, de ordem biológica (mulheres são mais afetadas por problemas de saúde não fatais), psicológica (mulheres são mais conscientes dos sintomas físicos e colocam mais atenção sobre os seus problemas de saúde) e sociocultural (ao longo da vida, mulheres utilizam mais frequentemente os serviços de saúde e estão mais familiarizadas com os medicamentos) (LAUKKANEN et al., 1992), questões essas, de alguma forma, potencializadoras do uso de medicamentos.

A polifarmácia presente entre os idosos é apontada pela literatura como um problema, pois influencia na ingestão de alimentos, na digestão, na absorção e na utilização de diversos nutrientes, o que pode comprometer ainda mais o estado de

Fatores associados à qualidade de vida de idosos adscritos no Distrito Sanitário Noroeste de Belo Horizonte, Minas Gerais

121

saúde e a necessidade nutricional do idoso (VERAS, 2003). Além disso, há o problema da subdosagem, superdosagem e não adesão à prescrição médica (TEIXEIRA; LEFÈVRE, 2001).

Sobre o elevado uso de anti-hipertensivos alguns autores alertam quanto ao manejo de hipotensão ortostática na população geriátrica decorrente dos efeitos colaterais do uso de agentes hipotensores que deve ser considerado e avaliação clínica individualizada é desejável, evitando risco de quedas e síncopes (CHEUNG; SOMAN; TAMURA, 2011; POON; BRAUN, 2005).

Outro aspecto importante a ser destacado, mas que não foi avaliado neste estudo, é o gasto médio com medicamentos que chega a comprometer aproximadamente um quarto da renda mensal média de mais da metade da população idosa brasileira (LIMA-COSTA; BARRETO; GIATTI, 2003).

Neste estudo, também foi constatado a tendência do baixo controle dos níveis pressóricos a qual é observada em vários países. Estudo realizado no Brasil mostrou que apenas 34,2% dos pacientes ambulatoriais possuíam pressão arterial controlada (PA < 130x85mmHg), e em 65% a pressão arterial sistólica encontrava-se acima dos valores recomendados (BATISTA et al., 2005). Em outro estudo, 76,1% dos entrevistados encontravam-se com níveis tensionais inadequados (MOREIRA et al., 2008). Tal realidade é alarmante, visto que, em 2001, cerca de 7,6 milhões de mortes no mundo foram atribuídas à elevação da pressão arterial (54% por AVE e 47% por doença isquêmica do coração) (WILLIAMS, 2009).

De acordo com Bregman (2004), a presença de indivíduos com maior nível de conhecimento sobre o tratamento farmacológico apresentaram benefício clínico importante, mantendo pressão arterial controlada, o que justifica a necessidade de maior ação dos profissionais de saúde quanto à orientação sobre o tratamento medicamentoso, que deverá ser associado ao não medicamentoso, levando em consideração as mudanças trazidas pelo processo de envelhecimento.

A dependência parcial ou total no desempenho das atividades de vida diária e a necessidade de equipamentos auxiliares para locomoção não foi expressiva na amostra estudada. Dos 391 participantes, todos foram classificados como independentes. Uma das possíveis explicações deve-se a não inclusão de indivíduos acamados e debilitados que moravam ou não em instituições de longa permanência

para idosos e os idosos que no momento da coleta de dados encontravam-se hospitalizados e ao tipo de seleção da amostragem por demanda espontânea o que pode ter causado um desvio positivo na avaliação dessas variáveis.

Devido a diversificação de pontos de corte na literatura, comparações de prevalência de incapacidade funcional para as atividades de vida diária são complexas. Estudo transversal realizado em São Carlos, São Paulo, revelou que 88% dos idosos entrevistados eram independentes, 6% parcialmente dependentes e os outros 6% tinham uma dependência importante. A dependência importante ocorreu somente entre as mulheres e a porcentagem de homens independentes foi maior em relação às mulheres (SANTOS; PAVARINI, 2011). Nesse mesmo estudo, também não foi constatado diferença significativa entre sexo feminino e masculino com relação ao Índice de Katz, verificando-se, portanto, que o sexo não influencia no desempenho das atividades de vida diária para os sujeitos destas pesquisas.

Resultados diferenciados foram encontrados na literatura, mostrando que o grau de dependência é maior entre as mulheres em relação aos homens. Os achados do estudo de Fiedler e Peres (2008) mostraram que a prevalência de capacidade funcional inadequada foi estatisticamente maior nas mulheres do que nos homens (43,1% vs 25,8%; p=0,002), semelhante à pesquisa realizada em Portugal (SOUSA; GALANTE; FIGUEIREDO, 2003).

A alimentação foi a atividade básica de vida diária mais realizada (98,0%), ao passo que o banho, a menos realizada (88,0%) (dados não mostrados), semelhante ao estudo realizado por Santos e Pavarini (2011).

Outras pesquisas brasileiras encontraram que mais da metade dos idosos era totalmente independente para a realização das atividades básicas de vida diária (COELHO FILHO; RAMOS, 1999; RAMOS et al., 1993), destacando-se a incapacidade para o controle das funções de urinar e/ou evacuar, seguida pelos atos de vestir-se e tomar banho. Do total de indivíduos com incapacidade para as atividades básicas, a grande maioria apresentou incapacidade para apenas uma atividade, majoritariamente representada pela incontinência urinária e/ou fecal, vista erroneamente como processo natural do envelhecimento pela população, no geral (DEL DUCA; SILVA; HALLAL, 2009).

Fatores associados à qualidade de vida de idosos adscritos no Distrito Sanitário Noroeste de Belo Horizonte, Minas Gerais

123

Lembra-se que a saúde do idoso está estritamente relacionada com a sua funcionalidade global, definida como a capacidade de gerir a própria vida ou cuidar de si mesmo. Essa capacidade de funcionar sozinho é avaliada por meio da análise das atividades de vida diária, que são tarefas do cotidiano realizadas pelo indivíduo e avaliam o grau de autonomia e independência do mesmo (MORAES; MARINO; SANTOS, 2010).

A mobilidade é das principais funções corporais e o seu comprometimento, além de afetar diretamente a independência do indivíduo, pode acarretar consequências gravíssimas, principalmente nos idosos. A instabilidade postural, por exemplo, leva o idoso à queda, o que representa um dos maiores temores em geriatria (MORAES; MARINO; SANTOS, 2010). No presente estudo, não foi avaliado a queda, o que exigirá investigações futuras, dada sua relevância. Ressalta-se que a incidência anual de quedas varia com a idade, sendo de 28 a 35% e de 32 a 42% entre pessoas com mais de 65 e de 75 anos de idade, respectivamente, chegando a 50% dos idosos em instituições de longa permanência (MORAES; MARINO; SANTOS, 2010).