• Nenhum resultado encontrado

3. Direito Processual Penal Militar

3.1. Dos princípios da territorialidade e extraterritorialidade

3.2.3. Características

A jurisdição, como é sabido, tem como características a inércia, a inevitabilidade, a definitividade, a indeclinabilidade, a unidade, o caráter secundário e a imparcialidade.

Como o Estado é um terceiro desinteressado, a atividade jurisdicional é inerte, ou seja, é a insatisfação de alguém levada ao Poder Judiciário que dá

42 Teoria Geral do Processo. 14ª ed., São Paulo: Malheiros, 1998, p. 129.

43 Manual de Direito Processual Civil. 9ª ed., atualizada por Ovídio Rocha Barros Sandoval,

início à prestação jurisdicional, de modo que “o processo se origina por iniciativa da parte (nemo iudex sine actore; ne procedat judex ex officio)”.44

Ada Pellegrini Grinover, Antonio Carlos de Araújo Cintra e Cândido Rangel Dinamarco colocam que “o exercício espontâneo da atividade jurisdicional acabaria sendo contraproducente, pois a finalidade que informa toda a atividade jurídica do Estado é a pacificação social e isso viria em muitos casos a fomentar conflitos e discórdias, lançando desavenças onde elas não existiam antes”.45

Humberto Theodoro Junior, por arremate, reconhecesse que “o órgão jurisdicional é, na verdade, convocado para remover a incerteza ou a reparar a transgressão, mediante um juízo que se preste a reafirmar e restabelecer o império do direito, quer declarando qual seja a regra no caso concreto, quer aplicando as ulteriores medidas de reparação ou de sanção previstas pelo direito”.46

Quanto à inevitabilidade da jurisdição, há uma relação de autoridade e sujeição em que, conforme a doutrina de Cândido Rangel Dinamarco, “o poder estatal não é exercido na medida em que o desejem ou aceitem os particulares, mas segundo os desígnios e decisões do próprio Estado, expressos pelos agentes regularmente investidos”.47

No que tange à definitividade da jurisdição, tem-se que tal característica repousa na imunização dos efeitos dos atos judiciais, consagrados no dogma da

44 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 7ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 327.

45 Ob. cit., p. 132. 46 Ob. cit., p. 32.

coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI).

Nesse sentido, Cândido Rangel Dinamarco expõe que “a própria Constituição Federal a assegura, primeiramente como afirmação do poder estatal, não admitindo que os atos de exercício de um poder que é soberano por natureza possam ser depois questionados por quem quer que seja”.48

A indeclinabilidade da jurisdição está assegurada no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, sob a rubrica de que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito, o que contém, implicitamente, o princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional. A esse respeito, Humberto Theodoro Junior adverte que “o órgão constitucionalmente investido no poder de jurisdição tem a obrigação de prestar a tutela jurisdicional e não a simples faculdade. Não pode se recusar a ela, quando legitimamente provocado, nem pode delegar a outros órgãos o seu exercício”.49

A unidade da jurisdição repousa nas ideias de soberania e independência dos poderes estatais.

Moacyr Amaral Santos ensina que “as atividades jurisdicionais não diversificam porque o conflito a compor-se é de natureza penal, civil, trabalhista, eleitoral. Nesse sentido, diz-se que a função jurisdicional é uma, sempre idêntica”.50

Há, porém, ponderações doutrinárias sobre a divisão da jurisdição em espécies, ou seja, jurisdição civil, penal e especial, esta última englobando a

48 Idem, p. 314. 49 Ob. cit. p. 34.

eleitoral, a trabalhista e a militar.

Contudo, como esclarecido por Ada Pellegrini Grinover, Antonio Carlos de Araújo Cintra e Cândido Rangel Dinamarco,

“a jurisdição, como expressão do poder estatal soberano, a rigor não comporta divisões, pois falar em diversas jurisdições num mesmo Estado significaria afirmar a existência, aí, de uma pluralidade de soberanias, o que não faria sentido (...) A doutrina, porém, embora fazendo tais ressalvas, costuma falar em espécies de jurisdição, como se esta comportasse classificação em categorias”.51

No mesmo sentido, Moacyr Amaral Santos assinala que “por motivos de ordem prática, resultantes do princípio da divisão do trabalho, costuma-se distinguir as atividades jurisdicionais segundo vários critérios. Fala-se a esse respeito em espécies de jurisdição”.52

Esse também é o entendimento de José Frederico Marques, para quem “razões de ordem prática obrigam o Estado a distribuir o poder de julgar, entre vários juízes e tribunais, visto não ser possível que um só órgão judiciário conheça de todos os litígios e decida todas as causas”.53

Ao tecer comentários sobre a unidade da jurisdição e a pluralidade dos órgãos que a exercem, Cândido Rangel Dinamarco observa que

51 Ob. cit., p. 140. 52 Ob. cit., p. 74.

53 MARQUES, José Frederico. Da Competência em Matéria Penal. Campinas: Millennium,

“a unidade da jurisdição permite compreender que todos os juízes do país são investidos desse poder, o qual é o mesmo apesar da distribuição de tarefas e atribuições, não falecendo jurisdição ao juiz incompetente e jamais se considerando inexistente o ato realizado sem competência para realizá-lo”.54

Assim, correto seria falar em divisão de matérias e de competência, por uma questão de estrutura judiciária, razões político federativas e política de técnica de especialização dos órgãos judiciários (em razão dos órgãos do Poder Judiciário), mas não em espécies de jurisdição.

Acerca do caráter secundário da jurisdição, tem-se que o Estado assume o papel de substituir a vontade das partes envolvidas no conflito.

É precisamente o que define Humberto Theodoro Junior quando coloca que se trata de atividade secundária “porque, através dela, o Estado realiza coativamente uma atividade que deveria ter sido primariamente exercida, de maneira pacífica e espontânea, pelos próprios sujeitos da relação jurídica submetida à decisão”.55

Quanto à imparcialidade da jurisdição, impende esclarecer que é característica decorrente do princípio do juiz natural. E tamanha a preocupação com a imparcialidade que as normas adjetivas, de forma geral, trazem disposições sobre impedimento e suspeição dos órgãos judicantes.

Cândido Rangel Dinamarco considera que

54 Ob. cit. p. 413. 55 Ob. cit., p. 32.

“seria absolutamente ilegítimo e repugnante o Estado chamar a si a atribuição de solucionar conflitos, exercendo o poder, mas permitir que seus agentes o fizessem movidos por sentimentos ou interesses próprios, sem o indispensável compromisso com a lei e os valores que ela consubstancia – especialmente com o valor do justo”.56

Na visão de Humberto Theodoro Junior, é “a jurisdição, atividade desinteressada do conflito, visto que põe em prática vontades concretas da lei que não se dirigem ao órgão jurisdicional, mas aos sujeitos da relação jurídica substancial deduzida em juízo”.57

3.2.4. Espécies

Fala-se ainda em espécies de jurisdição, como, por exemplo, jurisdição contenciosa e voluntária (administrativa ou graciosa), onde aquela se distingue pela existência do conflito de interesse (lide) e esta caracterizada pela intervenção administrativa nos interesses privados das pessoas.

Existem, ademais, aqueles que distinguem entre jurisdição superior e inferior. Trata-se de uma análise da jurisdição sob o ângulo do duplo grau de jurisdição, abordando-se a temática das competências originária e recursal.