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CAPÍTULO 2 O SETOR ELÉTRICO

2.1. Caracterização do setor elétrico

A segunda revolução industrial, na metade do século XIX, consolidou a difusão da eletricidade associada ao estabelecimento da industrialização, à expansão do transporte ferroviário, ao processo de transferência do centro econômico para as cidades, iniciados com a primeira revolução industrial do século XVIII (Calabi, et. al., 1983).

Essa nova forma de organização sócio-política e espacial da população concentrada em cidades repercutiu diretamente na estrutura de produção, comercialização e no consumo de energia elétrica (Hobson, 1985). Para atender a essas novas demandas sociais, foi preciso modernizar o

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setor elétrico com a elaboração de um sistema de produção centralizado, melhor organizado, e com uma distribuição de eletricidade descentralizada.

No final do século XIX, estavam se constituindo as primeiras empresas concessionárias para os serviços de eletricidade (Landes, 1969). No segmento de geração (G), a eletricidade permitiu um melhor aproveitamento do potencial de energia das águas, pela forma de produção hidrelétrica. Já na área de transmissão (T) de eletricidade, o primeiro fato marcante da indústria elétrica foi a construção de 56 km de linha de transmissão na França, em 1885, ainda de forma experimental. A energia elétrica passou a criar novos mercados consumidores: da iluminação (pública e doméstica), da força motriz móvel (bondes, metrôs), e fixa (motor elétrico) e a utilização em setores eletroquímicos e eletrometalúrgicos, dentre outros.

Outras aplicações industriais estiveram relacionadas à introdução de maquinário movido à eletricidade, uma vez que estes equipamentos exigem pouco espaço para instalação e oferecem uma maior flexibilidade, ao contrário das grandes máquinas a vapor. A eletricidade passou também a reorganizar os espaços sociais, uma vez que poderia ser levada a regiões até então sem estruturas para se desenvolverem (Martin, 1992).

A energia elétrica é um insumo essencial para a sociedade moderna, seja como insumo produtivo ou como bem de consumo (mercadoria) a ser produzida e consumida no mercado (regional, nacional ou internacional). Para organizar sua utilização, existe um conjunto de políticas, leis e normas que são criadas para definir, ordenar e coordenar o setor elétrico e seus respectivos atores. A coordenação e operação entre os atores nos segmentos de GTD buscam a conversão de determinada fonte (carvão, petróleo, hidroeletricidade e gás natural, por exemplo) em forma de energia (motriz e de iluminação) e que deve ser transmitida e distribuída aos consumidores finais, com menor preço, maior qualidade energética, menor desperdício e com menor impacto ao meio ambiente. Esse processo será melhor detalhado a seguir.

Operação do setor

Operativamente, o setor elétrico pode ser dividido em etapas desde a fase de produção, até o seu consumo final. São elas, basicamente: a geração de energia a partir de diferentes fontes energéticas; uma estrutura de transmissão de energia em alta-tensão (AT), cuja finalidade é o transporte da energia gerada aos centros consumidores; um sistema de distribuição em baixa tensão (BT) que leva a energia elétrica aos consumidores finais, nas classes residencial,

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industrial, comercial, poder público e rural. Esse desenho caracteriza o setor na forma dos segmentos: geração, transmissão e distribuição (GTD).

A geração de energia elétrica (G) consiste num processo de conversão de algum tipo de energia, seja ela energia potencial-cinética (quedas d’água para acionar turbinas hidráulicas), energia térmica (pelo aquecimento e expansão de gases), ou energia mecânica (usada para movimentar turbinas de geradores elétricos), na forma elétrica, por meio dos fenômenos de produção de corrente e tensão (diferença de potencial) elétricas. Essa conversão de energia é normalmente realizada nas chamadas centrais ou usinas de eletricidade.

Uma usina hidrelétrica funciona com base no aproveitamento da energia potencial dada pela altura das quedas d’águas dos rios, que se transforma em energia cinética (durante o movimento de queda). Essa quantidade de energia é suficiente para girar o eixo de uma turbina (energia mecânica) que, por sua vez, está acoplada a um gerador de energia elétrica. Os rios apresentam vazões e alturas variáveis no tempo, com grandes diferenças entre os períodos chuvosos e os de seca. Assim, são construídos os grandes reservatórios naturais, ou artificiais (por meio de barragens), com os desníveis necessários e controlados para a obtenção de vazões mais regulares e constantes.

No caso da geração por termelétricas e nucleares, a eletricidade é gerada a partir da energia química ou nuclear dos combustíveis, que se transforma em calor (energia térmica), promovendo a expansão de gases (vapor de água, ou outro) e o acionamento das turbinas, que por sua vez, fazem girar o eixo dos geradores de energia elétrica.

Além das formas de geração acima descritas, existem outros tipos de processo como: geotérmica, eólica, maré-motriz, energia das ondas, energia solar, etc. Uma característica importante dessas tecnologias é o fato de que elas utilizam fontes renováveis, com menor impacto ao meio ambiente. Este é um fator importante para que venham aumentando sua participação nas matrizes energéticas mundiais (Markad e Truffer, 2006).

Na fase de transmissão (T), para que a energia elétrica gerada possa ser utilizada pelos consumidores, é necessário transportá-la das usinas até os centros de consumo (ou de carga). Esse transporte é realizado pelas chamadas linhas de transmissão (LT), associadas com outros equipamentos e instalações como: subestações, transformadores, torres, isoladores, chaves, etc. A transmissão de energia elétrica pode ser realizada tanto em corrente alternada (50 ou 60 Hz, sendo esta última a frequência utilizada no Brasil), ou em corrente contínua. Esta característica

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técnica tem implicações econômicas, na medida em que as necessidades de equipamentos são distintas, sendo a corrente contínua mais cara por sua complexidade técnica-operativa e pela diminuição da confiabilidade do sistema.

O que diferencia os circuitos de transmissão dos de distribuição são os níveis de tensão e a capacidade de transporte de potência da energia elétrica. Os circuitos com tensões maiores ou iguais a 230 kV (quilovolts) são considerados de transmissão, e abaixo disso, de distribuição. A distribuição (D) é o segmento de interface entre o final do sistema de transmissão e os pontos de medição de consumo, por meio do qual flui toda energia elétrica a ser distribuída aos diversos consumidores. Ao chegar às subestações (SEs) das distribuidoras, a tensão é rebaixada por meio de um sistema composto por cabos, postes e transformadores.

A rede de distribuição é dividida em primária e secundária. A rede primária é composta por redes de média tensão que alimentam os transformadores de distribuição ou unidades industriais que operam com tensões mais elevadas (2,3 kV a 88 kV) e recebem a energia elétrica diretamente da SE da distribuidora (pela chamada rede de subtransmissão). Já a rede secundária é alimentada pelos secundários dos transformadores de distribuição e chega à unidade final em 127 V (volts) ou 220 V. Seus circuitos podem ser urbanos ou rurais (fora dos perímetros urbanos). Essas redes podem ser com condutores aéreos, ou subterrâneos (localizados abaixo do solo).

A energia elétrica funciona como um fluxo contínuo, caracterizada por sua dificuldade de armazenamento e a necessidade de ser fornecida instantaneamente, em resposta às exigências de carga dos consumidores. As cargas variam ao longo do dia: durante a madrugada a demanda é baixa, cresce nas primeiras horas da manhã, tende a se estabilizar durante o dia e volta a crescer no final da tarde e início da noite, até atingir um pico (entre as 18 e 21 hs, é chamado o horário de “Ponta”) e depois volta a decrescer (Brito, 1985). Assim, existe uma carga mínima, denominada carga de base, que deve ser suprida 100% do tempo; uma carga intermediária que deve ser ofertada na maior parte do tempo, e a carga de ponta que é demandada durante poucas horas do dia.

O sistema elétrico deve operar e ser controlado para atender essa complexidade de variação da demanda, com o máximo de qualidade e o mínimo de falha possível. Para isso, muitos países, como é o caso do Brasil, se utilizam de uma regra básica de controle do despacho dos sistemas de geração, sendo as primeiras a serem usadas as unidades mais eficientes, com menor custo de

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produção; só depois é que são despachadas as centrais menos eficientes, à medida que a demanda cresce.

Apresentado o modelo e as principais características de operação do setor, o próximo tópico ira descrever os aspectos estruturais deste setor no mundo e, posteriormente, o caso brasileiro.