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5.3 Resultados e discussão

5.3.3. Caracterização eletroquímica dos pRE de Ag/AgCl

O desempenho dos pREs impressos sobre o PET foram avaliados por cronopotenciometria em KCl 3,0 mol L-1, em comparação com um eletrodo de referência comercial de Ag/AgCl com junção líquida (adquirido da CH Instruments). Um eletrodo impresso de prata e um eletrodo de referência serigrafiado (do inglês: Screen-Printed Reference Electrode, SPRE, Acheson Electrodag 6037SS, tinta de Ag/AgCl§) foram utilizados para comparação dos resultados obtidos com os pREs propostos (Figura 5.11).

Figura 5.11. Medidas de CA comparando o comportamento dos eletrodos de prata impressos

em PET e os pRE de Ag/AgCl produzidos pelo método químico ou eletroquímico (além de um SPRE utilizado para comparação), contra um eletrodo comercial de Ag/AgCl||3,0 molL-1.

Detalhe: Visão aproximada do gráfico destacando a estabilização do potencial dos pRE.

§ Detalhes de fabricação do SPRE na sessão 5.2.2. – Equipamentos e métodos (pag. 97).

0 20 40 60 80 100 -0,08 -0,06 -0,04 -0,02 0,00 0,02 

E

vs

A

g(Ag

Cl

) /

V

t / s

Ag Ag/AgCl (Electroquímico) Ag/AgCl (Químico) Ag/AgCl (SPRE) 0 2 4 6 8 10 t / s

111

É possível observar a partir dos cronoamperogramas mostrados na Figura 5.11 que os eletrodos de prata apresentaram uma baixa (ou nenhuma) estabilidade quando comparado ao eletrodo de referência comercial de Ag/AgCl, como esperado. Entretanto, após a modificação dos eletrodos para a formação da camada de AgCl, foi observado um aumento da estabilidade dos pRE frente ao eletrodo comercial de Ag/AgCl, com E em torno de 6 e 3 mV, para os eletrodos preparados pela via eletroquímica e química, respectivamente. Os pRE impressos apresentaram ainda uma grande similaridade com os SPRE, indicando que o método proposto é confiável e pode ser utilizado para a fabricação de eletrodos de referência para os mais diversos dispositivos POC.

Em detalhe na Figura 5.11 pode-se observar uma grande estabilidade dos pRE impressos, considerando ambos os métodos utilizados (química e eletroquímico) desde o início do experimento, não sendo necessário um tempo de condicionamento do eletrodo ou etapa pré-analítica, o que é bastante interessante para dispositivos de rápido diagnóstico.

A estabilidade de um pRE é geralmente atribuída à velocidade com que a camada de AgCl formada na superfície do eletrodo de prata é solubilizada (Equação 5.2), levando à formação de um potencial misto na interface eletrodo/solução. O cloreto de prata apresenta uma constante de solubilidade (Kps) de 1,810-10, o qual termodinamicamente significa que 1,9 mg de AgCl sofre dissolução completa em aproximadamente 1L de água. Assim, uma fina camada de AgCl pode levar à diminuição do tempo de vida do eletrodo, além de sua estabilidade. Neste contexto, uma alternativa encontrada para sanar este problema sem a utilização de camadas protetoras ou coberturas poliméricas para impedir a rápida dissolução,24 seria um aumento da espessura da camada de AgCl pelo prolongamento da reação de cloração química com NaClO.

112

�� � � + �− ⇌ �� � + �−�� Eq. 5.2

Para avaliar tal afirmação, foi realizada a cloração química dos eletrodos de prata impressos por períodos de tempo diferentes (1, 5 e 10 minutos), utilizando solução de NaClO (40 mg/mL). Os resultados referentes à estabilidade dos pRE obtidos estão apresentados na Figura 5.12.

Figura 5.12. Medidas de CA dos pRE impressos em PET, preparados via cloração química

com solução de NaClO (durante 1 ou 5 min) contra um eletrodo comercial de Ag/AgCl||3,0 mol L-1. Detalhe: Uma fotografia do pRE após 10 minutos de cloração química.

Como pode ser observado, após 1 minuto de reação de cloração com solução de NaClO, obteve-se um pRE de Ag/AgCl que se mostrou estável por pelo menos 10 minutos de experimento antes de tornar-se inutilizável devido à solubilização da camada de AgCl. Entretanto, após 5 minutos de reação de cloração, pôde-se observar um aumento na estabilidade do pRE produzido, o qual manteve o potencial constante em aproximadamente 3,0 mV (contra um

0 500 1000 1500 2000 -0,15 -0,10 -0,05 0,00 0,05 Ag/AgCl_1 min Ag/AgCl_5 min

E

vs

A

g(Ag

Cl

) /

V

t / s

Após 10 min

113

RE comercial de Ag/AgCl||3,0 mol L-1) por pelo menos 30 minutos de medida. Os resultados obtidos sugerem que quando tempos maiores de cloração química são empregados ocorre a formação de uma camada mais larga de AgCl e, consequentemente, um aumento na estabilidade do eletrodo é observado.

Entretanto, após 10 minutos de cloração química, foi observado uma perda total da condutividade do eletrodo, provavelmente devido ao consumo da camada interna de prata para a formação do AgCl, levando à lixiviação do eletrodo, como observado em detalhe na Figura 5.12. Assim, o pRE de Ag/AgCl impressos em PET que apresentou melhor funcionalidade foi o obtido por reação de cloração com solução de NaClO por um período de 5 minutos.

O mesmo experimento foi realizando para os pRE impressos em papel e os resultados se encontram apresentados na Figura 5.13. Como pode ser observado a partir desta figura, com apenas 30 segundos de reação de cloração com NaClO o potencial do pRE formado se manteve estável por pelo menos 30 minutos de medida; tempo suficiente para a maioria das medidas eletroquímicas realizadas com dispositivos POC descartáveis. Entretanto, após 60 segundos de reação de cloração com hipoclorito, os pRE formados mostraram uma diminuição na estabilidade do potencial monitorado durante o tempo, que apresentou uma variação de aproximadamente 30 mV (contra o RE comercial de Ag/AgCl||3,0 mol L-1), enquanto que o pRE formado com menor tempo de reação de cloração apresentou uma variação de potencial de apenas ~2,0 mV.

114

Figura 5.13. Medidas de cronoamperometria dos pRE impressos em papel, preparados via

cloração química com solução de NaClO (30 ou 60 s) contra um eletrodo comercial de Ag/AgCl||3,0 mol L-1. Detalhe: Fotografía dos pRE de Ag/AgCl impressos em papel.

Esse comportamento pode estar relacionado com a formação de uma camada mais espessa de AgCl devido ao aumento no tempo de reação, como mencionado anteriormente, diminuindo assim a camada de prata responsável pelo equilíbrio do eletrodo de referência, além de sua condutividade, dificultando assim o transporte de carga. Por esta razão, para o pRE impresso em papel (Whatman #1), 30 segundos de reação em solução de NaClO (40 mg/mL) foi suficiente para a formação de um eletrodo de referência capaz de se manter estável por pelo menos 30 minutos de medida.

Uma comparação dos pRE de Ag/AgCl impressos em PET ou papel, bem como dos SPRE, em suas melhores condições (cloração química por 5 minutos ou 30 segundos para os pRE impressos em PET e papel, respectivamente), está apresentada na Figura 5.14. De acordo com o gráfico de barras, não se observou

0 500 1000 1500 2000 -0,15 -0,10 -0,05 0,00 0,05 Ag/AgCl_30 s Ag/AgCl_60 s

E

vs.

A

g(Ag

Cl

) /

V

t / s

115

diferença significativa entre os eletrodos fabricados neste trabalho e os obtidos por serigrafia, que são os RE mais comumente utilizados em dispositivos eletroquímicos POC,25-28 o que destaca a confiabilidade dos pRE propostos.

Figura 5.14. Gráfico de barras representando as medidas de CA para os pRE impressos em

papel e PET, seguido por cloração com uma solução de alvejante (SPRE foi utilizado para comparação) vs. o eletrodo comercial de Ag/AgCl||3,0 mol L-1.O gráfico em escala

maximizada está apresentado em detalhe.

Os valores de potenciais encontrados para todos os pRE em função do potencial do RE comercial de Ag/AgCl||3,0 mol L-1 apresentaram valores abaixo de 3,0 mV fora do valor ideal de zero. O pequeno erro observado em cada eletrodo utilizado pode estar relacionado à diferença da atividade do cloreto na solução teste e/ou no eletrólito de suporte presente no eletrodo de referência comercial, o qual pode provocar variações significativas nos potenciais observados devido à dependência logarítmica entre esses parâmetros, conforme descrito pela equação de Nernst:24

PET PAPEL SPRE

0 1 2 3 4

E

vs

Ag(AgCl) / mV

Eletrodos de referência

116

��,����,��− = ��,��0 +,��− − �� �����− Eq. 5.3

onde EAg,AgCl,Cl- é o potencial de redução do eletrodo, E0Ag,Ag+,Cl- é o potencial de

redução padrão, R é a constante universal dos gases, T é a temperatura expressa em Kelvin, F é a constante de Faraday, e aCl- representa a atividade química dos

íons cloreto em solução.

Apesar do bom funcionamento dos eletrodos de pseudo-referência impressos em papel, neste trabalho optou-se pelo uso do pRE de Ag/AgCl em substrato plástico (PET ou similar) para que a plataforma de papel seja utilizada sem prévias modificações, com a largura do canal delimitada apenas pelo corte. Assim, a estabilidade quanto à estocagem dos eletrodos foi avaliada apenas para os pRE impressos em PET. Para isso, medidas de estabilidade foram realizadas por cronoamperometria vs. o eletrodo de referência comercial de Ag/AgCl||KCl 3,0 mol L-1 durante um período de 30 dias. Os resultados estão apresentados na Figura 5.15.

Para este experimento, um pRE com a camada de AgCl produzida eletroquimicamente foi utilizado como padrão de comparação com o objetivo de provar a viabilidade do uso da solução de NaClO na produção de um pRE de Ag/AgCl. Como mencionado, a Figura 5.15 mostra a estabilidade dos pREs impressos em PET durante 30 dias de armazenamento em ambiente escuro e sem outros cuidados especiais.

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Figura 5.15. A estabilidade de armazenamento dos pRE impressos em PET, seguido por

cloração em solução de alvejante durante 1 min, foram avaliadas por cronopotenciometria contra eletrodo de referência comercial de Ag/AgCl||3,0 mol L-1. Um pRE

eletroquimicamente produzido foi utilizado para efeitos de comparação.

No gráfico apresentado, foi possível observar que os pREs produzidos se apresentaram bastante estáveis, mesmo após 15 dias de armazenamento, com E < 3,0 mV vs. o eletrodo de referência de Ag/AgCl comercial. Uma pequena variação foi observada após 30 dias, onde o potencial dos eletrodos aumentou para cerca de 5,0 mV com relação ao eletrodo comercial (também observado para os pREs produzidos eletroquimicamente). No entanto, em alguns casos, como por exemplo quando um sobrepotencial é aplicado, este ligeiro aumento de E não deve afetar os resultados finais, e o pRE pode ser utilizado mesmo após 30 dias de armazenamento. Além disso, desvios menores que ±5,0 mV nos valores de potencial são considerados aceitáveis para um eletrodo de referência

0 5 10 15 20 25 30 -10 -5 0 5 10 15 Químico (Ag/AgCl) Eletroquímico (Ag/AgCl)

E

vs

Ag(AgCl) / m

V

Tempo / dias

118

confiável29 (neste caso, o erro encontrado foi de ±1,6 mV para os pRE preparados quimicamente com NaClO em até 30 dias após o preparo).

Conforme o esperado, não foi observado uma diferença significativa para os eletrodos produzidos pelas diferentes técnicas (química com NaClO ou eletroquímica), o que indica que o método proposto de cloração pode simular muito bem o método mais comum relatado na literatura (método eletroquímico), com a vantagem de apresentar um menor custo, dispensando o uso de equipamentos sofisticados no processo de fabricação. Além disso, diferentes materiais podem ser impressos com a tecnologia de impressão inkjet, incluindo nanopartículas metálicas,13 polímeros condutores30 e grafeno,31 que podem atuar como WE, dentre outros,32 desde que o tamanho das partículas seja inferior a 200 nm, e a faixa de viscosidade da solução esteja entre 10 e 12 cPs. Portanto, um dispositivo POC eletroquímico completo pode ser construído em diferentes substratos usando esta tecnologia, incluindo um eletrodo de pRE de Ag/AgCl bastante confiável.