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CAPÍTULO I: O perfil conceitual de adaptação: um modelo da heterogeneidade de

1.3. Abordagens variacionais: um perfil de adaptação para o ensino superior de

1.3.2 Caracterização epistemológica da abordagem pluralista da evolução da forma

No modo de pensamento pluralista,

a adaptação é concebida como um dos fenômenos envolvidos na explicação da forma orgânica, ao lado de outros como a deriva gênica, o reaproveitamento de estruturas preexistentes (exaptação), as restrições do desenvolvimento, estruturais (spandrels), e da historia evolutiva (SEPULVEDA, 2010, p. 178).

A explicação para a origem de uma característica funcional, complexa ou conspícua, em uma narrativa pluralista, não se baseia na origem adaptativa, mas a considera uma entre outras hipóteses a ser analisadas (SEPULVEDA, 2010).

Os compromissos epistemológicos que fundamentam este possível modo de significar o conceito de adaptação são: (1) relativização do poder explicativo da seleção natural e (2) pluralismo de processos (SEPULVEDA, 2010, p.179). Ao se considerar outros processos e mecanismos que agem simultânea e/ou complementarmente à seleção natural no processo evolutivo das formas orgânicas, a forma de entender a relação organismo-ambiente é também ressignificada, podendo, por exemplo, ser considerada a partir de uma visão construtivista (LEWONTIN, 1985, 2002, ver também ODLING-SMEE et al., 2003).

Da perspectiva construtivista (LEWONTIN, 1985, 2002), organismos e ambiente seletivo interagem dialeticamente, de modo que, ao construírem seus nichos os organismos modificam o ambiente e, por conseguinte, geram gradualmente novos regimes seletivos ambientais, à medida que evoluem. Portanto, pensar a adaptação de uma perspectiva pluralista, é também se comprometer ―com simultaneidade e/ou interdependência entre forças externas e internas ao organismo na causalidade da forma‖ (SEPULVEDA, 2010, p.179).

Distintamente à tendência otimizadora que caracteriza o modo de pensar adaptacionista, aqui, a adaptação é uma estrutura, comportamento ou mecanismo que ―se mantém prevalente em consequência do fitness maior de seu design em relação aos problemas ambientais reais, enfrentados na historia do organismo, em comparação com alternativas historicamente disponíveis‖ (BURIAN, 2005, p. 62).

A concepção do processo evolutivo típica desse modo de pensamento é, segundo Sepulveda (2010), caracterizada pela metáfora da bricolagem e funilaria (ver

JACOB, 1977; MEYER; EL-HANI, 2005). De acordo com ela, dessa perspectiva, ―as novidades evolutivas podem ser produzidas a partir do reaproveitamento de estruturas pré-existentes, através da mudança de função de um sistema, ou da combinação de mais de um sistema em sistemas complexos‖ (SEPULVEDA, 2010, p.180).

No quadro 7 abaixo apresentamos a síntese da caracterização epistemológica das formas variacionais de significação do conceito de adaptação.

Ao propor a caracterização epistemológica para as duas formas de pensar o conceito de adaptação na perspectiva variacional, Sepulveda (2010) sugeriu que ao acrescer essas formas de pensar ao perfil inicialmente proposto (e avaliado) tal modelo ‗estendido‘ poderia se constituir em uma ferramenta para a investigação da significação do conceito de adaptação no ensino superior. No entanto, a autora não avaliou empiricamente este modelo ‗estendido‘, ou seja, não o aplicou na análise do discurso produzido em salas de aula de evolução no ensino superior e, por conseguinte, não caracterizou enunciativamente esses dois modos variacionais de pensar o conceito de adaptação.

Além disso, Sepulveda (2010) chamou a atenção para o fato de que algumas das categorias que haviam sido identificadas na matriz epistemológica (QUADRO 1), mas que não foram consideradas de modo sistemático e expressivo na constituição das zonas, tiveram um papel significativo na análise discursiva dos episódios de ensino no nível médio. Foi o caso, de acordo com a autora, especificamente da oposição entre visão prospectiva e retrospectiva de interpretar a natureza ontológica da adaptação e a oposição entre uma perspectiva internalista e uma perspectiva externalista de conceber a relação entre organismo e ambiente nos processos evolutivos. Diante dessa constatação, Sepulveda sugere que em novas investigações, ―seria o caso, portanto, de examinar a pertinência de incluí-las na caracterização das zonas já existentes‖ (SEPULVEDA, 2010, p. 384).

Tendo em vista essas proposições, o nosso estudo avaliou em que medida o modelo de perfil conceitual de adaptação proposto por Sepúlveda (2010), quando acrescido das zonas abordagem adaptacionista e abordagem pluralista, permite modelar a heterogeneidade de formas de pensar e modos de falar este conceito no contexto do ensino superior de biologia, como uma das vias para responder a nossa pergunta de pesquisa, a saber: Quais modos de pensar e formas de falar modelam a polissemia do

Para tanto, organizamos o estudo nas seguintes etapas: (1) Integração as duas formas variacionais de pensar o conceito de adaptação – abordagem adaptacionista e abordagem pluralista – às quatro zonas que compõe perfil conceitual proposto por Sepulveda (2010) (Ver QUADRO 8); (2) Desenvolvimento e proposta de uma estrutura metodológica para a caracterização das zonas de perfis conceituais; (3) Aplicação desta estrutura metodológica de modo integrado ao perfil conceitual de adaptação (SEPULVEDA, 2010) à análise discursiva de episódios de ensino de evolução em salas de aula de um curso de Licenciatura em Ciências Biológicas; (4) Aperfeiçoamento do modelo inicialmente proposto a partir dos resultados obtidos na análise discursiva de episódios de ensino, e da caracterização enunciativa dos modos de pensar o conceito de adaptação negociados em sala de aula.

QUADRO 8 - Perfil conceitual de adaptação (SEPULVEDA, 2010) ZONAS Compromissos ontológicos e

epistemológicos distintos

Compromissos que compartilham com outras zonas Funcionalismo

Intra-orgânico

-O fenômeno adaptação, enquanto adequação da forma ao entorno ecológico não é reconhecido como tal. -Teleologia intra-orgânica;

Suficiência das causas próximas para explicar o fenômeno vivo.

-Economia natural

-Foco de investigação no nível do organismo;

-Emprega atribuição funcional como estratégia explicativa

Ajuste Providencial

-A adaptação é concebida como um estado de ser, uma propriedade fixa do organismo ou grupo de

organismos.

Teleologia intra-orgânica e teleologia externa;

-Agência de uma força sobrenatural ou de outro tipo de força ordenadora da Natureza;

-Harmonia e perfeição na relação estrutura orgânica e meio

-Economia natural

-Pensamento essencialista;

-Emprega atribuição funcional como estratégia explicativa;

-Perfeição na relação funcional entre estrutura orgânica e condições de vida;

-Otimização (design ótimo);

Perspectiva Transformacional

-Acúmulo de processos ontogenéticos explica mudanças filogenéticas; -Tendência de transformação da essência da espécie para alcançar maior complexidade ou ajuste às condições ambientais (implicando na ideia de progresso e alguma forma de pensamento teleológico);

-Economia natural

-Pensamento essencialista; -Foco de investigação no nível do organismo;

-Perfeição na relação funcional entre estrutura orgânica e condições de vida;

-Otimização (aperfeiçoamento progressivo);

- Perspectiva evolutiva de explicar adaptação;

Abordagem Adaptacio-

nista da forma orgânica

-Primazia da adaptação em relação a outros fenômenos evolutivos;

-Exclusividade das Explicações adaptacionistas;

- Independência lógica entre seleção natural e adaptatividade;

- Supervalorização do poder causal e explicativo da seleção natural; -Alienação entre forças internas e externas ao organismo na causalidade da forma. Compromissos compartilhados entre as abordagens variacionais -Perfeição na relação funcional entre estrutura orgânica e condições de vida; -Otimização (design ótimo); -Pensamento populacional; Abordagem pluralista da forma orgânica -Compromisso em considerar hipóteses não adaptativas na explicação da forma;

-Pluralismo de processos;

-Relativização do poder explicativo da seleção natural;

-Simultaneidade e/ou

interdependência entre forças externas e internas ao organismo na causalidade da forma

-Pensamento populacional;

Fonte: adaptada de Sepulveda (2010)

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