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1 CONHECENDO A MAGIA

1.2 O CARTAZ DE CINEMA

Produzir um filme possui um custo muito alto, até mesmo os filmes mais baratos chegam a custar seus 10 milhões de dólares, porém, fora desse custo de produção, é preciso investir para que o filme fique conhecido e seja apreciado pelo público, algumas vezes, custando ainda mais que o próprio produto audiovisual.

“Deadpool” (2016, 20th Century Fox) foi um filme de super-herói com classificação indicativa para maiores de idade que custou 58 milhões de dólares, um valor que não corre muitos riscos para um filme que corta uma boa parcela do público de cinema, mas acredita-se que sua campanha publicitária tenha custado um valor aproximado do custo do próprio filme e os resultados foram os 781 milhões de dólares mundialmente arrecadados para a franquia que já possui sequências confirmadas (BOXOFFICEMOJO, 2016).

Todo esse trabalho de marketing existe para que a hype3 de um filme

seja forte começou há dezenas de anos com a mais simples e possivelmente peça mais forte de um filme: o cartaz cinematográfico.

Apesar de existirem diversas maneiras de promover um filme, seja nas mídias digitais, nos trailers, outdoors e patrocínios de eventos televisivos, o cartaz é a imagem que resume e transforma o filme em uma “marca”. Quintana afirma que “o cartaz de cinema (…) está para seu espectador no lugar da situação cinematográfica como antecedente; que representa o filme, para falar dele, da sua essência” (1995, p. 34) e que, consequentemente, se transformou em testemunhas das histórias dos filmes (1995, p. 31).

Nas primeiras sessões de cinema da história, com os irmãos Lumière em Paris, no ano de 1895, os primeiros cartazes já estavam presentes para

3 O significado formal e traduzido para hype é uma campanha publicitária de maneira intensa

e excessiva, de forma extravagante (OXFORD DICTIONARIES, 2016), porém o termo acabou ganhando um significado informal, como uma expressão para explicar algo que está “dando o que falar”, algo que está na moda e que todo mundo está discutindo (URBAN DICTIONARY, 2016)

promover os filmes (Figura 02). Porém, naquela época eles eram usados para promover a invenção do próprio cinema, com imagens da sala de cinema e seus espectadores assistindo uma projeção em uma grande tela, (QUINTANA, 1995, p. 20) isso acabou transformando o cartaz no “primeiro dispositivo voltado a deixar no espectador o desejo 'espontâneo' de frequentar as salas de exibição” (QUINTANA, 1995, p. 31).

Figura 02 – O primeiro cartaz de cinema.

Após isso, os cartazes nunca pararam de se transformar através da história, Abraham Moles (1974) disse que “a história de um país se traduz em seus cartazes” (p. 36), em que cada momento político, cotidiano, econômico e social passou pelo design de cartazes e que acabou, inclusive, se tornando um mecanismo social, “um modo de comunicação de massa, criado para servir de auxiliar a um sistema institucional qualquer" (MOLES, 1974, p. 46).

Se pensarmos de forma mais técnica, um cartaz promocional “se revela pela sua força de atração" (MOLES, 1974, p. 29), com uma mensagem nitidamente recortada e sempre unindo apelo a um produto. Explicando simplificadamente, o cartaz tem uma finalidade clara: “levar a mensagem ao cérebro do indivíduo” (MOLES, 1974, p. 46), é uma “unidade discursiva” (QUINTANA, 1995, p. 38) que transmite uma informação, "um instrumento

para convencer ou para seduzir" (MOLES, 1974, p. 53), “para exprimir algo do real para o mais real" (MOLES, 1974, p. 54).

Cabe aqui destacar que, apesar de um cartaz de cinema possuir uma ligação forte e direta com o filme ao qual ele está promovendo, nenhum cartaz transmite o contexto do filme, ele comunica por si só. Moles afirma que "o cartaz constrói reflexos condicionados, slogans e estereótipos que se imprimem na cultura individual e, por isso, adquirem valor autônomo, independente de seu assunto" (MOLES, 1974, p. 27).

Existem dieversas maneiras para que a transmissão de uma mensagem de um cartaz seja efetiva, Moles afirma que um cartaz é “uma imagem em geral colorida contendo normalmente um único tema e acompanhado de um texto condutor (…) portador de um único argumento" (1974, p. 44), para o autor, existem diferentes estímulos em um cartaz na transmissão de sua ideia: o forte, estético que deve “fisgar o leitor” e um fraco com um texto argumentativo como um comentário ou observação (1974, p. 44).

E também, o cartaz carrega uma forte gama de significações (QUINTANA, 1995, p. 38), "o jogo das cores e das formas, o jogo das palavras e das imagens, o contraste e a suavidade” (MOLES, 1974, p. 55) transmitem significados de maneiras diferentes para cada indivíduo e suas distintas culturas.

Além disso, se um filme possui etapas padrões para se caracterizar como tal, o cartaz não seria diferente. Cinematograficamente, os cartazes, ou informalmente conhecido como pôsteres, possuem elementos padrões que o caracterizam como um cartaz de cinema. Quintana (1995, p. 39) nomeia esses elementos de “lexias”, conceituado como “unidades de leitura de extensão variável que constituem intuitivamente um todo” (BARTHES apud QUINTANA, 1995, p. 39), uma maneira de recortar certos elementos que podem ser analisados separadamente.

Para o autor, existem três lexias a aparecer quase sempre num cartaz cinematográfico: título, ilustração e créditos. Ele acrescenta também uma quarta lexia que é usava de forma esporádica nos cartazes, a do chamariz (QUINTANA, 1995, p. 40).

O título do cartaz é o seu nome próprio, é o anúncio do conteúdo (QUINTANA, 1995, p. 41), é a lexia que anuncia o conteúdo do cartaz de forma de forma mais objetiva, e, quando distribuído internacionalmente, passa por adaptações e traduções por motivos comerciais, muitas vezes fugindo do seu sentido original.

Não deve ser visto como um problema, pois é uma “criação de mensagens equivalentes em códigos diferentes, (…) uma variação da mensagem” (QUINTANA, 1995, p. 43). Quintana (1995) também afirma que é no título que já presenciamos a primeira manifestação do designer gráfico4,

em que é atribuído “valores expressivos (cromáticos, formais, espaciais, metaplásticos etc.)” (QUINTANA, 1995, p. 44).

A imagem, vista como a segunda lexia chamada de “ilustração”, é o momento que representa e é “estruturada como uma narratividade” (QUINTANA, 1995, p. 59). É essa lexia que “expressa uma imagem referencial que representa, na maioria dos casos, o instante pregnante, ou seja, o instante que revela, segundo o ilustrador, a essência do acontecimento" (QUINTANA, 1995, p. 59-60), porém, não necessariamente é um instante exato do filme, mas uma ideia construída para representar um.

A ilustração também tendo um caráter narrativo, se interessa “não só no 'que', mas da mesma forma no 'como' dos acontecimentos" (QUINTANA, 1995, p. 58). A imagem é uma lexia que mais rapidamente é percebida pelo espectador. Moles afirma que “a imagem é percebida quase que imediatamente no cartaz. (…) A visão da imagem se faz totalmente clara em cerca de 1/5 de segundo” (MOLES, 1974, p 23).

Os créditos são a terceira lexia e muito valorizada quando codjuvante nos cartazes de cinema, pois é considerada apenas de forma comercial para promover nomes importantes presentes no filme. É a lexia que antecipa e faz “referência ao universo ficcional e à 'realidade' nomeando produtores,

4 "Abraham Moles concebe o designer como um 'engenheiro em comunicações', cujo projeto

de vida (...) seria o aumento da legibilidade do mundo" (QUINTANA, 1995, p. 52) e sua função "se funda numa intervenção renovadora dos parâmetros psicológicos e culturais da percepção, (…) reconhecendo a sua capacidade de gerar significados autônomos a respeito dos objetos representados e, consequentemente, fissuras na sua relação de conformidade" (QUINTANA, 1995, p. 53). Quintana conclui que "o design é o processo que leva à solução de problemas e que, a função do designer (...) é a de solucionar problemas com

distribuidores, atores, diretores, montadores, músicos, figurinistas, roteiristas, argumentistas, cenógrafos, fotógrafos, cartazistas, etc.." (QUINTANA, 1995, p. 72). É um trabalho que deve se adequar na composição do cartaz (QUINTAVA, 1995, p. 73), e não prevalecer aos outros elementos léxicos.

Todas essas lexias possuem uma ordem de importância em sua leitura. Segundo Quintana (1995, p. 76), o título deve estar nas extremidades do cartaz, com melhores resultados em sua área superior e os créditos, sem interferir as outras lexias, na extremidade inferior. Desta maneira, Quintana mostra uma ordem de leitura que é lógica com o produto audiovisual, pois

Institui-se, (…) não só uma leitura ordenada sequencialmente que corresponderia ao começo e fim do filme, mas também dois espaços diferenciados que remetem: à representação da ficção [no título] e a realidade enunciada [nos créditos] (QUINTANA, 1995, p. 76).

Enfim, uma última lexia não muito importante, de acordo com Quintana, é a do chamariz, onde aparece na estrutura do cartaz observações apenas para aumentar o nível de estímulo aos espectadores. Diretores de grande popularidade, indicações e prêmios que o filme recebeu, frases de efeito da crítica aceitando e elogiando o filme, instigam o público para “comprar” o filme através de outros aspectos que não sejam sua narrativa. (QUINTANA, 1995, p. 65).

Todas essas lexias aparecendo em todos os cartazes de uma franquia cinematográfica, podem mostrar, através de suas diferenças, mudanças da própria narrativa da história, pois em uma franquia, que possui padrões estéticos estabelecidos para possuir uma unidade singular em todos os seus filmes, qualquer mudança evidente em seus cartazes pode demonstrar algo que também mudou dentro da narrativa do filme. Dentro dos cartazes da franquia de Harry Potter poderemos observar se essas lexias sofrem mutações em seus cartazes de acordo com o passar dos filmes.

Portanto, as lexias propostas por Quintana (1995), auxiliam muito para demonstrar o papel comunicacional e persuasivo do cartaz, além de separar em três módulos que se relacionam muito com a composição que será estudada aqui, como a lexia do título e da ilustração.