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2 DA RESPONSABILIDADE CIVIL

4.3 ESTUDO DE CASO DA RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES

4.3.1 Caso Estados Unidos vs Fleet Factors Corp

De acordo com Evangelista Guimarães, a primeira vez que as instituições financeiras foram apontadas como responsáveis por impactos ambientais negativos causados por seus clientes foi no caso Estados Unidos vs. Fleet Factors Corp, onde a justiça norte-americana tendo por base a Comprehensive Environmental Response, Compensation and Liability Act – tradução livre, Lei de Resposta Ambiental, Compensação e Responsabilidade Ambiental – para condenar a instituição financeira a descontaminar o imóvel. Segundo o autor, essa decisão provocou imenso choque na comunidade bancária, tornando-se uma das referências na internalização da questão socioambiental do mundo financeiro109.

Sobre a lei que embasou a decisão de responsabilizar a instituição financiera, a Comprehensive Environmental Response, Compensation And Liability Act (CERCLA), também conhecida como superfund, esta foi criada em 1980, e estipula regras de prevensão aos danos ambientais, responsabilização dos agentes e, ainda, criou um fundo de reparação de danos ambientais para as áreas órfãs contaminadas por recursos perigosos110

109 JEUCKEN, 2004 apud GUIMARÃES, Glauco Leonardo Evangelista. GERENCIAMENTO DO

RISCO SOCIOAMBIENTAL NAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS BANCÁRIAS NO BRASIL. 2015. 128 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Desenvolvimento Sustentável, Universidade de Brasília - Unb, Brasília, 2015. Disponível em:

<http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/20059/1/2015_GlaucoLeonardoEvangelistaGuimar%C3%A 3es.pdf>. Acesso em: 02 nov. 2018. p. 27.

110 CASTRO, Clarice Rogério; REZENDE, Élcio Nacur. UMA ANÁLISE CRÍTICA SOBRE A

RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL NOS ESTADOS UNIDOS DA

AMÉRICA. Brasília: Revista do Mestrado em Direito, V. 9, nº 2, p. 1-20, Jul-Dez, 2015. Disponível em: <http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/uma_analise_critica_sobre_a_responsabilidade_civil _por_dano.pdf>. Acesso em: 02 nov. 2018.

Quanto às partes que podem ser responsabilizadas por possíveis ou efetivos danos, a Section 107 da CERCLA delimita 04 (quatro) categorias e todas elas podem ser responsabilizadas objetivamente pelos custos das ações praticadas em resposta aos danos ambientais causados, são elas:

1) O proprietário ou operador (owner or operator) de uma instalação (facility) ou embarcação (vessel) de onde proveio o despejo de substâncias perigosas; 2) A pessoa que, à época da ocorrência do despejo (release) da substância perigosa, era proprietária ou operava a instalação (facility);

3) O gerador do resíduo e o agenciador do transporte do resíduo até a disposição final ou tratamento;(10)

4) Aquele que aceita ou aceitou transportar a substância perigosa até uma instalação (facility) de disposição final ou tratamento, ou embarcação ou recipiente de incineração (incineration vessel), ou outro local escolhido por tal pessoa111.

O órgão responsável por fiscalizar a existência de produtos com potencial danoso ao meio ambiente é o EPA - Environmental Protection Agency, tradução livre Agência de Proteção Ambiental – por meio desta fiscalização, o órgão busca eliminar a ameaça e o efetivo lançamento de substâncias lesivas ao meio ambiente112.

Esse esclarecimento é necessário para melhor compreender a fundamentação do julgador no caso Estados Unidos vs. Fleet Factors Corp., sendo o julgado anexo ao presente trabalho113. Assim, passa-se a análise do referido julgado, portanto, os próximos parágrafos têm como base o corpo da decisão do caso Estados Unidos vs. Fleet Factors Corp. anexa ao presente trabalho.

Porém, extrai-se da narrativa fática que, em maio de 1982, Fleet Factors aceitou receber como garantia de um empréstimo, a participação nas instalações têxteis da empresa Swainsboro Print Works (SPW).

Em Maio de 1992, Fleet se utilizou de sua garantia para leiloar através da empresa Baldwin Industrial Liquidators (Baldwin) equipamentos do inventário da SPW, porém, os bens foram vendidos como estavam, no local que estavam, ficando a

111 SERIGNOLLI, Pedro Paulo Grizzo et al. Considerações sobre a responsabilidade civil na lei

do Superfund. Porto Alegre: Lex Magister. Disponível em:

<http://www.lex.com.br/doutrina_27165677_CONSIDERACOES_SOBRE_A_RESPONSABILIDADE_ CIVIL_NA_LEI_DO_SUPERFUND.aspx>. Acesso em: 15 nov. 2018.

112 SERIGNOLLI, Pedro Paulo Grizzo et al. Considerações sobre a responsabilidade civil na lei

do Superfund. Porto Alegre: Lex Magister. Disponível em:

<http://www.lex.com.br/doutrina_27165677_CONSIDERACOES_SOBRE_A_RESPONSABILIDADE_ CIVIL_NA_LEI_DO_SUPERFUND.aspx>. Acesso em: 15 nov. 2018.

113 UNITED STATES v. FLEET FACTOS CORP. Disponível em: <

remoção dos itens sob a responsabilidade dos compradores. Em 31 de agosto de 1982, Fleet Factors, supostamente, contratou Nix Riggers para remover o equipamento não vendido.

Ocorre que, em 20 de janeiro de 1984, a EPA inspecionou a instalação e encontrou 700 tambores de 55 galões contendo produtos tóxicos e quarenta e quatro caminhões carregados de material contendo amianto. A EPA estimou em aproximadamente U$ 400.000 o custo para limbar a área e evitar o dano ambiental. Porém, em 7 de julho de 1987 as instalações da SPW foram transferidas para o condado de Emanuel, Geórdia, em virtude de uma execução por ausência de pagamento dos impóstos pela SPW.

Então, o governo processou Horowitz e Newton principais executivos da SPW e a empresa Fleet Factors para recuperar os custos para limpeza de resíduos que apresentavam perigo ao meio ambiente. Restando a decisão acerca da responsabilidade da Fleet Factors em devolver os custos de limpeza das instalações da SPW.

Em decisão anterior a que se analisa, o tribunal distrital entendeu pela isenção estatutária da instituição financeira, entendimento este que a Corte revisora interpretou como muito permissivo.

De acordo com o julgador, a decisão anterior exigiria que um credor de empréstimo garantido fosse envolvido nas operações de uma instalação para incorrer em responsabilidade, porém, a interpetração do novo julgador é de que a lei explicitamente responsabiliza o credor caso este participe da administração de uma instalação.

Com isso, por mais que os termos “participando da gestão” e “operador” não sejam congruentes, o credor pode ser responsabilizado sem ser um operador, desde que participe da gestão financeira de uma instalação até certo ponto, indicando capacidade de influenciar no tratamento corporativo dos resíduos perigosos.

Para os juízes, não é necessário que o credor com empréstimo garantido realmente se envolva nas operações do dia a dia da instalação para ser responsável, também não é necessário que o credor participe nas decisões de gestão relacionadas com resíduos perigosos. Assim, concluiram que o credor será responsável se seu envolvimento com a administração da instalação for suficientemente amplo para que se entenda que poderia afetar as decisões de descarte de resíduos perigosos, se assim o desejar.

Nestes termos, em 23 de maio de 1990, foi proferida a primeira decisão que atribuiu a uma instituição financeira as consequências por um risco ambiental que seu cliente causara, chamando à responsabilidade mais um agente que, nos termos da decisão, possui influências na decisão de destinação dos resíduos, portanto, possuía influência no risco ambiental causado.

De acordo com Reis, os efeitos do caso Estados Unidos vs. Fleet Factors Corp foram devastadores para o mercado de crédito norte-americano. A subjetividade da responsabilidade da instituição financeira por danos ambientais causados por seus clientes, fez com que houvesse um congelamento da oferta de crédito no país114.

Dessa forma, no objetivo de mitigar a insegurança trazida pela decisão, em 1992, a EPA editou normas para a interpretação da responsabilidade das instituições financeiras trazida pela CERCLA. Após controvérsias acerca da legitimidade da EPA para a edição de tais normativas, em 1996, o Congresso Norte-Americano editou o Ato de Conservação de Ativos e Responsabilidade e Responsabilidade dos Agentes Financiadores, basicamente dando força de lei às regras administrativas editadas pela EPA115.

Desse modo, analisou-se um dos primeiros julgados que atribuiu a uma instituição financeira os danos ambientais causados por seu cliente, porém, o direito não é autônomo e inegavelmente se relaciona com outras partes da sociedade. Desta forma, observou-se que a decisão acabou por causar insegurança jurídica no cenário norte-americano, implicando, inclusive, na diminuição da oferta de crédito no país, o que demonstra a importância e abrangência da temática.

114REIS, Antônio Augusto. Financiamento e a Responsabilidade Civil Ambiental: uma análise

comparada da responsabilidade dos agentes financiadores à vista do modelo norte-americano e da jurisprudência do STJ. In: SAMPAIO, Rômulo S. R.; LEAL, Guilherme J. S.; REIS, Antônio

Augusto. Tópicos de Direito Ambiental: 30 anos da Política Nacional do Meio Ambiente. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 459-478. Disponível em: <http://www.rprsa.com.br/artigo-publicado- por-antonio-reis/>. Acesso em: 05 nov. 2018. p. 461.

115REIS, Antônio Augusto. Financiamento e a Responsabilidade Civil Ambiental: uma análise

comparada da responsabilidade dos agentes financiadores à vista do modelo norte-americano e da jurisprudência do STJ. In: SAMPAIO, Rômulo S. R.; LEAL, Guilherme J. S.; REIS, Antônio

Augusto. Tópicos de Direito Ambiental: 30 anos da Política Nacional do Meio Ambiente. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 459-478. Disponível em: <http://www.rprsa.com.br/artigo-publicado- por-antonio-reis/>. Acesso em: 05 nov. 2018. p. 462.