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CASO HOLANDÊS

No documento Manuel Alberto Malhado Ribeiro (páginas 29-34)

A Holanda, segundo FMI (2011), no ano de 2010 era a 16ª maior economia do mundo e o sétimo

país com o sistema financeiro mais interligado às restantes economias mundiais (FMI, 2010). No

ano de 2008, a Holanda tinha aproximadamente 1800 IF´s com licença de exercício. Com efeito,

conseguir mitigar os riscos de uma economia desta dimensão requer um sistema de supervisão

capaz (DFSA, 2011).

A estrutura da supervisão e regulação Holandesa sofreu vários ajustes ao longo dos anos.

Anteriormente a 1948, a supervisão do mercado financeiro (direcionada quase exclusivamente

para a banca) caraterizava-se pela sua informalidade, existiam como que acordos de cavalheiros

(Prast et al, 2004). Nesse ano foi, então, criado o, ainda existente, primeiro banco central

holandês, o De Nederlanche Bank (doravante DNB) com a responsabilidade de assegurar a

estabilidade macroeconómica, a estabilidade financeira das IF´s em particular (Prast et al, 2004;

G30, 2008) e a gestão da política monetária do país.

Ao DNB incumbia, assim, a faculdade de agir em casos de conflitos ou desequilíbrios no mercado

(supervisão prudencial) sendo que a base da atuação continuava a ser a consulta das práticas e

procedimentos em conjunto com os líderes das IF’s.

As décadas de 50 e 60 ficaram marcadas, por um lado, pela definição das regras de exercício e de

admissão ao mercado financeiro Holandês, sendo a idoneidade e integridade dos quadros de

gestão dos Bancos já uma preocupação expressa na Lei (Mooij e Prast, 2003); por outro lado, pela

definição de limites/requisitos para as IF’s (Mooij e Prast, 2003). O normativo definia níveis de

exigência de liquidez e de capital que os bancos tinham que cumprir para poder manter-se no

mercado.

Prast et al (2004) destacam outro fenómeno neste espaço temporal, a fusão de vários pequenos

bancos, como resultado das limitações impostas pela lei e pela necessidade que a economia

Holandesa tinha em ter IF´s com dimensão suficiente para competir no mercado internacional (foi

nesta altura que surgiram o Banco ABN e o AMRO).

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A par do DNB, a evolução que foi sendo incutida na regulação e supervisão levaram à criação de

mais duas agências de supervisão uma para o setor das Pensões e Seguros (Pensioen &

Verzekerings kamer - doravante PVK) e outra para o setor dos mercados mobiliários (Stichting

Toezieht Effeetenverkeer - doravante STE).

Nos anos 90, a Holanda detinha já um tradicional modelo setorial de supervisão (Prast et al, 2004;

G30, 2008; FMI, 2011, Dort, 2012; DFSA, 2011).

A crescente globalização, a concentração e internacionalização das IF’s (potenciada pela

liberalização do mercado de capitais na década de 80), a forte interligação entre os produtos dos

bancos, seguradores e valores mobiliários (Prast et al, 2004) foram os factores que destacaram a

Holanda como sendo um dos primeiros países na área da “Bancaassurance

4

”. Não obstante, a

entrada para a UE e para o mercado único, a importância da estabilidade financeira e proteção

dos clientes levaram a muitas alterações na supervisão e nas suas preocupações (Prast et al,

2004; Dort, 2012).

A principal e mais profunda alteração na estrutura de supervisão foi a mudança do modelo

institucional para o modelo Twin Peaks. De realçar que todo este processo ocorre num período de

prosperidade dos mercados financeiros.

Jeroen Kremers e Dirk Schoenmaker foram os responsáveis pela reforma do modelo de

supervisão que se iniciou em 2002 (Kremers e Schoenmaker, 2010).

Segundo os mesmos autores, dois princípios estiveram na base desta reforma: por um lado, que a

supervisão prudencial e comportamental assumem objetivos claramente diferentes e que por isso

deveriam ser tratados por agências separadas e concentradas apenas nos seus objetivos; por

outro lado, que em mercados financeiros concentrados (como é o caso do Holandês) a

estabilidade do sistema está estreitamente relacionada com a supervisão prudencial e com a

política monetária.

O grande fim a alcançar era claro, dotar a Holanda de um modelo de supervisão capaz de

acompanhar a evolução dos mercados financeiros, adaptando-o às suas características

intrínsecas, mercado muito concentrado e interligado entre si e com os mercados financeiros

internacionais. Assegurar a existência de um modelo de supervisão eficiente, eficaz e

concorrencial (Prast et al, 2004).

O relatório do G30 (2008) apoia este alinhamento justificando a alteração de modelo pela

crescente consolidação do mercado bancário holandês e ao surgimento abrupto de produtos

financeiros complexos e abrangentes aos três subsetores.

4 Comercialização de produtos de seguros pelos bancos. As IC´s para potenciar as suas receitas começaram a vender seguros vida e não vida associados aos seus produtos de depósitos e créditos.

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No ano de 2002, foi então alterado o Modelo institucional pelo Modelo Twin Peaks. A Holanda a

par da Austrália eram nesta altura as duas economias que utilizavam este modelo com pequenas

divergências nas suas aplicações.

O DNB manteve-se como banco central e responsável pela política monetária, contudo absorveu a

responsabilidade da supervisão prudencial (micro e macro). A supervisão comportamental ficou

entregue a uma nova entidade (Authority of Financial Markets − doravante AFM).

Como a figura 2 nos permite visualizar, o DNB aglutinou em si a responsabilidade de assegurar a

estabilidade de todas as IF’s em particular e de todo o sistema na sua globalidade (FMI, 2011;

Prast et al, 2004; Kremers e Schoenmaker, 2010; DFSA, 2011; G30, 2008). Conjuntamente,

manteve a responsabilidade da política monetária, mantendo o lugar como membro da

AEAB/SESF. Por seu lado, a AFM ficou responsável pela supervisão comportamental dos setores

bancário, segurador e valores mobiliários.

Ao concentrar a supervisão prudencial no Banco Central (juntamento com a política monetária), o

modelo Holandês diferencia-se do Australiano que centralizou o objetivo da estabilidade das IF’s e

do sistema numa entidade independente da política monetária. (DFSA, 2011; FMI, 2011).

Fonte: Prast, H., & van Lelyveld, I. (2004). New architectures in the regulation and supervision of financial markets and institutions: The Netherlands (No. 021). Netherlands Central Bank, Research Department. (p.16)

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Contudo, Kremers e Schoenmaker (2010) justificam esta integração com as mais-valias que

ambos acreditam ter, para um mercado concentrado como o holandês, a cooperação entre a

supervisão prudencial e política monetária.

Os mentores desta nova estrutura (Kremers e Schoenmaker, 2010) defendiam que este novo

modelo só seria válido caso os organismos fossem capazes de criar objetivos claros e não

conflituantes entre as agências de supervisão, podendo estes focar todas as suas energias no

cumprimento dos seus deveres. Por outro lado, destacam como fator crítico de sucesso a

constante interligação e cooperação entre a micro e macro supervisão prudencial e a política

monetária.

Relativamente aos críticos que questionam a validade do modelo e enunciam o perigo de captura

(Dort, 2012) que o país pode incorrer ao deter tanto poder numa só agência, contra-argumentam

que a política monetária é fundamentalmente decidida pelas entidades europeias, tendo o DNB

pouca intervenção direta, sendo quase o correspondente da AEAB na Holanda, reduzindo por isso

o poder e influência no sistema.

Prast et al (2004) compilou, através de um estudo sobre o Banco Mundial de De Luna Martinez e

Rose em 2003, os argumentos a favor e contra o Modelo Twin Peaks e escalonou a relevância de

cada um na economia Holandesa.

O artigo destaca, como se pode visualizar na tabela 1, que das vantagens apontadas ao Twin

Peaks as que assumem maior relevância na economia Holandesa são a facilidade de supervisão

dos conglomerados, a capacidade de acompanhar as questões que afetam todo o sistema na sua

globalidade e a rapidez de implementação do normativo regulamentar. Por outro lado, dá uma

relevância mediana às vantagens de economia de escala e de eficiência que este modelo permite.

A par das vantagens também as desvantagens foram classificadas por ordem de importância

quando ajustadas à realidade holandesa, tendo considerado que das sete desvantagens

elencadas nenhuma assumia uma relevância representativa.

A alteração da arquitetura de supervisão só ficou completa em 2007, ano em que despoletou a

crise do subprime, importante desafio para testar a eficácia e eficiência do novo modelo por

objetivos.

O mercado Holandês, enquanto sétima economia do mundo com as suas IF’s mais interligadas

com outras praças financeiras, acabou por sentir bastante as consequências da crise financeira de

2007.

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Tabela 1: Argumentos contra e a favor dos modelos de supervisão por objetivos

Fonte: Prast, H., & van Lelyveld, I. (2004). New architectures in the regulation and supervision of financial markets and institutions: The Netherlands (No. 021). Netherlands Central Bank, Research Department. (p.18)

Apesar do novo modelo de supervisão, a crise associada às suspeitas de corrupção levaram à

queda do DSB Bank, em 2009, e à integração do ABN AMRO num consórcio liderado pelo

Santander, RBS e FORTIS (Dort, 2012).

Estes fatos desde logo colocaram em discussão na praça política a validade do Twin Peaks, e

geraram várias queixas e até comissões de trabalho para avaliar o comportamento das agências

de supervisão (Dort, 2012). As comissões de inquérito no caso do ABN Amro concluíram que o

DNB não explorou todas a medidas possíveis para evitar a queda do banco, não lhe

reconhecendo medidas de apoio relevantes ao nível micro e macro prudencial (Dort, 2012;

Kremers e Schoenmaker, 2010; FMI, 2011).

Na sua nota técnica, o FMI (2011) afirma que a crise permitiu por a nu as áreas onde o Modelo

tinha que ser fortalecido para potenciar todas as vantagens e objetivos que foram propostos na

sua implementação. O mesmo relatório destaca que a atividade do DNB, maioritariamente

sancionatória, era limitada e que uma deveria ser mais direcionada para critérios de controlo mais

apertados de exercicio limitando as exposições a certos produtos e instrumentos financeiros teria

tornado a supervisão micro prudencial mais eficiente. Noutra perspetiva, determina ainda alguma

incapacidade do DNB de supervisionar os conglomerados financeiros.

No documento Manuel Alberto Malhado Ribeiro (páginas 29-34)

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