3 APLICABILIDADE DO MODELO TWIN PEAKS EM PORTUGAL
3.3 MODELO TWIN PEAKS EM PORTUGAL
A possibilidade de transformar o atual modelo setorial num Twin Peaks surgiu, em Portugal, em
2009, através de uma consulta pública desenvolvida pelo Ministério das Finanças, enquanto base
de discussão dos prós e contras da alteração proposta.
Pretendia-se, assim, criar um Modelo que melhor respondesse à diversificação do Sistema
Financeiro, diminuindo os custo de supervisão face ao Modelo Institucional ─ com a unificação de
toda a Supervisão Prudencial numa entidade e a Comportamental em outra ─ garantindo níveis
superiores de concorrência e transparência no Sistema Financeiro Português, em particular no
Setor Bancário. A adaptação do modelo Twin Peaks à realidade portuguesa implica uma alteração
profunda das funções atuais de cada agente regulador.
Efetivamente analisados os organogramas do BP, ISP e CMVM (ver anexos I, II e III), o número de
departamentos com as mesmas designações são consideráveis, duplicando-se as tarefas. Com a
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unificação dos agentes conforme proposto na figura 7, as necessidades de recursos humanos e
consequentemente os custos financeiros da supervisão reduzem substancialmente. Por outro
lado, as participações diretas e indiretas dos grandes grupos financeiros portugueses (ver anexos
IV, V, VI e VII) dificultam a supervisão setorial. Não obstante, potenciam a sobreposição de
regulação e problemas de arbitragem entre os agentes. A supervisão perde eficiência ficando mais
burocrática o que imputa custos financeiros superiores.
Figura 7: Modelo "Twin Peaks" - versão proposta para Portugal
Fonte: Consulta Pública (2009). Reforma da Supervisão Financeira em Portugal (p. 13). Disponível em
http://www.gpeari.min-financas.pt/arquivo-interno-de-ficheiros/Consulta-publica-reforma-da-supervisao-em-Portugal.pdf. Acedido em 20 de abril de 2013.
A nova estrutura de supervisão mantem o BP enquanto agente incumbido pela supervisão
prudencial de todas as instituições e mercados financeiros e enquanto “refinanciador de última
instância”.
Neste novo modelo de supervisão o BP continua também a ser o membro presente no SEBC e
mantendo por isso a responsabilidade da gestão da política monetária.
Por sua vez, a supervisão comportamental de todos os mercados financeiros seria entregue a um
novo agente de supervisão. O CNSF mantém neste novo modelo um papel semelhante ao atual
sendo a sua principal responsabilidade ser o elo de ligação e de cooperação entre os agentes
referidos.
Como se pode analisar na figura 7, o atual ISP e CMVM deixam de existir, passando a supervisão
comportamental e prudencial de um modelo setorial para um modelo por objetivos transversal a
todos os mercados financeiros e instituições.
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Esta alteração era esperada até ao último quarto de 2010 (Putnis, 2010) mas até à presente data
ainda não se concretizou. Efetivamente parece esquecida e sobreposta pelo estado de
“emergência financeira” em que o país se encontra.
A consulta pública confronta os pontos fortes da supervisão por objetivos versus a supervisão por
setores. A tabela seguinte resume os argumentos prós e contras, destacados quer na consulta
pública quer na restante literatura analisada, para o Modelo Institucional e o Modelo Twin Peaks.
Tabela 2: Prós e Contras do Modelo Setorial e Twin Peaks
Modelo Institucional
Pr
ó
s
A não separação da supervisão comportamental e prudencial
Adequação ao Modelo Europeu
Melhores desempenhos na crise financeira versus o Twin Peaks
C
o
n
tr
a
s
Gera Sobreposições
Não dá resposta adequada aos conglomerados financeiros
Compromete a eficácia da coordenação da supervisão
Gera conflitos de interesses no seio das autoridades de Supervisão
Menor capacidade de adequação à inovação financeira
Modelo Twin Peaks
Pr
ó
s
Permite Supervisão dos Conglomerados numa base financeira
Reduz as possibilidades de arbitragem regulatória
Reduz sobreposições de serviços (back office) / reduz custos de supervisão
Definição clara das responsabilidades de cada Supervisor
Menor possibilidade de lacunas ou sobreposição de supervisão
C
o
n
tr
a
s
Dificuldade na definição de objetivos claros e sua amplitude
Alinhamento entre os Agentes Reguladores e a política monetária
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Várias foram as manifestações contra a alteração do Modelo de Supervisão, com destaque para a
Associação Portuguesa de Seguros (2009) que emitiu um artigo onde tece várias críticas e
reticências ao Twin Peaks defendendo uma continuidade do presente Modelo, apesar de
reconhecer que precisa de reajustes urgentes. Existe mesmo quem defenda que a suspensão da
Reforma é “uma medida que parece acertada dada a situação económica atual do País e a
necessidade de manter estabilidade no sistema financeiro, para além de garantir o alinhamento da
regulação nacional com o modelo europeu.”
10A Associação Portuguesa de Seguros (2009) coloca em causa a eficácia da separação da
supervisão comportamental e prudencial, defendendo que são as faces de uma mesma moeda,
deixando até uma janela aberta para a análise de aplicação de um modelo de supervisão única.
Por outro lado, considera ainda que à data do artigo (2009), que a alteração proposta não se
adequa ao modelo em adoção na União Europeia. Este segundo argumento tem sido alvo de
diversas considerações e análises. Dort (2012) destaca este tema enunciando-o não como um
problema mas sim como uma curiosidade, defendendo que o modelo deve ser escolhido não por
tendências mas sim pela capacidade de os agentes conseguirem interligar a supervisão prudencial
com a comportamental, com a política monetária e com os agentes externos (entenda-se União
Europeia). Caprio et al (2011) aborda também esta questão, considerando que a maior desafio da
UE é a convergência das práticas e pressupostos regulamentares pela Europa e que a divergência
poderá trazer entraves na eficácia e alcance das práticas da regulação. Adjetiva ainda que o
adoção de um Modelo cada vez mais setorial por parte da UE poderá ser uma “oportunidade”
perdida de ajustamento a uma Europa cada vez com mais Modelos convergentes com o Twin
Peaks.
A Associação Portuguesa de Seguradores (2009) reforça a posição contra a proposta de alteração
defendendo que ainda não existem razões válidas e confirmadas para condenar o atual modelo
pelas causas da crise económica que o País atravessa, contrapondo que o desempenho quando
comparado com outros países com o Modelo Twin Peaks não foi manifestamente pior. Desde
logo, particulariza o caso da Holanda onde afirma que os efeitos da crise atingiram proporções
mais alarmantes. Mais adianta que não existem argumentos que sustentem a causa da crise na
incapacidade de interligação entre ISP, CMVM, BP e CNSF.
Efetivamente os fatores em defesa da manutenção do Modelo institucional prendem-se
essencialmente com fatores macroeconómicos e de reajustamento das prioridades num período
de assistência financeira ao país, não obstante na sua maioria protelam uma revisão do modelo.
Pelo contrário a literatura centra a defesa da supervisão por objetivos pela eficácia da mesma na
regulação dos conglomerados financeiros e poupança monetária com uma estrutura de supervisão
menos burocrática. No entanto, destacam também as dificuldades de alinhamento e definição dos
objetivos.
10 Disponível em http://economico.sapo.pt/noticias/novo-modelo-de-regulacao-adiado_108750.html, acedido em 19 de outubro, 2013
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Como aqui já foi dito, os Modelos Twin Peaks que foram e estão a ser implantados nos diversos
Estados-membros vão divergindo em aspetos importantes, nomeadamente quanto aos poderes
delegados no Banco Central enquanto responsável da política monetária e supervisão prudencial.
Efetivamente no caso dos dois Modelos analisados agregam estes dois componentes nas
competências do Banco Central. No entanto, no caso particular do Modelo do Reino Unido
contempla dois organismos subsidiários ao Banco Central para a gestão da supervisão prudencial.
O Modelo Português é claramente mais próximo do Holandês, com o BP a deter a
responsabilidade da gestão destes dois veículos de intervenção na economia. Não obstante,
vários autores (Mateus, 2009; Boyer, 2011; Moshirian, 2011) enunciam que modelos ─ como no
caso proposto para Portugal ─ onde a supervisão prudencial está centrada em uma só entidade
são potenciadores de fenómenos de captura dos supervisores pelos principais Bancos.
Neste contexto, o Banco Central assume uma posição de grande poder sendo por isso alvo dos
interesses dos supervisionados e de pressões políticas. Contudo este problema é também
elucidado por Mateus (2009) para o modelo setorial, particularizando os casos de fraude que
ocorreram em Portugal como exemplo da consequências da captura dos supervisores pelos
supervisionados e do conflito de interesses entre matérias de supervisão e diretrizes
governamentais.
Perante isto, conclui-se que o problema da captura não fica resolvido por si só com a alteração do
Modelo setorial para um por objetivos. Dort (2012) refere efetivamente que na Holanda os
inquéritos ao comportamento em particular do DNB, após a falência do DSB Bank, não colocam
em causa o Modelo de Supervisão mas apontam efetivamente melhorias de atuação do regulador,
nomeadamente quanto à eficiência das suas medidas e interligação com todos os organismos na
sua definição e aplicabilidade. O mesmo propósito é reforçado pelo FMI (2011) e Prast et al (2004)
quando referem, respetivamente, que o sucesso deste modelo está dependente da eficácia e
eficiência da comunicação e interligação dos agentes reguladores nacionais com os comunitários.
Numa outra perspetiva, e apesar de ser em épocas diferentes, Holanda e Reino Unido optaram
por um modelo de supervisão por objetivos por causas em parte divergentes. O Reino Unido opta
pela alteração como necessidade de reafirmar a confiança nos agentes entretanto perdidas com a
crise do subprime. A Holanda, pelo contrário, a confiança nos agentes e seus desempenhos eram
elevados à data da alteração. Não obstante existem motivos convergentes, nomeadamente o
desenvolvimento e crescente concentração dos mercados financeiros, onde os grandes grupos
detêm as principais empresas em todos os subsetores financeiros.
Estes são fatores que convergem com os elencados pela proposta de substituição do modelo de
regulação Português. Com efeito a consulta pública (2009) destaca o crescimento dos
conglomerados financeiros e justifica a necessidade de um modelo de supervisão que corrija os
erros que desacreditaram o modelo setorial existente.
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Como já foi referido e apesar da dimensão reduzida da economia Portuguesa quando comparada
com a Holandesa e a do Reino Unido (ver tabela 3 indicador do PIB), o mercado financeiro, após
25 Abril de 1974, acompanhou o crescimento, concentração e internacionalização verificado na
Europa (cinco grupos bancários têm mais de 75% de quota de mercado).
Tabela 3: Resumo comparativo dos três casos
Fatores Portugal Holanda
Reino
unido
C
o
n
ve
rg
e
n
te
s
Elevada concentração do mercado financeiro X X X
Captura dos supervisores X NA X
Necessidade de acreditar os agentes reguladores X X X
Insolvências no sistema financeiro X X X
D
ive
rg
e
n
te
s
Dimensão da Economia (PIB 2013 em milhares de
milhões)* 165,6 602,6 1 908,5
Modelo de Regulação (anterior ao Twin Peaks) Setorial Setorial Monista
Moeda em Circulação Euro Euro Libra
Veículo de ligação entre Supervisão Prudencial e
Comportamental CNSF NA NA
D
e
sa
fi
o
s
Definição clara dos objetivos e competências de cada agente
Interligação entre política monetária e supervisão prudencial e comportamental
Alinhamento dos Modelos Twin Peaks ao Modelo Europeu cada vez mais setorial
Amplitude e alterações de procedimentos e competências que a ABE vai introduzir
* Fonte: http://www.pordata.pt/Europa/Ambiente+de+Consulta/Tabela. Acedido em 22 de março de 2014.NA: Não Aplicável
O resgate financeiro a que Portugal se submeteu, em 2011, e a alteração do governo acabaram
por congelar a reforma do modelo. Com efeito, não são de prever alterações efetivas nos próximos
tempos até se ultrapassar a forte crise financeira que atravessa Portugal. Não obstante novos
desafios estão já a ser traçados e trabalhados com a intenção de criar a União Bancária e um
Mecanismo Único de Supervisão, com a transferência da supervisão dos Bancos da União
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Monetária diretamente para o BCE através da criação da ABE. Estas alterações vão certamente
modificar profundamente a Supervisão Bancária como hoje a conhecemos em Portugal, com
mudanças nos poderes do BP. De ressalvar a intenção da Comissão Europeia (2012, pag:12) de
fazer “o melhor aproveitamento do saber local e específico das autoridades nacionais de
supervisão”, o que perspetiva que apesar da passagem da Supervisão Bancária diretamente para
o BCE, o BP, no caso Português, continuará a desempenhar uma função com bastante relevo,
enquanto Banco Central, responsável pela política monetária e como veículo de aproximação da
realidade do Estado-membro à realidade Europeia.
Intrinsecamente, o caminho para a Harmonização Bancária nos Estados-membros segue neste
momento em passos acelerados, sempre com o fundamento de tornar o Sistema Financeiro
Europeu mais sólido, eficaz e resistente a novos terramotos financeiros. A Portugal caberá a
responsabilidade de ter flexibilidade e destreza para acompanhar as mudanças previstas, que
devolvam a confiança e transparência ao sistema financeiro. A convergência dos modelos de
supervisão dos Estados-membros com o Europeu é uma preocupação/desafio já abordado por
Dort (2012) e Kremers e Schoenmaker, (2010) enquanto fator crítico e de sucesso quer do Modelo
Holandês quer do Europeu.
O próprio Larosiere (2009) defende que o alcance e eficiência da supervisão será tanto melhor
quanto o grau de convergência entre os Modelos dos Estados-Membros e o Europeu, ressalvando
que os Modelos deveriam evoluir gradualmente para uma estrutura Twin Peaks.
Todas estas alterações têm arrefecido as reformas dos Modelos em curso, não só em Portugal,
sendo de esperar a sua estagnação até à definição final do Modelo de Supervisão Europeu, sua
amplitude de intervenção e veículos utilizados.
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CONCLUSÃO
A Literatura tem diversas assimetrias na definição de Regulação e Supervisão, com vários autores
a considerar que absorvem a amplitude das duas palavras apenas na Supervisão enquanto outros
fazem uma distinção clara de ambas, enquanto instrumentos complementares e necessários para
a eficácia e eficiência uma da outra. Com efeito, esta segunda linha de pensamento define
Regulação, como a capacidade de implementar as regras que vão delimitar/controlar/equilibrar a
atividade financeira, enquanto a Supervisão fica encarregue pela validação do cumprimento do
normativo emitido pela Regulação.
A Supervisão e Regulação financeira são, ainda, segmentadas em duas tipologias, supervisão
comportamental, que não é mais que o controlo da atividade das IC’s e IF’s diretamente com os
seus clientes, minimizando as assimetrias de informação e práticas anti concorrenciais. Por outro
lado a supervisão prudencial, tem como objetivo garantir o equilíbrio do sistema financeiro,
estabelecendo regras de acesso e de exercício, garantir a segurança dos fundos confiados às IF’s,
agindo proactivamente sobre os riscos potenciais.
Na definição de supervisão prudencial é normal fazer-se a distinção entre supervisão prudencial
micro e macro. A supervisão macro prudencial dá especial atenção ao mercado financeiro como
um todo, procurando detetar pontos de instabilidade, desequilíbrio que potenciem o risco
sistémico. Por sua vez a supervisão micro prudencial, acompanha de forma mais próxima cada IF
do sistema, assegurando a solvabilidade de cada uma individualmente como ponto de partida para
o equilíbrio do mercado como um todo.
A aplicação da supervisão financeira é estruturada em diversos modelos, que são implementados
em cada país. Não obstante os modelos de supervisão são agrupados em quatro modelos tipo, o
Modelo de Regulação unitária, o Funcional, o Sectorial e o por objetivos.
O modelo de regulação única, carateriza-se pela existência de apenas um agente regulador
incumbido da gestão da supervisão comportamental e prudencial de todo o mercado financeiro.
Este agente concentra em si um poder e responsabilidade muito grande. O Modelo funcional não
define um número de agentes supervisores, uma vez que a supervisão é feita por atividade e não
por subsetor ou objetivo, cabendo a cada agente a supervisão comportamental e prudencial de
todo o sistema financeiro onde se verifique essa atividade. Os custos de supervisão, pela
multiplicação dos agentes e gestão do risco sistémico são as principais ineficiências apontadas a
este modelo. O modelo setorial consiste na segmentação da supervisão por subsetor de atividade,
isto é, uma entidade responsável de toda a supervisão para o mercado bancário, outra para o dos
seguros e uma outra para os valores mobiliários. Por último, o modelo por objetivos (Twin Peaks),
que direciona a supervisão por objetivos e não por setores. Neste sentido, existe um agente
incumbido pela supervisão comportamental de todo o mercado financeiro e um outro pela
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prudencial, sendo que esta pode ainda ser segregada nas vertentes micro e macro. Este novo
modelo, defendido por Larosiere como o mais eficaz para mercados financeiros interligados e
complexos, permite um tratamento global de cada tema da supervisão minimizando-se os conflitos
de interesse, as sobreposições de supervisão ou falta dela.
O relatório de Larosiere (2009) demonstrando as vantagens deste novo modelo gerou uma onda
de processos de transformação dos Modelos em vigor para o Twin peaks, o próprio Modelo da UE
foi ajustado neste sentido. Contudo com o passar dos anos a UE tem reforçado uma posição
setorial do seu modelo de supervisão.
A Holanda adotou o modelo Twin Peaks em 2002, precisamente para acompanhar o
desenvolvimento do seu mercado financeiro. A crise de 2007, com a insolvência de uma IF, deixou
algumas dúvidas sobre o modelo, contudo a literatura, apesar de não ser unânime, considera que
o desempenho foi positivo quando comparado com outras economias semelhantes com modelos
de supervisão diferentes. O Reino Unido instaurou o modelo Twin Peaks em 2013, pela
necessidade de voltar a acreditar o mercado financeiro e os agentes reguladores, após as
consequências da crise financeira e manipulações de mercado agora conhecidas, que os agentes
então em vigor não conseguiram detetar.
Os modelos são na sua essência iguais tendo, no entanto, uma diferença importante. O Modelo
Holandês concentra no banco central toda a supervisão prudencial e a política monetária, por sua
vez o Modelo do Reino Unido, apesar de estar sob a gestão do Banco central foram criadas duas
subsidiárias encarregues da supervisão prudencial, segregando ligeiramente os poderes diretos
do banco central. Esta questão é importante pelo risco de captura que a literatura considera mais
elevado em modelos onde a política monetária e supervisão prudencial estão sob a hegide do
mesmo agente. Por outro lado, a mesma literatura conclui que o risco de captura se mantém nos
restantes modelos de supervisão existentes. Efetivamente, consideram que só uma boa definição
de objetivos e amplitude de atuação conseguem minimizar este risco independentemente do
modelo aplicado.
Portugal mantém um modelo setorial desde a década de 80, com um agente para cada subsetor
do mercado financeiro, o BP para o setor bancário, o ISP para o setor dos seguros e a CMVM
para o setor dos valores mobiliários. O modelo sofreu uma evolução com a criação de um agente,
o CNSF, enquanto veículo de comunicação e definição de estratégias entre os três agentes.
Acompanhando a tendência europeia, em 2009, surgiu através de uma consulta pública uma
proposta de alteração do modelo de regulação financeira setorial para uma perspetiva Twin Peaks.
Esta proposta, em virtude do agudizar da crise financeira e do pedido de resgate externo, nunca
chegou a avançar. O modelo Twin Peaks proposto era em tudo semelhante ao Holandês,
congregando no Banco Central (BP) a política monetária e a supervisão prudencial e contempla a
criação de um novo agente responsável pela supervisão comportamental. O desenho do novo
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modelo mantém a existência do CNSF enquanto facilitador de comunicação e entendimento entre
o BP e o novo agente o que implica o término da CMVM e do ISP.
A alteração nunca foi discutida a fundo e em detalhe, não obstante, algumas posições que foram
tornadas públicas, como a da Associação Portuguesa de Seguros que se manifestou claramente
contra a alteração. Sumariamente, considera que não existem provas sustentadas que justifiquem
que a crise financeira se deveu à falta de supervisão, que comparada com outras economias com
o modelo Twin Peaks os efeitos da crise em Portugal foram moderados e, por fim, por considerar
que a supervisão e regulação devem estar unidas e não em agentes separados, chegam mesmo a
equacionar o estudo de alteração do modelo setorial para um monista.
A proposta de trabalho consiste na equação da aplicabilidade do Modelo Twin Peaks em Portugal,
utilizando essencialmente como base de comparação a realidade de duas economias onde a o
modelo já esteja adotado, no caso a Holanda e o Reino Unido.
Em boa verdade são vários os fatores convergentes e que a par do que aconteceu na Holanda e
Reino Unido validam a alteração para um modelo Twin Peaks em Portugal. Desde logo o nível de
concentração e interligação do mercado financeiro português, que no pós Revolução do 25 Abril
1974, acompanhou as tendências dos mercados europeus. No mesmo enquadramento temos a
necessidade de acreditar o mercado financeiro e os agentes reguladores. As insolvências e as
suspeitas de fraude ligadas ao setor bancário, as alegadas pressões estatais divergentes das
orientações dos agentes reguladores (conflito de interesses) e o risco de captura que surge em
alguma literatura como motivos para a reforma da estrutura de supervisão.
Importa referir que, a par do que a literatura defende para os casos Holandês e do Reino Unido, o
problema da captura não fica resolvido apenas com a alteração de modelo sendo necessário uma
definição clara de objetivos, deveres e responsabilidades e uma contínua colaboração e
comunicação entre os agentes. O desenho Twin Peaks Português apresenta um fator
diferenciador relativamente às outras duas economias, mantendo em vigor o CNSF, com a
principal responsabilidade de fortalecer a comunicação e complementar a atuação do BP e o
agente responsável pela supervisão comportamental. O modelo da Holanda e Reino Unido não
No documento
Manuel Alberto Malhado Ribeiro
(páginas 50-65)