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3 ANÁLISE DA TÉCNICA DE JULGAMENTO MONOCRÁTICO DO ART.

3.3 Casos especiais

Cumpre apreciar, ainda que em seus delineamentos gerais, certas

hipóteses nas quais se revela amplamente discutível o proferimento de julgamento

monocrático. Nos casos especificamente tratados nas linhas seguintes, tem-se por

desaconselhável o manejo da técnica estabelecida no art. 557, pelas razões

demonstradas.

3.3.1 Julgamento de embargos infringentes

Conforme preceitua o art. 530 do CPC, caberão embargos infringentes

“quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a

sentença de mérito, ou houver julgado procedente ação rescisória”. (BRASIL, 1995).

Segundo o art. 531, o relator do acórdão embargado apreciará a

admissibilidade dos embargos infringentes. Doutrinariamente, Carvalho (2008, p.

246-247) pontua que a este relator não é possível realizar exame do mérito recursal,

posto encerrado o seu ofício jurisdicional no julgamento da apelação ou ação

rescisória, na forma do art. 463 do CPC.

Após o exame de admissibilidade, o recurso deve ser distribuído a novo

relator, na forma do art. 534 do CPC.

Discussão mais fecunda é aquela sobre se esse novo relator possui

poderes para julgar monocraticamente a admissibilidade e o mérito dos embargos

infringentes.

Segundo Carvalho (2008, p. 249-250), é perfeitamente possível o

julgamento de admissibilidade do recurso pelo novo relator, posto dizer respeito a

matéria de ordem pública, não sujeita a preclusão. Acrescenta que, “Na verdade, os

embargos infringentes poderão passar por três juízos de admissibilidade: relator do

acórdão embargado, relator dos embargos infringentes ou pelo órgão colegiado”.

Já no tocante à possibilidade de julgamento do mérito dos embargos

infringentes pelo relator, não é pacífica a doutrina.

Carvalho (2008, p. 254-255) entende que o escopo dos embargos

infringentes é o juízo de retratação do colegiado, não fazendo sentido que seja

promovido por um julgador singular. Outrossim, em havendo voto vencido no

acórdão recorrido, não haveria como reputar os embargos infringentes

“manifestamente improcedentes” (CPC, art. 557, caput).

Em mesmo sentido, Almeida (2003, p. 405, grifos do autor), pontua que

Os embargos infringentes buscam a prevalência do voto vencido, de sorte que a lei, nos casos em que prevê o seu cabimento – e a recente Lei 10.352/2001 tornou esse cabimento especialmente restrito –, estabeleceu a possibilidade de ser revista, por um outro e mais amplo órgão colegiado do mesmo tribunal, a decisão que, por maioria, o colegiado que inicialmente conheceu do recurso adotou. A previsão de jurisprudência dominante ou mesmo de súmula – que não tem força vinculante – em sentido contrário à manifestação do voto vencido não autorizará o julgamento pelo relator dos embargos infringentes porque, certamente, se o voto (ou votos) minoritário(s) não aplicou(aram) essa jurisprudência, é porque entendeu(ram) que no caso concreto ela não se aplicaria. Nessa hipótese, cabível a lição, já mencionada, da eminente Teresa Arruda Alvim Wambier: a de haver, pelo menos, dúvida, e “o relator não deverá agir individualmente, devendo, então, sempre remeter o processo a julgamento colegiado”.

Mendonça Júnior (2009, p. 177), por seu turno, sustenta que

A decisão monocrática do relator é incompatível com a situação e a finalidade dos embargos infringentes. Na mesma instância, a ocorrência de voto divergente gera a prerrogativa do jurisdicionado não apenas de provocar um reexame qualquer, por mero órgão singular, mas sim obter reapreciação do julgado por um colegiado mais representativo do tribunal e de que façam parte os julgadores anterior (órgão especial, grupo de câmaras, seção, turma acrescida etc.) ou até a totalidade deles (tribunal pleno).

Parece sustentar entendimento diverso Moreira (2009, p. 544), para

quem:

Nessa ordem de ideias, continuará a incumbir ao relator estudar os autos e depois devolvê-los à secretaria com o relatório (art. 549 e seu parágrafo único), a menos que ele próprio negue seguimento aos embargos, nos termos do art. 557, caput, ou lhes dê provimento, com base no art. 557, §1º- A.

Verifica-se, pois a existência de doutrina que, embora autorizada, revela-

se amplamente minoritária, sustentando a possibilidade de apreciação monocrática

do recurso de embargos infringentes, o que, pelas razões expostas no presente

tópico, não coaduna com a natureza própria dessa espécie recursal, mediante a qual

se busca justamente uma manifestação colegiada, a mais ampla possível, acerca da

matéria posta em julgamento (em relação à qual se verificou uma inicial divergência

no âmbito da corte competente para julgamento).

Sendo assim, tem-se como indevido o julgamento monocrático dos

embargos infringentes pelo seu relator, especialmente quando não enfrentada

fundamentadamente a questão relativa ao cabimento da aplicação da técnica

monocrática a tal espécie recursal.

3.3.2 Julgamento de embargos de declaração

Outro ponto de questionamento diz respeito à possibilidade de julgamento

monocrático de embargos de declaração interpostos contra decisão colegiada.

Lima (2005) conclui pela impossibilidade de julgamento monocrático de

embargos de declaração tomados contra acórdão. Primeiramente, argumenta que a

finalidade peculiar dos embargos de declaração é de integração e complementação

da decisão embargada, as quais devem ser procedidas por quem proferiu a decisão.

Assim, em caso de decisão colegiada (acórdão), o julgamento dos declaratórios

deve ser feito pelo órgão colegiado prolator da decisão embargada. A propósito:

O mais importante impedimento, ao julgamento monocrático dos embargos, está, em nosso entender, no seguinte aspecto: sendo os embargos de declaração recurso com finalidade peculiar, que é a integração, a complementação da decisão embargada, somente que a proferiu tem condições de validamente julgá-los. Vai de encontro às noções mais elementares de lógica e coerência entender que um acórdão proferido de acordo com a vontade de órgão colegiado possa ser complementado (ou não) de acordo com o posicionamento individual de apenas um dos participantes desse órgão (LIMA, 2005, p. 474).

Outro aspecto a impedir o julgamento monocrático de embargos

declaratórios, segundo a mesma doutrinadora, seria a impossibilidade de

jurisprudência dominante sobre matérias decididas em sede de embargos de

declaração, haja vista que cada um desses recursos depara-se com aspectos

particulares e únicos do caso concreto:

Outro impedimento para o julgamento monocrático dos embargos de declaração resulta de restrição imposta na própria redação do art. 557. Vimos que o julgamento do mérito do recurso pelo relator está sempre vinculado a anteriores posicionamentos de órgãos colegiados a respeito da matéria. Ora, a natureza peculiar dos embargos de declaração impede, a toda evidência, que sejam julgados com base em outros precedentes de órgãos colegiados. Os aspectos fáticos e jurídicos de cada caso concreto tornam cada decisão única e, portanto, os embargos destinados a integrá-la também têm essa feição, impedindo que o resultando do julgamento de um possa validamente interferir na apreciação (monocrática ou não) de outro (LIMA, 2005, p. 475).

Por fim, observa que a interposição de embargos de declaração nos

tribunais, via de regra, tem por objetivo viabilizar a interposição de recursos

extraordinários, de forma que o julgamento monocrático dos declaratórios terminará

por incentivar a interposição do agravo interno, inviabilizando a finalidade de

celeridade preconizada na criação do art. 557:

Em segunda instância, via de regra, a interposição de embargos de declaração tem por objetivo “abrir caminho” para a interposição de recursos de estrito direito. Portanto, o julgamento monocrático desfavorável somente fará com que a parte se utilize de outros meios, para o acesso às instâncias superiores, entre os quais, inclusiva, a interposição do agravo previsto no §1º do art. 557 (LIMA, 2005, p. 476).

Almeida (2003, p. 401-402) acrescenta que a impossibilidade de

julgamento monocrático dos embargos de declaração decorre (1) da previsão legal

de que tais recursos devem ser apresentados em mesa e (2) do fato de que, acaso

negado seguimento aos embargos declaratórios pelo relator, se uma parte quiser

interpor recurso especial ou extraordinário, terá de interpor agravo interno, cujo

julgamento pode ocorrer apenas quando já esgotado o prazo para interposição de

recursos extraordinários – tolhendo-se, portanto, o direito de acesso às cortes

superiores.

Já Cambi (2003, p. 19) argumenta ser possível o julgamento monocrático

dos embargos declaratórios, já que, estando elencados no rol de recursos do CPC,

estão abrangidos pela expressão “recurso” contida no art. 557 do código:

O argumento utilizado no sentido de que, em se tratando de embargos de declaração, estes devem ser apresentados em mesa para julgamento, de forma a inviabilizar o julgamento pelo relator, não convence, quer porque os embargos de declaração estão elencados entre os recursos previstos no art. 496, inciso IV, do CPC, quer porque, também, a exemplo dos recursos de apelação e dos embargos infringentes, nesses casos, cabe ao revisor “pedir dia para julgamento” (art. 551, §3º, do CPC), e nem por isso tais recursos são excluídos pela previsão legal (o art. 557 diz que “O relator negará seguimento a recurso (...)”).

Este derradeiro posicionamento não deve prevalecer diante da robustez

da fundamentação anteriormente apresentada, em sentido contrário.

3.3.3 Julgamento de agravo interno

No tocante ao agravo interno, o principal argumento em desfavor de seu

julgamento monocrático é o de que se presta a assegurar a revisão colegiada do

julgamento monocrático (como forma mesma de sua legitimação, conforme visto no

2.4.3), não podendo essa revisão ser substituída por atuação isolada do relator. A

propósito, Cambi (2003, p. 19):

No que se refere ao agravo interno, não há como obstar a apreciação do recurso pelo órgão colegiado, tendo em conta que a decisão do relator, sobretudo quando proferido contrariamente à jurisprudência dominante da Câmara, impõe que o recurso manifestado seja apreciado pela Câmara.

Demonstrou-se no primeiro capítulo (item 2.4.3) que o cabimento de

agravo interno contra a decisão monocrática revela-se necessário à própria

constitucionalidade da técnica, assegurando-se o “juiz natural” do julgamento

recursal, de cunho colegiado. Nessa esteira, admitir-se o julgamento monocrático do

agravo esvaziaria a justificativa demonstrada para a essa constitucionalidade.

Para Moreira (2009, p. 684):

Do elenco dos recurso em que incide a norma, por outro lado, fica intuitivamente excluído o agravo de que cuida o § 1º. Com efeito, não se concebe que o relator possa trancar ao inconformado com sua decisão a via de acesso ao colegiado ad quem. De resto, é expressiva a dicção da segunda parte do parágrafo primeiro: “o relator apresentará o processo em mesa”.

Na mesma linha, questionando sobre se é possível o julgamento

monocrático do agravo interno, à luz do art. 557 do CPC, conclui Guimarães (2013,

p. 180):

A resposta é negativa, porque o objetivo dos agravos de cinco dias é a obtenção de decisão colegiada, é a manifestação do direito constitucional do jurisdicionado em ter uma decisão, por acórdão, de sua lide no Tribunal [...].

O fato é que, a rigor, por fundamento nenhum poderia o relator deixar de submeter um agravo interno ou regimental à apreciação do órgão colegiado. Se o contrário fosse admissível, se fosse do agrado de um julgador, ele poderia se negar ad aeternum a submeter um recurso ao crivo do órgão colegiado. Nesse sentido, se posiciona o Superior Tribunal de Justiça.

Não se faz possível, portanto, interditar ao recorrente a possibilidade de

submeter ao colegiado veiculada no agravo.