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CAPÍTULO II – CONSELHO ESCOLAR: A DEMOCRATIZAÇÃO DA GESTÃO

2.2 Ceará Mirim: um olhar sobre sua história e geografia

O município de Ceará-Mirim/RN, localiza-se a 30 km da zona metropolitana de Natal/RN. No último censo de 2010, a população da cidade é composta por 68.141

21A esse respeito Queiroz (2018) afirma que: [...] a terra e outras formas de riqueza, como poder

econômico, também constituíam poder político. Os detentores desses poderes, comumente, estabeleciam as regras dos jogos socioeconômicos e político. Instaurados no poder tudo faziam para afastar a maioria da população do patamar político e econômico privilegiado. Contraditoriamente, utilizavam-se do proletariado, do ponto de vista político e ideologicamente, para se manter. Uma parcela de trabalhadores não consciente de sua exploração, se deixava envolver ou era pressionada, por força da própria sobrevivência, a aceitar o jogo dos patrões e de seus aliados na política e na economia (QUEIROZ, 2018, p. 36).

habitantes (IBGE, 2010). De acordo com Cunha (2017): “O município foi criado, oficialmente, em 3 de setembro de 1759 e instalado em 3 de maio de 1760, na antiga aldeia de Guajiru, tendo por sede a vila de Extremoz” (CUNHA, 2017, p. 62). Constatamos nos estudos realizados que a expansão da cidade está estritamente relacionada as condições naturais propícias ao cultivo da cana de açúcar, a qual se intensificou a partir de 185122, cultura que se tornou central após a derrocada da pecuária na Região Nordeste, sobretudo aquela criação de gado que foi responsável por povoar o semiárido nordestino e viabilizar a convivência do sertanejo com a seca, e que em dado momento contribuiu, inclusive, para a consolidação da indústria do açúcar.

O ciclo de desenvolvimento da indústria do açúcar no Nordeste do século XIX foi responsável por organizar a estrutura da administração pública do município e influenciou fortemente a implantação dos primeiros engenhos. Na prática o poder econômico-político em Ceará-Mirim centrava-se nas mãos dos senhores de engenho, pelo fato desses senhores serem os detentores das terras cultiváveis e dos escravos, situação que permanece dessa forma até meados do decênio de 1910,momento em que ocorre a crise que provocou a diminuição dos engenhos e sua substituição pelo conglomerado da usina de açúcar que a partir desse ponto torna-se a principal atividade da zona canavieira, situação essa que perdurou até a década de 1970 quando novamente ocorreu alteração na configuração da relação capital-trabalho, pois o caráter dessa relação intensifica-se diante da flexibilização das formas de concentração do capital e das condições tecnológicas, nesse estágio passa-se a identificar a presença de:

Grupos empresariais estranhos à vida municipal, as relações de trabalho começaram a se estruturar em bases nitidamente capitalistas, caracterizando toda a série de mudanças advindas com a usina. Os trabalhadores já não podiam entrar e sair dos locais de trabalho a sua vontade. Havia porteiro à entrada das Usinas exigindo identificação de quem se aproximasse. As relações entre o proprietário dos meios de produção – as usinas – e os detentores da força de trabalho – os proletários – e aqueles exigentes entre os trabalhadores dos engenhos e seus proprietários eram bem diversas, por serem estas mais diretas (CASTRO, 1991, p. 35).

22 Esse acontecimento trouxe ao Vale um crescente desenvolvimento em inúmeros engenhos de açúcar

Essa reconfiguração do processo de trabalho referida por Castro (1991) repercute no campo dos indicadores educacionais do Município, principalmente, dada as condições precárias de acesso a rede escolar, e, portanto, a consumação da escolarização dos trabalhadores – desempregados, subempregados e assalariados – e de suas famílias.

Para constatar essa situação referida basta observarmos o registro escrito feito por Queiroz (2018), pois a partir dessa leitura é possível entender o lugar destinado a classe trabalhadora nessa conjuntura de organização econômica e laboral do município de Ceará-Mirim, na qual o trabalhador é duplamente explorado e enganado, seja por meio das relações desiguais e injustas do mercado de trabalho, como também por meio da negação ao direito a uma educação pública de qualidade. Sobre esse cenário Maria Aparecida Queiroz assevera,

Os pequenos proprietários sequer tinham direito a produzir livremente sua subsistência, obrigando-se a vender a força de trabalho aos grandes proprietários. Essa condição demandava o trabalho de toda a família, sobrecarregando, de modo particular, a mulher e sacrificando os filhos menores de idade. Estes estudavam em escolas cujo o currículo formal não abordava as características fundamentais do meio rural, quais sejam: a estrutura fundiária, as formas de exploração da terra; a exploração do trabalhador face à expansão do capital no campo; os ciclos agrícolas; a migração entre o campo e a cidade. Não se discutia também sobre as consequências inevitáveis da exploração capitalista (QUEIROZ, 2018, p. 30).

A constatação referida antes pela autora, recai sobre a desigualdade de acesso e permanência das crianças e adultos à escolarização pautada “[...] no vazio existente entre a escola e a classe social à qual ela se destinava, que eram pobres” (QUEIROZ, 2018, p. 31). Essa estrutura econômico-social desigual e insensível à possiblidade de ascensão dos mais pobres é uma condição perceptível por meio do contato que temos com esses indivíduos que vivenciaram na prática a dificuldade dos pais, que não tendo condições financeiras de manter todos os filhos estudando ao mesmo tempo foram obrigados a determinar o período de permanência de cada criança na escola (QUEIROZ, 2018).

A história dessas crianças e jovens pode ser dimensionada através da análise dos relatos que expressam as dificuldades de manter-se estudando por motivos que

vão desde a necessidade de trabalhar na tenra idade até a distância elevada a ser percorrida entre a casa e a escola, dentre muitos outros aspectos de mesma ordem. Pelo desvelamento de fatos como os referidos anteriormente que percebemos o quanto é real a exploração do trabalho alheio de forma predatória e a instauração- naturalização da exacerbada desigualdade social, condições afeitas à sociedade burguesa, em especial, em regiões que tem características econômicas e geopolítica semelhantes a essas da cidade de Ceará-Mirim, uma Cidade localizada no Estado do Rio Grande do Norte e na Região Nordeste do Brasil, uma Região e um Estado que apresentam baixos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) e estão situados num País considerado ainda em vias de desenvolvimento.

Assim, quando o sujeito político é confrontado com uma situação injusta como a verificada no município de Ceará-Mirim, em que a exploração do trabalho e a desigualdade social passam a ser ideologicamente naturalizadas, torna-se premente que esse indivíduo reflita dialeticamente a superação da visão abstrata e reducionista, e faça isto por meio do movimento crítico do pensamento e do estudo científico das relações de existência humana que edificam a sociedade burguesa, para que dessa forma não restrinja as análises sócio-políticas a descrição do fenômeno visível e ao produto identificado de forma aparente, mas, sobretudo, considere as relações econômicas e sociais construídas na realidade dialético-histórica da sociedade capitalista.

Barbosa Júnior (2016, p. 30) ensina que: “reflexão implica necessariamente no movimento em que a consciência provocada, ou seja, convidada pelas coisas do mundo toma a si mesma como um a-se-pensar. Portanto, refletir pode ser compreendido como uma atitude de pensar o pensamento” [...]. Temos que trabalhar no sentido de criar as condições para construir mudanças reais e possíveis, dentro das possibilidades concretas presentes e oferecidas pela constituição, material e espiritual, do mundo e pela experiência vivenciada na prática cotidiana. Pois, a consciência de agir por si e de ter a capacidade de refletir nos leva a descobrir que somos capazes de reconhecer a existência do vazio entre oprimidos e opressores.

A superação desse vazio e a supremacia dos oprimidos deve dar-se, também, na escola pública, pois a partir dessa condição essa instituição passa a ser um lugar no qual se afirma a importância da ação educativa popular, atividade que deve levar em conta as dimensões histórica, social e humana no momento de consubstanciar os processos de formação político-sócio-cultural e de ensino-aprendizagem do

conhecimento científico, para que, dessa forma, uma outra parcela dos também oprimidos – professores, gestores, pais e comunidade – não contribuam inconscientemente para legitimar os dispositivos ideológicos excludentes, fundados, exclusivamente, na meritocracia do sistema de classificação e segregação capitalista.

Ao concluir essa caracterização histórica da cidade de Ceará-Mirim é possível perceber que o Município apresenta no seu genótipo traços econômicos, sociais, políticos e culturais que denotam uma condição na qual no nascedouro assume uma matriz patriarcal e colonizadora-exploratória, cujas características fundantes é a exclusão das classes populares do acesso à cultura, aos bens materiais e ao poder político decisório.

Contudo, na atualidade, a rede pública municipal de educação de Ceará-Mirim ensaia uma situação política contraditória implementadas por meio da criação dos colegiados escolares democráticos, Conselhos Escolares nos quais existe a representação dos diferentes segmentos presentes no âmbito escolar e potencialidade dessas categorias deliberarem os destinos da escola, movimento que não se inicia de forma espontânea, mas, em função das determinações legais nacionais que instituíram a exigência de democratização da gestão escolar pública.

Aliado a esse processo compulsório de democratização da gestão ocorre a ampliação do direito de acesso à educação pública e gratuita pela classe trabalhadora. Nesse aspecto, é importante ressaltar que tanto o primeiro movimento citado como esse último ocorrem, principalmente, pelo esforço coletivo dos movimentos sociais (nacionais, estaduais e municiais) vinculados ao campo da educação, que buscam criar e consolidar a cultura de inclusão educacional dos mais pobres e ampliar a participação e o monitoramento social por meio da atuação ativa das comunidades endógena e exógena a escola pública.

Porquanto, nesse próximo item, apresentaremos um quadro detalhado dos indicadores educacionais que caracterizam esse processo democratização da participação e ampliação do acesso à escola pública municipal por meio dos dados educacionais do município Ceará-Mirim.

2.3 Caracterizando a Estrutura de Rede Municipal de Educação de Ceará-