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O cenário liberalizante pós-1988

CAPÍTULO I – O FUTEBOL: O INÍCIO DO JOGO NO BRASIL

CAPÍTULO 2 – A RELAÇÃO ENTRE ESTADO E “SOCIEDADE ESPORTIVA”

2.2 O cenário liberalizante pós-1988

A Carta Magna de 1988 consagra a autonomia de organização e funcionamento das entidades esportivas, desencadeando o processo de liberalização do setor esportivo. Caberia à legislação dela decorrente regulamentar o modo de como deve usufruir da autonomia de organização e funcionamento do referido setor.

O Governo Fernando Collor (1990), primeiro governo civil brasileiro eleito por voto direto após duas décadas de ditadura brasileira, foi também o primeiro Governo escolhido dentro das regras da Constituição Federal (CF) de 1988, a extinguir a Secretaria ligada ao Ministério da Educação, criando a Secretaria de Desportos da Presidência da República. À época, os agentes do poder público começavam a debater sobre qual o papel estatal frente aos novos desafios de esporte e lazer. Por

outro lado, as entidades esportivas reivindicavam autonomia frente às intervenções do Estado e às mudanças na legislação esportiva.

Em julho de 1993, é promulgada a Lei Zico9 e, dentre os vários pontos de tal legislação, destacavam-se a necessidade de redefinição de papéis dos diversos segmentos da sociedade e do Estado em relação ao esporte e ao futebol, e a mudança jurídica desportiva institucional. Além dos itens em destaque, a ênfase dada na referida Lei foram: o esporte de alto rendimento, a autonomia das entidades esportivas e, principalmente, as questões pertinentes ao futebol, encerrando a estrutura tutelar do Estado sobre o esporte e trazendo a autonomia e a pluralidade como elementos de mudança.

Em suma, a Lei Zico considerava o direito de cidadania à prática desportiva ao consagrar o desporto participação como manifestação legítima apenas no campo conceitual.

Nesse sentido, Linhales (1996, p. 207) adverte: “a conquista dos direitos de livre organização não é garantia de torná-la realidade para todos, na ausência de definição de meios capazes de garantir a sua efetivação”. Apesar de a CF ter validado a autonomia de organização e funcionamento, a Lei Zico não rompe a ordem corporativa, transformando as confederações em entidades federais de administração do desporto. Conforme afirma Manhães (2002),

Quanto à forma de organização desportiva, a Lei Zico traz como novidade tão-somente a flexibilização da ordem desportiva, criando sistemas desportivos federais e nacionais concorrentes, mas únicos e obrigatórios nos âmbitos de suas competências, agora com nomenclatura de órgão público de administração às quais obrigatoriamente as entidades de prática (clubes ou associações desportivas) deveriam estar filiadas para participar de competições nacionais (MANHÃES, 2002, p. 113).

9 Lei nº. 8.672/1993. Institui normas gerais sobre desportos e dá outras providências. Revogada pela

Com o processo de autonomização e modernização conservadora em curso, dá-se então o fortalecimento da iniciativa privada no setor; o esporte brasileiro conquistou a sua liberdade de mercado na medida em que os interesses dos cidadãos não se materializaram na lei. As alterações pautavam-se na autonomia das entidades esportivas, abrindo a possibilidade dos clubes esportivos se tronarem empresas, na livre iniciativa e pouca democratização de acesso ao esporte. O esporte de rendimento tinha maior aporte de recursos destinados ao setor e passava a incorporar a lógica do mercado: a exportação de jogadores e os patrocínios dos grandes clubes de futebol. A iniciativa privada percebe, então, as vantagens de incorporar o esporte às suas estratégias de marketing.

No Governo Itamar Franco, com início em 1992, o esporte voltou a ser vinculado ao Ministério da Educação, com a Secretaria de Desportos. Em 1995, já no Governo Fernando Henrique Cardoso, criou-se o Instituto Nacional do Desenvolvimento do Desporto (INDESP)10, nomeando o ex-jogador de futebol Edson

Arantes do Nascimento (o Pelé) (1995-1998) como Ministro Extraordinário dos Esportes. Não havia um Ministério próprio para tal pasta, mas ainda cabia à Secretaria de Desportos vinculada ao Ministério da Educação (MEC), prestar apoio técnico e administrativo.

Após a implantação da Lei Zico, ocorre uma importante mudança na legislação brasileira. Também em consonância com a CF de 1988, surge a Lei conhecida como Lei Pelé11, aprovada em 25 de março de 1998, de iniciativa do Ministro Edson Arantes do Nascimento. A Lei Pelé, que regula o presente Sistema Brasileiro do Desporto, foi sancionada com a finalidade de aperfeiçoar a Lei Zico. Dentre as suas principais conseqüências, foram significativas as mudanças para com o futebol, principalmente no tangente ao fim do passe. No entanto, a liberação do passe ocorreu sem regulamentar ou assegurar os direitos dos jogadores. Tornava-se também facultativa a filiação das entidades de prática junto às entidades de administração, passando a permitir a criação de ligas nacionais e regionais.

10 Criado por meio do Decreto nº. 1.406, de 2 de março de 1995.

Com a Lei Pelé, a estrutura do Sistema Brasileiro do Desporto permaneceu quase a mesma. A composição desse sistema inclui: o Ministério do Esporte e Turismo, substituindo a Secretaria de Desporto do Ministério da Educação e do Desporto; o Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro que, com a Lei n°. 10.672/03, passou a ser o Conselho Nacional do Esporte; os Sistemas Federal, Estadual, Distrital e Municipais Desportivos, com autonomia para estabelecerem seus próprios sistemas. O Comitê Olímpico Brasileiro (COB) constitui-se como subsistema do Sistema Nacional do Desporto, e recebeu uma posição central na medida em que a Lei Pelé colocou como foco do Sistema Nacional do Desporto o esporte de alto rendimento, e vinculou àquela entidade o repasse de recursos financeiros destinados ao esporte.

Em março do mesmo ano, a Secretaria supracitada é transformada no INDESP, sendo desvinculado do MEC e subordinado ao novo Ministério. O INDESP, vinculado a este órgão, tinha como função aplicar as deliberações sobre a política e os programas de desenvolvimento do Esporte, estabelecer intercâmbio com órgãos públicos e privados e captar recursos financeiros para financiar projetos na área esportiva.

No segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, foi criado o Ministério do Esporte e Turismo, em 31 de dezembro de 1998. O INDESP passa, então, a ser vinculado a tal Ministério. Em outubro de 2000, o INDESP é extinto e substituído pela Secretaria Nacional do Esporte.

Se a Lei Zico não conseguiu avanços mais significativos, esses seriam contemplados pela Lei Pelé ao obrigar a transformação dos clubes, especialmente seus Departamentos de Futebol, em empresas ou em sociedades comerciais com fins lucrativos, no máximo de dois anos, e extinguir gradualmente a Lei do Passe, de modo que o jogador tenha direito ao passe livre com 24 anos de idade. Azevedo (1999) afirma que a Lei Pelé consolidou um caminho iniciado na década de 1980 com o Clube dos 13, e ratificou muitos aspectos da Lei Zico.

Com a aprovação das leis, o Governo Federal começava a diminuir gradativamente sua interferência na vida das entidades esportivas, mas não no financiamento. Nesse período, o esporte e o lazer no país reproduziam o modelo neoliberal de desregulamentação do Estado que se instalara no Brasil na década de 1990.

Com o cenário liberalizante pós CF de 1988, caberia à legislação dela decorrente regulamentar a organização e funcionamento do setor. O Governo Fernando Collor extingue a Secretaria ligada ao MEC e cria a Secretaria de Desportos da Presidência da República, em 1990. Em julho de 1993, é promulgada a Lei Zico, que destaca a necessidade da redefinição dos papéis do Estado e da sociedade em relação ao esporte e, especificamente, ao futebol. No Governo Fernando Henrique Cardoso, em 1995, criou-se o INDESP, nomeando Pelé como Ministro Extraordinário do Esporte, e em 1988, é aprovada a Lei Pelé, que regula o presente Sistema Brasileiro do Desporto, sancionada com a finalidade de aperfeiçoar a Lei Zico. Com a aprovação das referidas legislações, o Governo Federal diminuiu gradativamente a sua interferência na vida das entidades esportivas, mas manteve o financiamento.