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Lista de siglas

Capítulo 01: Favelas em São Paulo

2.1. Centro Industrial Jaguaré

Até a metade da década de 1930, a região hoje conhecida como Jaguaré era como muitas outras regiões do município de São Paulo situadas além das margens dos rios Pinheiros e Tietê, ou seja, grandes propriedades rurais: fazendas, sítios e chácaras, em geral de domínio de imigrantes portugueses e húngaros, que começaram a se instalar na região nos idos de 1925.

De acordo com Villares (1946), a região que compreende o Jaguaré propriamente dito era uma grande fazenda de 150 alqueires (3 milhões e 630 mil m²) , de propriedade da Companhia Suburbana Paulista.

Em 1935, essa área foi adquirida pela Sociedade Imobiliária Jaguaré, empresa de Henrique Dumont Villares, considerado o fundador do

Figura 2.01: São Paulo com suas vias de acesso. Fonte: Villares, 1946, s/p.

Jaguaré3, idealizou o projeto de urbanização para a região que previa áreas destinadas a construções residenciais, comerciais e industriais.

As figuras 2.01 e 2.02 mostram, respectivamente, o mapa de cidade de São Paulo com suas vias de acesso e o Centro Industrial Jaguaré assinalado e a implantação do Centro Industrial do Jaguaré, onde nota-se a distribuição dos trilhos ferroviários, a delimitação do Centro Industrial Jaguaré e a Cidade Universitária à direita.

Estava localizado a oeste do distrito industrial da cidade. A localização do Centro não foi feita ao acaso, mas imposta, de fato, pelas vantagens naturais que se evidenciam.

Henrique Dumont Villares planejou o bairro de forma estratégica, de acordo com referências internacionais de Bairros Industriais, que foram seu objeto de pesquisas anteriores. Após vários estudos, adotou as seguintes condicionantes: os bairros próximos poderiam municiar os funcionários mais especializados; os diversos laboratórios existentes e outros a serem implantados na Cidade Universitária, como os laboratórios de materiais e ensaios poderiam atender a demanda das indústrias a serem instaladas; a

3 Henrique Dumont Villares foi levado para a Europa aos sete anos de idade, onde cresceu

Figura 2.02: Implantação Centro Industrial Jaguaré. Fonte: Villares, 1946, s/p.

facilidade de acesso à área, por fazer divisa com a Marginal do Rio Pinheiros, que se liga com a Marginal do Rio Tietê, que por sua vez possui conexões com diversas grandes rodovias, traria vantagens de localização (PISANI, 2011, s/p.).

Os terrenos do Centro Industrial Jaguaré foram divididos em duas zonas distintas: a área industrial propriamente dita, e o bairro residencial operário. A localização do Centro Industrial oferecia ligação com o sistema ferroviário do país, como segue:

Nenhum bairro industrial quaisquer que sejam as aparentes vantagens de situação, ou outros requisitos que ofereçam, poderá ser considerado satisfatório e preenchendo sua finalidade, se não dispuser de ligação direta com o sistema ferroviário do país.

Desse ponto de vista, o Centro Industrial Jaguaré encontra-se em condições realmente privilegiadas, em comunicação direta com todas as estradas de ferro do Estado (VILLARES, 1946, p. 257-258)

Villares, em seu projeto, procurou realizar no Centro Industrial do Jaguaré, as diretrizes impostas pelo urbanismo moderno, propiciando à população operária a possibilidade de residir nos arredores acessíveis dos bairros

Figura 2.03: Trecho dos desvios. Fonte: Villares, 1946, s/p.

Figura 2.04: Cada lote com seu desvio ferroviário. Fonte: Villares, 1946, s/p.

industriais.

Será sempre precária a situação de um bairro industrial que ofereça dificuldades para o engajamento de operários, ou que os sujeite a longas e demoradas viagens, em penosos meios de transporte, para ir ao trabalho ou regressar ao lar (Villares, 1946, p. 264).

As figuras 2.03 e 2.04 mostram os desvios ferroviários existentes no projeto, facilitando o transporte dos operários.

No ano de 1940, Henrique Dumont Villares colaborou financeiramente para que a Prefeitura do município de São Paulo construísse a ponte do Jaguaré, ligando-o à Vila Leopoldina, uma extensão da Lapa. Ponte foi construída em concreto armado. As imagens da época dessa ponte são mostradas nas figuras 2.05 e 2.06.

Em São Paulo, nenhum outro bairro industrial que tenha sido implantado teve um planejamento urbano tão formulado. No início dos estudos para converter a área em bairro industrial, Villares intercede junto a Prefeitura do Município para que seja construída uma ponte no Jaguaré, ligando a gleba à Vila Leopoldina. A obra resolveria a transposição do Rio Pinheiros, a barreira natural, que criava um impedimento para a rede viária (PISANI,

Figura 2.05: Ponte do Jaguaré, num dos acessos à propriedade.

Fonte: Villares, 1946, s/p.

Figura 2.06: Vista de ponte do Jaguaré Fonte: Villares, 1946, s/p.

2011, s/p.).

O relógio do Jaguaré (ou Mirante do Jaguaré) foi construído em 1943, por Henrique Dumont Villares, por pensar que o Rio Pinheiros seria navegável. Com 28 metros de altura, continua sendo marco de localização para os moradores. Em 2004, foi tombado pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico – COMPRESP.

Abandonado e deteriorado, foi restaurado pela Sociedade Amigos do Jaguaré e hoje é aberto à visitação pública. As figuras 2.07 e 2.08 mostram, respectivamente, o relógio do Jaguaré quando foi construído e nos dias atuais. A figura 2.09 refere-se à vista do Mirante, na qual tem-se a possibilidade de ver longa extensão da cidade de São Paulo.

O Centro Industrial Jaguaré dispunha de um bairro residencial, com uma área de 800 mil metros quadrados, na qual eram previstas a construção de duas mil residências, como mostra a figura 2.10.

O Centro Industrial Jaguaré reservou uma área de 800.000 metros quadrados, arborizados, arruados na parte menos acidentada da encosta para a construção de 2.000 residências, em terrenos generosos a fim de permitir unidades isoladas, com variedades de projetos para que não se

Figura 2.07: Mirante do Jaguaré

Figura 2.09: Vista do Mirante do Jaguaré Fonte: www.panoramio.com

Acesso em 22.04.11

Figura 2.10: Vista parcial do bairro residencial operário. Fonte: Villares, 1946, s/p.

tornasse um bairro monótono. [...] Uma planta baixa foi desenvolvida apresentando o plano piloto à Imprensa e aos industriais, para a comercialização dos lotes industriais (PISANI, 2011, s/p.).

Contrastando com o parcelamento do setor industrial, o loteamento residencial foi projetado com desenho orgânico e sinuoso para melhor se adaptar à topografia. As figuras 2.11 e 2.12 referem-se às casas operárias.

A encosta leste da colina mais próxima ao rio, com declividades elevadas, com pior orientação solar e exposta aos ventos frios e úmidos do sudeste, foi destinada a um parque público que serviria de área de lazer de todo o empreendimento (FREIRE, 2006, p. 99).

A área à qual Freire se refere, deu origem à favela Nova Jaguaré, por falta de monitoramento da Prefeitura, como será mostrado adiante.

Com a implantação de seu projeto, a primeira fábrica que se instalou no Jaguaré pertencia ao grupo Matarazzo, fato que acabou por atrair inúmeras empresas e comerciantes. A zona industrial e distribuição ferroviária presente é mostrada nas figuras 2.13 e 2.14.

Figura 2.11: Casas operárias do Centro Industrial Jaguaré.

Fonte: Villares, 1946, s/p.

Figura 2.12: Casas operárias do Centro Industrial Jaguaré.

Fonte: Villares, 1946, s/p.

Após a execução da infra-estrutura, as primeiras indústrias que se implantaram no loteamento foram: S/A Indústrias Reunidas F. Matarazzo; Cia Antártica Paulista e a Cia Swift do Brasil. Essas empresas renomadas e em plena ascensão atraíram muitas outras que deram impulso ao Bairro que chegou a ser o mais industrializado de São Paulo, com 125 indústrias de vários portes funcionando na década de 1970. A necessidade de mão de obra para manter o funcionamento das empresas atraiu moradores para a região e o Bairro foi totalmente ocupado, bem como os vazios no seu entorno (PISANI, 2011, s/p.).

De acordo com Villares, dentre as estratégias do projeto original, enumera- se:

1. Zoneamento dividido em diferentes áreas industriais, onde se localizaram os estabelecimentos manufatureiros, depósitos, armazéns e pátios de recepção e expedição;

2. Patamares grandes para os terrenos industriais (que exigiram movimentos grandes de terra) com caimentos gerais para o leito do Rio Pinheiros, acompanhando basicamente a topografia natural;

3. Construção de 12.000 metros de vias internas de circulação, sendo 9.8 km de avenidas com 30 metros de largura e 2,2 km. de vias secundárias com

Figura 2.13: Zona industrial Fonte: Villares, 1946, s/p.

Figura 2.14: Zona Industrial Fonte: Villares, 1946, s/p.

20 metros de largura;

4. Arborização com mais de 5.000 árvores, indicadas e fornecidas pelo horto florestal de São Paulo, para que houvesse uma adequação entre as espécies e o local;

5. Calçamento das vias com paralelepípedos;

6. Ligação ferroviária completa, com comunicação com todas as ferrovias do estado. Na época havia duas bitolas diferentes em uso, a Central, a São Paulo Railway e Paulista utilizavam a larga de 1,60 metros e a Cia Mogiana, a Noroeste e a Estrada São Paulo- Rio Grande a bitola estreita de 1,10 metros. O Bairro Industrial teve a oportunidade de instalar 17 chaves de desvios, com 12,7 km. de trilhos com os dois tipos de bitolas, podendo trabalhar com todas as ferrovias do País;

7. Ligação rodoviária eficiente e existente;

8. Previsão para porto hidroviário, devido à proximidade do Rio Pinheiros; 9. Água para uso industrial deveria ser retirada do Ribeirão Jaguaré; 10. Água potável abundante, pois as sondagens mostraram a pequena

Figura 2.15: Grupo escolar. Fonte: Villares, 1946, s/p.

Figura 2.16: Restaurante. Fonte: Villares, 1946, s/p.

profundidade e intensidade do lençol freático;

11. Energia levada até o alinhamento dos lotes, feitas pela Light, bem como os fios telefônicos;

12. Coleta de lixo em toda a área;

13. Esgoto: foi resolvido com um projeto equivocado e impactante, usando o Rio Pinheiros como canal de lançamento de resíduos. Infelizmente era método usual nos anos de 1940 (VILLARES apud PISANI 2011, s/p.). As ruas foram desenhadas de modo que o centro comercial fosse rodeado por residências e estas pelas indústrias.

Foram construídas residências, escola, restaurante, parque, praça de esportes, centros de recreação, igreja, escola profissional. Estavam previstos também, cinema e centro cívico, que não foram construídos.

A figura 2.15 mostra o grupo escolar, que contava com seis salas de aula, gabinetes médico e dentário, chuveiros e refeitórios. (VILLARES, 1946, p. 261). A figura 2.16 apresenta um dos restaurantes do local. O primeiro estudo do estádio é mostrado na figura 2.17. Na figura 2.18 vê- se o

Figura 2.17: Estudo do estádio. Fonte: Villares, 1946, s/p.

Figura 2.18: Desenho dos belvederes, pavilhões rústicos e churrasqueiras.

Fonte: Villares, 1946, s/p.

desenho dos belvederes, pavilhões rústicos e churrasqueiras. A implantação do núcleo comercial Jaguaré, e a planta da loja e sobrado, projeto do Arquiteto João Francisco de Andrade (VILLARES, 1946, p. 266) são mostradas, respectivamente, nas figuras 2.19 e 2.20.

Uma década após o lançamento do bairro residencial apenas uma centena de casas, das 2.000 previstas, haviam sido construídas e a maior parte dos lotes foram vendidos sem qualquer tipo de construção: os novos moradores construíam por conta própria casas mais modestas e muitas vezes parcelando o lote para atender a mais de uma moradia ao mesmo tempo (FREIRE, 2006, p. 100).

A partir dos anos 1980, com o processo de desconcentração econômica, desindustrialização e obsolescência das antigas plantas industriais, a região enfrentou acentuada desvalorização. A partir dos anos 2000, inicia-se o processo de revitalização do bairro, através da utilização das antigas áreas industriais e armazéns para funções do serviço terciário da economia.

Administrativamente, o bairro do Jaguaré faz parte da Subprefeitura da Lapa, assim como a Vila Leopoldina, Barra Funda e Perdizes. Possui uma área de 6,574 Km2. Em 1992 sua população era estimada em 60 mil habitantes, e de acordo com as Unidades de Informações Territorializadas –

Figura 2.19: Núcleo comercial Jaguaré Fonte: Villares, 1946, s/p.

Figura 2.20: Plantas do núcleo comercial Jaguaré. Fonte: Villares, 1946, s/p.

UITs do Jaguaré (SÃO PAULO, 2009), possui atualmente uma população de aproximadamente 45 mil habitantes.

Situado na Zona noroeste da cidade de São Paulo e às margens do rio Pinheiros, encravado entre o Rio Pequeno, Cidade Universitária - USP e a cidade de Osasco, o Jaguaré é formado pelo Parque Continental, Vila Lageado, Centro Industrial Jaguaré, Vila Jaguaré, Vila Gomes e a favela Vila Nova Jaguaré e constitui-se em um importante pólo econômico, misto de comércio, indústria, serviços e lazer, mas mantém a forte característica de área residencial. Cortada por importantes vias como o corredor das avenidas Jaguaré e Escola Politécnica, que dão acesso à Rodovia Raposo Tavares e consequentemente, ao Rodoanel Governador Mário Covas. Já a Avenida Corifeu de Azevedo Marques constitui-se em um meio de ligação entre o Butantã, Rio Pequeno, Jaguaré e o município de Osasco, onde se liga à Avenida dos Autonomistas, a partir da Vila Yara.

Conta com escolas desde o ensino infantil até graduação superior. Embora localizado na Vila Leopoldina, o Parque Estadual Villa Lobos é uma área de lazer frequentada por seus habitantes, principalmente nos finais de semana. Não conta com hospitais públicos, mas apenas com uma Unidade Básica de Saúde – UBS. Quando necessário, os moradores recorrem ao Hospital

Universitário da USP ou então ao Ponto Socorro da Lapa. Possui onze creches, sendo sete delas públicas e quatro particulares.

As figuras 2.20 à 2.22 a seguir mostram, respectivamente, a imagem de satélite do Sistema de informações para Habitação Social na cidade de São Paulo (HABISP) – ORTOFOTO – do ano de 2007; foto aérea do ano de 2000 e os equipamentos encontrados no bairro. Tanto na imagem de satélite quanto na foto aérea, nota-se o adensamento da favela Nova Jaguaré.

Apresenta boa infraestrutura de transporte. Há inúmeras linhas de ônibus ligando o Jaguaré ao centro velho da cidade, como também ao Alto da Lapa, ao Sumaré, à Avenida Paulista, à Lapa, ao metrô Barra-Funda, a estação de trem do Jaguaré que está localizada ao lado da ponte e à estação de Vila Leopoldina, ambas operadas pela Companhia Paulista de Trens Paulistanos - CPTM, à zona sul de São Paulo, aos municípios de Osasco, São Bernardo do Campo e Guarulhos. Estrategicamente localizado próximo a centros empresariais e comerciais como os de Pinheiros, Lapa e a região da Avenida Faria Lima.

Figura 2.20: Imagem aérea do bairro do Jaguaré, com a área da favela Nova Jaguaré demarcada, ano de 2007. Fonte: HABISP, 2007, em http://mapab.habisp.inf.br Acesso em 05.06.11

Figura 2.21: Favela Nova Jaguaré no ano 2000. Fonte: BASE Aerofotometria SA apud FREIRE, 2006, p. 125.

Figura 2.22: Equipamentos presentes no bairro do Jaguaré, com a favela do Jaguaré demarcadada. Fonte: SÃO PAULO, 2009.

Figura 2.23: Jaguaré em 1959.

Fonte: VAPS Aerofotometria SA apud FREIRE, 2006.