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CERCO DE SARAJEVO 1992 (GUERRA DA BÓSNIA)

No documento Arquitetura de emergência (páginas 31-39)

O cenário de guerra na Bósnia há uns anos permitiu colocar algumas questões sobre a reestruturação da cidade e de que maneira faria sentido esta recuperação depois de tanta destruição. O arquiteto Lebbeus Woods foi uma das pessoas que foi até Sarajevo para ajudar no debate desta reestruturação pós-guerra e propor uma nova forma de pensar a cidade destruída.

A Guerra

A guerra da Bósnia deu se entre 1992 e 1995, tratou-se de uma rivalidade entre diferentes etnias que resultou num confronto armado onde morreram mais de 100.000 pessoas. (Silva, Gustavo, 2011) Em 1945 foi fundada a República socialista federativa da Jugoslávia que agrupava diferentes países como a Sérvia, Croácia, Eslovénia, Montenegro, Macedónia e Bósnia-Herzegovina. Durante este período as rivalidades étnicas foram controladas pelo regime ditatorial de Tito. Os movimentos pela independência começaram em 1991 com o fim da influência soviética, entretanto já desde o início da década de 1990 que os debates políticos se tinham voltado para a questão étnica.

Os conflitos começaram quando a Bósnia Herzegovina quis também afirmar a sua independência depois de países como a Eslovénia, a Croácia e a Macedónia a terem conseguido. Apesar da intenção de independência, a Bósnia Herzegovina tinha um real problema de diversidade étnica em 1991 onde dos 4,4 milhões de habitantes 44% eram bósnios muçulmanos, 31% sérvios e 17% croatas. (Silva, Gustavo, 2011, p. 17)

A grande responsabilidade deste genocídio realizado para a declaração de independência da Bósnia é atribuída a Radovan Karadzic líder e representante dos sérvios bósnios. Cada grupo defendia diferentes resoluções para a independência da Bósnia Herzegovina, os Bósnios defendiam a independência total da Bósnia com a formação de um novo governo totalmente Bósnio, por outro lado os sérvios defendiam uma anexação de territórios bósnios (onde a maioria da população era Sérvia) à Jugoslávia e os croatas defendiam também uma anexação de territórios mas à Croácia.

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O Cerco a Sarajevo

Ao comando de Radovan Karadzic os sérvios mantinham uma postura agressiva perante o facto de a Bósnia poder tornar-se totalmente independente, consequência desta postura agressiva foi o início da guerra em Abril de 1992 quando as tropas sérvias foram deslocadas para os arredores de Sarajevo e cercaram totalmente a cidade.

O cerco de Sarajevo foi resultado de um massacre em massa, os Sérvios tinham armamento em massa que lhes permitia atirar consecutivamente durante meses e ordens para bombardear indiscriminadamente sobre a população. Resultou na morte de mais de 8.000 pessoas e na condenação de Radovan a 40 anos de prisão por genocídio. (Diário noticias, Abril 2018)1

A guerra terminou em 1995 com uma negociação de paz com o acordo de Dayton. Neste acordo foram estabelecidos termos para a independência da Bósnia e manter a paz entre as partes, criaram-se duas federações para agrupar os dois movimentos étnicos, a federação da Bósnia e Herzegovina sobe o controlo dos bósnios e croatas e a república Sérvia da Bósnia sobe o controlo dos sérvios.

Impacto da Guerra e a Destruição

Esta guerra que decorreu num período de três anos provocou em Sarajevo uma total destruição. À época este acontecimento levantou diferentes preocupações ao nível da recuperação e reconceptualização não só da cidade destruída mas também da forma como se pensa o espaço urbano e a arquitetura.

A nível internacional o interesse em Sarajevo era notório, a destruição de monumentos históricos levantaram o interesse pela ideia da memória e da destruição do património, por outro lado a mudança das dinâmicas do quotidiano quando se vive numa cidade cercada e em constante bombardeamento, tudo isto levantou o interesse dos media e consecutivamente deu abertura à discussão pública sobre a situação de Sarajevo.

1Disponível em: www.dn.pt/mundo/interior/karadzic-recorre-a-justica-internacional-para-anular-sentenca-por-

crimes-nabosnia-9280359.html (De cima para baixo)

Figura 7 - Ambiente durante a guerra, Welcome To Sarajevo de Michael Winterbottom

Fonte: http://www.denofgeek.com

Figura 9 - Guerra de Bósnia, 1992 – 1995

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Guerra_da_Bosnia

Figura 8 - Price of peace de David J. Rothkopf, 1998

Fonte: https://www.nadirkitap.com/the-price-of-peace- david-j-rothkopf-kitap6112907.html

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War and Architecture - Lebbeus Woods

Numa situação de grande mediatismo em torno da cidade de Sarajevo, foram vários os interessados em explorar alternativas e em desenvolver discussões sobre o período após a guerra, analisando todo o cenário de destruição e propondo novas alternativas relativamente à reestruturação da cidade destruída. Entre muitos arquitetos, Lebbeus Woods, com o seu pensamento singular relativamente à relação que a arquitetura e a guerra estabelecem, no reflexo da reconstrução de uma cidade, desenvolveu uma proposta estratégica de intervenção.

A sua estratégia passou pela reflexão sobre o papel da arquitetura enquanto materialização da memória em situações de recuperação física como é um pós guerra. Para Woods a solução de uma cidade em ruína não passa pela total demolição do antigo, nem por uma total reabilitação tentando ter a cidade que era antes da catástrofe.

A estratégia de Lebbeus Woods passou pela mudança do pensamento e da forma como o arquiteto pensa procurando dar um significado à arquitetura para que a própria arquitetura tenha impacto na memória das pessoas e para evitar que situações graves como este cerco em Sarajevo sejam esquecidas.

“A arquitetura deve aprender como transformar a violência assim como a violência tem o poder de mudar a arquitetura.” (Woods,1993, p. 24).

Para os edifícios arruinados e os sítios devastados pela guerra, Woods delineia uma estratégia de intervenção que passa por três gestos, scab, injections, e scar. O arquiteto usa a metáfora da crosta e da ferida como comparação perfeita para a destruição provocada pela guerra e a sua respetiva reconstrução.

O primeiro gesto scab (conceito crosta), passa pela criação de um involucro de proteção das feridas da construção protegendo os espaços para futuras intervenções, nesses espaços protegidos pode concretizar-se o segundo gesto, as injeções (injections). Este conceito surge com o objetivo de preservar os vazios provocados pela destruição da guerra, trata-se de buracos ou outros vazios provocados por bombas ou derrocadas.

As estruturas injetáveis têm como propósito promover a experiência mais ativa do espaço, onde cada um poderia experimentar um lugar consequente da destruição, permitindo assim uma reflexão, Woods fala em “(…) ferramentas para o jogo essencial da vida experimental, estendendo as faculdades humanas para experimentar, pensar e agir.” (Woods, 1993, p.29).

(De cima para baixo)

Figura 10 - Lebbus Woods, Projects for the reconstruction of Sarajevo, 1993–1996

Fonte: http://thirdrailquarterly.org/joshua-johnson- lebbeus-woods-at-the-drawing-center/

Figura 11 Lebbus Woods, La Habana Vieja: Wall. 1994-95.

Fonte: https://archi.ru/events/10624/lebbeus-vuds

Figura 12 - Lebbeus Woods, Radical Reconstruction, 1997

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O último conceito desta estratégia, a cicatriz (scar) vem ressaltar esta ideia de memória que a arquitetura pode partilhar depois de uma grande guerra, a ideia de que ficam nos edifícios algumas marcas da destruição e do sofrimento do passado, permitindo que seja testemunha da história transformadora de uma cidade e avisando às futuras gerações o horror que não pode ser ignorado. A cicatriz será mais um elemento que vai articular os tecidos velhos com os novos tecidos urbanos. Em conclusão, o pensamento de Lebbeus Woods e desta análise, em que vê a arquitetura como uma possível materialização da memória, vem fundamentar a importância que a memória tem na história, na reconstrução e no futuro. Para atuar num cenário de guerra e para ajudar a restabelecer pessoas, e reabilitar lugares será fundamental pensar na destruição como possível impulsionadora de novas ideias e novas formas de se propor o futuro.

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Figura 13- Sarajevo: Meditations, 2001

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AARQUITETURA EM CONTEXTOS DE EMERGÊNCIA

Ao entrar no mundo da arquitetura de emergência com o objetivo de dar algum contributo positivo no sentido de melhorar a vida das pessoas é necessário tentar perceber o que se tem feito nos últimos anos nesta área e que tipo de ajuda já existe. Este capítulo aborda de uma forma geral todas as principais áreas fundamentais da emergência, as organizações e instituições existentes, espaços de refúgio e abrigo, e diversos projetos de referência que contribuíram para a evolução das técnicas de construção de abrigos ao longo dos anos.

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No documento Arquitetura de emergência (páginas 31-39)

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