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As Ciências Físicas, Químicas e Naturais

No documento EVA MARIA SIQUEIRA ALVES (páginas 126-132)

2.3 As cadeiras lidas no Atheneu Sergipense

2.3.8 As Ciências Físicas, Químicas e Naturais

As cadeiras anteriormente examinadas compunham as cadeiras das Humanidades no Atheneu Sergipense, que conforme a defesa de Júlio Ribeiro, em 1885, devia sofrer uma ampliação dos conhecimentos.

O primeiro requisito da educação moderna, como base de reorganização social, é a universalidade de conhecimentos.

O homem cientificamente preparado deve conhecer, ao menos elementarmente, as mathematicas, a physico-khimica, a bio-physiologia, a psykhologia-moral. Deve ter boas noções de arithmetica, de algebra, de geometria, de mekhanica, de cosmologia, de astronomia sideral e planetaria, de geodesia, de geographia physica, de geologia, de mineralogia, de paleontologia, de botanica, de zoologia, de anatomia, de histologia, de pathologia, de psyhologia, de moral, de anthropologia, de ethnologia, de linguistica, de historia e geographia-historia, de industria, de arte, de litteratura, de sociologia, de legislação, de politica.

E mais, deve ter estudos classico solidos (Morse, 1970, p.212).

As ciências deveriam, pois, compor o conjunto dos saberes estudados para a formação do “homem cientificamente preparado”. No período em que foi criado o Atheneu Sergipense, a ênfase estava voltada para as Humanidades, além dos saberes Matemáticos. Declara Lorenz (2003) que:

A restrita presença das ciências no currículo pode ser atribuída ao fato que no Brasil, como nos países europeus, o ensino de ciências era considerado necessário apenas para as profissões técnicas da indústria, do comércio e da agricultura,

enquanto os estudos clássicos eram tidos como apropriados para os estudos superiores de Medicina e Direito (Lorenz, 2003, p.53).

A indiferença para com os estudos das ciências foi uma característica das escolas públicas e particulares até o ano de 1887, quando os conteúdos de Física, Química e História Natural passaram a compor o rol das exigências dos Exames de Preparatórios para as Faculdades de Medicina. O Atheneu Sergipense preencheu essa lacuna em 1882, quando, após concurso, tomou posse o médico Daniel Campos como professor vitalício da cadeira de

“Ellementos de Sciencias Physicas e Naturaes, Ellementos de Physiologia e Hygiene”.136

Pela série dos Planos de Estudos construída a partir das fontes identificadas, é possível afirmar que a cadeira de Ciências Físicas e Naturais esteve presente no quadro das disciplinas do Atheneu Sergipense, com uma carga horária de uma hora de aula, durante os anos de 1882

a 1883, voltando a compor o rol das disciplinas em 1890, pelo Decreto de 14 de março.137

Com seis anos de duração, o curso de Humanidades do Atheneu Sergipense em 1892 tinha no seu conjunto das cadeiras a de Ciências Físicas e Naturais, ministrada no último ano do curso, abordando “Physica e Chimica, noções de Mineralogia e Geologia, Zoologia, Hygiene e Biologia e principaes noções” (Ata da Congregação do Atheneu Sergipense, 8 de fevereiro de 1893). Nessa mesma reunião foram organizados seus horários e determinado que as aulas desta cadeira seriam ministradas das 10 às 11 horas da manhã, nas segundas, quartas e sextas. Importante verificar que a cadeira de Ciências Físicas e Naturais, com os mesmos conteúdos, compõem o quadro das matérias dos estudos do terceiro ano do curso Normal, aumentando também o rol das disciplinas daquele curso. No ano seguinte, a cadeira passa a ser lida diariamente no curso de Humanidades, ampliando a sua carga horária, ao tempo em que não há registro de que a cadeira das Ciências Físicas e Naturais tenha composto o quadro do curso Normal.

O posicionamento das cadeiras científicas no último ano do curso é resultado da adoção de modelos de planos que entendiam os estudos clássicos como pré-requisitos para o estudo das ciências, “considerados mais especializados e difíceis” (Lorenz, 2003, p.54). Alerta o autor para entender também esse posicionamento como uma organização que facilitava a não conclusão do curso, uma vez que aqueles que preferissem aligeirar seus estudos cursavam apenas as disciplinas exigidas nos exames de Preparatórios, sem cursar as

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Por volta de 1883, somente quatro das vinte e uma escolas provinciais ofertavam as matérias de Física e Química e uma de História Natural (Lorenz, 2003, p.59).

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Mesmo não tendo sido encontrada menção na distribuição dos horários para a cadeira de Ciências Físicas e Naturais do Atheneu Sergipense nesse período, o professor Daniel Campos permaneceu no quadro docente da instituição até 1896, quando se afastou para assumir o cargo de Inspetor de Higiene.

ciências, alocadas no final do curso – “Não gastavam tempo nem energia em estudos considerados desnecessários” (Lorenz, 2003, p.54). De opinião contrária é Sílvio Romero, que defendia alocar os conhecimentos da Física e da Química nos primeiros anos do curso, com o “caráter pratico para iniciar os estudantes nos grandes e maravilhosos processos da sciencia moderna” (Romero, 1901, p.214).

O ano de 1897 iniciou-se com novidades. A três de fevereiro, a Congregação do Atheneu Sergipense apresentou uma lista de pontos para o concurso aberto para a cadeira das Ciências Físicas e Naturais.

Physica

1. Definição e divisão da Physica, o lugar que ella ocupa na classificação das sciencias. Força attractiva e repulsiva. Diversos estados dos corpos, caracteres de cada estado. Propriedades geraes dos corpos.

2. Movimento e força

3.Attração universal. Lei de Newton. Gravidade, sua direcção, causas que a modificam. Lei da queda dos corpos.

4.Equilibrio dos fluidos. Pressão e impulso dos fluidos. Principio de Pascal. Equilibrio dos corpos fluctuantes. Principio de Archimedes.

5.Calor, medidas da temperatura. Dilatação dos corpos pelo calor. Thermometros. Pendulo compensador.

6.Pressão atmospherica. Barometro. 7.Da luz na propagação e sua intensidade.

8.Da eletricidade, corpos conductores e isoludocso.

Chimica

1.Definição e divisão da Chimica. Corpos simples e compostos. Combinação e mistura. Leis da combinação.

2.Theoria atomica. Affinidade e causas que a modificam. 3.Acidos, bases e saes.

4.Hydrogeneo, Oxygeneo e Ozono. 5.Agua

6. Ar atmosferico 7. Carbono

8. Classificação dos metaes, classificação de Phenosol, classificação natural. Botanica

1. Definição da Botanica, sua divisão. Tecido celular, fibroso e vascular 2Estudo geral da haste.

3.Estudo geral da raiz. 4.Estudo geral da folha. 5.Estudo geral da flor.

Zoologia

1.definição de zoologia. Divisão dos reinos da natureza, seus caracteres distintos 2.Animaes vertebrados, seus caracteres (Ata da Congregação do Atheneu Sergipense, 3 de fevereiro de 1897).

Com esses pontos destacam-se os conhecimentos exigidos para um professor ingressar no Atheneu Sergipense, apontando, para a análise em questão, quais os saberes necessários para o ensino das Ciências Físicas e Naturais. Seguindo os ritos prescritos na legislação quanto à realização dos concursos para professores, perante a banca examinadora composta dos membros Geminiano Paes d’Azevedo, professor de Francês; Brício Cardoso, professor de Retórica, Poética e Português, e Francisco Teixeira de Faria, professor de Matemática, Geometria e Trigonometria, o único candidato inscrito sorteou o ponto de número 6 da parte da Química – Ar Atmosférico.

Aos vinte dias daquele mês, o farmacêutico Guilhermino Amâncio Bezerra defendeu a sua tese sobre o Ar Atmosférico, seguindo das provas escritas e orais. Avaliado sobre o seu desempenho, por escrutínio secreto, o candidato foi aprovado com distinção, tomando posse

perante a Congregação a 1o de março daquele ano. Este era, pois, o segundo professor das

Ciências Físicas, Químicas e Naturais do Atheneu Sergipense, com a ressalva de ser o

primeiro a ter prestado concurso para essa cadeira.138

Em 1899, foi também professor de Física e Química do Atheneu Sergipense o médico José Moreira de Magalhães, lembrado carinhosamente por Campos:

Sempre de fraque, chapéu mole e guarda chuva. Além de cabeçudo, testa larga e cabelo bem aparado. Exercendo a clínica na cidade, atendia a todos, ricos e pobres [...] suas aulas eram boas, resumindo a Física de Langlebert e a Química de Martins Teixeira, para poucos alunos do Ateneu (Campos, 1976, p.60).

Mas as transformações relativas à cadeira examinada não cessaram. Conforme o Decreto 231, de 9 de julho de 1897, sete passaram a ser os anos do curso Integral do Atheneu Sergipense, com as cadeiras de “Sciencias Naturaes, compreendendo Biologia” e “Chimica e Physica” apontando para uma inicial separação de programas. Destaque-se que é a partir dessa legislação que é expressa a denominação “Física e Química”.

Mandava o Decreto 351, de 9 de junho de 1899, que as aulas de Elementos de

Química e Física , com seis horas de duração fizessem parte do rol das cadeiras do 5o ano do

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Foram ainda professores do Atheneu Sergipense: o médico José Moreira de Magalhães em Ciências Física e Naturais (1899) e o médico Aristides da Silveira Fontes na cadeira de Física, Química e Higiene (1911). Destaque-se a formação desses professores em Medicina ou Farmácia

curso Integral do Atheneu Sergipense, sendo com duas horas semanais ministrada também no

6o ano. A História Natural do 6o ano apresentava uma carga horária de 8 horas semanais No

ano de 1904, entretanto, as cadeiras de Química e Física e de História Natural foram

ministradas apenas no 5o ano, reduzindo-se desta forma a carga horária destinada aos seus

ensinamentos.

Quanto aos compêndios adotados na cadeira examinada, a Ata da Congregação de 8 de fevereiro de 1902, registra que a obra de João Martins Teixeira deveria ser utilizada para os

estudos da Química e a de Edmond Jean Langlebert para os da Física e da História Natural.139

Os estudos da Física e Química realizados no 5o ano do curso Integral do Atheneu

Sergipense passaram a ser de quatro horas semanais durante o ano de 1906, e de três horas

semanais no 6o ano, conforme Decreto 543, de 9 de outubro. A História Natural tinha uma

carga horária de duas horas para o 5o ano e de cinco horas para o 6o ano em 1906.

Enunciava o Decreto 556, de 24 de agosto de 1908, os conteúdos de cada disciplina e a forma didática em que os professores deveriam desenvolver suas atividades, ou seja, não apenas “o que” devia ser ensinado, os limites dos conteúdos, mas também “o como”, restringindo sem dúvida o potencial criativo inerente a cada professor que almejasse extrapolar aquelas indicações. No capítulo “Dos programmas de ensino”, o legislador determinava dever o corpo docente do Atheneu Sergipense observar fielmente preceitos metodológicos fundamentais para cada cadeira.

No ramo physico da cadeira de physica e chimica se ensinarão os factos do domínio da gravidade, do calor, da acustica, da optica, da electricidade e do magnetismo. O ensino da chimica começará pelo da mineral e passará ao da organica.

Fará objecto da primeira parte depois do estudo da nomenclatura e notação chimica, do das leis da combinação e do da doutrina atomica, o dos principaes metalloides e metaes e dos respectivos compostos. A segunda parte tratará da composição, constituição e classificação dos corpos organicos, das formulas organicas, dos radicais, das series organicas e das funcções chimicas em geral (Art.6, VII, Decreto 556, 24 de agosto de 1908).

A História Natural, por sua vez, compreenderia

na mineralogia o estudo da crystalisação e suas leis, o dos systemas crystalinos, o exame dos mineraes, seus caracteres morphologicos, a designação das especies mineraes e sua classificação.

Na geologia se discriminarão as rochas, segundo sua origem, composição minerologica e estructura, e se explicará a formação dos estratos rudimentares e a chronologia geológica.

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Na botanica, alem da parte geral desta sciencia, se fará o estudo das mais importantes familias vegetais, servindo como exemplares para isso plantas frescas das especies mais communs.

Na zoologia, das nocções relativas aos tecidos, orgaos, apparelhos, systemas e funcções dos animaes se passará ao estudo das especies e sua taxionomia e á succinta descripção dos typos da serie animal. (Art. 6, VIII, Decreto 556, de 24 de agosto de 1908).

Recorda Campos o seu exame oral de Botânica feito com o professor Luiz Figueiredo Martins, que havia substituído o professor Francisco Teixeira de Faria.

Não nos entendemos muito bem a propósito da nomenclatura botânica, mas o professor Figueiredo depois da prova oral, nos corredores do Ateneu, que estava perto do quartel da polícia, me disse: o sr. não satisfez todas as minhas perguntas, mas atendendo à recomendação do professor Teixeira vai ter distinção.... Nosso desacordo proveio da maneira de perguntar do professor Figueiredo. – Qual é a propriedade dos ólhos?... Eu entendi que êle se referia aos óleos (gordura lubrificante) e êle não gostou da resposta, pois se referia aos olhos, gomos, botões, elementos de reprodução de certas plantas (Campos, 1970, p.59).

Contava o Atheneu Sergipense no seu quadro administrativo com a figura de um Preparador para as cadeiras de Física, Química e História Natural, de livre nomeação do Governo. Porém, a condição essencial para exercer essa função seria a de ter exames das cadeiras respectivas, prestado em qualquer instituto oficial ou equiparado ao Ginásio Nacional. Ao Preparador cumpria:

I.Ter todos os objectos do gabinete catalogado e dispostos na melhor ordem e estado de asseio;

II. Preparar as colleções conforme as instrucções dos lentes;

III.Cumprir o que pelo lente lhe for ordenado relativamnete ás demonstrações praticas nas aulas (Art.117, Decreto 351, de 9 de junho de 1899).

É importante destacar que a partir desse Decreto aparece no quadro do pessoal administrativo do Atheneu Sergipense a figura do Preparador, indicando possivelmente ser o início da organização dos “Gabinetes de Física, Química e História Natural”, e demonstrando

mais uma vez a preocupação com as experiências práticas.140

Embora ainda juntas como uma só cadeira de Química e Física, lecionada no 5o e 6o

ano em 1907, na distribuição dos horários das aulas estes conteúdos seriam ministrados em dias alternados. É o que se registra: Física das 9 às 10 horas às segundas, quartas e sextas.

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Em sessão da Congregação do Atheneu Sergipense de 22 de julho de 1904, é registrado voto de pesar pelo falecimento do Farmacêutico Francisco Nathaniel de Azevedo Ribeiro, Preparador de Ciências Físicas e Naturais, sendo nomeado para o cargo, em 3 de agosto daquele ano, Álvaro da Silveira Britto.

Química das 9 às 10 horas às terças, quintas e sábados. A História Natural era ministrada de

segunda a sábado.141

Continuava assim o movimento de organização da cadeira Física, Química e História Natural, proporcionando aos alunos que buscavam os estudos no Atheneu Sergipense ampliarem seus conhecimentos do saber científico.

No documento EVA MARIA SIQUEIRA ALVES (páginas 126-132)