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O SAMBA PIRAPORANO – OS GRUPOS LOCAIS

3.1. A CIDADE – OS DIAS ATUAIS

Neste terceiro capítulo procura-se traçar uma etnografia do samba na cidade de Pirapora do Bom Jesus nos dias atuais. Busca-se, no entanto, atentar para a estrutura de funcionamento interno dos dois grupos de samba de bumbo existentes na cidade, bem como sua inserção em Pirapora, sobretudo a relação com a prefeitura local.

Portanto, faz-se necessário o relato de algumas das principais características da cidade nos dias atuais antes de se discorrer a respeito dos grupos de samba locais. Pirapora do Bom Jesus é uma cidade pequena, com aproximadamente 15 mil habitantes, município pertencente à Grande São Paulo, situado aproximadamente a 50 quilômetros da capital paulista66. A principal atividade econômica local é o turismo religioso, que movimenta a cidade principalmente nos finais de semana, dinamizando a economia local. É crescente também o desenvolvimento das atividades turísticas em relação aos “esportes radicais” realizados nos arredores da cidade, como no Morro da Capuava, por exemplo, em que tem aumentado a prática de esportes como o vôo livre e o motocross. Alguns outros eventos em especial também possuem grande influência na movimentação da economia local, como alguns realizados fora de períodos comemorativos, o carnaval, a semana santa e, sobretudo, considerando a tradição religiosa da cidade, a festa do Bom Jesus de Pirapora.

Nos dias atuais, a organização da festa do Bom Jesus em agosto não é mais responsabilidade de órgãos religiosos da cidade, como citado por Cunha em pesquisa realizada em 1937, mas antes da Secretaria da Cultura e Turismo de Pirapora do Bom Jesus. A festa do Bom Jesus é o evento local que mais congrega devotos e turistas na cidade, e ocorre ainda hoje nos dias 3, 4, 5 e 6 de agosto, sendo que no ano de 2007 o ápice da festa ocorreu no dia 5, já que dia 6 foi segunda-feira, fato que dificultou a ida de muitas pessoas devido ao vínculo empregatício destas. Na festa, o maior movimento de religiosos em Pirapora concentrou-se no fim de semana, sábado e domingo, que em 2007 foram, respectivamente, os dias 4 e 5 de agosto. A cidade assume outra configuração nesses dias, a economia local, incluindo hotéis, restaurantes, barraquinhas de doces, artigos religiosos, roupas, flores, objetos de lembrança da cidade, além do aluguel de quartos em casas de moradores locais, é dinamizada (Foto 14). É grande o número de devotos que freqüentam Pirapora nos dias de festa, sendo marcante a

66Informações retiradas do site oficial da Prefeitura Municipal de Pirapora: www.piraporadobomjesus.sp.gov.br. Data

presença de romeiros e devotos do Bom Jesus que, visitando a cidade a fim de cumprir promessas e por devoção, participam das atividades religiosas da cidade, que se concentram, sobretudo, em missas e procissões (Ver fotos 15 e 16).

Complementando a parte religiosa, na festa do Bom Jesus, há também outras atividades de lazer para as pessoas que visitam a cidade nesta época do ano. São os shows de duplas “sertanejas”, os quais ocorrem em um grande palco montado próximo ao portal dos romeiros, ou no salão de festas local, e também de sambistas paulistanos, eventos que acontecem na Casa do Samba. Houve em 2007, em relação à música “sertaneja”, shows de Gian e Giovani, Duani e Celso Lee, e de Lucylla e Lucyana. Quanto às atividades ligadas ao samba, a prefeitura organizou um evento na Casa do Samba com o intuito de promover um resgate da dimensão profana da festa, revivendo o antigo barracão. A proposta foi promover o samba das 17:00 hrs do dia 5 de agosto até o mesmo horário do dia seguinte, contando com os seguintes convidados: Osvaldinho da Cuíca (sambista principal em todos os eventos relativos ao tema em Pirapora), Thobias da Vai-Vai, Grupo de Samba de Roda Vozes do Paraguassú, Velha Guarda da Escola Nenê de Vila Matilde, Elizeth Rosa, Odair & Cia, Samba do Baú, Samba da Laje, Samba do Cafofo, e o grupo “Samba de Roda” de Pirapora. Também compareceu à festa Inezita Barroso, a qual foi à cidade para receber o título de primeira “cidadã samba” de Pirapora do Bom Jesus. O grupo “Samba de Roda” se apresentou nos dias 5 e 6 de agosto na praça fronteira à Igreja, logo após a missa realizada à tarde, reunindo o público religioso que participava da cerimônia.O samba, antes reprimido e proibido, no auge na reação religiosa, é atualmente componente oficial da programação da festa de agosto, sendo muito valorizado nos eventos realizados dentro e fora do município enquanto expressão cultural típica da própria cidade de Pirapora.

Nos dias normais, sem eventos ou comemorações, Pirapora é uma cidade calma, sendo poucos os visitantes ou turistas, de modo que uma movimentação maior ocorre nos finais de semana, quando devotos visitam a localidade e o mercado local é movimentado, barraquinhas são montadas, hotéis e restaurantes abrem para receber os visitantes. A religiosidade é um traço marcante na cultura dos moradores locais, os quais em grande maioria são católicos. Nesse sentido algumas ações de moradores evidenciam este traço, como o costume de parar para fazer uma pequena oração quando às seis horas da tarde bate o sino da igreja matriz, ou neste momento se benzer com água benta, atitudes observadas em alguns sambadores e

moradores locais. A religiosidade não é somente um elemento capaz de impulsionar a economia local, mas é também um traço marcante nas práticas cotidianas dos moradores.

No tocante ao samba, é nos finais de semana que também ocorrem alguns eventos na Casa do Samba. Alguns comportam a presença de grupos de samba paulista, na maioria provenientes da cidade de São Paulo, os quais se apresentam em alguns finais de semana. A Casa do Samba é um espaço aberto à visitações por parte de quaisquer pessoas interessadas, embora a procura maior seja por parte de instituições de ensino. Há algumas ocasiões em que visitações são previamente marcadas por escolas ou universidades em finais de semana, sobretudo com o intuito de conhecer o samba de bumbo realizado na cidade. Quando são agendadas tais visitações, há apresentações do grupo “Samba de Roda” local e, na maioria das vezes é oferecida uma feijoada aos visitantes na própria Casa do Samba, sendo esta preparada por uma instituição filantrópica da cidade, a qual participa dos eventos a fim de angariar fundos para seus trabalhos assistenciais.

As atividades ligadas ao samba na cidade despertam pouco interesse em grande parte da população local. Há pouca identificação dos moradores com a manifestação cultural realizada na cidade, sendo pequena a participação destes nos eventos realizados em torno do samba, e grande a presença de pessoas vindas de outras localidades. No geral, os moradores conhecem os grupos “Samba de Roda” e o “Vovô da Serra Japi”, entretanto, muitos deixam claro a falta de interesse pelos grupos e constantemente fazem referência a dona Maria Esther como uma figura pitoresca. O desinteresse da população local contrasta com o interesse de pessoas vindas de outras localidades. É constante a presença de jornalistas de revistas, jornais e televisão, repórteres, estudantes universitários, cineastas, dentre outros, que procuram a cidade, sobretudo para realizar trabalhos em que o samba é o foco central. Mesmo nas comemorações relativas ao samba realizadas no município, principalmente no carnaval, o público visitante (turistas) assume um perfil mais intelectualizado.

Nestes eventos citados, o grupo “Samba de Roda” possui centralidade, em oposição ao lugar ocupado pelo grupo “Vovô da Serra Japi”, o qual é concebido, tanto pelos sambadores do primeiro grupo, quanto por funcionários da prefeitura local, como uma organiz ação desprovida de “tradição” em relação à história do samba local. Isto devido ao fato do referido grupo ter sido formado recentemente, sendo dissidente de um grupo de Santana de Parnaíba, o que será melhor discutido posteriormente. O que se torna relevante aqui é a centralidade do

grupo “Samba de Roda” nestes eventos, o que se dá, sobretudo, ao fato deste possuir, de certa forma, uma referência ao samba historicamente realizado em Pirapora.

Foto 13 – Vista do centro de Pirapora. Foto de Fernanda Dias, setembro/2007.

Foto 15 – Procissão em frente à Igreja local. Foto de Fernanda Dias, agosto/2007.