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O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça envenenou a alma dos homens, levantou no mundo as muralhas do ódio e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido. (CHARLES CHAPLIN, O grande Ditador)

Chaplin foi um grande artista, pois não apenas produziu bons filmes, mas queria, com esses filmes, produzir uma mentalidade superior para as massas. O pensador Walter Benjamin via essa mesma função para o cinema, que deveria não apenas entreter, mas também produzir uma mentalidade crítica. O uso do longa-metragem e do curta-metragem já é de conhecimento dos professores para utilidade em sala de aula. Mas a capacidade de tocar o aluno com o filme poderia ser visto com um olhar fenomenológico.

A inserção do outro em um mundo diferente já foi visto logo acima. O filme também tem uma magia com seu expectador, pois não estamos mais sentados a frente da tela, olhando para esse filme, mas sim vivenciando a história. Quando vemos um filme, nós nos conectamos através de nossos olhos a uma nova narração da vida, e podemos com isso, conceber o outro: sua visão, suas emoções e suas memórias.

Através de histórias complexas, poderemos envolver assuntos ligados diretamente com a filosofia. Podemos ver isso através da interpretação pessoal do personagem principal, que pode ser tratada pelo aluno como uma interpretação absoluta na história. Com o filme,

poderemos conceber todas as facetas da história, e mostrar a complexidade e a integralidade de uma narração. Dependendo do filme, muitas outras coisas podem e devem ser tratadas, dependendo de como o professor encaminha sua aula. Toda essa explicação das utilidades dos filmes não é nova, mas podemos contemplar essa metodologia mais sinceramente.

Os alunos têm á sua volta filmes atualizados, que utilizam de uma gama enorme de efeitos, assim como de linguagem. A maioria são produções vindas diretamente dos Estados Unidos da America, e trazem a linguagem da cultura americana.3 Podemos com isso perguntar: quais são as diferenças mais gritantes quando estamos sentados calmamente em nossos sofás, com uma boa pipoca e chimarrão nas mãos? Digo que a vida que passa pelo filme não é a mesma vida que temos na nossa própria cultura.

Isto poderia ser um início para a visão crítica e fenomenológica do aluno. No decorrer das aulas, poderemos fazer paralelos com filmes antigos, mostrando como a mudança de uma cultura poderá mudar diretamente o conhecimento de uma sociedade, assim como a própria linguagem. Colocar em paralelo a obra Metrópolis, de 1927, com Eu, Robô, de 2004, possibilita uma contemplação da mudança de paradigmas que a sociedade viveu entre os 77 anos entre estes dois filmes.

O filme apenas mostra um novo, uma nova forma de ver nosso ser. A principal dificuldade de usar essa metodologia reside no fato do tempo. O tempo em sala de aula é escasso, senão ínfimo, para um trabalho usando filmes, já que a maioria destes filmes têm uma duração de 90 á 120 minutos. Uma aula tem o tempo de 50 minutos.

Mas podemos usar formas diferentes de apresentar eles. Hoje, o professor poderá selecionar partes de um determinado filme, e passar para seus alunos, utilizando para isso programas disponíveis gratuitamente na internet. Selecionando pequenas partículas especificas, nós delimitamos o tempo, e buscamos dialogar profundamente sobre esta parte de forma complexa com os alunos. Os filmes Metrópolis e Eu, Robô poderão ser demonstrados desta forma, em vez de ser colocado integralmente aos alunos.

Um exemplo mais prático. Um dos últimos filmes que vi atualmente é Sociedade dos

Poetas Mortos, de Peter Weir, feito em 1989. É um filme antigo, devo admitir. Tenho o

costume de ver filmes antigos mais vezes do que os novos. Acho que é natural quando chegamos perto dos 30 anos de vida. A idade sempre traz a nostalgia. Pois bem, em um

3 Não que apenas os filmes norte americanos nos mostrem outra cultura, mas sim que todos os filmes a qual

estamos sendo apresentados contém uma cultura diferente daquela que nos rodeia. Os filmes indianos, filmes orientais, até filmes brasileiros nos mostram um diferente, pois aquilo que nos toca é justamente essa estranheza da história, nos cativando para aquilo que está passando pelas imagens.

determinado momento do filme, todos os alunos se encontram no pátio da escola, e há um dialogo interessante.

O professor Jonh Keating fala a seus alunos

“– Não vou dar notas. Apenas dêem uma volta. Isso!”

Os três alunos caminham cadenciadamente, formando uma marcha ao seu final, onde todos aqueles que estavam observando começam a bater palmas e dar risadas abafadas.

“– Obrigados senhores. Se notaram, todos começaram com seu próprio passo. O senhor Pitts, calmamente, sabia que chegaria lá. O senhor Cameron pensou: ‘Está certo? Talvez esteja, talvez não.’ O senhor Overstreet, conduzido por força mais primitiva...”

Começou a caminhar imitando esse aluno. “– Eu não os trouxe aqui para ridicularizá-los,

mas para ilustrar a conformidade, a dificuldade de manter suas crenças diante dos outros.”

Dirigindo para o restante dos alunos, exclama: “– Se pensaram: ‘Eu teria andado diferente’,

por que bateram as mãos? Todos precisamos de aceitação. Mas acreditem que suas crenças são únicas, mesmos que outros as achem estranhas e que o rebanho diga ‘Meeeeedíocre’!”

Este exemplo poderá ser incrível quando procuramos associar o pensamento nietzcheano em sala de aula. A moral do rebanho tem agora uma explicação, uma exemplificação vinda diretamente de filmes, onde o aluno terá uma identificação com os alunos do filme. Vários filmes poderão utilizar-se deste mesmo método, criando vínculos dos alunos com o professor, pois cada um mostra o gosto particular para á todos.

Mas filmes que não tenham essa visão complexa, como poderão ser usados? Não podemos conceber que existam filmes complexos e filmes simples, pois isso é julgar, coisa que, como professores, não poderemos fazer. Vamos a um exemplo: o filme Shrek poderá ser uma ponte bem interessante com a obra A Origem das Desigualdades entre os Homens, de Jean-Jacques Rousseau. Como isso, você, voraz leitor, perguntará? Nesta obra, Rousseau coloca no homem duas formas de desigualdades, uma física e outra moral. No filme citado, a linha base de toda a narrativa trata de como Shrek é desprezado na sociedade nestes dois modelos, pois esta sociedade tem um preconceito quando julga o personagem principal como ignorante por ser simplesmente diferente. A discussão em aula poderá ser complexa, liberando a capacidade crítica tão bem quanto uma aula expositiva, e o aluno sentirá compelido a buscar a obra clássica para sanar suas duvidas.

Quantos filmes nós poderemos, como professores, utilizar neste método simples, pois a fenomenologia não impõe algo, mas determina que usemos nossa vivência, nosso sentir, como processo para a produção do conhecimento.