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4.8 Alternativas aos financiamentos do FMI

4.8.5 Cláusulas de ação coletiva

Sugerir que o FMI não deveria recorrer a pacotes financeiros emergências é algo que é facilmente proposto. Porém, isso só ocorrerá com facilidade em casos específicos, onde não haja alternativas para solucionar as crises financeiras em países emergentes. De acordo com Eichengreen e Mody (2000), esse seria o momento no qual as “cláusulas de ação coletiva” entrariam em cena. Cláusulas de ação coletiva são projetadas para facilitar a reestruturação de dívidas com a mínima intervenção das instituições financeiras internacionais, isto é, com a participação máxima dos credores e devedores envolvidos na dívida83.

Cláusulas como essas já existem em títulos da dívida emitidos pelo Reino Unido, que servem para proteger devedores soberanos da ameaça de ações legais que perturbem o processo de reestruturações. Esses títulos exigem que uma massa crítica de investidores concorde antes de dar início a um litígio, limitando, assim, a capacidade de alguns credores atrapalharem a reestruturação. As cláusulas de ação coletiva atenuam também o problema que se coloca quando alguns resistem a um acordo, pois especificam regras e procedimentos de

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Cláusulas de ação coletiva foram sugeridas pelo G-10 após a crise mexicana e foi paulatinamente recomenda em diversos relatórios e declarações do G-7 e G-22. O G-7 também reforçou o assunto no seu Work Program para reformar o sistema financeiro internacional (EICHENGREEN e MODY, 2000).

votação, que permitem a uma maioria de credores imporem os termos de um acordo a uma minoria discordante.

Essas cláusulas especificam procedimentos para selecionar os representantes dos detentores de títulos de dívidas nas negociações e para enumerar as suas responsabilidades. Esses representantes comunicam aos detentores de títulos os termos da negociação. Além disso, as cláusulas permitem que tais detentores convoquem uma assembléia para indicar um representante para negociar com o devedor e aprovar resoluções extraordinárias, para solucionar questões de acordos de moratória ou qualquer modificação a ser feita no contrato original84.

Uma das vantagens que as cláusulas de ação coletiva apresentam é que elas forçam a participação de credores litigantes e permitem que Governos com problemas transitórios declarem uma suspensão de pagamentos, sem se expor a ações legais que atrapalhariam o processo. Para Eichengreen (2003), se as cláusulas de ações coletivas fossem adotadas mais amplamente, não haveria necessidade de modificar leis nacionais ou internacionais para realizar as exigências do FMI ou a algum tribunal independente.

O argumento de que cláusulas de ação coletiva sejam preferíveis a permissões de saída como mecanismo para obrigar os credores a manter o compromisso é que essas cláusulas de ação coletiva são muito mais transparentes. Assim, as precificações vão se tornando muito mais fáceis de fazer, na medida em que as cláusulas se tornam mais transparentes e previsíveis, minimizando, assim, os custos de crédito.

O movimento para tornar as cláusulas mais utilizadas não está sendo forte o necessário por causa de algumas razões. O risco moral aparece, neste caso, pelo fato de que essa ferramenta facilita as reestruturações que são muito indesejáveis. Os tomadores de créditos são incentivados a fugir de suas dívidas, assim, os custos de financiamento são automaticamente aumentados, formando barreiras de acesso ao mercado.

Outra razão seria a assimetria de informação que leva à seleção adversa. Os credores podem classificar os emprestadores, separando os emprestadores ruins e pedir a inclusão de cláusulas de ação coletiva em seus contratos de financiamento. Assim, os credores colocarão um prêmio mais alto a esses emprestadores pelo fato de que eles terão mais chances de fazer um ajuste para a reestruturação.

84 Infelizmente, reestruturações de dívidas, por meio do mercado, são extremamente difíceis de realizar quando os títulos em questão são emitidos com base nas leis americanas. As maiorias dos títulos embasados nas leis americanas possuem uma falta cláusulas coletivas para desencorajar investidores “mavericks” a recorrem a processos judiciais e outras maneiras que dificultam os acordos (EICHENGREEN e MODY, 2000).

Entretanto, há muita conversa e pouca ação nessa área. Os emitentes receiam que as cláusulas de ação coletiva aumentem os custos diretos aos emprestadores. Eles acreditam que alternativas de reestruturação, nas quais os devedores poderiam sair sem prejuízos seriam mais fáceis. Porém, cláusulas que facilitam uma reestruturação ordenada num evento de dificuldades excepcionais, poderiam render aos mercados emergentes uma maior atratividade minimizando disputas amargas, negociações difíceis quando os serviços de pagamentos das dívidas não estão sendo cumpridos.

Os resultados apresentados num estudo realizado com mais de 2000 títulos emitidos pelos devedores dos mercados emergentes entre 1991 – 1998 mostraram que as cláusulas de ação coletiva aumentam os custos para os devedores e para os emitentes com uma baixa classificação; porém, para os emitentes com alta classificação, esses custos são reduzidos. Os emitentes com crédito (credit-worthy), de fato, se beneficiam por possuírem a capacidade de se reestruturar ordenadamente num evento com circunstâncias excepcionais. Para os devedores sem crédito (less credit-worthy), os benefícios são contrabalanceados pelo surgimento de risco moral e risco de default, associados à presença de cláusulas que facilitam a renegociação (EICHENGREEN e MODY, 2000). Portanto, se a meta é fortalecer a arquitetura do sistema financeiro internacional, incentivando os investidores a generosamente premiar os devedores credit-worthy (aptos a tomar empréstimos) e penalizar os menos, então, a adoção para o maior uso de cláusulas de ação coletiva seria o caminho certo a seguir.

Se a introdução de cláusulas de ação coletiva fosse generalizada, se todos os contratos de empréstimos fossem obrigados a incluir tais provisões, haveria um melhor equilíbrio entre os direitos de credores e a necessidade de facilitar uma reestruturação ordenada. Assim sendo, não haveria a necessidade de transferir, do Governo para o FMI, o poder de iniciar a suspensão de pagamento. Como também não haveria a necessidade de alguma entidade, como o FMI, a adjudicar disputas entre devedores e credores, coisa que os emissores e investidores de títulos da dívida com cláusulas de ação coletiva, emitidos no Reino Unido, têm sido capazes de fazer perfeitamente sozinhos.