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Eichengreen (2003) demonstra que muitos concordam que o gerenciamento da taxa de câmbio é o problema mais grave da década de 1990, porém, há muito menos acordos sobre o que fazer a respeito. No momento não há consenso sobre qual seja o regime cambial preferível em geral ou mesmo em países específicos73. O problema maior está em regimes nos quais o Governo fixa o câmbio, mas altera periodicamente essa taxa fixa (soft pegs); a solução seria de ter um câmbio fixo ou deixar a moeda flutuar livremente. O problema apontado com o soft pegs é que as autoridades não conseguem assumir a política com credibilidade e mantêm os outros objetivos da política econômica subordinados à defesa da moeda. Como vem ocorrendo, a defesa geralmente cai e o câmbio acaba se desvalorizando quase que imediatamente, e a recessão que vem a seguir fere principalmente os mercados emergentes74.

Um dos fatos marcantes da década de 1990 é que quase todas as crises financeiras, de fato, apresentaram um regime cambial fixado: isso se aplica a todas as crises financeiras em países em desenvolvimento neste período, exceto a crise brasileira de 2002, que foi causada pelo temor de que, se Luis Inácio Lula da Silva fosse eleito (FISCHER, 2006). Fixando o câmbio ou protegendo a taxa é como se fosse fazer um convite ao setor privado para apostar contra as autoridades se a conta de capitais é aberta.

73 Em 1975, cerca de 90% dos países em desenvolvimento possuíam um câmbio no sistema de pegs, ou seja, esses países representavam 80% do PIB mundial dos países em desenvolvimento, e somente 10% possuíam um regime de câmbio flexível. Porém, em 1997, a porcentagem dos que usavam o sistema de pegs caiu para cerca de 50% e sua participação no PIB mundial dos países em desenvolvimento caiu para 25%. Entre os maiores países emergentes que mantiveram uma taxa fixa de câmbio, só restaram dois: Argentina e Hong Kong (GOLDSTEIN, 1999).

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A década de 1990 apresenta diversos eventos, nos quais a desvalorização, quase que imediata, da moeda, que abalou a economia dos países em questão: a crise do Peso mexicano (1994-95), a desvalorização do Real brasileiro (1998) e a crise da Rússia (1998).

Fischer (2006) também aponta que regimes flexíveis (flutuantes) fizeram mais diferença para o sistema financeiro internacional do que qualquer outra mudança. Este regime, para o autor, tira um grande fator de risco. Taxas cambiais, nas quais Bancos Centrais não intervêm, apresentam a vantagem que, se a pressão sobe, o Governo pode permitir que o câmbio se ajuste, sem ter que subordinar e transformar toda a política econômica. O objetivo disso é evitar que o mercado tenha algum alvo a seguir, a fim de reduzir as probabilidades de ocorrer um ataque especulativo à moeda. Entretanto, se os mercados não são informados em que ponto as autoridades vão intervir para evitar que a taxa de câmbio oscile ainda mais, eles não podem tomar posições que antecipem a intervenção.

Para evitar a volatilidade da moeda, comum para o câmbio flutuante e livre, é necessário utilizar o sistema de metas de inflação que substituirá as regras baseadas na taxa de câmbio. Neste caso, se as autoridades explicam como pretendem modificar as suas políticas em função dos diferentes choques, a incerteza do mercado será muito mais limitada, em comparação as metas de câmbio. Assim, um regime de metas de inflação tem quatro elementos: um compromisso institucional com a estabilidade de preços como objetivo fundamental da política; mecanismos que atribuem ao Banco Central a responsabilidade por atingir suas metas de política monetária; o anuncio público de metas de inflação; e uma política de comunicar ao público e aos mercados as razões por trás das decisões tomadas pelo Banco Central. O importante é que estabelecer esses compromissos, o Banco Central a independência necessária para perseguir as metas.

Porém, para os mercados emergentes, há quatro argumentos pelos quais a maior flexibilidade cambial apoiada por uma política de metas de inflação não é desejável e assim seja até inferior a qualquer tipo de câmbio fixo75.

(1) “Muitos países em desenvolvimento têm desequilíbrios fiscais crônicos cuja presença lhes removerá a capacidade de comprometer-se com a inflação baixa. Além disso, muitos Bancos Centrais não têm independência. Nessas condições, as metas de inflação não terão credibilidade.”

75 Goldstein (1999) aponta quatro vulnerabilidades que são associadas a um regime de câmbio fixo: (1) há uma tendência para subestimar o risco cambial e de evitar o hedging contra a moeda durante o regime de câmbio fixo;(2) a segunda vulnerabilidade ocorre em programas de estabilizações, baseado na taxa de câmbio quando a taxa nominal se torna a âncora do esforço de eliminar a inflação de um dado país. A inflação geralmente cai, porém, o país perde competitividade com seus parceiros econômicos; (3) quando uma taxa de câmbio fixa se torna supervalorizada, não há nenhuma maneira fácil para transferir-se para um regime mais flexível. Se o mercado não está ameaçando a desvalorizar a moeda, não há nenhum apoio político para fazê-lo. Porém, quando a moeda começa a ser desvalorizada, as autoridades são obrigadas a negar que alguma coisa está acontecendo e, quando o problema está claro, já é tarde demais. (4) confrontação entre o mercado global de capitais e economias relativamente pequenas que não conseguem defender uma taxa pegged com uma alta taxa de juros durante um longo período de tempo.

(2) “Um regime de metas de inflação não oferecem mais flexibilidade no câmbio do que um regime de câmbio fixo.”

(3) “O fato de que os passivos dos bancos, das famílias e das firmas sejam denominados em dólares elimina para, muitos mercados emergentes, as vantagens de uma maior flexibilidade cambial.”

(4) “Metas de inflação contribuem menos para o aprofundamento e o

desenvolvimento financeiro do que uma âncora

cambial.”(EICHENGREEN, 2003)

Outra perspectiva sobre o assunto de regimes cambias é que, independente do que as economias emergentes decidem sobre seus próprios arranjos cambias, não haverá uma estabilidade sistemática sem alguma reforma do regime cambial do G-376. As taxas cambiais do G-3 desencorajam o comércio internacional e investimentos, e resultou em custosas operações de hedging. Além disso, a ausência de metas de câmbio também impediu a “especulação estabilizadora” e uma coordenação de políticas econômicas mais eficazes77.

Os debates sobre regimes cambiais já duram séculos. Os resultados desses debates são definidos como “um pendulo que balança (a cada década ou duas) entre dois pólos de moedas ficas e flutuantes” (GOLDSTEIN ET AL, 1999, p. 37)78. De acordo com esses autores, a crise

asiática empurrou o pêndulo no mundo emergente simultaneamente para ambos os lados, isto é, em direção a maior flexibilidade, e para casos mais polares de taxas fixas como currency

boards79.

Para o Council on Foreign Relations, reduzir a vulnerabilidade às crises financeiras e melhorar o desempenho econômico através de políticas cambiais em economias emergentes, é necessário que:

Através do Article IV (cláusula IV) e negociações, o FMI deve aconselhar os países membros a não adotarem regimes cambias baseados em um peg ajustável e também deve colocar limites rígidos em pacotes financeiros que defendem regimes de taxas cambias fixas que estão sobrevalorizadas;

76 Críticos do regime cambial flutuante dos países do G-3 afirmam que as grandes oscilações do yen/dólar (50% para mais) durante a década de 1990 manipularam a competitividade dos países asiáticos que sofreram com a crise, a tal ponto que foram essas que contribuíram diretamente com o ciclo do boom e bust na Ásia (Goldstein, 1999).

77 A oposição deste ponto de vista afirma que, orientando o regime cambial do G-3, os resultados seriam inferiores: crescimentos econômicos mais baixos e problemas na área de inflação.

78 Tradução livre do autor. 79

Currency Board é uma autoridade monetária que é necessária para manter uma taxa cambial em relação a uma moeda estrangeira. Esta política necessita que os objetivos do Banco Central sejam subordinados a uma meta cambial.

• O FMI deve incentivar economias emergentes a adotarem regimes cambiais flutuantes e administrados (managed floating);

O FMI deve apoiar a criação de currency boards para circunstâncias nas quais arranjos cambiais alternativos não são o suficiente para restaurarem a disciplina de políticas monetárias; e

• No longo-prazo, economias emergentes devem considerar os benefícios e custos de reduzir a vulnerabilidades à crises ao adotar uma reserva cambial de uma moeda estrangeira (dolarização da moeda) (GOLDSTEIN, et al, 1999, p. 65).

Portanto, mesmo as metas de inflação sendo muito atraentes para mercados emergentes com renda baixa, elas são só factíveis apenas se os mercados de ativos financeiros denominados em moeda doméstica atingiram certo grau de desenvolvimento; mas esses mercados financeiros, só muito lentamente, alcançarão liquidez e profundidade se as autoridades transferiram-se rápido demais para um regime de metas de inflação. Eichengreen (2003) afirma que os países de renda mais baixa talvez devessem começar com uma fase na qual a taxa de câmbio seja fixada. Com a manutenção de controles de capitais, aumenta a probabilidade de que o regime de câmbio fixo tenha êxito, mas assim, seus mercados financeiros só se desenvolverão lentamente80. A alternativa seria ter um câmbio flutuante, mas com a volatilidade, os residentes do país podem ser incentivados a manter seus ativos em moeda estrangeira; assim, esses mercados só atingirão um bom nível de liquidez com muita lentidão. Outra alternativa seria estabelecer um regime de conselho da moeda sempre disposto a trocar a moeda doméstica por outra moeda estrangeira a uma taxa fixada, ou reconhecer uma moeda estrangeira como a moeda legal do país. Mas esses países viverão com uma incerteza sobre o futuro financeiro. A decisão sobre a escolha certa do regime cambial correto ainda é um assunto que o debate sobre o futuro da arquitetura financeira internacional ainda não chegou a um consenso.

As Cláusulas de Acordo do FMI (IMF’s Articles of Agreement) fornecem a países membros diversas alternativas para a escolha do regime cambial certo. Porém, como afirma Goldstein (2007):

80 Os instrumentos chaves para defender taxas de câmbios fixadas são a intervenção pela parte do mercado e taxas de juros elevadas. Após a deterioração das reservas internacionais, as taxas de juros elevadas se mantêm como a principal ferramenta de defesa. Porém, há um limite de tempo que economias emergentes conseguem manter as taxas de juros elevadíssimas.

But experience strongly suggests that some of those choices are wiser than others. The IMF and G-7 countries can influence the exchange rate regime choices of developing countries- not least by financial support that they are prepared to extend to support adjustable peg exchange rate regimes during periods of market stress. Global crisis prevention will not be able to gain more traction until the IMF and the G-7 are prepared to say “no” more often to defending overvalued fixed rates (GOLDSTEIN, 2007, p. 37).