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Capítulo 1 Marco Teórico

1.3. Teoria de Jogos

1.3.3. Classes de jogos

A Teoria de Jogos se estrutura em duas grandes classes; os jogos cooperativos e os não cooperativos. Suas diferenças residem nos acordos vinculantes entre os indivíduos envolvidos numa situação e no tratamento que receberão.

A primeira estrutura fundamental para o estudo da TJ é a dos jogos cooperativos ou coalizacionais. Nessa estrutura se supõe que os jogadores dispõem de mecanismos que lhes permitam firmar acordos vinculantes, e se assume também que se podem obter algum beneficio de tal cooperação. O interesse radica então no resultado que os jogadores podem obter de forma individual e de forma conjunta, ainda que não se indique a forma pela qual se obterá o dito resultado. Concretamente, a questão central neste tipo de jogo está na definição de conceitos de solução, que indiquem como repartir, entre os jogadores, o ganho gerado pela cooperação entre todos eles. Por suposto, sob uma estrutura como a dos jogos cooperativos, um acordo de cooperação pode não ser a “solução”, de maneira que os agentes devem ter uma estrutura de informação sobre certa valoração, a priori, das coalizões nesta valoração. Através da função característica (que atribuirá a cada coalizão o ganho que pode obter se seus membros decidem cooperar), é que se reconhece qual coalizão é a mais “valiosa” e qual não é. (Peleg, 1985), Owen (1995) e Moura (2003).

Dentro dos jogos cooperativos, distinguimos as seguintes classes:

a) Jogos cooperativos com utilidade transferível (TU) - Supor que a utilidade é transferível, quer dizer que os pagos de cada coalizão podem se distribuir de qualquer

forma entre seus membros, e que o mais importante não é o fato de como se pode repartir, senão o que se pode repartir. Daí o nome utilidade transferível. (Peleg, 1985).

Exemplo - Suponha que três jogadores, A, B e C, tenham que repartir entre eles $100. O sistema de reparto tem que ser uma das quatro possíveis coalizões vencedoras: ABC, AB, BC e AC, mas há infinitas formas de repartir os pagos entre os três jogadores.

b) Jogos cooperativos sem utilidade transferível (NTU) – Supor que a utilidade é não transferível é o mesmo que dizer que o pago de cada coalizão não se pode distribuir de qualquer forma entre seus membros. Quando se renuncia a utilidade transferível, já não resulta possível descrever os pagos de que dispõe uma coalizão em particular, como a soma da utilidade que esse grupo poderia obter, cabendo então, uma nova reformulação da função característica (Peleg, 1985).

Exemplo – Suponha que três jogadores, A, B e C, tenham que repartir entre eles uma casa. Acontece que este reparto não é possível, uma vez que os jogadores se veem na obrigação de renunciar a utilidade transferível para obtenção de seus pagos individualmente. A utilidade de uma sala ou de uma cozinha para o sujeito A, por exemplo, não é a mesma que para B, daí que o objeto em disputa não pode ser dividido e, portanto, não pode ser calculada a utilidade individual.

A segunda estrutura fundamental para a TJ (a mais dominante dentro do pensamento econômico) é a dos jogos não cooperativos, na qual, basicamente, temos um conjunto de jogadores, cada um com umas estratégias a sua disposição, e umas retribuições de pagos que recebem por levar adiante tais estratégias. A característica “não cooperativa” está na maneira de como elegem e no que sabem dos outros jogadores quando estes elegem também. Em geral, se supõe que os indivíduos tomam suas decisões independentemente uns dos outros, ainda que conhecendo seus oponentes e as possíveis estratégias que estes têm a sua disposição, isto é, são indivíduos egoístas, mas que tratam de prever o que os outros agentes farão. Nesta estrutura de análise, os agentes não alcançam nenhum nível de cooperação. Peleg, (1985), Owen (1995) e Moura (2003).

Vejamos o seguinte exemplo, ele é bem ilustrativo do modus operandi do tipo de modelo que acabamos de descrever, chama-se o dilema do prisioneiro, o qual foi formalizado e analisado

pela primeira vez por Tucker, em 1950, e é possivelmente o jogo mais conhecido e estudado na TJ. Baseado nele foram elaboradas outras tantas variações, muitas delas com base na repetição do jogo.

Dilema do Prisioneiro: A história deste jogo se passa como segue: Dois delinquentes são detidos e encarcerados em celas isoladas, sem que haja comunicação entre eles. O delegado suspeita que eles participaram do roubo do banco, delito cuja pena é de dez anos de cárcere, mas não há provas que os incriminem. Somente tem provas e pode culpá-los de um delito menor, porte ilegal de arma de fogo, cujo castigo é de dois anos de cárcere. O delegado promete a cada um que reduzirá sua condenação, se algum deles proporcionar as provas para culpar o outro do roubo. A situação se resume na seguinte matriz de pagos. A estratégia "lealdade" consiste em permanecer em silêncio e não proporcionar provas para acusar ao companheiro. Chamaremos de "traição" a outra estratégia.

Fonte: Adaptado de Owen (1995)

Ambos têm duas alternativas: cooperar (ser leal) ou não cooperar (trair). Eles sabem que se nenhum confessa, cada um irá à prisão por dois anos (pena pelo porte ilegal de arma). Mas, se um dos dois trair e o outro não, então o que traiu ficará livre e o que foi traído receberá a condenarão de 10 anos. Se ambos decidem trair mutuamente, os dois irão à prisão por oito anos.

A pergunta natural é: que farão os detidos? Cooperarão entre si (não confessarão) ou um entrega ao outro (confessarão)? Alguém desprevenido que esteja observando este jogo poderia pensar que os dois jogadores cooperarão (não confessarão), posto que nesse caso, ambos obteriam o menor castigo possível. Entretanto, a estrutura não cooperativa do problema faz que este acordo não seja pensado, se pactuarem a não confissão, ambos teriam incentivos particulares para rompê-lo, pois deixando ao outro em cumprimento do pacto de não confessar, e o outro

Anos de prisão Preso Y Lealdade Traição Lealdade (2, 2) (10, 0) Preso X Traição (0, 10) (8, 8)

confessando, o que rompe o pacto obtém a liberdade enquanto ao outro, o condenarão a 10 anos. E, similarmente, estudando as outras três possibilidades do jogo (ou seja, (l, t), (t, t), (t, 1)) observamos que o único acordo possível (que significa que nenhum dos dois queira romper o pacto unilateralmente porque perderia) é (t, t). Em definitivo, a previsão do que ocorrerá no jogo é que ambos confessem e permaneçam na cadeia por oito anos, determinando assim o equilíbrio de Nash (8,8).

A conclusão em situações similares a esta (muito comuns na vida cotidiana) é que a concorrência egoísta (Elster, 1989, 1995 e 2003) pode conduzir a estados que são inferiores (em termos de benefício pessoal e social) aos estados cooperativos, mas que estes últimos não poderão se implementar, a menos que existam reforços externos (contratos firmados por lei) que obriguem as partes a cumprir com o acordo de cooperação.

Esta é a ideia essencial de Nash ao definir o conceito de equilíbrio de um jogo, que é um acordo que nenhuma das partes pode romper a discrição sem perder. Quer dizer, se alguém quiser romper o pacto e o fizer unilateralmente, se arriscaria a ganhar por baixo do que houvesse ganhado dentro do pacto. Assim, ambos se delatariam mutuamente e cada um deles passaria 8 anos na prisão. É o único equilíbrio de Nash do jogo. Observa-se que existe uma forma de atuar dos dois jogadores, que melhora a ambos (que nenhum deles delate ao outro), mas, como ambos ganham se desviam unilateralmente dela, num contexto puramente não cooperativo, em que os acordos vinculantes são inviáveis, esse perfil de estratégias construtivo não ocorrerá na prática.

Evidentemente, se os prisioneiros tivessem previsto de antemão a possibilidade de serem capturados e houvessem estabelecido algum tipo de acordo, o jogo se converteria em cooperativo, e ambos se vinculariam ao não delatar o contrário e acabariam passando dois anos na prisão. Dito de outra forma, a cooperação favorece os interesses dos agentes, de forma individual e de forma conjunta.

Não obstante, podemos dizer que os dois enfoques, cooperativos e não cooperativos podem, e incluso devem, ser combinados. Neste sentido, Nash assegura que a TJ cooperativa e não cooperativa são complementares, já que cada uma ajuda a justificar e clarificar a outra. A esta combinação se denomina Programa de Nash. O Programa Nash busca a possibilidade da unificação teórica, ou seja, a obtenção de equilíbrios nos acordos vinculantes.