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Classificação dos actos administrativos quanto ao conteúdo

No documento URI: DOI: (páginas 179-183)

V. A organização da Administração Pública Portuguesa

2. Classificação dos actos administrativos e demais actos jurídicos da Administraçãoda Administração

2.3. Classificação dos actos administrativos quanto ao conteúdo

Tendo em conta o conteúdo, isto é, os. efeitos. que. visam. produzir.

na. esfera. do. destinatário (independentemente agora dos efeitos que produzam relativamente a terceiros), podemos distinguir quatro tipos de actos:

I) Os actos desfavoráveis (que provocam situações de desvantagem para o respectivo destinatário):

1) actos.ablatórios.– suprimem, comprimem ou retiram direitos ou faculdades (como a expropriação de um terreno, a apreensão da carta de condução, o encerramento de um estabelecimento ou a resolução de um contrato administrativo);

2) actos.impositivos – ordens, sejam comandos, que impõem obri‑

gações de conteúdo positivo – de fazer (demolir um prédio), de dar (liquidação de taxa), ou de suportar (inspecção policial) –, ou proibições, que têm um conteúdo negativo, restringindo a liberdade (proibição de circular, interdição de venda de me‑

dicamento);

3) indeferimentos.– recusa, pelo órgão competente, total ou parcial, da prática de acto favorável ou da produção de efeitos jurídicos requerida pelo interessado.

II) Os actos favoráveis (que desencadeiam benefícios para os desti‑

natários, particulares ou públicos):

1) Concessões e outros actos que conferem.ou.ampliam.direitos ou poderes."administrativos" ou extinguem.obrigações

As concessões podem ser translativas, se transmitem direitos ou poderes (já) existentes na titularidade da Administração concedente, ou consti‑

tutivas, se criam "ex novo" direitos ou poderes de que a Administração não pode ser titular, mas que só ela pode criar em favor dos particula‑

res (implicando, em regra, uma restrição ou compressão dos próprios poderes públicos).

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Os casos típicos da concessão translativa são as concessões.de.serviço.

público e as concessões de poderes.públicos.(por exemplo, de acreditação e certificação); por sua vez, são hipóteses frequentes de concessão cons‑

titutiva as concessões. de. uso. privativo. do. domínio. público (esplanadas, exploração de cais portuários, gestão de parques de estacionamento, utilização do subsolo para instalação de redes) – embora actualmente as concessões, pelo menos as mais complexas, operem quase sempre pela via do contrato e não através de actos administrativos individuais e concretos.

Como vimos, a delegação de poderes entre órgãos administrativos tem a natureza de uma concessão.constitutiva.

Para além das concessões, há outros actos que conferem direitos, como, por exemplo, a promessa (da prática de um acto favorável) e a adjudicação (de uma posição contratual).

Também são actos favoráveis os actos que ampliam a esfera jurídica do destinatário, ao terem como efeito a extinção ou limitação de deveres, ónus e sujeições perante a Administração, incluindo os actos de renúncia.

administrativa.

2) As.autorizações em sentido amplo, que, por iniciativa ou candidatura do interessado, visam.remover.um.limite.imposto.pela.lei ao exercício de uma actividade fora.do.domínio.administrativo.da.entidade.autorizante (isto é, quando está em causa o exercício de uma actividade da esfera.própria.do.

destinatário da autorização, seja um particular ou outro órgão administrativo).

Dentro desta categoria geral, podemos ainda distinguir:

a) Autorizações.nas.relações.entre.a.Administração.e.os.particulares (na sequência de normas legais que limitam as liberdades, com maior ou menor intensidade, fazendo depender a actuação do particular de uma intervenção administrativa favorável):

i) dispensas, que removem, a título excepcional, no caso concreto (por isso não se confundem com as isenções, que são gerais e abstractas), um dever especial, relativo a uma actividade em regra estritamente.proibida.ou.imposta por lei, à qual não corres‑

ponde um direito da Administração (por exemplo, a autorização

excepcional para construção em zona de reserva agrícola – RAN ou de reserva ecológica ‑ REN);

ii) licenças (autorizações constitutivas), que constituem direitos sub‑

jectivos em favor dos particulares em áreas de actuação sujeitas a proibição relativa (preventiva) pela lei, uma vez acautelada no caso concreto a não lesão do interesse que justificou a proibição legal – trata ‑se de actividades privadas que também podem ser de interesse público e que a Administração deva promover ou fomentar (licenças para desenvolvimento de actividade indus‑

trial ou para o funcionamento de estações emissoras de rádio);

iii) autorizações propriamente ditas (autorizações permissivas), que permitem o exercício pelos particulares da actividade correspon‑

dente a um direito.subjectivo.pré.‑existente, apenas condicionado pela lei a uma intervenção administrativa, em regra vinculada – estas autorizações visam remover os limites impostos pela lei ao exercício do direito pelo particular (exemplo, a autorização para sair do país, a habilitação para o exercício de uma profis‑

são comum, a autorização do trabalhador para acumulação de funções públicas e privadas);

iv) reconhecimentos, enquanto permissões de exercício de actividade por particulares já autorizados por outra autoridade, designada‑

mente de outro Estado – por exemplo, os reconhecimentos para actividades de prestação de serviços, ao abrigo da Directiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro – “Directiva ‑ Serviços” (v. também o reconhecimento de qualificações profissionais, ao abrigo da Directiva 2005/36/

CE do Parlamento Europeu e do Conselho).

Deve ter ‑se em conta que nem sempre a lei utiliza os conceitos doutrinais adequados ao regime que estabelece, bem como a existência de zonas de fronteira entre estas categorias de actos – por exemplo, as licenças de uso e porte de arma situam ‑se na fronteira entre as dispensas e as licenças; as licenças de construção são para alguns autores autorizações permissivas, pressupondo que o direito de propriedade inclui a faculdade de construir.

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As designações legais dos actos permissivos do exercício de actividades também são variadas, utilizando ‑se, por exemplo, a “validação”, a “au‑

tenticação”, o “registo” e a “certificação” de capacidades e competências.

Actualmente, na linha de uma orientação europeia, a tendência para a simplificação administrativa inclui uma política (iniciativa “licenciamento zero”), que substitui as autorizações, designadamente as autorizações per‑

missivas, por “declarações”.ou “comunicações.prévias” do interessado à Administração de que preenche os pressupostos legais e regulamentares para exercício de uma determinada actividade ou para uma determina‑

da actuação. Os efeitos jurídicos produzem ‑se se não houver oposição do órgão competente (“rejeição”) ou se ela não se verificar dentro de determinado prazo (está prevista, por exemplo, para certas operações urbanísticas) – por vezes, a lei prevê um reforço da fiscalização posterior, com sanções mais pesadas (cf. o Decreto ‑Lei n.º 48/2011, de 1 de Abril, relativamente a diversas actividades económicas).

As comunicações prévias, com. prazo.ou. sem. prazo, dependem de previsão legal expressa e estão actualmente previstas no artigo 134.º do CPA, que estabelece o respectivo regime.

Importante é que, nas comunicações prévias com prazo, a ausência de pronúncia do órgão competente não dá origem a um acto de deferi‑

mento tácito, mas habilita o interessado a exercer a actividade pretendida (artigo 134.º, n.º 3).

b) Autorizações.nas.relações.entre.órgãos.administrativos:

i) autorizações.constitutivas.da.legitimação (distintas das delegações de competências), em que o órgão autorizante confere ao órgão autorizado a possibilidade de praticar num caso concreto um acto administrativo (ou um outro acto jurídico) da competência do destinatário (para cuja prática o órgão autorizado (já) é, em abstracto, competente);

ii) aprovações, que desencadeiam a eficácia do acto administrativo aprovado (normalmente, depois de este estar constituído), no qua‑

dro de um controlo preventivo externo, que pode ser de legalidade e também de mérito, conforme o disposto na lei nas respectivas relações interorgânicas.

III) Os actos relativos a "status"

São actos de eficácia instantânea, através dos quais se procede à.criação (sobretudo por admissões ‑ nomeação, matrícula, inscrição, internamento), à modificação (promoção, suspensão, transferência) ou à extinção (demis‑

são, expulsão, desvinculação, “alta” hospitalar) de estatutos, em regra, de estatutos pessoais (funcionário, militar, aluno, educando, internado, preso), mas também reais (classificação constitutiva, afectação ou desafectação de um bem do domínio público).

Deve ter ‑se em conta o carácter.objectivo.e.regulamentar do “estatuto”

(conjunto articulado de direitos e de deveres), que se destaca e torna inde‑

pendente relativamente aos actos concretos que o atribuem – resulta daí a possibilidade de modificação do status por via geral e abstracta, mesmo que tais modificações sejam desfavoráveis, não sendo possível, em princípio, invocar direitos adquiridos à aplicação das normas vigentes à data da admissão – salvo em casos excepcionais, quando a lei o determine (direito à irredutibilidade do salário) ou quando deva relevar o princípio da protecção da confiança legítima.

IV) Os actos secundários.ou.de.2.º.grau

São actos que visam produzir efeitos sobre um outro acto adminis‑

trativo anterior, que constitui o respectivo objecto (revogação, anulação, reforma, ratificação ‑sanação ou convalidação, conversão).

Não se devem confundir os actos secundários com os "actos contrários"

– estes não actuam sobre o acto, mas sobre a relação jurídica determinada pelo acto precedente, como acontece, por exemplo, com a demissão, rela‑

tivamente à nomeação do funcionário (é um acto que extingue um status), ou a reversão, relativamente ao acto de expropriação do imóvel (não se anula nem se revoga a declaração de utilidade pública expropriativa).

No documento URI: DOI: (páginas 179-183)