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Capítulo IV – Análise dos Dados Obtidos: Caracterização da Oferta e Procura

4.2. Principais Características Físicas

4.2.2. Climatologia e Rede Hidrográfica

O clima madeirense é influenciado por um conjunto de factores externos e regionais. Os externos relacionam-se com a localização geográfica da ilha, destacando- se: o efeito da corrente quente do Golfo; a latitude; os centros anticiclónicos e as depressões continentais centrados no Norte de África; as baixas pressões associadas ao fluxo zonal de oeste, com sistemas frontais associados; os efeitos da presença ou ausência do anticiclone dos Açores. De facto, o anticiclone dos Açores exerce uma influência decisiva na ilha condicionando os tipos de tempo. Qualquer variação na sua posição altera as condições atmosféricas no atlântico oriental, pois é responsável pelo transporte de ar tropical marítimo subsistente, actuando como barreira relativamente aos centros de baixa pressão do norte atlântico e aos ventos alísios, influenciando a direcção do vento, os níveis de nebulosidade e a ocorrência de aguaceiros (Prada, 2000; Figueira, 2009; Fernandes, 2009; Neves, 2010).

De uma maneira geral, o clima da ilha é ameno ao longo do ano, sendo caracterizado como um clima mediterrânico e temperado (Borges et al., 2008; SRA, 2014; Fernandes, 2009; Figueiredo, 2008), pois o verão é temperado e seco (em média a temperatura do mês mais quente ultrapassa os 22ºC) e o inverno é suave e húmido (existindo vários meses com temperaturas superiores a 10ºC) (Fernandes, 2009; SRA, 2014). A ilha apresenta uma regularidade térmica, devida ao efeito regulador do oceano, mantendo-se entre 8º/9ºC e 19ºC ao longo do ano. Também existem vários dias sem ocorrência de precipitação, sendo a média anual de 1 628mm. A humidade relativa raramente ultrapassa 75% no inverno, mas desce nos meses mais quentes atingindo os 60% (mínimo registado na estação do Areeiro) (SRA, 2014). Em relação ao vento a direcção predominante é de NE, embora se registem também ventos de N, principalmente no inverno, e raramente de S ou de E (Figueira, 2009; Prada, 2000; SRA, 2003). Note-se que esta descrição é um pouco simplista, não destacando a grande variedade de microclimas existentes na ilha (Borges et al., 2008; Fernandes, 2009). De entre os factores responsáveis pelos micro-climas realça-se a vegetação, embora seja o relevo e a altitude que têm uma dimensão mais preponderante nas variações climáticas regionais. Note-se que o relevo da ilha se dispõe quase de forma perpendicular aos ventos dominantes de NE, fazendo com que a temperatura e a precipitação sejam distintas entre locais com altitudes semelhantes, em função da exposição desigual em relação aos ventos e à radiação solar, o que reforça as assimetrias existentes não só entre os locais de maior e menor altitude, mas entre as vertentes N e S da ilha (Borges et al., 2008; Neves, 2008, Fernandes, 2009; Figueira, 2009; SRA, 2014; Prada, 2000).

Os ventos alísios, de cariz húmido, transportam massas de ar que são obrigadas a subir devido ao relevo da vertente N da ilha. Por isso, a condensação resultante dá lugar à ocorrência de nevoeiros quase constantes (mesmo junto ao litoral), fazendo com que haja maior precipitação, humidade e nebulosidade naquela vertente. De facto, a cordilheira central impede a passagem do ar húmido para S, sendo esta vertente moderadamente chuvosa, com valores entre 500 e 650mm (553mm no Funchal). Globalmente a precipitação ronda 1000 a 1500mm anualmente, com tendência a subir

63 conforme a altitude local aumenta, podendo ultrapassar 2800mm nos picos mais altos (3084mm no Pico do Areeiro) (Neves, 2010, DRTM, 2016a; Fernandes, 2009)7.

A variação da temperatura entre as 2 vertentes da ilha é de apenas 1.2ºC no litoral, registando-se uma temperatura anual superior na vertente S (18.8ºC no Funchal) e inferior no N (17.8ºC em São Vicente e 15.2ºC em Santana). O valor desce conforme a altitude aumenta (9.7ºC no Areeiro) (DRTM 2016a; Prada, 2000)8.

Em relação ao Município da Calheta, devido à ausência de dados, os valores da precipitação e da temperatura média anual são baseados nos das estações meteorológicas mais próximas. De acordo com a Secretaria do Ambiente e dos Recursos Naturais (SRA) para o último Plano Regional da Água da Madeira (PRAM) (2003a), existem algumas diferenças a nível do concelho.

Em relação à precipitação, os valores mais baixos localizam-se na vertente S junto ao litoral, embora sem uma distribuição espacialmente uniforme. Na Calheta junto ao litoral a precipitação é inferior tal como na faixa SE; contudo, já a W ou em altitude, a precipitação assemelha-se à do concelho de Porto Moniz e das zonas a NW, com valores entre 1400 e 1800mm, destacando-se as freguesias da Fajã da Ovelha e da Ponta do Pargo. Figueiredo (2008) destaca a ocorrência de alguns aguaceiros intensos durante os meses da Primavera e Outono, influenciados pelas massas de ar de SW resultantes de uma circulação meridiana associada ao relevo acidentado.

As diferenças entre o N e o S da ilha a nível dos elementos do clima acabam por se reflectir também na rede hidrográfica. A rede é densa, jovem e a sua torrencialidade deve-se aos desníveis e aos fortes declives do relevo da ilha. A rede é composta por inúmeros cursos de água (na sua maioria ribeiras), com perfis longitudinais declivosos, encaixados e com grande capacidade de carga na sequência de períodos chuvosos, apesar da sua pequena dimensão/comprimento (Neves, 2010; Prada, 2000; Figueira, 2009; Figueiredo, 2008). Do conjunto destacam-se vinte cursos de água e as suas respectivas bacias hidrográficas, sendo que todas estas bacias possuem cabeceiras acima de 550m de altitude que, nos cursos de água principais, atingem altitudes que ultrapassam os 1200m. Em termos de área, as cinco maiores são a Ribeira dos Moinhos (Calheta, com 66.92 km2), a Ribeira dos Socorridos (63.31 km2), a Ribeira da Janela (62.52 km2), a Ribeira de Santa Luzia (61.55 km2) e a Ribeira de São Jorge (54.66 km2) (SRA, 2014). Os caudais registam uma variação acentuada entre o verão e o inverno (como é normal nas nossas latitudes), ocorrendo também contrastes entre os valores registados na vertente N e na vertente S da ilha. Apesar de no inverno o caudal dos cursos de água ser elevado, no verão os valores tendem a reduzir bastante chegando a secar, particularmente os que correm para o litoral S (Neves, 2010), destacando-se, na Calheta, os localizados nas zonas SE e do Paul do Mar (Figueiredo, 2008).

Para além dos cursos de água, a Madeira tem um grande número de nascentes, pois as suas formações geológicas permitem a formação de aquíferos suspensos de água doce que não se misturaram com os aquíferos salinos de base (Figueira, 2009; Prada et al., s. d.). Os principais locais de infiltração localizam-se no Paul da Serra (área plana com taxas de infiltração de 70%) e em alguns planaltos menores no Maciço Central

7/8

64 (Figueira, 2009; Madeira Rural, 2015). O estado das massas de águas superficiais da ilha é, na sua maioria, de elevada qualidade (entre bom e excelente). Os recursos hídricos subterrâneos têm sido aproveitados desde a colonização da ilha (Figueira, 2009) e, para tal, surgiu a construção de canais para o transporte da água, as tradicionais ‘levadas’. Correspondem a canais estreitos com pouco declive que permite um correr de água vagaroso, surgindo as primeiras no século XV, aumentando a sua construção conforme as exigências da produção agrícola (Figueira, 2009; Quintal, s. d.; Fernandes, 2010; Quintal, 2010). A construção ganha um maior destaque a partir do século XIX com a intervenção directa do Estado na sua edificação e manutenção. O principal objectivo era o transporte de água da vertente N para vertente S da ilha, pois, até à época, as levadas não atravessavam a cordilheira central (Quintal, s.d.; Fernandes, 2010; Figueira, 2009; Quintal, 2010). A primeira financiada pelo Estado foi a levada do Rabaçal na Calheta. Porém, o grande boom deu-se na segunda metade do século XX. O transporte de água permitiu a construção de estações hidroeléctricas para a produção de energia, sendo as duas primeiras inauguradas nos anos cinquenta (1953): central da Calheta e central da Serra de Água (Empresa de Electricidade da Madeira, EEM, 2014; Quintal, s. d.; Fernandes, 2010; Quintal, 2010).

As levadas têm uma enorme importância a nível turístico, encontrando-se as primeiras referências em guias de viagem do séc. XIX. Actualmente continuam a ser altamente apreciadas pelos turistas pois permitem: realizar caminhadas longo das mesmas; vislumbrar todo o rico e diversificado património natural biótico e abiótico, além de algum património cultural, não só relativo às próprias levadas mas também à paisagem humanizada, que é alvo de apreciação desde o início da actividade turística na ilha (Quintal, s. d.; Quintal, 2010; Fernandes, 2010; Sousa, 2014).