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Ao longo das primeiras décadas do século XX, a colocação de professores não sofreu grandes alterações. O modo de procedimento nas colocações, mediante concurso, fez-se sempre da mesma forma.

No período relativo à descentralização, apesar da colocação dos professores não depender, totalmente do inspetor, necessitava sempre da sua comprovação, pois era pedido o parecer e dada informação pertinente sobre os candidatos a concurso, bem como passadas as certidões de efetividade de serviço. Durante este período, as Câmaras foram acusadas pelos inspetores de falsificar informações, respeitantes aos professores candidatos, para colocação indevida dos mesmos. Este tipo de “colocação abusiva”, que foi exercida com insistência, provocou grandes conflitos entre a inspeção e as Câmaras, nos Açores, tendo-se arrastado processos em tribunal.

Em casos de irregularidade, os inspetores reportavam às entidades superiores, estas situações, que prejudicavam os professores que tinham de sujeitar-se a longos períodos de espera até verem o seu problema resolvido. Estes professores e os que eram colocados, indevidamente chegavam a permanecer nos locais onde tinham sido colocados, por vezes, dois ou três anos, devido à morosidade das decisões e das comunicações com o continente21.

Até 1910, os documentos que compunham o processo dos candidatos aos lugares, para efeitos de concurso, eram enviados para a 1.ª circunscrição em conformidade com o art.º 137 do Regulamento, de 19 de setembro de 1902. Estes

21 ANEXO VI – Ofício enviado ao Procurador da República pela Comarca da R. Grande (transcrição).

Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta. BPAPD. DEPD. L.º 10. N.º 272 de 30 de setembro de 1916, pp.365 a 371.

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processos podiam corresponder à promoção da 1.ª para 2.ª classe, à ocupação de lugares de ajudante ou a provimento definitivo22.

Eram incluídos no processo de candidatura, o parecer e a informação pertinente sobre os candidatos a concurso, por parte do inspetor, bem como as certidões de efetividade de serviço. Sempre que surgisse uma vaga era comunicada para Lisboa para que fosse colocada a concurso no Diário do Governo.

Nos Açores, para que as escolas não ficassem muito tempo encerradas e se houvesse apenas um candidato a concurso, o inspetor dava logo, a ordem de colocação, mesmo antes da abertura oficial do concurso. Como exemplo disso, em 1904, participou-se a vaga para professora ajudante, para um lugar na escola da Matriz de Ponta Delgada e que reunia todas as condições, no dia 2 de março. O concurso só teria sido aberto, oficialmente, a 13 de março do mesmo ano23.

A colocação dos professores, antecipando o concurso, já era um procedimento comum nos Açores e foi-lhe dada continuidade pelas Câmaras, durante o período de descentralização. Em 1914 foram várias as colocações feitas, precedendo o concurso, com a diferença de serem candidatos, que não constavam do primeiro lugar, das listas de colocações. Aconteceu, na freguesia de S. Pedro de Ponta Delgada, ao colocarem a candidata que se encontrava, em 2.º lugar, da lista de classificados. A candidata lesada, após reclamação, conseguiu anular, pouco tempo depois, a deliberação tomada24. A

maior parte dos casos de irregularidade não tinham o mesmo desfecho, pois a ordenação

22 ANEXO VII – Processo completo para a criação de uma escola no concelho de Vila Franca e

transcrição de um ofício endereçado à 1.ª zona para requerer a conversão de uma escola paroquial a central. BPAPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta. LB1 (1911-1916). M.º 196 de 17 de janeiro de 1913, pp. 255 a 266.

23BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada.

LB9 (1903-1904). N.º 105, 16 de fevereiro de 1904, p.167.

24BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada.

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de reposição ou transferência podia levar 2 ou 3 anos, se não envolvesse acusação jurídica.

Por ser feita uma colocação indevida, na escola da freguesia da Conceição, no concelho da Ribeira Grande, levantou-se um processo em tribunal. O lugar da escola acabou por voltar a concurso depois de um ano por ordem do tribunal25. Apesar disso, a

21 de setembro do ano seguinte, Manuel Inácio d`Arruda continuava a pressionar a Comissão Executiva da Câmara para que a professora fosse suspensa das suas funções, lembrando a ordem emanada do tribunal. O inspetor chegou a comunicar à 2.ª Repartição acerca desta colocação e no final do ofício declarou que:

[…] a atitude despótica das Câmaras passou a constituir uma verdadeira ameaça ao socego e bem estar do inspectorado do paiz que entende não deve deixar atropelar as leis com a sua complacência justamente punível.

Ponta Delgada, 21 de setembro de 1917

O inspector Manuel Ignacio d`Arruda

Na cidade de Ponta Delgada, também foram muito comuns estas situações de irregularidade. Em 1913, a inspeção recebeu uma reclamação da 1.ª candidata a um lugar para a escola de S. Pedro e que ameaçava levar o caso às estações superiores. Alegava que era a candidata mais graduada, segundo as disposições legais em vigor. Segundo ela, também não havia disposição da lei que revogasse as condições de preferência e como habilitação possuía o diploma complementar, que na altura, lhe conferia o 1.º lugar (Lei de 29 de junho de 1913, Decreto Regulamentar de 8 de julho do

25BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada.

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mesmo ano e Código Administrativo vigente, n.º 9, do art.º 94) em conformidade com os preceitos contidos, nas leis e regulamentos especiais26.

Para além das colocações irregulares também chegou a proceder-se, ilegalmente, a transferências de professores. Embora o decreto de 29 de março de 1911 (n. º5 do art.º 64) tivesse concedido às Câmaras a faculdade de nomeação, transferência e demissão de professores dos concelhos, chegaram a ser executadas transferências, sem o regulamento estar ainda, integralmente, publicado. O inspetor informava que tinham de seguir o regulamento ainda em vigor de 19 de setembro de 1902 e que nos termos da lei vigente, que não tinha sido alterado, só podiam fazer transferências como pena disciplinar, o qual só deveria ser aplicado, precedendo o respetivo processo e defesa do arguido (art.º. 155 do regulamento de 19 de setembro de 1902) e não por conveniências da instrução ou dos professores que só poderiam obter o lugar por concurso27.

Apesar da autoridade por parte das Câmaras, em 1913, foi enviada uma Circular para esclarecer que determinados procedimentos relativos aos professores teriam de passar sempre pela inspeção. Levou-se ao conhecimento que as Câmaras deviam informar os inspetores de todas as resoluções relativas aos professores dos concelhos, de modo a manter, em dia, os cadastros das inspeções28.

As irregularidades foram de tal ordem que, em 1917, devido a uma nomeação indevida na Piedade, na freguesia dos Arrifes, o inspetor Manuel Inácio de Arruda tomou a iniciativa de enviar a todas as Câmaras do Círculo escolar, uma cópia da lista

26BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada.

LB20 (1913-1914). N. º40, 16 de fevereiro de 1914, pp. 62 a 66.

27 BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada.

LB20. (1913/1914). L 9. N. º38, 9 fevereiro de 1914, pp.54 à 57.

28BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada.

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graduada dos professores. Verificavam-se outras regularidades por parte das Câmaras. Estas mantinham as escolas encerradas muito tempo e não davam ordens para a abertura do concurso. Estes casos, geralmente, aconteciam por falecimento ou transferência de professor. O inspetor acabava por ser obrigado a pressionar as Câmaras, para abrirem concurso, de modo a evitar possíveis situações de irregularidade29.

Em casos em que não havia queixa por parte dos professores lesados era o inspetor que contactava diretamente com o professor que tinha sido colocado indevidamente, para que se consciencializasse do erro e desistisse do lugar. Como exemplo disso foi o ofício enviado a uma professora de Vila Franca, a pedir que reconhecesse o engano, pois preteria os direitos de 11 colegas que se encontravam antes dela, na lista dos concorrentes às interinidades30.

A partir de 1919, a orgânica relativamente às colocações de professores passou a ser da competência das Juntas Escolares que, à semelhança das Câmaras, passaram a colocar professores indevidamente. Destacaram-se as Juntas Escolares dos mesmos concelhos que já o haviam feito, anteriormente, como o da Povoação, Lagoa, Ribeira Grande e Ponta Delgada.

O inspetor Manuel Moniz Morgado denunciou à 10.ª Repartição da Direção Geral da Contabilidade Pública que a regência da escola da Ribeira Chã era ilegal. No ano seguinte, enviou um ofício aos mesmos serviços, dando conhecimento de professores a exercer, ilegalmente, por influência das Juntas Escolares31. O inspetor

chegou mesmo, a ameaçar uma professora na Povoação, devido à ilegalidade da

29BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada.

LB21. (1914/1917). L.º 10. N.º 281, 21 de outubro de 1916, p. 380.

30 BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada.

LB22. L.º 3. N.º 486, 29 de outubro de 1921, p. 362

31 BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada.

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colocação e que se não abandonasse de imediato o cargo, o tempo de serviço não lhe seria contado32

Os professores após a colocação deveriam apresentar-se de imediato ao serviço e tomar posse, assinando um documento relativo à tomada de posse.