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As orientações do pedagogo Dewey e da “escola progressiva” americana influenciaram alguns pensadores açorianos como Manuel Inácio de Arruda, João Machado Benevides e Maria Evelina de Sousa. Para estes, as escolas deveriam ser dotadas de laboratórios, de bibliotecas, de museus, de oficinas, de jardins e de todo o tipo de infraestruturas, onde as crianças pudessem expressar toda a sua criatividade através da experimentação, de dramatizações, de récitas e de jogos. Os museus escolares estavam, também, associados ao conceito do ensino prático e científico e constituíam uma forma de ministrar às crianças ideias exatas derivadas de factos de observação, aspetos que se coadunavam com o ensino racional e científico. Eram, pois, considerados excelentes auxiliares das lições teóricas e procuravam estabelecer a ligação entre a escola e a vida prática.

Um museu escolar poderia comportar objetos naturais e artificiais e destinava-se a dar à criança ideias mais nítidas e exatas acerca de tudo o que a rodeava. Segundo um corresponde do jornal O Dia, a existência de um museu escolar justificava-se para facilitar aos alunos a posse de um meio que lhes permitiria fixar e comunicar ideias, mas também como uma forma de preparar o aluno para a vida, moldando-lhe o caráter e desenvolvendo-lhe as ideias de altruísmo, de bondade, do sentimento artístico e das emoções cívicas.

No sentido geral, a expressão museu escolar aplica-se às colecções de toda a natureza organizadas pelo professor, tendo em vista o que se propõe transmitir aos alunos. No sentido restricto, designava principalmente os objectos usuaes de que o professor se serve no processo de ensino conhecido como “lições de cousas”. (O Dia, 1906, n.º 909).

Neste contexto, no dia 1 de dezembro de 1904, noticiou-se a inauguração do museu industrial e comercial Madeira Pinto. Anexo à escola com o mesmo nome, a sua

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formação partiu da iniciativa do professor Luiz Campos. Considerado como o primeiro do género, O Açoriano Oriental designou-o como “um museu coletivo dos Açores, onde estariam representados os produtos da atividade comercial e industrial do arquipélago” (O Açoriano Oriental, 1904, n.º 3627). Este museu serviria também, como local de visita de estudo para os alunos das escolas oficiais e particulares.

Foi também noticiada a criação de um museu escolar na escola de Feteira, no concelho de Angra do Heroísmo, e referido que o professor se encontrava a recolher todos os elementos necessários para o ensino prático, com vista a dotar a escola com um pequeno museu. O museu escolar designado Marquês de Pombal foi inaugurado no dia 5 de janeiro de 1908, a cargo do professor oficial da mesma escola, José Sebastião d`Ávila Júnior.125 O jornal O Tempo teria encerrado a subscrição para aquisição de

material para este museu no dia 29 de dezembro de 1907, com a obtenção de 20$700 reis. À sessão inaugural presidiu o capitão do porto d`Angra, Silva Ribeiro, que elogiou o trabalho meritório de Ávila Júnior. Discursaram Ávila Júnior, Vieira d`Areia, Cardoso Valadão e Machado Tristão procurando incutir nos habitantes da Feteira o amor pela escola, pela leitura e pela instrução. Segundo o jornal O Tempo, o museu teria ficado razoavelmente instalado e deveria servir de motivação a outros professores.

No dia 22 de fevereiro do mesmo ano, em simultâneo com a abertura da biblioteca escolar João de Deus, Joaquim Machado Tristão fundou também um museu na Terra Chã que designou de museu Teófilo Braga. Apesar de não haver conhecimento do tipo de objetos aí apresentado foi referido, na imprensa, ter sido em grande número e que tinha sido apreciada a sua disposição e seleção.

125 Comprova-se a intenção da criação deste museu escolar, Marquês de Pombal, pela carta enviada a João

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Houve a preocupação não só da criação de museus escolares na Terceira, bem como o reconhecimento da sua importância no apoio ao ensino. A insatisfação dos alunos decorrente da falta de aulas práticas era diversas vezes mencionada pelo jornal O

Dia.

É de salientar que, também nos estatutos das Sociedades, se consignava a possibilidade da criação de museus escolares. O terceiro ponto do estatuto da Liga Micaelense de Instrução, por exemplo, considerava, para além de outras coisas, a criação de museus escolares e apesar da omissão da sua criação na base dos estatutos da Sociedade Promotora da Instrução Terceirense, estes fizeram referência, à “exposição de objetos de arte e industria” (3.º ponto da 1.ª alínea), o que pressupõe tratar-se de museus.

Em S. Miguel os museus escolares não parecem ter-se popularizado. Apenas constou a tentativa de abertura de um museu por Maria Evelina de Sousa, na sequência da abertura da biblioteca escolar, na escola do sexo feminino, da freguesia de Santa Clara em Ponta Delgada. Segundo a imprensa Evelina colocou a hipótese da fundação de um museu escolar e para o efeito terá consultado o coronel Francisco Afonso Chaves.

As bibliotecas escolares, tal como os museus, surgiram associadas à ideia de ensino concreto, racional e científico, embora na propaganda que se fazia para a sua criação estivesse sempre subjacente a ideia do combate ao analfabetismo. Constituía uma forma de as crianças desenvolverem a leitura após a alfabetização, obterem informação e adquirirem novos conhecimentos.

Embora houvesse conhecimento da abertura de algumas bibliotecas, elas não funcionavam dentro do espaço escolar. A primeira do início do século da qual se tem

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conhecimento foi a da Instituição Século XX, em 1904, em Ponta Delgada, por iniciativa do Conde de Santa Catarina. A fundação desta biblioteca foi noticiada no Diário dos

Açores e tinha como objetivo servir de auxiliar aos estudos das crianças albergadas

nesta mesma instituição (Diário dos Açores, n.º 3923, 1904). Em 1905, Faria e Maia enquanto subinspetor, em resposta ao ofício n.º 289 de 19 de janeiro, de pedido do mapa estatístico, informa numa pequena nota, que a coluna relativa às bibliotecas escolares não se encontrava preenchida por não existir ainda nenhuma126. Oficialmente, ainda não

podia constar, atendendo que, a instituição Século XX foi criada por iniciativa particular. Foi uma das associações que, em Ponta Delgada colaborou com o ensino público, procurando contribuir para a redução do analfabetismo entre as classes mais desfavorecidas. A “Associação de Caridade Promotora da Instrução”, como se denominava, nunca se afastou dos objetivos para que inicialmente tinha sido criada, que eram a divulgação da instrução popular e o combate ao analfabetismo, encontrando-se em estreita colaboração com o ensino oficial127.

A primeira biblioteca escolar foi criada na Terceira, na freguesia de Belém (Terra Chã), a 22 de fevereiro de 1908, por Joaquim Machado Tristão, que lhe atribuiu o nome de biblioteca João de Deus. A biblioteca contava, segundo os periódicos, com um número razoável de obras e entre elas, constavam alguns dos clássicos portugueses. Alguns periódicos terceirenses, tal como O Tempo e O Dia, ajudaram nas subscrições para a sua criação. Esta biblioteca encontrava-se à disposição de pessoas da localidade e não estava confinada apenas aos professores e alunos.

126 BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada -

L.º 2.º n.º 99 de 16 de março de 1905. p. 139.

127 A Associação Século XX foi fundada em Ponta Delgada pela loja maçónica local “Companheiros da

Paz” e foi designada como uma associação benemérita, educativa e recreativa. – Marques, A.H. Oliveira (1986). Dicionário de Maçonaria Portuguesa, p.116.

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A 29 de julho de 1909, noticia-se a criação de uma biblioteca na escola feminina de Santa Clara, por Evelina de Sousa, então a exercer nessa mesma escola128. O jornal

Diário dos Açores acusou, em março desse mesmo ano, a receção de uma carta-circular

enviada por Evelina de Sousa, anunciando a intenção da criação de uma biblioteca escolar, tendo em conta que a lei vigente que regulava os serviços de instrução primária permitia a criação de bibliotecas escolares. Para a fundação desta biblioteca da escola oficial (sexo feminino) de S. José, no bairro de Santa Clara, foi anunciada por Evelina de Sousa a oferta, por um benemérito da instrução popular, da importância necessária à aquisição de algumas estantes, pelo que Evelina de Sousa de imediato solicitou a oferta de livros apropriados, ou de quantia destinada à aquisição dos mesmos. Confirmou ter conseguido recolher perto de 500 livros e 36$250 réis em donativos (Revista

Pedagógica, 1909, n.º93).

Na inauguração da biblioteca escolar de Santa Clara destacaram-se as presenças de Rosa Emília de Sequeira Morais, Maria Emília Borges de Medeiros, Maria Ermelinda de Sequeira Morais, Maria da Glória Lima, Maria do Carmo de Sequeira Morais Flores, Maria Augusta Carvalho, Maria Eufrosina da Costa Torres, Teresa Carreiro de Lima, Maria Leopoldina de Sousa, Alice Moderno, comendador de Mello Abreu, presidente da Comissão de Beneficência e Ensino da freguesia de S. Pedro, António Germano dos Reis, capitão do exército e diretor do Colégio Açoriano, Luiz Francisco Bicudo, advogado e publicista (impulsionador da Liga Micaelense de Instrução), doutor Matta, médico militar, Manuel da Câmara Melo Cabral, jornalista e chefe do partido regenerador do concelho da Lagoa, Félix Horta, estudante de direito, padre João de Fontes Ferraz, cura de S. José e professor particular, padre Manuel Vicente, capelão, Jayme Amaral, professor particular, Alfredo de Sousa Motta, redator

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de A Mocidade, Francisco António Raposo de Medeiros, professor oficial, António Manuel Âmbar, chefe de conservação das obras públicas, João Anglin como representante de A Vida Nova, Miguel de Sousa Alvim, jornalista e professor, representando a redação do Diário dos Açores (Sousa, 1909, p.10).

A criação desta biblioteca suscitou alguma polémica, pois foi noticiada na imprensa local e continental como tendo sido a primeira do género nos Açores. O jornal

A Voz do Professor, órgão da Associação do Professorado Terceirense, veio esclarecer,

publicamente, que o diretor desse mesmo jornal, Joaquim Machado Tristão, já teria fundado uma biblioteca escolar na Terceira, o que, na época, não foi contestado por Evelina de Sousa.

No discurso de inauguração, Evelina afirmou ser uma militante da nova cruzada de combate ao analfabetismo, “inimigo que impede e opõe resistência a todos os ideais alevantados, tornando o progresso perigosamente lento e moroso” Segundo ela, a biblioteca devia reger-se pelas seguintes normas: “1.º Facultar às alunas que frequentem a escola a consulta, durante as horas letivas, dos seus livros e leitura dos mesmos, quer na hora de descanso, quer em suas casas. 2.º Facultar a estranhos, nos seus domicílios, livros, mediante, além da responsabilidade pela conservação da obra, a quota mensal de 125 réis, destinada ao aumento e conservação da biblioteca” (Sousa, 1909, p.16). Evelina considerava que, para ensinar a ler, a biblioteca constituía uma forma importante de levantar o nível moral do indivíduo, ensinando-o a ver, ou melhor, saber ver, a saber compreender, julgar, distinguir o verdadeiro do falso, o bem do mal, a justiça da iniquidade. (Sousa, 1909, p.14).

Os republicanos micaelenses e terceirenses alertavam, com frequência, para a necessidade da criação de bibliotecas escolares nas freguesias rurais, onde a falta de

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leitura era manifesta. As crianças que frequentavam o ensino oficial, na sua maioria, eram oriundas de famílias pobres e viam-se, muitas vezes, privadas de esclarecer e desenvolver o seu espírito, pela falta absoluta de livros. Às bibliotecas escolares estava, pois, incumbida a missão de preencher essa deficiência.

Relativamente à criação de laboratórios, nenhuma escola primária conseguiu criar um. No entanto, e atendendo ao custo que isso acarretaria, a Liga Micaelense de Instrução criou apenas um laboratório, que designou como Gabinete de Física para funcionamento do curso industrial, no liceu central de Ponta Delgada 129.

4.3 - Visitas de estudo, colónias infantis, escolas ao ar livre e “lições