• Nenhum resultado encontrado

Nas ilhas, cada concelho procurava que cada freguesia contemplasse uma escola para cada sexo de preferência e, onde não era possível criá-la, procurava colmatar-se a sua falta, com o estabelecimento de escolas mistas e cursos noturnos.

Na Terceira, tal como mencionamos no Cap.1, a imprensa não fez alusão à falta de escolas durante as primeiras décadas do século XX. A partir de 1901 quando se procedeu a um recenseamento escolar mais rigoroso, com o auxílio dos párocos das freguesias, procedeu-se à divisão das escolas em 2 turnos: um das 8:30 às 11 horas e outro das 12 às 15 horas. Relativamente ao recenseamento escolar na Terceira, em 1904, o Diário dos Açores publicou um artigo em que salientou que, no final de novembro desse ano só faltavam recensear apenas 37 crianças de ambos os sexos. Embora não fizesse referência ao número total de alunos depreendeu-se que não seriam necessárias mais escolas. Também se comprovou a existência de escolas em todas as freguesias da ilha pelo facto de a imprensa ter questionado as causas dos índices elevados de analfabetismo na Terceira, mencionando a existência de uma escola em cada freguesia a “funcionar em condições razoáveis” e, por isso, o estado do analfabetismo não se devia à falta delas (O Tempo, 1906, n.º 125). As escolas encontravam-se todas em funcionamento e a falta de professores também não se fez sentir, como aconteceu em muitas localidades de S. Miguel. A falta de professores com habilitação obrigou, por vezes, ao encerramento temporário de escolas por falta de colocação ou por doença do professor. Mesmo em 1907 em que se verificou um excesso de professores para provimento dos lugares vagos, a inspeção e a imprensa nunca fizeram referência ao excesso nas ilhas.

102

As atas das sessões da Câmara da Vila da Praia da Vitória também o comprovam, uma vez que não eram frequentes os pedidos para casa de escola. Neste concelho foi pedida a criação de uma escola em 1907, para o sexo feminino, para o Cabo da Praia, pedido que foi atendido pela Câmara por se considerar uma necessidade. A Câmara disponibilizou uma casa pertencente ao proprietário Manuel Mendes de Borba a residir na vila52. Dois anos depois foram também feitos outros pedidos que

foram satisfeitos com alguma prontidão:

- escola para o sexo masculino – São Braz – 83 alunos - escola mista – Casa da Ribeira – 75 alunos

-escola mista - Santa Luzia e Serra – 60 alunos - escola mista - Porto Martins – 45 alunos

No ofício de requisição, o subinspetor informou que para a 1.ª escola a Junta de Paróquia das Lages tinha obtido uma casa e mobília. Para a 2.ª e 3.ªescolas as populações comprometeram-se a fornecê-las logo que elas fossem criadas. Salientou que já tinha “conferenciado com os indivíduos mais importantes” dessas localidades. Para o Porto Martins esperava obter-se a cedência de um edifício já mobilado e construído para o efeito pelo benemérito Visconde do Porto Martins, na data já falecido53.

As escolas, geralmente, ficavam situadas nos centros das localidades, mas com frequência, nas ilhas, por falta de casa, eram instaladas em zonas limítrofes e por vezes muito distantes. Facto tantas vezes referenciado, sobretudo para a ilha de S. Miguel e justificado pelos inspetores, como a razão para a não aplicabilidade da lei da

52 CMPV. Actas da Câmara Municipal (23-1-1907 – 14-10-1908). L.º 41, ata da sessão de 10 de abril de

1907.

53 CMPV. Actas da Câmara Municipal (23-1-1907 – 14-10-1908). L.º 45, ata da sessão de 31 de maio de

103

obrigatoriedade escolar por formas coercivas. As poucas escolas e a distância a que ficavam das localidades constituíam um obstáculo à execução do ensino obrigatório, como relataram alguns inspetores e, por isso, ficavam impossibilitados de o pôr em prática. A distância a que ficavam, por vezes, as casas de escola dos centros das localidades sujeitava as crianças a longas deslocações, pelo que nos pedidos de requisição de estabelecimentos escolares era alegado esse facto. Assim, o concelho da Povoação requereu, para as freguesias do Faial da Terra e da Ribeira Quente com distâncias não inferiores a 10 km das freguesias limítrofes, estabelecimentos de ensino para o sexo feminino. No mesmo concelho, na freguesia de Nª Srª da Mãe de Deus e nos lugares das Lombas, foram requeridos estabelecimentos de ensino apresentando como motivo, não só a distância, mas também as deficientes vias de comunicação. Os concelhos da Ribeira Grande, Nordeste e Lagoa, segundo os relatórios de 1902 a 1904, eram os que se encontravam melhor dotados de escolas. A mesma informação foi publicada pelo Diário dos Açores, reforçando o facto de ainda se verificarem distâncias consideráveis entre algumas localidades (Diário dos Açores, 1904, n.º 4037).

A falta de escolas, em algumas freguesias, foi tão grave que levou os pais das crianças a fazerem abaixo-assinados solicitando a criação de escolas mistas. Aconteceu, por exemplo, na localidade da Lomba da Pedreira, em que a população enviou o abaixo- -assinado à 1.ª Circunscrição Escolar do reino, para que se atendesse ao número populacional das crianças em idade escolar devido à distância que ficava a escola mais próxima54.

Em 1904, no relatório escolar relativo ao ano anterior, o subinspetor reforçava a necessidade de criação de escolas, o mais próximo das habitações, atendendo às

54 BPAPD. DEOD. LB1 (1904-1905). Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de

104

distâncias e ao facto de estas não deverem ser criadas em lugares ermos. Apesar de implicar a distância, o problema da falta de escolas não se colocava apenas nas freguesias rurais da ilha. Mesmo na cidade de Ponta Delgada solicitou-se, para a freguesia de S. José, a criação de mais duas escolas para o sexo masculino por só possuir apenas uma para uma população de 8000 pessoas. Segundo a opinião do inspetor, esta situação também poderia ser colmatada com a criação de uma escola central55. A freguesia de S. Roque, nos arredores de Ponta Delgada, necessitava de mais

uma escola para o sexo masculino porque só tinha uma e o número de crianças recenseadas, do sexo masculino, era de 147. O mesmo terá acontecido no concelho de Vila Franca, na freguesia de Água d`Alto, em que para uma população de 2800 pessoas, com 106 crianças do sexo feminino e 128 do sexo masculino, também havia a necessidade de criar duas escolas, uma para cada sexo.

A obrigatoriedade do recenseamento escolar a partir de 1901 implicou a criação de mais escolas, devido ao aumento significativo dos alunos que constavam do recenseamento. Segundo as contas do Diário dos Açores, no ano de 1903, o número de crianças recenseadas era de 14.061. Chamava a atenção para o facto de as escolas, além de apresentarem uma frequência superior à que realmente podiam suportar, não comportariam todas estas crianças, porque ficariam de fora 9.621 e, isto, sem terem sido contabilizadas as freguesias onde não se fez o recenseamento (Diário dos Açores, n.º 4.036, 1904).

Inácio de Arruda chegou a oficiar para Lisboa a necessidade urgente da abertura de escolas em diversas localidades. Só em 1906, em S. Miguel, o número de crianças em idade escolar passou de 4.312 crianças para 6.161, pelo que quase todas as escolas

55 A freguesia de S. José de Ponta Delgada tinha uma população superior a 10.000 pessoas e por esse

105

do círculo começaram a ficar sobrelotadas, excedendo a sua capacidade legal. Por exemplo, a professora Francelina Olympia, da Ribeira Chã, notificou que por ter 65 alunos na sala já não podia receber mais nenhuma criança, atendendo a que a sala não comportava mais mobília56. Mesmo nos concelhos da Ribeira Grande, Ponta Delgada e

Nordeste que, três anos antes, tinham sido apontados como não tendo falta de escolas, Inácio de Arruda teve de as requerer para as freguesias da Lomba de S. Pedro e Fenais da Ajuda (Ribeira Grande), para a freguesia de S. Roque (Ponta Delgada) e para as freguesias da Pedreira e Salga (Nordeste)57.

Enquanto não foram criadas as escolas requeridas, houve necessidade de dividir os alunos em turnos e, muitos destes pedidos foram feitos pelos professores. Este tipo de segmentação não era do agrado dos inspetores devido à sobrecarga do tempo letivo para os professores e porque implicava também “a possibilidade dos alunos não apresentarem resultados finais satisfatórios”, como pode ler-se nos relatórios. No entanto, vinha colmatar um problema que se pretendia temporário até que houvesse uma ocasião oportuna para proceder a um arrendamento de casa que satisfizesse as condições de comportar todas as crianças58.

Apesar de não concordarem com esta medida, os inspetores viram-se obrigados a exercer pressão sobre algumas escolas para o fazer, incitando-os a que pusessem em execução, o disposto no art.º 75 do Regulamento da Instrução Primária em vigor. À

56 BPARPD.CEPD. Escola Oficial Mista de Instrução Primária Elementar da Ribeira Chã - Livro de Correspondência Expedida e Recebida, 1904 – 1906 (documentos soltos integrados no mesmo Livro).

57 BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada.

LB1 (1910-1912). N.º 57, 18 de agosto de 1910, p. 82.

58 ANEXO IX - Livro nº 1 e 2 de Registo das Escolas Oficiais da Circunscrição Escolar Ponta Delgada.

106

professora de Rabo de Peixe foi imposta a divisão da classe por turnos porque o total do número de crianças que constavam no recenseamento era de 115 e registava uma média diária de frequência de 76. Atenda-se à gravidade da situação não só pelo número de alunos, mas também porque a sala tinha apenas 60m2, embora contasse com uma professora ajudante59.

Para resolução imediata do problema, que se colocava com a falta de escolas, foi enviado pela inspeção uma Circular para as escolas onde havia necessidade desse desdobramento:

Concelho de Ponta Delgada

- escola do sexo masculino dos Mosteiros - escola do sexo feminino dos Mosteiros - escola do sexo masculino de Feteiras - escola do sexo feminino de Feteiras - escola do sexo masculino de Livramento - escola do sexo masculino da Bretanha

Concelho da Lagoa

- escola do sexo feminino do Rosário

Concelho da Ribeira Grande

- escola mista da Lomba de Stª Bárbara - escola do sexo masculino da Lomba da Maia

Concelho da Povoação

- escola do sexo feminino Mãe de Deus Concelho do Nordeste

59 BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta Delgada.

107

- escola mista da Algarvia

- escola mista da Lomba da Fazenda.60

Provavelmente gerado pelas expetativas criadas em torno da República, relativamente à educação, verificou-se um boom de pedidos e organização de processos para a criação de novas escolas que tardaram ou nunca chegaram. Era uma realidade a inexistência de casas e principalmente de “espaços condignos” para a prática de ensino, em muitas freguesias.

Dois anos após a implantação da República tinham sido muito poucas as escolas criadas, apenas 3, das quais só uma tinha sido provida, a escola mista da Lomba de S. Brás, na freguesia de Porto Formoso, no concelho da Ribeira Grande, a 5 de agosto de 1912.

No período entre 1891 a 1920 verificou-se que, na Circunscrição Escolar de Ponta Delgada, deram-se variações relativamente ao número de abertura de escolas. Nos dois quinquénios anteriores a 1903 registou-se, por exemplo, uma maior intensidade, apesar de a população, a partir de 1900, ter diminuído. Após esta data, o número de escolas não aumentou, mas procurou fazer-se uma distribuição mais equitativa nos diferentes concelhos. Por exemplo, em 1903 apenas os concelhos da Lagoa, Ponta Delgada e Vila do Porto registaram aberturas de escolas tendo-se verificado que, no quinquénio seguinte, só os concelhos do Nordeste, Povoação e Ribeira Grande foram contemplados. Embora o concelho de Ponta Delgada fosse muito mais populoso, a obtenção do mesmo número de escolas, relativamente ao concelho da Povoação foi, provavelmente, devido à existência de estabelecimentos de ensino particular e doméstico e também devido ao facto de as distâncias existentes entre as Lombas serem

60 BPARPD. DEPD. Copiadores de Correspondência Expedida da Inspeção Escolar de Ponta

108

significativas. Como complemento da informação, relativamente a anos posteriores, foi escolhido como objeto de estudo outra fonte para saber o número de escolas existentes.