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Atualmente, o currículo de Matemática do Ensino Fundamental está organizado em Eixos que, apesar de terem características singulares, estão interligados. São eles: Números e Operações (no campo da Aritmética e da Álgebra), Espaço e Forma (no campo da Geometria), Grandezas e Medidas (que permite ligações entre os campos da Aritmética, Álgebra e Geometria) e Tratamento da Informação. O trabalho com esses eixos deveria ser realizado de forma articulada, entretanto, o eixo Números e Operações tem sido o de maior destaque na Matemática do Ensino Fundamental das escolas brasileiras.

Ao longo do ensino fundamental o conhecimento sobre os números é construído e assimilado pelo aluno num processo em que tais números aparecem como instrumento eficaz para resolver determinados problemas, e também como objeto de estudo em si mesmos, considerando-se, nesta dimensão, suas propriedades, suas inter-relações e o modo como historicamente foram construídos.

Nesse processo, o aluno perceberá a existência de diversos tipos de números (números naturais, negativos, racionais e irracionais) bem como de seus diferentes significados, à medida que deparar com situações-problema envolvendo operações ou medidas de grandezas, como também ao estudar algumas das questões que compõem a história do desenvolvimento do conhecimento matemático.

(BRASIL, 1998, p.50)

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), o desenvolvimento do eixo Números e Operações deve se basear em situações em que o aluno construa o significado de números e os significados das operações. Nos quatro primeiros anos do Ensino Fundamental o objeto principal de estudo do eixo Números e Operações é o conjunto dos números naturais e o conjunto dos números racionais (positivos)é introduzido na 4ª série ou 5º ano.

O primeiro ciclo, referente às 1ª e 2ª séries (ou 2º e 3º anos) deve desenvolver no Eixo Números e Operações: a observação de critérios que definem uma classificação de números

(maior que, menor que, estar entre); contagens crescentes e decrescentes; identificação de regularidades em uma série numérica; a leitura e a escrita de números; a análise, interpretação, resolução e formulação de situações-problema, compreendendo alguns dos significados das operações, em especial da adição e da subtração; a utilização de sinais convencionais (+, –, , , =) na escrita das operações; a organização dos fatos básicos das operações pela identificação de regularidades e propriedades; a utilização da idéia de decomposição de escritas numéricas para a realização de cálculos mentais exatos e aproximados; cálculos de adição e subtração por meio de estratégias pessoais e técnicas convencionais.

No Eixo Números e Operações o segundo ciclo do Ensino Fundamental, formado pelas 3ª e 4ª séries (ou 4º e 5º anos) deve desenvolver: a ampliação do significado do número natural pelo seu uso em situações-problema e pelo reconhecimento de relações e regularidades; a compreensão e utilização das regras do sistema de numeração decimal, para leitura, escrita, comparação e ordenação de números naturais de qualquer ordem de grandeza; a consolidação dos significados das operações fundamentais a partir da resolução de problemas; a construção do significado do número racional (positivo) e de suas representações (fracionária e decimal), a partir de seus diferentes usos no contexto social; a interpretação e produção de escritas numéricas, considerando as regras do sistema de numeração decimal e estendendo-as para a representação dos números racionais (positivos) na forma decimal; a localização na reta numérica, de números racionais (positivos) a fim de compará-los e ordená-los; identificação e produção de frações equivalentes, pela observação de representações gráficas e de regularidades nas escritas numéricas; exploração dos diferentes significados das frações (parte/todo, quociente e razão); observação de que os números naturais podem ser expressos na forma fracionária; e a relação entre representações fracionária e decimal de um mesmo número racional (positivo).

Ainda no Eixo Números e operações o terceiro ciclo do Ensino Fundamental, formado pelas 5ª e 6ª séries (ou 6º e 7º anos) amplia e constrói novos significados para os números naturais, inteiros e racionais a partir do de situações de: reconhecimento dos significados dos números naturais em diferentes contextos e estabelecimento de relações entre números naturais, tais como “ser múltiplo de”, “ser divisor de”; compreensão do sistema de numeração decimal, identificando o conjunto de regras e símbolos que o caracterizam e extensão de regras desse sistema para leitura, escrita e representação dos números racionais na forma decimal; reconhecimento de números inteiros em diferentes contextos e exploração de situações-problema em que indicam falta, diferença, orientação e deslocamento entre dois pontos; localização na reta numérica de números racionais e reconhecimento de que estes podem ser expressos na forma fracionária e decimal, estabelecendo relações entre essas representações; análise, interpretação, formulação e resolução de situações-problema, compreendendo diferentes significados das operações, envolvendo números naturais, inteiros e racionais; cálculos envolvendo operações com números naturais, inteiros e racionais; compreensão da potência com expoente inteiro positivo como produto reiterado de fatores iguais, identificando e fazendo uso das propriedades da potenciação em situações-problema; atribuição de significado à potência de expoente nulo e negativo pela observação de regularidades com expoente positivo; compreensão da raiz quadrada e cúbica de um número (natural ou racional positivo); cálculos aproximados de raízes quadradas por meio de estimativas; resolução de problemas de contagem, incluindo os que envolvem o princípio multiplicativo.

O quarto e último ciclo do Ensino Fundamental que é formado pelas 7ª e 8ª séries (ou 8º e 9º anos) deve desenvolver: a ampliação e consolidação dos significados dos números racionais a partir dos diferentes usos em contextos sociais e matemáticos e reconhecer que existem números que não são racionais; identificação de um número irracional como um

número de representação decimal infinita e não periódica e a localização de alguns deles na reta numérica; a resolução de situações-problemas envolvendo números naturais, inteiros, racionais e irracionais, ampliando e consolidando os significados da adição, subtração, multiplicação, divisão, potenciação e radiciação; e a seleção e a utilização de diferentes procedimentos de cálculo com números naturais, inteiros, racionais e irracionais.

O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), foi criado em 1988 e aplicado a cada dois anos a partir de 1990 até o ano de 2005. Avaliava por amostragem a qualidade, a eqüidade e a eficiência do ensino e da aprendizagem nos Ensinos Fundamental e Médio. O SAEB foi desenvolvido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) na sua Diretoria de Avaliação da Educação Básica (DAEB). Alunos de 4ª e 8ª séries (5º e 9º anos) do Ensino Fundamental e do 3° ano do Ensino Médio de escolas públicas e particulares em todo o Brasil realizavam provas de Português e de Matemática com ênfase em leitura, compreensão de textos e resolução de problemas. O principal objetivo do SAEB era oferecer subsídios para a formulação, reformulação e monitoramento de políticas públicas, contribuindo, dessa maneira, para a melhoria da qualidade do ensino brasileiro e diminuição da diferença no sistema educacional nas diferentes Regiões e Estados da Federação. A partir dos resultados obtidos, o MEC e as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação poderiam definir ações voltadas para a correção de distorções e deficiências identificadas e direcionar seus recursos para áreas prioritárias.

O SAEB utilizava dois formatos de instrumentos: testes e questionários. Os testes visavam, a partir de questões específicas, medir o desempenho dos alunos nas disciplinas de Língua Portuguesa – ênfase na leitura e interpretação de texto – e Matemática – ênfase na resolução de problemas. Os questionários visavam coletar informações sobre os contextos sócio-econômico e cultural dos alunos, professores e diretores e conhecer a formação

profissional dos docentes e diretores. Informações sobre a infra-estrutura da escola também eram coletadas. O recurso metodológico para a avaliação dos resultados se baseavam na utilização de uma metodologia de comparação de resultados, denominada Equalização que permitia comparar os resultados do SAEB, ao longo dos anos e entre as séries, por meio da inserção de um conjunto de itens comuns aos testes aplicados no final dos ciclos dos Ensino Fundamental e Médio e inserção de itens comuns a mais de uma série. Além disso, o site do INEP descreve ainda o uso da Teoria de Resposta ao Item (TRI), que pode ser definido como um conjunto de modelos matemáticos que relacionam um ou mais traços latentes de um indivíduo e permite, segundo ele, estimar as habilidades dos alunos independentemente do conjunto específico de itens respondidos

Os resultados da avaliação da educação básica do SAEB são apresentados em uma escala de desempenho específica das disciplinas capaz de descrever9, em cada nível, as competências e as habilidades que os alunos são capazes de demonstrar. A escala do SAEB, como já citado, permite apresentar em uma mesma métrica os resultados de desempenhos dos estudantes de todas as séries avaliadas nos anos de aplicação dos testes (1990, 1993, 1995, 1997, 1999, 2001 e 2003). A escala nos mostra o porcentual dos alunos que já construiu as habilidades desejáveis para a sua série e os que estão abaixo ou acima do esperado.

Em 2005 o SAEB sofreu uma ligeira alteração e foi dividido em dois processos: a Avaliação Nacional da Educação Básica (ANEB) e a Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (ANRESC). A ANEB é realizada por amostragem em cada Estado da Federação e tem como objetivo avaliar as gestões dos sistemas educacionais, a ANEB recebe o nome do SAEB em suas divulgações. A ANRESC é mais extensa e detalhada e tem como objetivo avaliar cada escola. Pela sua universalidade, a ANRESC recebe o nome de Prova Brasil em

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suas divulgações sendo aplicada a todos os estudantes de 4ª e 8ª séries ( 5º e 9º anos), de todas as escolas públicas urbanas do Brasil com mais de 20 alunos na série.

Nos testes de Matemática são avaliadas habilidades e competências definidas nas matrizes de referência que estabelecem o domínio esperado de alunos de 4ª série ou 5º ano (ANEXO 1), 8ª série ou 9º ano do Ensino Fundamental (ANEXO 2) e de alunos do 3º ano do Ensino Médio (ANEXO 3) recomendados pelos PCNs. É utilizada uma mesma matriz de referência em Matemática no SAEB e na Prova Brasil. As questões são elaboradas a partir de situações que requerem a resolução de problemas nos eixos Espaço e Forma, Grandezas e Medidas, Números e Operações e Tratamento da Informação.

Os resultados de ambas as avaliações são apresentados em uma escala de desempenho por disciplina, designado por níveis. A escala de Matemática é composta por dez níveis que vão do 125 ao 375, portanto, os níveis variam de 25 em 25 pontos. Os níveis da escala são cumulativos, ou seja, o que os alunos demonstram saber em um nível está incorporado nos níveis posteriores da escala, ou seja, cada nível é constituído pelas habilidades descritas somadas às habilidades dos níveis anteriores. Os números indicam apenas uma posição na escala, por isso, faz-se necessária uma interpretação pedagógica dos resultados (ANEXO 4).

O gráfico abaixo apresenta as médias de proficiência em Matemática obtidas pelos alunos nas avaliações do SAEB realizadas entre 1995 e 2005.

Resultados como os verificados no gráfico anterior e o dia a dia em sala de aula mostram que o Ensino de Matemática no Brasil apresenta problemas. Os alunos demonstram dificuldades básicas de aprendizagem. Esse déficit básico dificulta o ensino de conceitos mais avançados que deveriam ser ensinados nas séries seguintes. Dessa forma, todo o ensino- aprendizagem durante a vida escolar do aluno fica comprometido e prejudicado.

Na experiência profissional de sala de aula e em aulas particulares verifiquei que muitos dos erros apresentados em Matemática são cometidos por vários alunos, bem como são semelhantes as dificuldades em realizar algumas operações e conceber determinados conteúdos são semelhantes em vários indivíduos. Alunos que concluíram o Ensino Fundamental se atrapalham, por exemplo, com operações básicas envolvendo frações, com números irracionais e até com divisão entre números naturais, apesar de saberem resolver questões de geometria e trabalhar com álgebra, conteúdos considerados mais complexos. Em divisões como 1236 ÷ 12, que resulta 103, freqüentemente aparece como resultado o número 13, pois os alunos se atrapalham com o algoritmo e não se preocupam com o valor posicional dos números, como também não têm noção da ordem de grandeza dos números envolvidos

sem do resultado esperado. Esse erro pode ser encontrado ainda em estudantes dos Ensinos Médio e Superior.

O significado de cada passo do algoritmo quase nunca é justificado, o que leva a problemas como o evidenciado na seqüência de cálculo anterior.

Outras questões semelhantes, verificadas no dia a dia de um professor de Matemática, suscitaram a hipótese de que a concepção errônea dos números naturais, inteiros, racionais, irracionais e reais surge como obstáculo a muitos dos problemas que os alunos apresentam no decorrer de sua vida escolar. Muitos professores reclamam de que seus alunos não sabem a tabuada e atribuem a essa deficiência a “culpa” pela maioria dos erros cometidos, mas muitas vezes o problema se encontra na concepção dos números, como, por exemplo, na equivalência entre as ordens10 numéricas.

A presente pesquisa tem por objetivo identificar alguns exemplos de obstáculos epistemológicos matemáticos na sala de aula do Ensino Fundamental, no ensino/aprendizagem dos números naturais, inteiros, racionais e irracionais a fim de ampliar a discussão visando a concepção dos números reais.

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O lugar ocupado por um algarismo, na escrita de um número, indica a ordem do agrupamento; essas ordens são numeradas da direita para a esquerda, têm nomes específicos e são agrupadas em classes a cada três ordens. Como classes podemos citar a das unidades simples, formada pelas ordens unidades, dezenas e centenas; a classe dos milhares, formada pelas ordens unidades, dezenas e centenas de milhar; e a classe dos milhões, formada pelas ordens unidades, dezenas e centenas de milhão.