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Comparação dos estímulos em português com os do francês

No documento danielpereiraalves (páginas 59-62)

3. FENÔMENOS SUPRASSEGMENTAIS

4.2. Comparação dos estímulos em português com os do francês

Os estímulos criados seguiram o modelo daqueles utilizados no experimento em francês (Christophe et al., 2004), mas além da diferença da língua, outras adaptações foram feitas para as sentenças do Português. Em francês, não foi controlado o número de sílabas entre as sentenças e, por isso, há sentenças curtas com apenas 11 sílabas e outras mais longas, com até 25 sílabas:

(9) Sentença em francês com 11 sílabas:

(10) Sentença em francês com 25 sílabas:

Il se souvenait du port trépidant d'Amsterdam où il avait passé douze années de son enfance1.

Em nossos experimentos, procuramos manter uma variação menor entre o número de sílabas. No experimento 1, as sentenças experimentais tinham de 20 a 21 sílabas e as distratoras de 20 a 23 e no experimento 2, as experimentais tinham de 19 a 23 sílabas e as distratoras de 19 a 22. Exemplos de sentenças em português serão apresentados na próxima seção, e uma lista completa pode ser consultada nos Apêndices A (p. 126), B (p.129), C (p.132) e D (p.133).

Outra diferença é em relação à posição do segmento crítico nas sentenças. Em francês, há casos em que os segmentos aparecem em posição medial, mas em muitas sentenças a palavra-alvo está presente logo no início, como segunda sílaba das sentenças, antecedida apenas por um pronome ou artigo. Nos exemplos abaixo, a palavra-alvo encontra-se negritada em caixa-alta:

(11) Sentença em francês com palavra-alvo em posição medial: Tout le monde disait que le FORT bancal allait s'écrouler.

(12) Sentença em francês com palavra-alvo em posição inicial: Le FORT colossal repoussait facilement les envahisseurs

Embora seja importante certa diversificação entre as sentenças, a fim de se evitar que os sujeitos reconheçam padrões de recorrência nos estímulos e passem a apresentar um comportamento viciado em suas reações, acreditamos que a palavra-alvo sendo apresentada tão no início da sentença possa interferir nos resultados obtidos. Uma vez que as sentenças são apresentadas umas após as outras e em grande quantidade, mesmo um sujeito atento pode ter sua reação atrasada nesse caso.

Em português, optamos por manter a posição medial como padrão de apresentação do segmento crítico, momento em que o sujeito deveria reagir diante da palavra-alvo. A

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Dependendo da velocidade de fala, o número de sílabas produzidas pode variar, preservando-se ou não as sílabas com "e" mudo.

diversificação desse padrão, deixamos a cargo das sentenças distratoras, com a palavra-alvo ora mais no início ora mais no final, mas sempre com uma distância mínima de quatro sílabas a partir da extremidade inicial da sentença. Desse modo, evita-se, a um só tempo, uma reação dos sujeitos condicionada pela regularidade de apresentação dos estímulos e, ainda, que os tempos de reação nas sentenças experimentais sejam distorcidos por algum tipo de desatenção, uma vez que as distratoras não são computadas em nossas análises.

Abaixo, são apresentados exemplos de uma sentença experimental com padrão medial (13) e duas sentenças distratoras, a primeira com padrão inicial (14) e, a segunda, com padrão final (15). As três sentenças foram retiradas do Experimento 1, mas o mesmo padrão é válido para as sentenças do Experimento 2. A palavra-alvo encontra-se negritada e em caixa-alta:

(13) Sentença experimental com padrão medial:

A Simone passou o réveillon num BAR famoso de Copacabana.

(14) Sentença distratora com padrão inicial:

O navio enGOLfou-se na neblina e desapareceu pra sempre.

(15) Sentença distratora com padrão final:

Ele se dizia marinheiro, mas não sabia dar um NÓ sequer.

Constata-se, ainda, uma terceira diferença entre os estímulos do francês e do português, em relação ao controle acentual. No experimento em francês, a palavra virtualmente competidora superposta à fronteira do constituinte prosódico tinha um padrão acentual diferente daquele apresentado pelas sílabas que deveriam ativá-la nas sentenças:

(16) Il avait un DÉ faussé qui lui permettait de jouer des tours à ses amis (défaut) (S W S W) (W S)

(17) D'après ma soeur, le gros CHAT grimpait aux arbres. (chagrin) (S W S W) (W S)

Segundo as próprias autoras, o padrão acentual da língua francesa é fraco-forte, com última sílaba das palavras quase sempre tônica (Christophe et al., 2004, p.535). No entanto,

em (16), a palavra ambígua encontrada entre as fronteiras seria “défaut”, cujo padrão acentual é fraco-forte e em (17), a palavra ambígua seria “chagrin” com o mesmo padrão acentual, mas, no contexto em que estão inseridas, as palavras ambíguas apresentam, na verdade, um padrão forte-fraco, atípico no francês. Talvez isso seja devido à dificuldade de se criarem frases com palavras ambíguas entre fronteiras de constituintes prosódicos, dada a própria característica da língua francesa. As palavras ambíguas deveriam ser formadas, nesse caso, pelo monossílabo seguido de uma palavra cuja primeira sílaba seja tônica. Mas, como vimos, a tônica geralmente é a última sílaba de uma palavra francesa, e não a primeira, o que torna difícil criar, entre fronteiras de constituintes prosódicos, palavras ambíguas iniciadas por sílaba fraca.

Como vimos, o acento lexical em francês recai sempre na última sílaba; portanto, um monossílabo tônico não seria um concorrente perfeito à primeira sílaba de um dissílabo, que não carrega o acento lexical. Em PB, os candidatos dissílabos escolhidos eram paroxítonos, com o acento lexical recaindo na primeira sílaba e, portanto, concorrentes perfeitos aos monossílabos alvos.

Uma quarta diferença é percebida em relação às sentenças distratoras. No francês, há casos em que a sílaba homófona ocorre no início das palavras: "un CHApeau". As autoras relataram que nesse caso houve um alto número de falsos alarmes, pois os ouvintes eram levados a supor que se tratava da palavra-alvo chat. Ressaltam, ainda, que o aumento desse tipo de sentenças ("hardest to reject") no experimento 2 pode ter sido o motivo para os tempos de reação mais lentos na condição Fronteira de Palavra Prosódica, em comparação com os tempos obtidos para essa mesma condição no experimento 1. Dada essa possibilidade de interferência nos resultados, evitamos tais tipos de sentenças e utilizamos a sílaba homófona como sílaba medial das palavras-alvo, nunca inicial.

Estabelecidas as diferenças em relação ao experimento em Francês, passemos à descrição da construção dos estímulos em Português. Primeiramente serão apresentados os estímulos do Experimento 1 e, posteriormente, os do Experimento 2.

No documento danielpereiraalves (páginas 59-62)