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Até 1971, o regime de cobrança ao beneficiário para comparticipação em medicamentos estava fixado na base de 25 % e 40 % do PVP, conforme se tratasse, respectivamente, de medicamentos de origem nacional ou estrangeira (56, 63).

O consumo de medicamentos aparecia, no entanto, com uma substancial taxa de crescimento que, do ponto de vista financeiro, era agravada pelo aumento dos respectivos preços. Adicionalmente, o valor estimado em despesas afectas a esta área era, em 1982, na moeda antiga, já cerca de 14 000 000 de contos. Era, também, excessiva a despesa que o OGE tinha de suportar relativamente à assistência medicamentosa, excluindo os hospitais oficiais, assim como era exagerado o consumo de medicamentos em algumas zonas do País, constituindo motivo de preocupação pelo potencial distúrbio do equilíbrio psico- fisiológico dos indivíduos e das manifestas condições de desperdício (70).

Foi posta, então, em execução uma política de racionalização da aplicação dos meios disponíveis na prestação dos cuidados de saúde. Para tal, e considerando que, no momento, se apresentava como a alternativa menos gravosa para a população, foi considerada forçosa a implementação de uma taxa fixa referente à prescrição de cada medicamento, prática já corrente noutros países (70).

A 1 de Fevereiro de 1982, por orientação do Ministro dos Assuntos Sociais, entrou em vigor a cobrança, aos utentes, de uma taxa de 25$00 por cada embalagem de cada especialidade farmacêutica prescrita no receituário em uso nos SMS (70). Para aplicação

desta taxa, cada prescrição só podia conter uma embalagem de cada especialidade farmacêutica, com excepção dos medicamentos apresentados em unidose, cuja prescrição em conjunto se considerava como monoprescrição (70).

No entanto, por ocorrerem situações clínicas em que a prescrição de medicamentos não podia obedecer estritamente ao disposto na lei, sob pena de serem cometidas injustiças em relação a cidadãos cujo quadro clínico obrigava a tratamentos continuados por largo período de tempo, foi admitida, nesse mesmo ano, a prescrição de medicamentos para tratamentos até períodos de um mês, ficando excluídos da obrigação de prescrição de mono-embalagem os medicamentos tonicardíacos, anti-hipertensivos, anticonvulsivos,

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antibióticos, antiparkinsónicos, da terapêutica hormonal substitutiva e da anti-diabética, citostáticos, imunodepressores e anti-glaucomatosos, para os quais passou a ser admitida a prescrição para um mês de tratamento, desde que claramente indicado na receita pelo médico prescritor tratar-se de doença crónica (71).

A experiência conseguida com a introdução do pagamento da comparticipação por receita dos SMS, demonstrou que o regime instituído contribuía, efectivamente, para o fim em vista, possivelmente por maior consciencialização do seu custo, quer por parte dos médicos, quer por parte dos utentes (72). Na medida em que fosse possível reduzir os gastos

inúteis nesse campo, tornar-se-ía viável orientar mais recursos para a satisfação de outras necessidades prementes da população, a qual não devia ser sacrificada em consequência de gastos indiscriminados e desproporcionados em relação aos benefícios.

Em 1982, foi julgado ter chegado o momento oportuno de, conservando as vantagens de um sistema que favorecia a racionalização do consumo de medicamentos, introduzir aperfeiçoamentos e clarificar aspectos do seu funcionamento (72). Pretendeu-se

iniciar a adopção de medidas destinadas a corrigir situações que seriam de injustiça social por atingirem os doentes crónicos, tendo sido introduzidas alterações para beneficiar um considerável e elevado número de utentes que não podiam dispensar o uso permanente de certos medicamentos. Consequentemente, a comparticipação dos utentes na compra de preparações de insulina, fixada então em 40 %, por serem de origem estrangeira, passou a ser de 25 % (72). Adicionalmente, foram acrescentados à lista de medicamentos que podiam

ser adquiridos em mais do que uma embalagem os anti-asmáticos, com comparticipação fixa só pelo total, exigindo-se a indicação de tratamento prolongado na receita médica, e foi suprimida a restrição do limite de um mês de tratamento nos casos de prescrição para

tratamento prolongado, deixando ao médico a liberdade para estabelecer tal limite (72).

A revelação positiva nos efeitos, conseguida pela aplicação do regime de cobrança de um valor de comparticipação no preço dos medicamentos, reflectia-se no notório decréscimo do consumo de medicamentos considerados não essenciais e na diminuição da despesa; expressava, também, benefícios no campo da saúde, pois permitia contrariar a tendência reconhecidamente perigosa do consumo excessivo de medicamentos. Isso fez com que o Governo estipulasse um montante fixo de 25$00 de PVP por embalagem de

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medicamento sempre que este fosse de valor igual ou inferior a essa quantia (70, 72). O

Governo estipulou, também, o pagamento de uma parte variável na comparticipação dos utentes dos SMS e nos preços dos medicamentos prescritos, incluídos no receituário em uso naqueles serviços, igual a 25 % ou 40 % do preço total, consoante se tratasse de medicamento de origem nacional ou estrangeira, respectivamente, mantendo-se a comparticipação dos utentes em 25 % do PVP para as preparações de insulina, independentemente da consideração da sua origem (70-73). Contudo, o aviamento de

medicamentos prescritos no receituário não implicava necessariamente a utilização desse esquema de comparticipação podendo o utente, quando tal lhe fosse mais favorável, prescindir desse valor, pagando a totalidade do PVP (73). Manteve-se, ainda, a prescrição de

apenas uma embalagem de especialidade farmacêutica, salvo os casos de prescrição de medicamentos apresentados em unidose destinados a um só tratamento, os medicamentos destinados a tratamento prolongado (tonicardíacos, anti-hipertensivos, anticonvulsivos, antibióticos, antiparkinsónicos, medicamentos de terapêutica substitutiva hormonal e antidiabética, citostáticos e imunodepressores, antiglaucomatosos e antiasmáticos), desde que sujeitos à menção de tratamento prolongado escrita pelo médico (73). Para além destes

ajustamentos, as comparticipações dos utentes nos preços dos medicamentos passaram a ser cobradas directamente pelas farmácias fornecedoras dos mesmos (73).

As comparticipações dos utentes na despesa com os medicamentos prescritos no receituário em uso nas administrações regionais de cuidados de saúde pretendiam, entre outros objectivos, fazer reflectir sobre o acesso àqueles cuidados, tendo em atenção não só os prejuízos para a saúde, como resultado do seu consumo excessivo e incontrolado, mas também a necessidade de sensibilizar os utentes para os custos, cada vez mais elevados, dos mesmos. Contudo, essas comparticipações não podiam ser praticadas de forma generalizada e indiscriminada. Era necessário prever situações de excepção que justificassem abordagens distintas, como era o caso, por exemplo, dos medicamentos cujo consumo não podia ser moderado, por serem de aplicação exclusiva e indispensável em situações clínicas específicas, os quais incluiam os tuberculostáticos, os antilepróticos e os citostáticos (74). Por isso, e seguindo recomendações da OMS, organismo a que Portugal

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relativamente à Saúde (75), o acesso a esses medicamentos, obrigatoriamente constantes das

listas do FNM, actualizadas sempre que a evolução técnica assim o aconselhasse, e desde que prescritos nas unidades prestadoras de cuidados de saúde e em impressos próprios, passou a ser integralmente gratuito (74).

Na sequência das reformas feitas, os medicamentos subsidiados pelo Estado e sujeitos a pagamento de comparticipação pelos utentes passaram a incluir antiepilépticos,

antiparkinsónicos, antiasmáticos, inaladores, antidiabéticos orais, injectáveis (preparações

de insulina), citostáticos imunosupressores e outros medicamentos utilizados em

oncologia, e medicamentos específicos para a hemodiálise (74).

Na sequência de eleições legislativas nacionais, realizadas em 9 de Junho de 1983, foi formado um novo Governo nacional, de acordo com a incidência parlamentar do Partido Socialista e do Partido Social-Democrata, que se manteve em funções até 6 de Novembro de 1985, tendo sido, nessa data dissolvido por desentendimentos entre os referidos partidos.

Uma das primeiras preocupações na área da saúde, expressas no programa desse IX Governo Constitucional, resultava da necessidade de reformular o regime de comparticipações para acesso às prestações de saúde, designadamente as relativas aos medicamentos (76). A ausência de base legal suficiente para suportar a legislação em vigor

como documento regulamentador da anuência de taxas moderadoras fixas para acesso aos medicamento (72, 73), revelava-se inconstitucional (76). Para além de não ter cobertura no

OGE para 1982, o Ministério dos Assuntos Sociais, que a fez publicar em 6 de Novembro de 1982, não dispunha de competência legislativa, da exclusiva responsabilidade da Assembleia da República, para estabelecer a dupla comparticipação dos utentes: a taxa fixa de 25$00 e a taxa variável de 25 % ou 40 % sobre os medicamentos (76). Também não se

descortinava razão para ser fixa a taxa de comparticipação, uma vez que continuava por se descobrir a contraprestação para o respectivo preço (76, 77).

A declaração de inconstitucionalidade então realizada foi bem acolhida, mas não foi observada de imediato por ser considerado mais oportuno e aconselhável proceder primeiro à reformulação total da política de medicamentos, pela sua inevitável e elevada

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complexidade, tecnicidade e dificuldade. Só em 1984 foi possível a efectividade da sua vigência (76).

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