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2. INFORMAÇÃO, CIDADANIA E DEMOCRACIA: COMUNICAÇÃO

2.2 Comunicação pública, da visão organizacional à perspectiva do cidadão

2.2.3 Comunicação pública e Jornalismo

Seguindo a perspectiva de que o sentido precípuo da comunicação pública estatal é o interesse público, Kunsch (2013) defende a existência de uma comunicação integrada para a prática eficaz da comunicação pública. Esta deve se desenvolver, para a autora, a partir da integração entre diversas áreas da comunicação, como Relações Públicas, Comunicação Organizacional, Jornalismo, Publicidade e Propaganda, editoração multimídia, comunicação audiovisual, comunicação digital etc. (KUNSCH, 2013). Por sua vez, Koçouski (2012) observa que o Jornalismo é, dentre as áreas da comunicação que podem desenvolver a comunicação pública, a que mais tem proximidade com o interesse público, enquanto a Publicidade e Propaganda a que tem menos.

Como parte do trabalho da área de Relações Públicas a favor da comunicação pública, Kunsch (2013) aponta o papel de abrir canais de comunicação com os públicos, a opinião pública e a sociedade em geral. Têm-se ainda como subáreas a atuarem na comunicação pública: a Publicidade e Propaganda, que deve “ter como princípio fundamental o caráter de interesse e de utilidade pública, e não a ênfase nas glórias e conquistas dos fazeres de um governo” (p. 11), caso em que se justifica, para a autora, a veiculação paga; e a comunicação digital e as novas mídias, por meio de experiências de e-governance (governo eletrônico) e dos portais governamentais, que permitem o acesso do cidadão às ações da administração pública.

Por sua vez, o Jornalismo no âmbito da comunicação institucional, para a autora, é outra subárea indicada como “um campo que abre amplas possibilidades no tocante às práticas da comunicação pública e governamental” (KUNSCH, 2013, p. 11). Ela lista alguns valores que devem guiar a informação jornalística neste caso:

[...] “ouvir” a sociedade – ser sensível às demandas sociais e políticas; verdade – ser transparente, pois os receptores precisam ser respeitados e os fatos publicados/divulgados podem ser objeto de verificação, análise e comentários; rapidez – atender às demandas sociais com a maior presteza possível; sinceridade – elucidar fatos que merecem esclarecimento dos diversos segmentos (cidadão, entidades, sociedade civil, opinião pública, imprensa etc.); cordialidade – uma marca que deve guiar as relações entre fontes governamentais e a mídia; e credibilidade – a confiança na fonte é algo imprescindível (p. 11).

Ainda no tocante à comunicação estatal, Kunsch (2013) resume sua perspectiva:

Defendo que a proposição de estratégias e ações de comunicação pública estatal pressupõe: a existência de uma política global de comunicação; a utilização de pesquisas e auditorias; planejamento estratégico; e, sobretudo, a prática de uma comunicação integrada, que capitalize eficaz e eficientemente a sinergia das distintas subáreas de comunicação social (p. 12).

Assim, a comunicação pública pode se dar sob formas variadas – de campanhas publicitárias a programas noticiosos –, desde que o interesse público seja priorizado. Falamos exatamente que ele deve ser priorizado em virtude da impossibilidade de total ausência de outros interesses, como interesses políticos ou empresarias. Segundo Costa (2006), “as ações de Comunicação de Interesse Público [...] despontam como iniciativas diferenciadas que acabam agregando associações positivas à imagem das organizações, sejam elas públicas, privadas ou não-governamentais” (p. 21). Quando uma emissora comercial, por exemplo, produz um programa instrutivo e formativo sobre a importância da preservação ambiental, salta aos olhos o interesse público da temática, porém está também presente o interesse empresarial de angariar credibilidade. Do mesmo modo, ocorre com emissoras estatais. Ademais, não se pode olvidar que o próprio Jornalismo sofre de tal ambiguidade, o que pode levar-nos a tratar como natural tal miscelânea de interesses e pretensões, que, numa última instância, é característica da própria sociedade.

Pode-se dizer que a realização da comunicação pública empregando técnicas jornalísticas é uma forma possível de contornar as dificuldades que o universo de informações geradas na administração pública gera para a compreensão do cidadão. Desse modo, o filtro, a seleção e o tratamento oferecidos por esta atividade propiciam uma simplificação requerida no mundo político ou da administração pública, favorecendo, assim, o papel democrático a ser exercido pela comunicação pública. Este trabalho busca enxergar a Agência Câmara Notícias sob esta ótica.

Jornalismo público

Se, institucionalmente, defende-se que o papel a ser exercido pelos veículos da Câmara é a prática da comunicação pública, Bernardes (2007, 2010) e Barros, Bernardes e Lemos (2008) vão além ao indicarem que tais meios realizam, em parte, um Jornalismo público, em virtude, especialmente, de terem o interesse público como principal critério de noticiabilidade e de contribuírem para sofisticar a educação política do cidadão. Ressaltamos que não há uma opinião pacífica acerca da caracterização desses

veículos, ponto que abordamos mais detidamente no próximo capítulo. Por ora, tratemos de como surgiu essa denominação e de como ela tem conexões com o próprio conceito de comunicação pública de que estamos tratando.

Fallows (1997) apresenta um quadro nebuloso vivido pela imprensa estadunidense no final do século XX, principalmente a televisiva. Segundo ele, o Jornalismo havia distorcido o seu papel, ao adaptar-se à linguagem e às práticas do entretenimento: a cobertura política era feita com foco no “perde-ganha” das disputas eleitorais, permeada por intrigas, desprezando-se o debate sobre as políticas públicas e sobre as necessidades da população; os temas complexos e de interesse público eram tratados superficialmente, reduzidos a posições extremas.

Gomes (2004) relata como o sistema informativo acaba seguindo as propriedades da indústria cultural, baseando-se principalmente na conquista de audiência. Por conta disso, elementos da cultura de massa, da lógica do entretenimento, são incorporados como critérios de noticiabilidade jornalísticos. Por esse pensamento, o principal critério de decisão sobre o que é ou não notícia é a capacidade de despertar interesse no público (percebe-se, assim, uma substituição da ideia de “interesse público” pela noção de “interesse do público”).

Na tentativa de recuperar a ligação da imprensa com o interesse público e com a cidadania, um grupo de jornalistas e acadêmicos cria a ideia de um “Jornalismo Público” ou “Jornalismo Cívico”. Segundo Jay Rosen, um dos fundadores desse movimento, “O Jornalismo pode e deve ter um papel no reforço da cidadania, melhorando o debate público e revendo a vida pública” (apud TRAQUINA, 2005, p. 172).

Na avaliação dos fundadores desse movimento, a cobertura negativa da política desestimulava o interesse dos cidadãos pela vida pública. Eles propunham a prática de um Jornalismo pautado nos interesses dos cidadãos, capaz de aproximá-los da discussão das questões públicas e de oferecer-lhes condições para a formação de um julgamento crítico (FALLOWS, 1997; MORAES, 2011; ROTHBERG, 2011; TRAQUINA, 2005).

Arthur Charity (apud MORAES, 2011), outro teórico do movimento, defende que a cobertura de um assunto público deve contribuir para que os cidadãos tenham um conhecimento amplo da situação. Além disso, é essencial nessa proposta a defesa da presença de diversos grupos sociais no espaço de discussão pública, ou seja, da pluralidade de discursos na mídia (MORAES, 2011).

Os críticos dessa prática, contudo, afirmavam que uma cobertura mais aprofundada certamente acarretaria um maior conhecimento político, mas esta também poderia acontecer no âmbito dos padrões tradicionais de Jornalismo. Fallows (1997) concorda com o fato de o Jornalismo Público não ser algo novo, mas apenas a aplicação de critérios que a prática jornalística deveria sempre adotar. “Essa abordagem é apenas ‘bom Jornalismo’” (p.322), defende.