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CAPÍTULO 1 O PROJETO GARABI-ITÁ, SUA EXECUÇÃO NO MUNICÍPIO DE

1.1 COMUNIDADE LOCAL

A compreensão do contexto da comunidade local, na qual se encontram os sujeitos desta pesquisa e a escola envolvida, requer uma caracterização do município, definido como um município que se constitui como um diversificado parque industrial, com uma população de pouco mais de 38.000 habitantes, para a qual convergem indivíduos em busca de trabalho, de várias regiões deste e de outros Estados e costuram uma trama de culturas, de valores, hábitos, atitudes, pensamentos, que modificam e hibridizam a cultura local.

A comunidade em questão sofreu forte influência da colonização alemã, iniciou sua história com a instalação, pelos imigrantes, de ferrarias, serrarias e oficinas artesanais, o que viria a ser o embrião para o desenvolvimento de diversas e sólidas indústrias nos anos seguintes. Sua relação com o trabalho na indústria é cada vez mais forte, na medida do crescimento do parque industrial municipal, considerado o 3º Polo Metal Mecânico do Estado e conhecida como Cidade das Máquinas, o que já dá indicativos sobre suas características, seu povo, sua cultura e economia.

A caracterização do município como polo industrial ocorreu devido à existência de uma grande quantidade de empresas, o que requer constante mão de obra e promove a convergência contínua de um fluxo de migrantes em busca de emprego, fato intensificado nos últimos anos pelo aumento da oferta. A falta de moradias para atender a demanda desse

contingente entre outros fatores impõe uma restrição a uma parcela significativa dos trabalhadores que mantém apenas relações de trabalho na comunidade, residindo em outros municípios, o que dificulta o estabelecimento de vínculos locais mais profundos. O recente aumento da oferta de cursos técnicos e de faculdades também representa a vinda de estudantes e trabalhadores temporários, da mesma forma como há egressão de mão de obra qualificada.

Esse fenômeno de migração, também tem um impacto significativo sobre a vida das pessoas, suas relações pessoais, culturais e suas atitudes em relação ao meio ambiente, na medida em que produz uma mistura de culturas, valores, hábitos e formas de ver o mundo. De acordo com Hall (2006), a migração produz a pluralização de culturas e identidades nacionais, pela possibilidade de entrelaçamento e criação de novas culturas e identidades, o que também pode ser visível em âmbito local.

Influenciada pela mídia e por outras culturas que se estabeleceram neste município pode-se dizer que há um hibridismo cultural, menos intenso, no qual o traço cultural unificante é o trabalho. Percebe-se claramente a tensão entre o global e o local, e um empenho numa tentativa de manter as tradições da cultura que os imigrantes cultivavam no início da colonização do município.

Segundo Hall (2006) as identidades formadas são cada vez mais desvinculadas, desalojadas de tempos, lugares, histórias, e tradições específicas. Esse deslocamento das identidades locais pode suscitar a investigação da forma como as culturas locais contribuem para a costura, a construção dessa identidade. Para compreender a realidade local se pode fazer o que propõe Giroux (1986, p.301) “investigar os significados e práticas culturais de diferentes grupos e começar a apurar como suas naturezas contraditórias podem ser utilizadas para promover uma compreensão crítica da realidade”.

Neste lugar sobram postos de trabalho, falta mão de obra especializada e, em busca de soluções, diversos programas e instituições privadas, de âmbito municipal, estadual e, ou, federal procuram preparar para o trabalho, como o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), Instituto Federal Farroupilha (IFF), Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC), ainda, o Poder Executivo mantém um convênio com o Colégio Evangélico Panambi para concessão de bolsas de estudo de cursos técnicos.

As próprias empresas investem em formação de seus trabalhadores, promovendo parcerias com escolas particulares, auxiliando nas despesas dos cursos técnicos de seus funcionários, como uma empresa que paga parte da faculdade de engenharia mecânica para funcionários. Ônibus são fretados para a busca diária de trabalhadores de outros municípios e

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está se investindo na construção de um condomínio prioritariamente para funcionário próximo a uma das empresas.

Neste cenário municipal modificado na última década, perpassado por fases de grande desemprego e atual fase de desenvolvimento industrial e comercial intenso viveram e vivem os sujeitos dessa pesquisa, os ex-alunos que hoje tem idade entre 23 e 28 anos, os quais se encontram em sua maioria trabalhando na indústria e comércio. A cultura do trabalho e o que representa para a comunidade local pode ser representada na fala de um ex-aluno, entrevistado em 2011, que relatou trabalhar na mesma empresa que o pai trabalhava e não pensava em fazer faculdade, pois os amigos lhe diziam que com o valor pago poderia comprar um carro. Esta é uma realidade de grande parte dos jovens da comunidade, trabalhar para comprar os bens da moda, celular, computador, roupas, moto, carro, o que reflete um comportamento nacional, devido ao desenvolvimento econômico do país na última década.

Desenvolvimento visível na frota de carros do município de 20.486 veículos, registrados no próprio município, sem considerar os emplacados em outros lugares que circulam na cidade. Em comparação com o número de 12.996 domicílios particulares permanentes, conforme o censo de 2010 pode-se observar uma média de mais de um carro por família3. O crescimento da frota de veículos é verificado no congestionamento crescente no trânsito e o crescimento demográfico também se reflete no crescimento visível da construção civil local.

Nesse contexto de desenvolvimento e de crédito facilitado para aquisição da casa própria, carro e outros bens, observam-se um consumo extremo, e uma competição pelo melhor, mais moderno, que se reflete na escola, na sala de aula. No tripé trabalho x consumo x satisfação, observa-se um frenesi de consumo.

Esse comportamento diferenciado de gerações anteriores tem produzido resultados questionáveis, contraditórios, à medida que ocorre um aumento da renda per capita e possibilidade de acesso a bens materiais, também se verifica outra face, a falta de tempo para lazer, distanciamento dos filhos, índices alarmantes de doenças cardiovasculares, neurodepressivas e alto índice de câncer. Além da degradação ambiental, aumento do desflorestamento, contaminação da água, dos alimentos, poluição e produção de lixo.

Esse comportamento local reflete o que ocorre a nível global com o processo de ocidentalização do mundo, verificado no modo de agir, na música, nos filmes, na comida, nos

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BRASIL: Censo Demográfico 2010 Completo de Panambi (RS). Disponível em:

<http://informacoesdobrasil.com.br/dados/rio-grande-do-sul/panambi/frota-automoveis-2010/>. Acesso em: 20 de nov. 2013.

bens de consumo, que apesar de ser maior no centro do sistema global, nos grandes centros comerciais, também se verifica nas periferias do mundo e, em menor escala e mais lentamente no interior dos países. Fenômeno que para Hall (2006) também pode ser visto de forma positiva, à medida que produz identidades partilhadas e permite que várias culturas convivam sem que cada uma perca sua essência.

Ainda, enquanto caracterização do município é imperativo lembrar o significado do nome, cuja origem vocabular é decorrente da língua tupi-guarani e quer dizer “borboleta”. Cognominada como “Vale das Borboletas Azuis”, o termo “vale” é utilizado em alusão à topografia acidentada do município, que segundo falas de moradores mais antigos eram verdes, com flora e fauna exuberantes, onde sobrevoavam muitas espécies de borboletas, entre as quais se destacavam grandes borboletas azuis metalizadas. O fato de este cenário ser comum na década de 1940 remete a uma reflexão sobre as modificações ocorridas, passado pouco mais de meio século. Não é possível negar o fato do desenvolvimento industrial e a ocupação do espaço urbano terem contribuído com a degradação ambiental, mas também a forma de pensar e a relação individual do homem com a natureza teve impacto significativo sobre este lugar.

Inserida no bioma de mata tropical, o que originalmente era mata nativa e campos é hoje uma reduzida área ou modificada. A grande quantidade de coqueirais do passado é atualmente presença rara. Da original Floresta de Planalto com presença de Araucária pouco restou, sendo que apenas escassos pinheiros são vistos na paisagem atual.

O principal rio, denominado Fiúza, corre em área urbana e é fonte de água para a população, porém, muito diferente do início da colonização quando era um local de encontro e diversão das famílias, que segundo o historiador Leitzke (1990) em suas margens existia um balneário público onde era possível a prática da pesca, canoagem e havia aulas de natação e muito mais espécies de animais eram vistos em suas águas transparentes e límpidas. Apesar da atual poluição da água e do desmatamento da mata ciliar ainda é habitado por lontras.

Dos vários afluentes do rio Fiúza, destaca-se o Arroio do Moinho, à margem direita, cujo curso inferior corta a cidade, apresenta um trecho canalizado e é desprovido da vegetação ciliar em vários pontos e como o rio Fiúza recebe resíduos domésticos e industriais. Em uma porção, no curso superior do arroio, na entrada do limite rural para o urbano, foi realizada a reposição florestal da mata ciliar, objetivado pelo Projeto Garabi-Itá e realizado nos anos 2000 a 2003, do qual os sujeitos desta pesquisa participaram.

Os problemas ambientais observados em âmbito local, também podem ser observados em âmbito global, porém, algumas soluções podem ter abrangência local. Percebe-se, porém,

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que iniciativas de preservação ambiental, de sensibilização, de conscientização, no município de Panambi parecem surtir pouco efeito, mostram certa letargia em que se encontra o ser humano. No entanto percebe-se que muitas dessas iniciativas são mais de cunho pessoal do que coletivo, são projetos de alguns militantes incansáveis e persistentes. Com certeza, há outras ações individuais que buscam formas de relação menos agressivas com o ambiente, porém poucas são ações de cunho coletivo, discutidas e planejadas pela comunidade local.

Todas as características locais demandam um olhar especial sobre a forma de ocupação do espaço, sobre o uso dos recursos naturais e a produção e destinação de resíduos. É construtivo diagnosticar e conjecturar sobre os pontos frágeis da comunidade nos aspectos físicos, socioeconômicos e socioambientais, com os quais a comunidade local precisa se preocupar. Na biosfera tudo está interligado, uma coisa afeta a outra. A preservação da água é um problema global, para a qual é necessário preservar a mata ciliar, as vertentes de água, acabar com a poluição da terra, da água, destinar corretamente os resíduos, evitar a erosão e o desflorestamento. Um ambiente degradado compromete a boa qualidade de vida, a saúde e a felicidade do ser humano.

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