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A greve pode ser conceituada juridicamente como a paralisação do trabalho de um grupo de trabalhadores com interesse comum para postular pretensões ao seu empregador. (NASCIMENTO, 2012, p. 507) Nota-se, portanto, que é exigência para o reconhecimento jurídico da greve a necessidade de se pleitear perante o empregador novas condições de trabalho aos interessados.

Para Süssekind (1993, p. 37), a greve pode ser conceituada de duas formas distintas, uma de caráter sócio-político e a segunda com conteúdo jurídico. A greve, enquanto fenômeno sócio-político, compreende a insubordinação de pessoas com interesses comuns que tenha o objetivo de substituir instituições públicas ou sistemas legais. Nesse caso, assume caráter nitidamente revolucionário e não há tutela pelo ordenamento jurídico. Por outro lado, a greve, compreendida no âmbito jurídico, refere-se à pressão exercida por trabalhadores contra empresários para a conquista da negociação coletiva acerca de aspectos econômicos, jurídicos ou referentes ao meio ambiente de trabalho.

A Constituição Federal de 1988 não traça o conceito do direito de greve, deixando para os próprios trabalhadores a escolha sobre a oportunidade para seu exercício, bem como a definição dos interesses que pretendem defender. Por sua vez, a Lei nº 7.783/1989, legislação ordinária responsável pela regulamentação do direito de greve, estabelece o conceito de greve para o ordenamento jurídico em seu art. 2º: “Para os fins desta Lei, considera-se legítimo exercício do direito de greve a suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços a empregador. ”

A partir do conceito legal, será legítimo o exercício do direito de greve quando ocorrer a suspensão coletiva da prestação dos serviços, ou seja, é exigência da lei a participação de um grupo de trabalhadores, não sendo admitida a greve individual. Além disso, o movimento deve ser temporário e pacífico, sendo que a prática de atos de violência importa em abuso do direito de greve. Não se exige que todos os trabalhadores de uma empresa ou de uma determinada categoria deixem de prestar os serviços, pois o conceito admite a paralisação parcial do trabalho.

Para Delgado (2016, p. 1.557), o conceito de greve pode ser extraído em sentido mais amplo caso tomada como parâmetro a definição do art. 9º da Constituição Federal. Dessa forma, a greve corresponde à paralisação coletiva das atividades do empregador ou tomador dos serviços, que deve ser provisória, podendo ter como objetivo a conquista de interesses coletivos ou outros objetivos sociais mais abrangentes.

A greve é, assim, o direito de não trabalhar com o objetivo de alcançar a aprovação das reivindicações resistidas, pois a ausência da prestação de serviços causa prejuízos normais ao empregador e também à coletividade nas greves em atividades essenciais. Por outro lado, os prejuízos, que advêm da utilização truculenta do movimento, podem dar origem à responsabilização civil, penal e trabalhista dos envolvidos pelos danos causados. (MELO, 2011, p. 40)

No tocante à dimensão subjetiva da greve, é necessário apontar quais trabalhadores podem realizar o movimento paredista. Inicialmente, destaca-se que o “lock out” é vedado no ordenamento jurídico brasileiro, não cabendo aos empregadores a paralisação das atividades com o intuito de frustrar ou dificultar o atendimento das reivindicações dos trabalhadores. Nesse sentido, prevê o art. 17 da Lei nº 7.783/1989: “Fica vedada a paralisação das atividades, por iniciativa do empregador, com o objetivo de frustrar negociação ou dificultar o atendimento de reivindicações dos respectivos empregados (lockout). ”

Dessa forma, somente é possível mencionar o direito de greve a partir dos trabalhadores, únicos legitimados a paralisar as atividades na busca pelo atendimento de seus interesses. É necessário indicar quais trabalhadores têm assegurado o direito de greve.

Pela definição do art. 2º da Lei nº 7.783/1989, a greve é realizada contra o empregador, portanto, por entendimento restritivo somente atingiria os empregados. Entretanto, esse posicionamento vai de encontro com o texto constitucional que admite, inclusive, a greve de servidores estatutários. (MALLET, 2015, p. 30-31) Além disso, os próprios trabalhadores avulsos, que não são empregados, podem realizar o movimento grevista, tendo em vista sua organização capaz de realizar paralisações em relação a seus tomadores de serviços. As próprias relações jurídicas decorrentes do aumento da terceirização colocam em questionamento a dualidade entre a greve de empregados e empregadores, sendo necessária a consideração também dos tomadores de serviços. (DELGADO, 2016)

As paralisações realizadas por trabalhadores autônomos, sócios, cooperados e também pelos usuários de algum serviço não se configuram como greve na acepção jurídica do termo, uma vez que essas entidades não têm legitimidade para a propositura de dissídio coletivo ou mesmo para firmar acordo ou convenção coletiva de trabalho. (MALLET, 2015, p. 32)

Acerca das características do movimento paredista, destaca que é essencial o caráter coletivo do movimento, não podendo ser aceito o movimento simplesmente individual. Ainda que pautado em condições prejudiciais quanto ao meio ambiente de trabalho e que tenha repercussão aos demais empregados da empresa, não há greve. Por outro lado, para ser coletiva, não se exige a abrangência da greve em todos os empregados de determinada empresa ou categoria, pois a própria legislação permite a greve total ou parcial. (DELGADO, 2016, p. 1.558)

Mallet (2015, p. 36-39) salienta a necessidade da manifestação coletiva do movimento para a configuração da greve. Nesse sentido, a greve apresenta duas importantes facetas, uma coletiva e a outra individual. No momento de deflagração do movimento, exige-se a manifestação e aprovação dos interessados, por isso, seu caráter coletivo. Ainda que vários

trabalhadores deixem de comparecer ao trabalho, se não houver aprovação do grupo de trabalhadores interessados ao movimento, não há configuração de movimento paredista.

O autor destaca que, aprovada pelo grupo, a greve pode ser realizada, não havendo, no entanto, obrigação de adesão pelos trabalhadores. Portanto, pode o empregado continuar trabalhando, mesmo após a deflagração da greve. Essa é a faceta individual da greve, pois permite que o empregado escolha se adere ou não ao movimento, direito estendido inclusive às lideranças do movimento sindical que não são obrigadas a participar da greve, caso não concordem com o posicionamento do grupo.

Para o autor, ainda que apenas um trabalhador exerça a greve, ela será válida, caso tenha sido aprovada previamente pelos interessados. Nesse caso, estará fadada ao término diante da não adesão dos demais trabalhadores, mas será plenamente válida em relação ao nosso ordenamento jurídico.

Outra importante característica da greve é a sustação das atividades pelo empregado de forma provisória, que ocorre com a omissão coletiva do cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de trabalho. Além disso, exige-se também a realização de atos preparatórios e de ampliação e preservação do movimento que necessitam de atuação dos envolvidos e que não desconfiguram o movimento. (DELGADO, 2016, p. 1.558)

O caráter transitório do movimento é destacado por Mallet (2015, p. 33) como indispensável para a caracterização do movimento grevista, pois esta não se confunde com o abandono coletivo do emprego pelos trabalhadores. Haverá sempre a expectativa de retorno ao trabalho com o fim do movimento. A legislação não estabelece nenhum prazo mínimo ou máximo para o término da greve, que poderá durar horas ou até mesmo anos, ou seja, até que o interesse tutelado que tiver dado origem ao movimento permaneça e que haja paralisação do trabalho, a greve pode perdurar no tempo.

O autor salienta que é permitido, inclusive, a fixação do prazo com a deflagração, prevendo termo prefixado para o fim da greve. Essa medida será problemática caso o motivo que justificou a greve não seja alcançado antes do final do seu prazo. Todavia, é possível que novo movimento seja autorizado em assembleia pelos trabalhadores e a greve seja novamente instaurada.

A atual legislação não proíbe que a greve ocorra no interior da empresa, desde que não haja nenhum ato de violência, como a destruição dos equipamentos e demais ferramentas de trabalho e que não haja impedimento para que os demais empregados, que não aderirem ao movimento, ingressem na empresa para trabalhar. A ocupação do local de trabalho é, todavia,

mais suscetível ao cometimento destes atos ilícitos, o que permite a declaração de abusividade do movimento. (DELGADO, 2016, p. 1.559)

Portanto, a greve, enquanto fenômeno jurídico, é eminentemente uma manifestação que decorre das relações coletivas de trabalho, pois os trabalhadores coletivamente organizados podem paralisar seus serviços na busca de seus interesses, como a concretização de determinada reivindicação remuneratória ou de melhorias nas condições de trabalho. É a manifestação da autotutela protegida pelo ordenamento jurídico como direito fundamental dos trabalhadores.

A deflagração e a manutenção do movimento grevista não asseguram apenas reflexos no plano fático, mas trazem diversas consequências jurídicas positivas para a relação de trabalho, pois são ferramentas indispensáveis para assegurar o cumprimento de direitos do trabalhador e alcançar a dignidade da pessoa humana. A greve tem ainda como característica fundamental a defesa dos interesses dos trabalhadores.