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De acordo com Geurts e Sonnentag (2006), a recuperação é definida como um processo que ocorre após um esforço, e na ausência de stressores, em que os sistemas psicofisiológicos ativados durante situações stressantes regressam a um nível basal, isto é, aos seus níveis pré-stressores. Segundo as mesmas autoras, é possível distinguir dois tipos de recuperação: interna e externa. A recuperação interna ocorre no contexto de trabalho e durante pequenas pausas para descanso, como pausas para café, almoço ou lanche, verificando-se que contribuem para o controlo da fadiga e manutenção do desempenho profissional (Lombardi, et al., 2014; Tucker, 2003). Além disso, a recuperação interna pode igualmente referir-se à possibilidade dos profissionais criarem pequenas pausas entre as tarefas a realizar no trabalho quando se sentem cansados, como por exemplo, alterar para tarefas menos exigentes ou diminuírem o ritmo de trabalho. Já a recuperação externa

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ocorre fora do contexto do trabalho e durante o período pós-trabalho no final do dia, durante os fins-de-semana ou durante maiores períodos de pausa como as férias. As autoras distinguem ainda que esta recuperação externa pode ocorrer através de um mecanismo mais passivo, pelo simples afastamento dos fatores de stress do trabalho, ou através de um mecanismo mais ativo, através da realização de atividades que contribuem para a recuperação como ver televisão, conviver com os amigos ou praticar desporto. A este nível, já Fritz e Sonnentag (2005) tinham analisado o efeito do fim-de-semana na recuperação, concluindo que o envolvimento em atividades sociais com pessoas significativas tem um efeito positivo no bem-estar e no desempenho profissional no início da semana.

Embora inicialmente a investigação se centrasse no tipo de atividades que permitem a recuperação, Sonnentag e Fritz (2007) defendem que mais importante do que a atividade em si, o que é relevante para a recuperação são os processos psicológicos subjacentes a essa atividade. Por exemplo, para um profissional a leitura de um livro ou ver televisão poderá ser suficiente para recuperar do stress do trabalho, enquanto outro pode necessitar de realizar uma caminhada para se sentir recuperado. Ainda que estas atividades sejam diferentes, o processo subjacente (e.g. relaxamento) é semelhante para os dois profissionais. Neste sentido, as autoras defendem a importância de analisar estes processos psicológicos subjacentes às atividades, e que definem por Experiências de Recuperação, sendo possível distinguir quatro experiências de recuperação: Afastamento Psicológico, Relaxamento, Procura de Desafios e Controlo, dimensões que compõem o questionário desenvolvido pelas mesmas autoras para operacionalizar as experiencias de recuperação (Recovery Experiences Questionnaire), e que passamos a descrever.

O Afastamento Psicológico refere-se não só a estar fisicamente afastado do local de trabalho, mas também que o profissional consiga desligar-se mentalmente do próprio trabalho. Isto é, implica que o profissional não realize em casa tarefas profissionais, como enviar emails, receber ou fazer telefonemas de trabalho, mas também que ele próprio não pense nas tarefas profissionais a executar ou situações de trabalho a resolver. Se o profissional não conseguir desligar-se mentalmente do trabalho, continuando sistematicamente a pensar no trabalho, os sistemas psicofisiológicos ativados durante o exercício profissional continuam a ser ativados e a recuperação pode não ocorrer. O Relaxamento está associado a atividades de lazer e caracteriza-se por um estado de baixa ativação fisiológica. O relaxamento pode ocorrer a um nível físico ou mental, através da

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realização de atividades como o relaxamento muscular progressivo de Jacobson, a meditação ou outras atividades como caminhar ao ar livre, ouvir música ou ler um livro. O relaxamento é assim importante para a recuperação, na medida em que permite reduzir a ativação psicofisiológica e promove o humor positivo. A Procura de Desafios diz respeito ao processo subjacente à realização de atividades que constituem novos desafios (e.g. escalar uma montanha), novas aprendizagens (e.g. aprender uma nova língua, um novo hobby) ou ainda alargar horizontes, como viajar para um país desconhecido. Ainda que estas experiências possam acarretar exigências adicionais para o indivíduo, é esperado que promovam a recuperação, pois favorecem o desenvolvimento de novos recursos internos, como novas competências pessoais, ou da autoeficácia. Por último, o Controlo refere-se à possibilidade do indivíduo escolher qual a atividade que vai realizar durante o seu tempo livre/lazer, assim como, quando e como realizar. Deste modo, o Controlo favorece a recuperação, na medida em que permite aos profissionais escolher atividades da sua preferência, aumentando o seu sentimento de competência, que por sua vez promove o bem-estar.

Analisando o impacto das experiências de recuperação na saúde dos profissionais, verifica-se que estão relacionadas com a saúde e o bem-estar (Siltaloppi, Kinnunen & Feldt, 2009; Sonnentag & Fritz, 2007). Concretamente, o afastamento psicológico está negativamente correlacionado com sintomas psicossomáticos, depressão e perturbações do sono (Sonnentag & Fritz, 2007), assim como, negativamente correlacionado com a necessidade de recuperação e a exaustão emocional, constituindo a experiência de recuperação com maior impacto no bem-estar (Siltaloppi, et al., 2009; Sonnentag & Fritz, 2007). Também o relaxamento está negativamente associado a problemas de saúde, exaustão emocional, depressão e necessidade de recuperação (Sonnentag & Fritz, 2007). Já a procura de desafios encontra-se negativamente associada à exaustão emocional, depressão e necessidade de recuperação (Sonnentag & Fritz, 2007), constituindo também preditores significativos e positivos do engagement (Siltaloppi et al., 2009). Por sua vez, o controlo também se correlaciona negativamente com sintomas psicossomáticos, ansiedade, depressão, exaustão emocional e perturbações do sono (Sonnentag & Fritz, 2007). Além disso, verifica-se que as quatro experiências de recuperação estão positivamente correlacionadas com a satisfação com a vida (Sonnentag & Fritz, 2007).

Também o impacto a longo prazo das experiências de recuperação tem sido analisado, verificando-se que desempenham um papel fundamental na manutenção do

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bem-estar psicológico. Siltaloppi, Kinnunen, Feldt e Tolvanen (2011), num estudo longitudinal realizado com um ano de intervalo, verificaram que os profissionais com maiores níveis de procura de desafios e de controlo durante o seu tempo livre/lazer apresentavam maiores níveis de engagement. Por outro lado, os profissionais que apresentavam níveis mais reduzidos em todas as experiências de recuperação analisadas, isto é, de relaxamento, afastamento psicológico, procura de desafios e controlo, apresentavam maiores níveis de exaustão emocional.