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CAPÍTULO 1. Emoção

1.3. Regulação Emocional

1.3.1. Conceito de Regulação Emocional

O estudo da regulação emocional tem origem nas tradições psicanalíticas do

stress e do coping. O interesse neste domínio acentuou-se pela necessidade de

distinguir: a) regulação das e pelas emoções; b) auto e hetero-regulação; e c) regulação emocional consciente e inconsciente (Gross, 1999). A regulação emocional diz respeito ao modo como se regulam as emoções (regulação das emoções), mais do que como estas regulam algo exterior (regulação pelas emoções) (Gross, 2014).

Nos últimos 20 anos aumentou exponencialmente a pesquisa sobre o campo da regulação emocional (Gross, 2015) e o impacto das diversas estratégias de regulação na fisiologia, na experienciação e na expressão emocionais (para revisões ver Gross & Thompson, 2007; Koole, 2009). Solidificou-se a compreensão de que uma eficaz regulação das emoções é essencial para diversos aspectos da adaptação saudável, desde o funcionamento afectivo até às relações sociais (Gross, 2001). De acordo com a base de dados PsycINFO, depois da publicação do artigo de Gross (1999), surgiram mais de 700 artigos que incluíam no título, ou abstract, o termo “regulação emocional”. O número multiplica-se se considerarmos aqueles que focam constructos intimamente relacionados, mas distintos, como o coping, a regulação e a reparação do humor, e as defesas psicológicas. A regulação emocional distingue-se destes pela expressão ou supressão das emoções (Gross, 1998b; Gross, Richards, & John, 2006; Gross & Thompson, 2007).

O coping é a forma como o indivíduo enfrenta uma situação adversa (John & Gross, 2007). É o esforço do organismo para gerir as suas relações com o meio- ambiente, tendo o foco primário no decréscimo da experienciação da emoção negativa (Gross, 1998b).

A regulação do humor distingue-se da emoção por ter maior duração, menor intensidade, ser mais difusa e não necessitar de uma causa antecedente definida (Forgas, 1995). Comparativamente à regulação emocional, tanto a regulação como a reparação do humor estão mais focadas na alteração da experiência da emoção do que no comportamento (Larsen, 2000).

A defesa psicológica refere-se às características relativamente estáveis de um indivíduo, que operam inconsciente e automaticamente, com o intuito de reduzir a experiência subjectiva da ansiedade, da agressividade, dos impulsos sexuais e de outras emoções desagradáveis (Gross et al., 2006; Gross & Thompson, 2007).

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A regulação emocional reporta-se à tentativa do indivíduo determinar que e

quando tem emoções e como as experiencia ou expressa (Gross, 1998a,b; Gross et al.,

2006; Gross & Thompson, 2007). Tais esforços podem ser automáticos ou controlados, conscientes ou inconscientes, e ter consequências em um ou mais momentos do processo gerador da emoção (Gross, 1998b): início, manutenção e/ou modificação da ocorrência, intensidade e duração dos estados emocionais (Gross et al., 2006). São processos intrínsecos e extrínsecos encarregados de monitorizar, avaliar e modificar as reacções emocionais, com o intuito de atingir objectivos específicos, com especial atenção nas características de intensidade e de tempo (Thompson, 1994). Segundo Gross (2007), a regulação emocional refere-se à diminuição da intensidade ou duração (down-regulation) do afecto negativo e ao aumento (up-regulation) do afecto positivo. Envolve a consciência e a compreensão das emoções, a sua aceitação, a aptidão para controlar comportamentos impulsivos e de agir de acordo com as metas pretendidas, e a capacidade para recorrer a estratégias de regulação emocional apropriadas à situação com a flexibilidade necessária para modular as respostas emocionais conforme o desejado, a fim de alcançar as metas individuais e as exigências situacionais. A falta de uma ou de todas estas aptidões indicia a presença de dificuldades na regulação, ou mesmo desregulação, da emoção (Gratz & Roemer, 2004).

A maior parte da literatura afirma que o período crucial para o desenvolvimento da regulação emocional se situa entre a infância e a adolescência (Thompson, 1994), época em que as forças temperamentais, neurobiológicas (e.g., desenvolvimento dos lobos frontais), conceptuais (e.g., compreensão dos processos emocionais) e sociais (e.g., família, pares e professores) se unem para fundar as bases da vida emocional do sujeito (Calkins & Hill, 2007; Rothbart & Sheese, 2007; Thompson & Meyer, 2007). Estes alicerces podem sofrer alterações e desenvolver-se ao longo da idade adulta (John & Gross, 2004). Outros autores defendem que a formação da criança, em termos de regulação emocional, ocorre mais cedo, desde o nascimento até ao início da idade escolar, atribuindo ao contexto familiar um lugar de destaque (Castro, Halberstadt, Lozada, & Craig, 2015; Retana-Franco & Sánchez-Aragón, 2010; Southam-Gerow & Kendall, 2002). Mais, um grande número de estudos indica que os ambientes familiares expressivos relacionam-se com a expressividade manifestada na adultez (e.g., Halberstadt, Fox, & Jones, 1993; Kring & Gordon, 1998; Mizokawa, 2013; Nelson et al., 2012).

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Para Retana-Franco e Sánchez-Aragón (2010), a aprendizagem pelas crianças das técnicas de auto-controlo parece ficar a dever-se à relação que estas estabeleceram com as estratégias utilizadas pelas mães, ao longo do tempo. O modo como se vivencia e transmite a emoção no seio da família é uma variável preditiva da maneira como os filhos irão fazê-lo. Enquanto uns aprendem a exteriorizar as emoções outros apreendem a ocultá-las, com o intuito de se expressarem em conformidade com o socialmente aceite. Visto que o processo de aprendizagem se faz, também, por imitação4, as crianças consolidam a sua personalidade mais influenciadas pelo que os pais fazem do que pelo que dizem.

Os pais influem a maneira como as crianças avaliam as situações relevantes através da informação que fornecem sobre as circunstâncias (e.g., descrevendo como divertida uma estadia no acampamento não mencionando os bichos inerentes ao contexto), explicando as causas das emoções que a criança sente ou observa nos outros (e.g., “o teu irmão está com medo do cão porque ontem um outro cão lhe ladrou”), e transmitindo regras de sentimento, ou guiões emocionais (e.g., “as crianças crescidas portam-se bem quando estão na casa dos outros”) (Calkins & Hill, 2007; Cassidy, 1994; Gross & Thompson, 2007). As crenças, os comportamentos e as capacidades dos pais contribuem para 37% da variância para as crianças reconhecerem as emoções nos outros, o que vai ter efeito no seu sucesso, em diversos domínios sócio-emocionais. Mas é na escola, e na interacção com os pares, que se torna essencial compreender as próprias emoções e as dos outros. Neste processo de socialização, as crianças aprendem a regular-se por normas, valores e padrões de comportamento (Yárnoz, Alonso-Arbiol, Plazaola, & Sainz de Murieta, 2001). “A utilização de regras de expressão emocional exige uma perspectiva centrada no outro e orientada para a relação interpessoal” (Sá, 2002, p. 15).

A expressão das emoções revela-se desde tenra idade, porém, a regulação emocional nas crianças está dependente dos outros. Aproximadamente 99% das expressões faciais, todas elas com uma função adaptativa, estão relacionadas com as emoções básicas de interesse, divertimento, tristeza e raiva (Izard et al., 1995). A expressão das emoções é de crucial importância para o desenvolvimento e regulação das relações interpessoais. Sujeitos com paralisias faciais congénitas, revelaram sérias dificuldades em desenvolver e manter até as mais simples relações sociais, em

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consequência da sua incapacidade de expressar emoções através do rosto (Ekman, 1999).