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Conceito e aspectos introdutórios

III. DA DUPLA PATERNIDADE.

3.1 Conceito e aspectos introdutórios

Sempre que mencionamos a palavra família, nos vem à mente aquele modelo adotado originariamente pela sociedade, um homem e uma mulher que se casam, constituem família e convivem para sempre. No entanto, esse conceito familiar não é mais vivenciado atualmente, ou seja, hoje em dia já é aceito novos modelos familiares.

Sempre que se pensa em família ainda vem à mente o modelo convencional: um homem e uma mulher unidos pelo casamento, com o dever de gerar filhos, até que a morte os separe mesmo na pobreza, na doença e na tristeza. Só que essa realidade mudou se é que um dia existiu! Mas, hoje todos já estão acostumados com as famílias que se distanciam do perfil tradicional. A

convivência com famílias recompostas, monoparentais, homoafetivas impõe que se reconheça que seu perfil se pluralizou (DIAS, 2016, p. 228).

A família brasileira passou por importantes transformações nos últimos anos, como já foi dito anteriormente. O modelo de família que estávamos acostumados a encontrar muito se modificou, já que, o que encontramos agora, é uma sociedade que não se preocupa somente com o vínculo biológico, mas também com o vínculo afetivo.

Sendo assim, a filiação não pode ser baseada somente em um vínculo consanguíneo e físico, é preciso demonstrar a vontade em ser pai, o afeto entre os filhos, genitor ou genitora. Dessa forma, podemos concluir que a nossa sociedade se tornou uma família baseada na afetividade.

Diante deste cenário, com a transformação da sociedade, o sistema judiciário também teve que se atualizar e encontrar maneiras que beneficiem e simplifiquem as entidades familiares, ou seja, foi aí que surgiu a possibilidade da multiparentalidade, que é a possibilidade da pessoa ter dois pais ou duas mães reconhecidas.

A doutrina vem admitindo, nesse sentido, a possibilidade da multiparentalidade, ou seja, uma pessoa possuir mais de um pai ou mais de uma mãe simultaneamente, produzindo efeitos jurídicos em relação a todos eles, ou seja, incide a obrigação alimentar e sucessória entre as partes. (MALUF E MALUF, 2016, p. 532).

A multiparentalidade ou dupla paternidade no registro civil de nascimento é a possibilidade da criança ter dois pais ou duas mães em seu registro. Antes das mudanças ocorridas nos últimos anos, com relação ao modelo de família, a criança se via em uma situação muito difícil, já que tinha seu pai biológico registrado, mas na maioria das vezes ausente, e, ao mesmo tempo, havia a figura do padrasto, que era considerado um pai presente, mas que não podia formalizar essa situação.

“Consiste no fato de o filho possuir dois pais ou mães reconhecidas pelo direito, o biológico e o socioafetivo, em função da valorização da filiação socioafetiva”. (GONCALVES, 2015, p 315).

Sabemos que o ideal seria que a criança pudesse ter em uma figura paterna os dois laços, tanto o afetivo quanto o biológico, mas, diante da realidade que vivemos, ter os dois

pais reconhecidos foi uma maneira de viabilizar o melhor benefício da criança, já que ficaria muito difícil a escolha de qual pai seria registrado.

O fenômeno que vemos muito hoje em dia é o fato dos pais biológicos, muitas vezes, nem chegarem a se casar, ou se casam e acabam separando depois, contraindo novas núpcias. Diante disso, com o convívio, a criança passa a reconhecer como pai ou mãe o companheiro de sua genitora ou genitor, haja vista, que é essa pessoa que muitas vezes educa, ajuda com despesas, tarefas diárias, estando muito mais presente do que o pai de vinculo biológico, no qual a criança acaba passando só as férias, fins de semana ou feriados. Essa convivência envolve, às vezes, relações transversais entre filhos oriundos dos relacionamentos anteriores de cada pai e os comuns, dentro do mesmo ambiente familiar, o que provoca incertezas acerca dos possíveis direitos e deveres emergentes, pois é inevitável que o padrasto ou madrasta assuma de fato as funções inerentes da paternidade ou maternidade. (LOBO, 2008, p.73).

Alguns doutrinadores defendem ainda a importância da relação afetiva com relação à biológica, o que não foi pacificado, já que não pode haver uma disputa entre as duas relações. Nenhuma figura paterna pode ser considerada mais importante do que a outra, podendo assim a criança ter os dois pais reconhecidos e formalizados na filiação. Sendo assim, essa foi uma maneira da legislação se adequar à nova realidade, já que a sociedade muito se transforma com o tempo.

“Portanto há a filiação biológica e a filiação socioafetiva, podendo-se a esta última se aplicar por analogia, no que couber, as disposições alusivas á filiação biológica”. (LISBOA, 2013, p. 275).

Por outro lado, diversos casos fizeram com que o ordenamento jurídico tomasse uma atitude em relação a esse tipo de situação, ou seja, houve vários relatos, também de crianças, que foram registradas por um pai ou mãe, e, futuramente, descobriram que estes não eram seus pais biológicos. Sendo assim, diante de tal situação, porque não incluir o nome do genitor ou genitora biológico e manter o afetivo, ou vice-versa?

Diante de tal situação a lei nº 11.924/2009 atualizou a Lei de Registros Públicos de 1973 permitindo o enteado adotar o sobrenome do padrasto ou madrasta.

Lei 11924/09 Altera o art. 57 da Lei no 6.015 , de 31 de dezembro de 1973, para autorizar o enteado ou a enteada a adotar o nome da família do padrasto ou da madrasta. Altera o art. 57 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para autorizar o enteado ou a enteada a adotar o nome da família do padrasto ou da madrasta. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1o Esta Lei modifica a Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973 - Lei de Registros Públicos, para autorizar o enteado ou a enteada a adotar o nome de família do padrasto ou da madrasta, em todo o território nacional. Art. 2o O art. 57 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, passa a vigorar acrescido do seguinte § 8o: "Art. 57. § 8o O enteado ou a enteada, havendo motivo ponderável e na forma dos §§ 2o e 7o deste artigo, poderá requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o nome de família de seu padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo de seus apelidos de família." (NR) Art. 3o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

É muito interessante perceber como nosso ordenamento jurídico também se transforma em busca do melhor interesse da criança ou adolescente, e, até mesmo, com relação ao princípio da dignidade humana, uma vez que a criança, tendo o amparo de ambos os pais, fica em uma melhor posição econômica.

Em uma recente decisão o CNJ fez mais uma alteração beneficiando a dupla paternidade e a paternidade afetiva autorizando os oficiais de cartório incluir o nome do pai socioafetivo na certidão de nascimento sem nenhum tipo de decisão judicial.

Provimento Nº 63 de 14/11/2017

Art. 10. O reconhecimento voluntário da paternidade ou da maternidade socioafetiva de pessoa de qualquer idade será autorizado perante os oficiais de registro civil das pessoas naturais.

§ 1º O reconhecimento voluntário da paternidade ou maternidade será irrevogável, somente podendo ser desconstituído pela via judicial, nas hipóteses de vício de vontade, fraude ou simulação.

§ 2º Poderão requerer o reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva de filho os maiores de dezoito anos de idade, independentemente do estado civil.

§ 3º Não poderão reconhecer a paternidade ou maternidade socioafetiva os irmãos entre si nem os ascendentes.

§ 4º O pretenso pai ou mãe será pelo menos dezesseis anos mais velho que o filho a ser reconhecido.

Art. 11. O reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva será processado perante o oficial de registro civil das pessoas naturais, ainda que diverso daquele em que foi lavrado o assento, mediante a exibição de documento oficial de identificação com foto do requerente e da certidão de nascimento do filho, ambos em original e cópia, sem constar do traslado menção à origem da filiação.

§ 1º O registrador deverá proceder à minuciosa verificação da identidade do requerente, mediante coleta, em termo próprio, por escrito particular, conforme modelo constante do Anexo VI, de sua qualificação e assinatura, além de proceder à rigorosa conferência dos documentos pessoais.

§ 2º O registrador, ao conferir o original, manterá em arquivo cópia de documento de identificação do requerente, juntamente com o termo assinado.

§ 3º Constarão do termo, além dos dados do requerente, os dados do campo FILIAÇÃO e do filho que constam no registro, devendo o registrador colher a assinatura do pai e da mãe do reconhecido, caso este seja menor.

§ 4º Se o filho for maior de doze anos, o reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva exigirá seu consentimento.

§ 5º A coleta da anuência tanto do pai quanto da mãe e do filho maior de doze anos deverá ser feita pessoalmente perante o oficial de registro civil das pessoas naturais ou escrevente autorizado.

§ 6º Na falta da mãe ou do pai do menor, na impossibilidade de manifestação válida destes ou do filho, quando exigido, o caso será apresentado ao juiz competente nos termos da legislação local.

§ 7º Serão observadas as regras da tomada de decisão apoiada quando o procedimento envolver a participação de pessoa com deficiência (Capítulo III do Título IV do Livro IV do Código Civil).

§ 8º O reconhecimento da paternidade ou da maternidade socioafetiva poderá ocorrer por meio de documento público ou particular de disposição de última vontade, desde que seguidos os demais trâmites previstos neste provimento.

Art. 12. Suspeitando de fraude, falsidade, má-fé, vício de vontade, simulação ou dúvida sobre a configuração do estado de posse de filho, o registrador fundamentará a recusa, não praticará o ato e encaminhará o pedido ao juiz competente nos termos da legislação local.

Art. 13. A discussão judicial sobre o reconhecimento da paternidade ou de procedimento de adoção obstará o reconhecimento da filiação pela sistemática estabelecida neste provimento. (BRASIL, 2017).

Parágrafo único. O requerente deverá declarar o desconhecimento da existência de processo judicial em que se discuta a filiação do reconhecendo, sob pena de incorrer em ilícito civil e penal.

Art. 14. O reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva somente poderá ser realizado de forma unilateral e não implicará o registro de mais de dois pais e de duas mães no campo FILIAÇÃO no assento de nascimento.

Art. 15. O reconhecimento espontâneo da paternidade ou maternidade socioafetiva não obstaculizará a discussão judicial sobre a verdade biológica.

Assim, vemos que a multiparentalidade não é mais nenhuma novidade em nosso ordenamento jurídico, entretanto, esse provimento recém-publicado deu uma maior inovação, trazendo ainda a possibilidade desse reconhecimento ser feito de forma extrajudicial.

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