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Segundo Tartuce (2015, p. 904), “o regime matrimonial de bens pode ser conceituado como sendo o conjunto de regras de ordem privada relacionadas com interesses patrimoniais ou econômicos resultantes da entidade familiar”. Desse modo, o regime de bens tem por consequência o efeito patrimonial, pois, geralmente disciplina a relação jurídico- patrimonial existente entre os cônjuges; cabe a esses escolherem o regime, antes da celebração do casamento; se forem omissos, assumirão o regime supletivo previsto no artigo 1.640 do Código Civil/2002.

O ordenamento jurídico brasileiro estabelece os regimes de bens conjugais. Esses são norteados pelos seguintes princípios: liberdade de escolha, variabilidade de regimes, e mutabilidade.

O princípio da liberdade de escolha está previsto no artigo 1.639, CC/2002; permite aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular quanto ao regime que será adotado, o qual passará a vigorar desde a data do casamento. Neste sentido têm-se os ensinamentos de Silva (2002, p. 1451):

Em regra geral, vigora o princípio da autonomia da vontade, ou da liberdade, quanto à escolha pelos nubentes de um regime de bens tipificado em lei ou de um regime de bens tipificado em lei ou de um regime misto, ou ainda, de regras especiais, desde que a convenção não prejudique os direitos conjugais ou paternos, ou outra disposição absoluta da lei, casos em que a convenção será havida como nula. Essa autonomia na escolha de regras mistas ou especiais advém do caput deste dispositivo, inobstante o art. 1.640, parágrafo único estabeleça que os nubentes, no processo de habilitação possam escolher qualquer dos regimes tipificados neste Código.

Por este princípio, o Estado não interfere em suas escolhas, em regra, salvo exceções previstas no artigo 1.641, CC/2002, como segue:

Art. 1.641. É obrigatório o regime de separação de bens no casamento: I- das pessoas que o contraírem com inobservância das cláusulas suspensivas da celebração do casamento; II- da pessoa maior de setenta anos; III- de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial (BRASIL/2002).

Tema que gera muita discussão na doutrina é o que estabelece o inciso II, quando veda a liberdade de escolha, antes maiores de sessenta anos, agora dos maiores de setenta anos. Discursa sobre este tema Lôbo (2008, p. 299):

Mesmo se apenas um dos nubentes estiver com mais de 60 anos, obrigatório será o regime da separação de bens. Expõe ainda que essa hipótese é atentatória do princípio constitucional da pessoa humana, por reduzir sua autonomia como pessoa e constrangê-lo a tutela reducionista, além de estabelecer restrição à liberdade de contrair matrimônio, que a Constituição não faz. Consequentemente, é inconstitucional esse ônus.

Este posicionamento considera haver injustiça ao considerar (implicitamente) que pessoa maior de 70 anos (considerado absolutamente capaz para a prática de diversos atos da vida civil) é incapaz de escolher livremente um dos regimes patrimoniais que julgue melhor atender suas expectativas; por outro, por meio da súmula 377, STF, faz justiça ao determinar a comunhão dos bens adquiridos no curso da união familiar, determinando sua partilha, evitando - se, assim, o enriquecimento indevido.

O princípio da variabilidade possibilita aos nubentes escolherem entre os regimes de bens previstos na legislação civilista, cabendo apontar, que no silêncio das partes, prevalecerá o regime da comunhão parcial, que é o regime legal ou supletório (art. 1.640, caput, CC/2002). O regime de bens adotado começa a vigorar desde a data do casamento (art. 1.639, § 1.º, CC/2002).

O princípio da mutabilidade possibilita aos cônjuges modificar o regime de bens ao qual estão inseridos. Nesse sentido, Madaleno (2001, p. 398) escreve que:

Considerando a igualdade dos cônjuges e dos sexos, consagrada pela Carta Política de 1988, soaria sobremaneira herege aduzir que em plena era de globalização, com absoluta identidade de capacidade e de compreensão dos casais, ainda pudesse um dos consortes apenas por seu gênero sexual, ser considerado mais frágil, mais ingênuo e com menor tirocínio mental do que o seu parceiro conjugal. Sob esse prisma , desacolhe a moderna doutrina a defesa intransigente da imutabilidade do regime de bens, pois homem e mulher devem gozar da livre autonomia de vontade para decidirem refletir acerca da mudança incidental do seu regime patrimonial de bens, sem que o legislador possa seguir presumindo que um deles possa abusar da fraqueza do outro.

Fortalecendo esse entendimento, Carvalho (1996, p. 29) afirma, no que se refere ao direito de terceiros frente ao interesse na mutabilidade do regime de bens, que:

Ora, se o casamento não foi instituído à luz do interesse de terceiros, também não pode o regime de bens estar submetido a tais interesses. As pretensões de terceiros não estão dotadas de tal magnitude que possam se enrustir na coluna dorsal do matrimônio, em sua dimensão econômica. Para proteger os interesses de terceiros, máxime credores, preservando-os contra eventuais conluios dos cônjuges, a lei lhe empresta instrumentos próprios, põe-lhes à disposição institutos específicos como a

fraude à execução, a fraude a credores, etc. O devedor, dentro ou fora da sociedade conjugal, tem tratamento igual. Em nada se diferencia o devedor casa do do devedor condômino. O devedor casado não tem mais ou menos privilég ios do que o devedor solteiro.

Pela letra da lei, dispõe o artigo 1.639, § 2°, CC/2002 que haja autorização judicia l, em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros. Sobre os procedimentos legais para regularizar a mudança do regime de bens, Farrula Júnior (2002, p. 318) afirma que:

Diversos cuidados deverão, outrossim, adotar-se nos procedimentos de mudança de regime. Por exemplo, para evitar-se o favorecimento de um cônjuge em relação ao outro, é indispensável saber se ambos ostentam plena capacidade de discernimento e se conhecem as consequências do pedido. Ainda, necessários verificar-se todo o patrimônio envolvido, devendo vir aos autos, por exemplo, declaração de rendimentos de cada qual, certidões cartorárias tanto pessoais quando de bens imobiliários etc. Para afastar eventual fraude de terceiros, seria aconselhável verificar se os requentes têm filhos, dívidas e se são sócios de alguma pessoa jurídica, perquirindo -se, igualmente , quanto à saúde financeira desta. Seria de boa cautela também proceder-se à citação editalícia de eventuais terceiros interessados, preservando -se o Princípio da Publicidade, norteador da eficácia dos atos jurídicos.

Assim sendo, este princípio admite a alteração do regime matrimonial adotado, desde que haja autorização judicial, atendendo a um pedido motivado de ambos os cônjuges, após a verificação da procedência das razões por eles invocadas e da certeza de que tal modificação não causará qualquer gravame a direito de terceiros.

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