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Existem regras quanto ao regime de bens que merecem especial atenção. A começar com o artigo 1.640, CC/2002, pois é o comando legal que determina que o regime legal de bens do casamento é o da comunhão parcial de bens, inclusive nos casos de nulidade ou ineficá c ia da convenção entre os cônjuges e do pacto antenupcial. “Na falta de pacto antenupcial, o regime legal é o da comunhão parcial de bens. A nulidade ou ineficácia do pacto antenupcial não invalida o casamento, que, neste caso, vigorará sob o regime legal, da comunhão parcial de bens” (SILVA, 2012, p. 853). Esse regime é o legal desde a entrada em vigor da Lei 6.515/1977 (Lei do divórcio), sendo que antes, o regime legal era o da comunhão universal de bens.

Entretanto, qualquer que seja o regime de bens, seja o regime legal ou outro adotado por escolha dos contraentes, tanto o marido quanto a mulher podem livremente : praticar determinados atos, conforme estabelece o atual Código Civil (art. 1642, I a VI, CC/2002), acatando o princípio constitucional da igualdade entre os cônjuges, como seguem:

Art. 1.642. Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente:

I - praticar todos os atos de disposição e de administração necessários ao desempenho de sua profissão, com as limitações estabelecida no inciso I do art. 1.647;

II - administrar os bens próprios;

III - desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham sido gravados ou alienados sem o seu consentimento ou sem suprimento judicial;

IV - demandar a rescisão dos contratos de fiança e doação, ou a invalidação do aval, realizados pelo outro cônjuge com infração do disposto nos incisos III e IV do art. 1.647;

V - reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato por mais de cinc o anos; VI - praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente (BRASIL, 2002).

Silva (2012) entende que referida previsão legal corrige as desigualdades entre homem e mulher havidas na legislação civil anterior, fazendo valer o princípio constitucio na l da paridade absoluta entre os cônjuges, como se expõe:

Este artigo versa sobre os atos que podem livremente ser praticados pelo cônjuge, independentemente do regime de bens adotado, e trata marido e mulher de forma igualitária, em acatamento ao princípio constitucional da absoluta paridade entre os cônjuges (CF, art. 226, § 5º). Corrige, assim, as desigualdades que constavam do Código Civil anterior, pelo qual a mulher não podia contrair obrigações que pudessem importar em alheação dos bens do casal (art. 242, IV), ou até mesmo somente podia contrair obrigações concernentes à indústria ou profissão que exercesse “com autorização do marido ou suprimento do juiz” (art. 247, III). (SILVA, 2012, p. 855).

Destaca-se que, conforme prevê o artigo 1.642, inciso V, do CC/2002, tanto o marido quanto a mulher podem livremente reivindicar os bens comuns, móveis ou imóve is, doados ou transferidos pelo outro cônjuge, desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato por mais de cinco anos (BRASIL, 2002). Desse modo, compete ao cônjuge prejudicado e aos seus herdeiros demandar pelo dano causado nas hipóteses do artigo 1.642, III e IV, CC/2002; esse assunto está pacificado pelo STJ, através da Súmula 134, pela qual: Embora intimado da penhora em imóvel do casal, o cônjuge do executado pode opor embargos de terceiro para defesa de sua meação (BRASIL, 1995).

Entretanto, existem exceções, pois embora a pessoa esteja casada, só poderá praticar determinados atos se for autorizada pelo cônjuge, ainda que digam respeito a bens que sejam exclusivamente seus, exceto se o casamento for pelo regime da separação absoluta de bens. Esses atos em relação aos quais a lei impõe restrições estão indicados no artigo 1647, I a IV, CC/2002, como segue:

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:

II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; III - prestar fiança ou aval;

IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.

Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada. (BRASIL/2002).

Art. 1.648. Cabe ao juiz, nos casos do artigo antecedente, suprir a outorga, quando um dos cônjuges a denegue sem motivo ju sto, ou lhe seja impossível concedê-la (BRASIL, 2002).

Assim, pouco importa que o imóvel seja só do marido ou só da mulher, de qualquer modo, salvo no regime da separação absoluta dos bens, determinados atos dependem da autorização do outro cônjuge ou de suprimento da outorga pelo Juiz, conforme estabelece o artigo 1.648, CC, pelo qual: Art. 1.648. Cabe ao juiz, nos casos do artigo antecedente, suprir a outorga, quando um dos cônjuges a denegue sem motivo justo, ou lhe seja impossível concedê- la (BRASIL, 2002). Assim, segundo os ensinamentos de Gonçalves (2017) passa-se a explicar cada um dos atos referidos na legislação civilista (art. 1647, I a IV), como segue.

O ato de gravar com ônus real (art. 1647, I CC/2002) significa oferecer o imóvel como garantia, por exemplo na hipoteca. Por mais que um dos cônjuges seja o dono exclusivo do imóvel, não poderá oferecê-lo em hipoteca sem que o outro autorize. Por exceção, se o regime for o da participação final nos aquestos, poderá constar no pacto antenupcial, se assim os nubentes desejarem, que os imóveis que sejam exclusivos de um deles podem ser vendidos sem a autorização do outro, mas se adquirido na constância do casamento, patrimônio comum do casal, em uma possível divisão dos bens, o valor da venda será considerado como integra nte do patrimônio comum para fins da partilha dos bens comprados na constância do casamento.

O ato de pleitear como autor ou réu (art. 1647, II, CC/2002) em processo no qual se discutam os direitos sobre bens imóveis tanto o autor quanto o réu, se casados, terão que figurar na ação acompanhados do respectivo cônjuge, ainda que o direito a ser discutido diga respeito diretamente apenas a um deles.

O ato de ser fiador (garantia por dívidas comuns) ou avalista (garantia por títulos de crédito) (art. 1647, III, CC/2002) são garantias pessoais nas quais uma pessoa assume o compromisso de pagar dívida de outra, e sendo assim, a fiança e o aval comprometem o patrimônio do casal com dívidas de terceiro, e neste caso, a legislação determina que deve haver a concordância do cônjuge, para evitar que um deles, apenas, possa comprometer a renda familiar por dívidas alheias. Essa questão está pacificada pelo STJ, através da Súmula 332, pela qual: “A fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia” (BRASIL, 2008).

O ato de fazer doação dos bens comuns ou que estejam destinados a serem divididos entre ambos, (art. 1647, IV, CC/2002) pelo fato de o bem pertencer comumente ao casal, certo é a exigência da concordância de ambos para se desfazer do bem, como também os que futuramente poderão ser divididos pelo casal, por mais que sejam atualmente administrados unipessoalmente. Por exceção, no regime de separação absoluta não é necessário a outorga conjugal

Destaca-se que de acordo com os artigos 1.649 e 1.650 do CC/2002, "a falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária, tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade conjuga l" e "a decretação de invalidade dos atos praticados sem outorga, sem consentimento, ou sem suprimento do juiz, só poderá ser demandada pelo cônjuge a quem cabia concedê-la, ou por seus herdeiros" (BRASIL, 2002).

Nesse sentido, é o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, pelo qual é inválida totalmente a fiança prestada sem outorga uxória, como segue:

TJRJ - 0016428-95.2009.8.19.0209 – APELAÇÃO. DES. MÁRIO GUIMARÃ ES NETO – Julgamento: 16/01/2013 – DÉCIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL – EMENTA. APELAÇÃO CÍVEL – DECISÃO MONOCRÁTICA – AÇÃO ANULATÓRIA. CONCESSÃ O DE FIANÇA EM CONTRATO DE LOCAÇÃ O. FIADOR CASADO SOB O REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSA L DE BENS – Ausência de outorga uxória. Invalidade total da fiança prestada sem o consentimento da esposa. Artigo 1.647, III, do Código Civil. Verbete nº 332 da Súmula do STJ. Honorários advocatícios corretamente arbitrados recurso a que se nega seguimento, na forma do artigo 557, caput, do Código de Processo Civil. (RIO DE JANEIRO, 2013)

Por fim, quando um dos cônjuges não puder exercer a administração dos bens que lhe incumbe (art. 1.151, CC/2002) por interdição, ausência, prisão etc. caberá ao outro, em conformidade com o regime matrimonial, substituí- lo, assumindo a direção exclusiva da sociedade conjugal, bem como a gerência dos bens comuns e os do consorte; a alienação dos bens móveis comuns; e a alienação dos imóveis comuns e dos móveis ou imóveis do consorte, mediante autorização judicial. E estando o cônjuge na posse dos bens particulares do outro (art. 1.152, CC/2002), será para com este e seus herdeiros responsável como usufrutuário, se o rendimento for de ambos; como procurador, se tiver mandato para administração; e como depositário, se não for usufrutuário, nem administrador (BRASIL, 2002) (GONÇALVES, 2017).

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