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Pretendemos aqui apresentar as primeiras reflexões que as crianças manifestam, quando são interpeladas em relação ao conceito de família.

Assim, podemos afirmar que, para as crianças, a noção de família, assume-se de extrema importância, considerando como um lugar privilegiado, como podemos constatar pelos seus discursos:

“ Família interessa muito para mim” (Kevin, 8 anos) “Eu acho que a família é tudo” (Barbie, 7 anos).

Perante estes discursos depreendemos que as crianças patenteiam a valorização do conceito de família, considerando que esta assume um papel essencial nas suas vidas. Deste modo, a família pode ser entendida como um conjunto invisível de exigências, que organiza a interacção dos diferentes elementos que a constituem.

Assim sendo, a família pode ser considerada como um sistema que opera através de padrões transaccionais: que é sistema ecológico e sistémico onde encontramos as relações interpessoais, que constituem a base do desenvolvimento e socialização (Palácios & Rodrigo, 1998). Então, facilmente compreendemos a importância de as crianças possuírem representações positivas, relativamente à família. Este processo de socialização consiste na educação, na aprendizagem de novas competências e, ao mesmo tempo serve como forma de controlar o comportamento, no sentido de propiciar à criança formas de conduta de acordo com os padrões sociais e convencionais da comunidade onde se encontra integrada.

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Podemos então afirmar que as crianças entendem a família como algo bastante positivo, focando aspectos de apreço e união, que apoia a ideia de que a família é unida por múltiplos laços capazes de manter os membros ligados entre si:

“É pessoas juntas. É termos alguém…” (Princesa, 8 anos) “Uma família com muito carinho” (Mikey, 8 anos)

Este pensamento enquadra-se na perspectiva defendida por Sampaio & Gameiro (1998), na qual encontramos a família como uma rede complexa de relações e emoções. Então, encontramos na família, um sistema social uno, o qual é constituído por diferentes indivíduos com papéis bem diferenciados, que funcionam em prole do todo. Neste sentido, as crianças mostram-nos que para além da importância assumida pela família, a existência de laços de afecto ocupa um lugar de destaque, merecedor de atenção.

Estas ideias também vêm ao encontro das perspectivas das crianças mais crescidas, que entendem o conceito de família como sendo algo unificador e, em corroboração com as perspectivas das crianças mais pequenas, de extrema importância: “É um bem essencial. É como se fosse um bocado de nós!!!” (Lili, 14 anos).

De salientar que neste grupo de crianças já encontramos sentimentos de pertença associados, bem como a ideia de apoio e suporte, essencial para o desenvolvimento pessoal: “É um apoio para nós” (Carla, 13 anos).

É precisamente no seio familiar, como nos sugerem estes discursos, que encontramos os alicerces fortificadores que impulsionam o crescimento pessoal, bem como as principais fontes de suporte e apoio, daí a relevância atribuída pelas crianças.

À semelhança das crianças mais pequenas, a ideia de união também é partilhada pelos mais crescidos, como importante para a representação do conceito de família: “É ser unida!” (Cristiano, 11 anos). É no interior da família que os indivíduos constituem o que podemos chamar de subsistemas, podendo estes ser formados pelo sexo, faixa etária e/ou função, nos quais se verificam diferentes níveis de poder, e onde os comportamentos de um membro afectam e influenciam os outros membros. Então, a família como unidade social, enfrenta uma série de tarefas de

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desenvolvimento, diferindo a nível dos padrões culturais, mas possuindo as mesmas raízes universais (Minuchin, 1990).

A noção de apoio é uma vez mais demonstrada no discurso das crianças, pelo que podemos afirmar que as interacções familiares constituem uma fonte contínua e duradoura de apoio social. O que confere à família a fonte de apoio social é a qualidade do relacionamento entre seus membros, pelo que verificamos no último discurso, que para o Cristiano a fonte de apoio na família não só existe, como também assume um papel importante na sua vida.

O desenho da Barbie, ilustra-nos o seu conceito de família:

“O pai, a mãe, o tio, eu e meu irmão António, o meu tio, a Jéssica, a Rita! São as minhas irmãs!” “Que gosto muito deles…” “Em minha casa vivo eu, o tio, a mãe, o António, as minhas irmãs... A minha outra irmã vive na Irlanda, não vive lá em casa.”

“O pai não vive lá em casa. Não sei dele há dois anos. (saudades) Uma vezes sim... outras vezes não!!!”

“Família somos todos. São todos!!! Todos os que vivem lá em casa!!!” (Barbie, 7 anos)

É interessante perceber que quando nos fala do seu desenho, a Barbie faz referência à figura paterna e quando questionada se sente saudades do pai, a sua resposta não é claramente afirmativa. Este facto mostra-nos que a convivência com as figuras de referência assume especial enfoque no quotidiano desta criança, pelo que não estar com o pai há cerca de dois anos, não permite concretizar representações acerca do progenitor. Por outro lado, apenas reconhece como membros da família os que partilham a mesma habitação, com os quais convive diariamente e com aqueles que lhe transmitem apoio, suporte, protecção. Daqui, podemos depreender que a

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convivência, a transmissão de valores, o suporte social e apoio, os sentimentos de pertença, apenas podem ser relacionados com figuras presentes na vida das crianças e não com os laços sanguíneos. Não encontramos então a figura paterna, nem no seu mundo imaginário.

No que concerne à importância atribuída à família, as crianças identificam questões de co-sanguinidade, como nos é possível constatar com o discurso do Kevin (8 anos): “Porque é nossa família e é nosso sangue”.

Para que a criança se desenvolva de forma equilibrada é necessário que tenha experiências positivas; pois quando essas experiências são "negativas, traumatizantes ou inexistentes, a construção da personalidade será fortemente afectada" (Rota, 1991, p. 40). Se é verdade que as crianças têm uma grande capacidade de adaptação às adversidades, não é menos verdade que estão numa fase fundamental do seu desenvolvimento e que, para que este ocorra sem grandes prejuízos, é essencial que sintam satisfeitas as suas necessidades básicas, quer fisiológicas quer emocionais. Só assim poderão crescer saudáveis para se tornarem adultos equilibrados.

Gostaríamos de enfatizar o discurso da Lili, o qual nos sugere que a importância da família se encontra aliada a um forte sentimento de pertença e de união: “A importância da família é como se fosse a nossa vida, praticamente!!!”(Lili, 14 anos). Os pais e/cuidadores desempenham um papel único como agentes de socialização. Durante o desenvolvimento da criança, os pais e/ou cuidadores orientam as experiências da criança, na tentativa de transmitir os seus valores educacionais, objectivos e as suas aspirações (Grusec & Goodnow, 1994).

Apesar da dificuldade demonstrada em realçar a importância da família, “Fico contente por ter família” (Carla, 13 anos), “Porque é importante...Não sei!” (Cristiano, 11 anos), as afirmações destas crianças deixam transparecer incertezas e insegurança em relação à necessidade de possuir uma família. Talvez seja por medo, ou talvez por nunca terem tido oportunidade de reflectir acerca desta temática.

Podemos então destacar que para as crianças, o conceito de família encontra-se bem patente nas suas representações, pelo que é notória a valorização que lhe atribuem. Assim sendo, a família ocupa um lugar importante nas vida destas crianças, tendo vindo a demonstrá-lo ao longo dos seus discursos, como nos foi possível constatar.

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Importa ainda referir o facto de terem feito referência ao apoio e suporte, potenciadores de bem-estar, favoráveis a um bom desenvolvimento.