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Relativamente às figuras protectoras na família percebemos que todas as crianças conseguem identificar, dentro da família, mesmo que seja na família alargada, figuras que representam suporte e apoio, como podemos verificar:

“A minha mãe e a minha tia e minha madrinha” “Tenho o telefone da minha madrinha, de minha tia e de minha mãe!” (kevin, 8 anos),

“A minha madrinha!” “A “Nanda” e mais outra madrinha” “... E falta mais uma, dois, o padrinho e o avô” “Só dois, três, o meu padrinho a minha madrinha, o meu padrinho a e minha madrinha”. “E a minha avó, cinco.” (Princesa, 8 anos),

“A mãe, o pai…”“Às vezes, a mãe, as irmãs, o irmão, os tios e as primas. A mãe vive comigo, o tio vive comigo!” (Barbie, 7 anos),

“A minha avó. Minha avó e mais um tio, mais um tio... E o meu avô...” (Mikey, 8 anos).

Gostaríamos de salientar que nesta identificação, que diz respeito aos mais novos, todos conseguem reconhecer mais do que uma figura de apoio, aspecto que, ao nosso ver, merece especial atenção. Assim, para estas crianças a rede de suporte não é escassa nem inexistente.

Boyce (1985) refere que a família é muito importante para o desenvolvimento de interacções sociais positivas. Estas interacções sociais constituem uma fonte contínua e duradoura de apoio social. Deste modo, o que caracteriza a família como uma fonte de apoio social é a qualidade do relacionamento entre seus membros: a tenacidade e a estabilidade dos relacionamentos familiares, a capacidade trocas saudáveis na interacção das relações interpessoais, a mutualidade e o diálogo. Assim, apoiando-nos na perspectiva do presente autor, o apoio social procedente da

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família é importante, na vida de cada ser humano (Boyce, 1985), para a obtenção de uma representação da realidade, estabilidade no seio familiar e existência do sentimento de pertença.

À semelhança das perspectivas do grupo que acabamos de focar, os mais crescidos também identificam a rede de suporte e apoio, apesar de serem mais selectivos nas escolhas, quer isto dizer, contam com um número inferior de elementos para o desempenho desta tarefa:

“Peço ajuda à minha mãe!” (Cláudia, 13 anos), “Conto com a minha mãe.” (Cristiano, 11 anos),

“A minha madrinha e às vezes ao meu padrinho.” (Carla, 13 anos).

O apoio social tem aliado um factor protector na medida em que se relaciona à capacidade desenvolvida para lidar com situações de adversidade, promovendo características de resiliência e desenvolvimento adaptativo (Rutter, 1987). Deste modo, podemos compreender que para as crianças a sua família constitui a fonte de apoio social mais próximo, desempenhando um papel fundamental para o seu desenvolvimento.

Queremos aqui realçar a ideia da Lili, de que o suporte e apoio, não são provenientes do seio familiar: “Ou não peço a ninguém ou peço à minha vizinha, que também é minha tia e é simpática.” (Lili, 14 anos). Tentando descortinar este relato, a perspectiva da jovem sugere a possível existência de conflitos no relacionamento interpessoal entre os membros da família nuclear.

Das conversas com a Lili, conseguimos perceber que ela se sente sozinha, apesar de pertencer a uma família numerosa e que dificilmente recorre à figura maternal quando precisa de apoio, pelo que a relação de ambas é por vezes, tumultuosa. (Nota de Campo nº 8, Estrada Militar, Novembro, 2008)

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Como nos sugere Orford (1992), quanto mais satisfatória for a fonte de apoio, mais satisfação e realização pessoal é experimentada pelos sujeitos. Deste modo, a Lili encontra o apoio de que necessita na família alargada e não no núcleo familiar. No que diz respeito à protecção, as crianças mais pequenas apresentam alguma dificuldade na verbalização deste conceito:

“Porque a família é muito importante para nós” (Mikey, 8 anos), “Eles ajudam-nos. Esta mesmo aqui. YA!” (Mikey, 8 anos),

“Porque a família nos ajuda” (Princesa, 8 anos). Podemos reter destes discursos que as crianças poderão nunca ter vivenciado situações em que sentissem falta de protecção, talvez seja devido aos poucos anos de vida, ou porque se sentem ou sentiram protegidos no contexto em que se encontram inseridos.

O ser humano não é meramente um receptor passivo, uma vez que interageno meio ambiente em que se desenvolve. É precisamente o modo de actuação do indivíduo que assume um papel determinante, no que se refere ao risco e protecção. Os factores de protecção segundo Rutter (1985, 1987) são aqueles que inibem o impacto do risco.

Para o grupo das crianças crescidas, a atribuição de significado ao conceito parece bem integrado, demonstrando que se sentem protegidos pelo seu núcleo familiar, como nos mostram a Lili e o Cristiano: “Sinto-me protegida pela minha família, pelo menos até agora” (Lili, 14 anos), “Estamos todos protegidos em casa” (Cristiano, 11 anos).

Este sentimento de protecção poderá ser devido as características pessoais destas crianças, como nos sugere Masten & Garmezy (1985), na sua identificação de factores de protecção fundamentais para o desenvolvimento da criança. Assim encontramos as

características pessoais do indivíduo (auto-estima, competências sociais, etc.), a coesão familiar (existência de um ambiente familiar harmonioso de desprovido de conflitos) e a presença de sistemas externos de apoio que instigam a criança, a lidar de forma efectiva como as situações adversas. Deste três factores de protecção defendido pelos autores, gostaríamos de salientar que de facto, neste contexto, as

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características pessoais das crianças se encontram em primeira instância, bem como a fonte de apoio, uma vez que já nos foi possível aceder a relatos que evidenciam a existência de conflitos familiares.

Apesar de não encontrar apoio e ajuda na mãe, a Lili identifica-a como figura que lhe confere protecção, como podemos ver na descrição do seu desenho da família:

“O fiz o desenho para mostrar que a minha família é feliz. “A minha mãe, o meu tio e a minha prima! São as que me ajudam mais quando eu preciso!”

(figuras de protecção) “Sim, são! A minha mãe, a minha prima e o meu tio!” “É uma família que muita gente gostaria de ter e que não tem!” (Lili, 14 anos)

Fazendo referência a outros factores de protecção, encontramos os cuidados conscientes e constantes para com as crianças; as expectativas positivas nela depositadas; as relações de afecto, a existência de pelo menos um adulto realmente interessado no bem-estar da criança, que seja capaz de cuidá-la e protegê-la, assim como a sensibilidade materna que, juntamente com o suporte social são, segundo Amazonas, Damasceno, Terto, & Silva, (2003), factores capazes de reduzir substancialmente problemas emocionais e comportamentais, principalmente para crianças que crescem em ambientes com maiores desvantagens.

Bretherton (2000), fala-nos a propósito do conceito de “Porto Seguro”, que, se a criança construir uma base de segurança que a faz sentir confiante na figura de vinculação, então ela pode explorar o mundo que a rodeia. A criança pode afastar-se

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(sistema exploratório) e voltar (sistema de vigilância) ao seu porto seguro. As emoções positivas específicas do sistema de vinculação são o sentimento de segurança, ou seja, o conforto e o bem-estar que a segurança proporciona.

Já na perspectiva da Carla, este conceito, apesar de existente no seu vocabulário, parece nem sempre existir no seu quotidiano: “Às vezes, porque há muitas discussões entre a família.” Nesses momentos não me sinto tão protegida” (Carla, 13 anos). Esta constatação remete-nos, por outro lado, para a fragilidade a que esta criança se encontra exposta e, por outro lado reflecte os quotidianos da sua família, podendo ser reveladores de angústia. Não se sentir sempre protegido pela família poderá ser um fardo bastante pesado para esta criança.