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A Psicologia Moderna, como abordamos no tópico anterior, constituiu-se a partir de diversas raízes filosóficas que serviram de base para a elaboração das principais teorias de aprendizagem e de personalidade atuais. Muitas delas como o funcionalismo e pragmatismo orientaram pesquisas norte-americanas com animais em ambiente controlado. Foi no seio desse movimento, então, que se delinearam os primeiros passos para a construção do paradigma analítico- comportamental. Esse capítulo fará uma apresentação geral da Análise do Comportamento e de uma compreensão funcional do comportamento considerado patológico.

Em linhas gerais, a Análise do Comportamento é uma ciência ou um paradigma de investigação psicológica que tem como base filosófica o Behaviorismo Radical, filosofia sistematizada por Burrhus Frederic Skinner (1904 – 1990) (2003). Além de sua base filosófica, é sustentada pelo arcabouço de dados produzidos através de pesquisa experimental e aplicada. Dizemos, assim, que as pesquisas realizadas em laboratório retroalimentam os programas de intervenção social isso porque evidenciam, com detalhes, quais são os determinantes ambientais do comportamento. As demandas sociais, por sua vez, geram problemas a serem investigados tanto em laboratório quanto em pesquisa aplicada.

A observação dos dados em laboratório e posteriormente em ambiente social possibilita o descobrimento de leis comportamentais e princípios básicos do comportamento. Com essas descobertas ao longo do século XX, foi possível desenvolver uma produção tecnológica para problemas socialmente relevantes (CARVALHO NETO, 2002; BAER; WOLF; RISLEY, 1968).

A abordagem behaviorista do fenômeno psicológico costuma diferir das tradicionais abordagens da Psicologia. Em partes porque rompe com o modelo vigente de compreensão baseada no dualismo corpo-mente e não considera útil o método de investigação psicológica tradicional. Entre a Psicanálise, o Humanismo e o Behaviorismo, podemos arriscar que mais de 90% das abordagens psicológicas têm como base uma filosofia dualista. O que seria o dualismo e por

que o Analista do Comportamento não é dualista?

O dualismo corpo-mente nada mais é do que a compreensão que o ser humano é formado por duas entidades: a mente e o corpo. A origem da palavra Psicologia data do século XV e significa literalmente o ―estudo da alma‖, em latim chamada de Psychologia. Era de se esperar que os primeiros estudiosos dessa ciência buscassem descobrir a estrutura e o funcionamento da mente, encontrar regularidades e registrá-las. E assim o fizeram!

No século XIX grandes descobertas e propostas no campo da Biologia, da Medicina e da Filosofia impactaram estudiosos na Europa e nos Estados Unidos, resultando em diferentes propostas de um estudo experimental da mente.

Apenas com 34 anos de fundação enquanto campo de investigação científica, em 1913, o psicólogo estadunidense John B. Watson (1878 - 1958) propôs uma outra face da Psicologia. Através do trabalho ―A Psicologia como um behaviorista a vê‖ (WATSON, 1913) apresentou claramente as vantagens de um estudo científico do fenômeno psicológico, fez duras críticas à introspecção enquanto método de coleta de dados e aos construtos que seriam desfavoráveis à mensuração do fenômeno, como ―mente‖, ―percepção‖ e etc. (BAUM, 1999; CANÇADO et al, 2006).

É importante destacar que Watson não ignorou os processos internos vivenciados pelo organismo como se estes não existissem. Enfatizou, apenas, que o objeto de estudo da Psicologia deveria ser de natureza mensurável porque assim se era possível construir um conhecimento psicológico sólido e útil. Dessa forma, construtos como ―mente‖, ―emoção‖ e ―volição‖ deveriam ser deixados de lado para se observar diretamente o comportamento humano, já que era o único material possível de observação direta pelo cientista (e não especulativo). Novamente: o que estava se propondo não consistia em negar ou ignorar esses processos, mas repensar a forma como os nomeamos e observamos para que pudéssemos sair do campo especulativo.

Fortemente influenciado por uma concepção darwinista sobre a espécie humana, Watson ressaltou a natureza de sua origem e, portanto, a natureza do comportamento observável, possivelmente governado por leis gerais assim como qualquer outro fenômeno natural. Até então, os estudos de Titchener e Ivan Petrovich Pavlov (1849 – 1936) estenderam a compreensão de Reflexo para comportamentos emocionais aversivos, como as fobias e o nojo.

O que foi chamado de condicionamento clássico (reflexo) é produto de diversos estudos em que notou-se ser possível, através de sucessivos emparelhamentos sistemáticos, que um elemento do ambiente neutro adquirisse a propriedade de eliciar respostas fisiológicas semelhantes a de outro elemento ―naturalmente‖ eliciador. A grande contribuição dos fisiologistas russos e depois aperfeiçoada por Watson foi evidenciar que também respostas emocionais como medo ou nojo por coisas aparentemente inofensivas poderiam ser aprendidas através desse tipo de condicionamento. No entanto, esse paradigma parecia não explicar a origem de novos comportamentos ainda mais complexos, como o comportamento verbal e a aprendizagem da linguagem matemática, por exemplo.

Foi com o conceito de condicionamento operante desenvolvido por Skinner que a maioria dos comportamentos complexos puderam ser formalmente explicados. Essa expressão sugere que muitas dessas respostas operam no ambiente produzindo consequências que retroagem sobre a resposta, alterando sua probabilidade de emissão futura. Assim, o comportamento não é apenas ―internalizado‖ como cópia de uma imitação, mas tem sua frequência alterada por contingências ambientais e opera também sobre essas contingências.

O Behaviorismo Radical reafirma a possibilidade de estudar os comportamentos internos e substitui a noção de causa-efeito newtoniana pela noção matemática de relações funcionais. Um autor que influenciara Skinner fora o físico Ernst Mach (1838 – 1916). Sobre as relações funcionais sabemos que

Esse sistema englobava dois tipos de condicionamento: o que chamou tipo S, ou condicionamento reflexo já estudado por Pavlov e Watson, e o que chamou tipo R, no qual se torna uma consequência contingente a uma resposta, o que já havia sido trabalhado por Thorndike, como vimos acima. Os resultados de Skinner em suas pesquisas sobre o comportamento reordenavam as considerações feitas sobre esse objeto de estudo até então. O comportamento dos organismos não seria influenciado apenas por alterações ambientais antecedentes, como proposto pela psicologia estímulo-resposta, baseada no paradigma reflexo. Grande parte do

comportamento seria influenciada por suas consequências.

(CANÇADO et al, 2006, p. 183, grifo nosso).

A proposta Skinneriana tem como premissa investigativa a relação funcional entre comportamento e ambiente. Consiste, portanto, em descrever as condições em que as mudanças comportamentais ocorrem definindo os estímulos ambientais

específicos que tornam certos comportamentos mais ou menos prováveis de ocorrer no futuro. Nesse sentido, a explicação não é causal, é probabilística.

É importante destacar que a noção de controle utilizada pelo autor aparece em alusão a uma relação de interdependência entre o comportamento e eventos do mundo. Por isso, o termo é usado não como sinônimo de coerção, mas significa que o comportamento não é ―espontâneo‖, ―intencional‖, ―livre‖ de determinantes, embora seja emitido por um organismo capaz de alterar o próprio ambiente.

Em síntese, o Behaviorismo bebe de fontes pragmáticas, rejeita o mentalismo, adota e aceita o sistema explicativo evolucionista por meio da Seleção Natural e o modelo funcionalista de Mach (MATOS, 1999). Com relação à rejeição ao mentalismo, Baum (1999) nos deixa ainda mais claro o porquê não se trata de rejeitar a subjetividade humana, mas de ser cético quanto as explicações que circundam sobre ela:

O termo mentalismo foi adotado por B. F. Skinner para se referir a um tipo de ―explicação‖ que na verdade não explica nada. Suponha que você pergunte a um amigo por que ele comprou um par de sapatos e a resposta seja ―Comprei porque quis‖, ou ―Comprei por impulso‖. Embora essas afirmações soem como explicações, você na verdade não avançou nada em relação a sua pergunta. Essas não explicações são exemplos de mentalismo. (BAUM, 1999, p. 47).

Uma das confusões interpretativas gera, até hoje, resistência à Análise do Comportamento. Todorov e Moreira (2008) desmistificam alguns dos mitos que circundam essa abordagem:

[…] dizer que uma explicação é mentalista não é equivalente a falar de um ―organismo vazio‖, mas a mera especificação de um erro lógico na atribuição de causalidade a fenômenos comportamentais: o comportamento observado é, na explicação mentalista, a única evidência do ―processo mental que o causou‖, gerando um raciocínio tautológico que se estende ad infinitum. Há uma diferença dramática entre dizer que uma emoção não

é causa de um outro comportamento e dizer que o indivíduo não tem emoções (ou pensamentos, ou lembranças, etc.). No entanto, via de

regra, quando o analista do comportamento destitui de certos processos comportamentais (ou psíquicos) o status de causa da ação, o não-analista do comportamento insiste em acreditar que se destitui o organismo tais ―faculdades mentais‖. (TODOROV; MOREIRA, 2008, p. 405, grifo nosso).

Se o comportamento é fruto da relação entre o organismo e o ambiente e selecionado por suas consequências, seria a linguagem também fruto dessa seleção? É de especial interesse para os analistas do comportamento estudar uma forma específica de comportamento operante que é muito característica das relações humanas: o comportamento verbal. Esse é um tipo de operante que produz reforço mediacional, ou seja, é qualquer comportamento que envolva palavras, ―independente da modalidade (falada, escrita, gestual); que é adquirido e mantido por práticas de reforçamento de uma comunidade verbal, isto é, uma comunidade de falantes e ouvintes‖ (CATANIA, p. 1999, p. 392). Esse tipo de comportamento tem especial importância nos estudos experimentais com humanos, onde são investigados os efeitos de contingências sociais no comportamento verbal na manutenção de comportamentos simbólicos como os relatos esquizofrênicos, por exemplo (maiores detalhes serão abordados nas próximas seções).

A posição alternativa do analista do comportamento tem o colocado paralelo à Psicologia no que tange ao desenvolvimento de intervenções socialmente relevantes. O próximo tópico abordará com maiores detalhes uma perspectiva analítico-comportamental do comportamento psicopatológico.

5.1 O que é o Comportamento Anormal?

Respondendo à pergunta ―Por que os organismos se comportam?‖ Skinner (2003) aprimorou, através de pesquisa experimental e aplicada, os mecanismos de aprendizagem e modificação do comportamento, compreendido aqui como toda

e qualquer interação observável ou não entre organismo-ambiente. Seus primeiros

estudos privilegiaram o ambiente do Laboratório para dar continuidade à investigação dos princípios elementares do comportamento; utilizou-se, portanto, de ambientes controlados com animais não humanos (ratos e pombos). Seguindo a tradição de Thorndike e outros psicólogos, tornou-se central o papel do ambiente na identificação das relações funcionais que, naquele momento, circunscreveriam uma análise científica do fenômeno psicológico.

Fortemente influenciado pelo modelo explicativo darwinista da evolução por meio da Seleção Natural, Skinner (1981) desenvolveu um modelo semelhante para explicar o processo pelo qual se produz emergência e variabilidade

comportamental, chamando-o de paradigma da variação e Seleção por Consequências. O contexto histórico em que o comportamento foi emitido adquire, portanto, um papel central na análise dos fatores que mantém o comportamento atual (SKINNER, 1991), como aponta Matos (1999)

O modelo de causalidade próprio ao analista do comportamento é um modelo de seleção pelas consequências. Para um funcionalista, comportamentos evoluem (isto é, se modificam) porque têm uma função de utilidade na luta pela sobrevivência do indivíduo; evoluem porque de alguma maneira representam um mecanismo de lidar com ambientes complexos. Assim por exemplo, um comportamento estranho jamais é dito ‗patológico‘, pelo analista comportamental; se ele ocorre é porque de alguma maneira ele é funcional, tem um valor de sobrevivência. Fazer uma análise funcional é identificar o valor de sobrevivência de determinado comportamento. (MATOS, 1999, 11)

Explicamos, assim, porque uma pessoa sente, pensa ou faz a partir de uma análise das condições ambientais anteriores e posteriores a essas respostas. Desse modo, ao nos perguntarmos ―Por que Maria está com raiva? Por que Fernanda está alucinando?‖ estamos, na verdade, nos perguntando quais fatores causam aquele modo de se expressar – e esses fatores devem ser procurados na história filogenética e no ambiente físico e social do sujeito.

Na Análise do Comportamento dizemos que a maioria dos comportamentos complexos que emitimos são aprendidos ao longo da vida por experiência direta com consequências (modelagem), imitação (modelação) e pela inserção do sujeito em grupos por meio da aprendizagem de regras sociais (cultura). Muitos dos comportamentos essenciais à nossa sobrevivência como piscar os olhos, afastarmos de objetos muito quentes ou gritarmos em situações de ameaça fazem parte da análise comportamental, constituindo um bloco de variáveis importante que favoreceu a nossa sobrevivência enquanto espécie.

Associada às experiências interpessoais de aprendizagem direta por meio da exposição à contingência (Ontogênese) e por meio de regras favoráveis a manutenção de uma sociedade (Cultura), esses três grandes blocos de elementos ambientais históricos possuem relação funcional com o comportamento geral de organismos, alterando sua probabilidade (SKINNER, 2003). Assim, o debate ―inato

versus adquirido‖ perde o sentido uma vez que comportamentos complexos são

compreendidos num continuum.

começa desde a emissão das primeiras respostas primárias úteis a sobrevivência do bebê (como o choro e o sugar) sendo modelada pelo ambiente e a genética ao longo da vida. A partir dessa complexa interação, ocorrerá um aumento da variabilidade e especificidade comportamental, tornando os seres humanos únicos entre si (ainda que pertençam a mesma cultura e grupo social).

Os experimentos com pombos e ratos ao longo do desenvolvimento da proposta skinneriana culminaram no famoso instrumento até hoje usado na pesquisa básica, chamado ―Caixa de Skinner‖. Essa ferramenta de condicionamento operante consiste em uma caixa de vidro com dispositivos para acionamento de água e luz. Os experimentos desenvolvidos por meio dessa ferramenta demonstram alguns procedimentos de instalação e manutenção de novos comportamentos, sejam eles observáveis publicamente ou não, nomeados de Reforçamento Positivo e Reforçamento Negativo.

O termo ―reforçamento‖ trata-se de uma analogia utilizada por Skinner (2003) para indicar um aumento na frequência de determinadas respostas comportamentais; os termos ―positivo‖ ou ―negativo‖, nesse caso, são empregados pelo significado matemático de adição e remoção de estímulos ambientais. Não se tratam, por tanto, de termos de caráter qualitativo, não são uma atribuição moral ao tipo de procedimento, apenas indicam acréscimo ou retirada de eventos ambientais posteriores à emissão da resposta.

A primeira diferença em relação ao condicionamento operante e reflexo consiste no fato de que um estímulo ambiental anterior à apresentação do comportamento, no condicionamento operante, não elicia a resposta fisiológica, mas sinaliza a alta probabilidade de reforçamento (estímulo discriminativo).

Quando um comportamento é reforçado positivamente, dizemos que sua resposta produziu um elemento adicional no ambiente e esse aumentou a probabilidade da resposta em ser emitida no futuro (por ex.: pedir [resposta] uma caixa de remédios e obter [operar sobre o ambiente] a atenção e o remédio [consequência reforçadora] do farmacêutico).

O mesmo efeito de aumento da frequência da resposta é semelhante no reforçamento negativo, no entanto a diferença consiste no aumento da emissão da resposta em função de evitar o contato do organismo com a estimulação aversiva (por ex.: estudar (resposta) para evitar (operar sobre o ambiente) julgamento

social (consequência reforçadora). Chamamo-los de reforçamento negativo, portanto, pois trata-se de um significado matemático para a retirada de um estímulo ambiental através da emissão do comportamento, que se fortalece após essa consequência.

Quando uma consequência reduz a probabilidade de emissão de alguma resposta dizemos que ela é aversiva e o procedimento chama-se punição. Novamente, o termo aqui empregado não adquire caráter qualitativo, apenas indica que a resposta reduz em sua frequência. A punição positiva refere-se a uma consequência que, quando adicionada no ambiente, reduz a probabilidade de emissão da resposta no futuro (por ex.: o filho joga videogame [resposta] na presença do pai, que o obriga a acompanhá-lo em alguma atividade do trabalho, retirando-o temporariamente do videogame [consequência punitiva]. O filho reduz a quantidade de vezes em que joga videogame no horário em que o pai está presente). Já a punição negativa refere-se a uma condição em que são retirados estímulos apetitivos para o organismo não contingentes a resposta a ser extinta (por ex.: o pai retira a mesada do filho quando este tira notas baixas na escola).

O procedimento de extinção diz respeito à retirada de estímulos apetitivos CONTINGENTES à resposta que os precede, diminuindo a probabilidade de sua ocorrência, por exemplo: a professora bloqueia o acesso do aluno a outros colegas de turma, mudando-o de lugar na sala de aula após observar que as conversas altas estão sendo mantidas pela atenção desse grupo de colegas.

Esses são os procedimentos básicos de instalação e manutenção de qualquer comportamento. Existem esquemas de reforçamento e diversas outras particularidades que fogem ao escopo desse trabalho detalhar. O importante é evidenciar que, para a Análise do Comportamento, a maioria dos comportamentos complexos é modelado pelas contingências ambientais e tem função adaptativa. Seja ele considerado patológico, esquisito, aberrante ou bizarro, como as alucinações esquizofrênicas ou os delírios fóbicos, qualquer comportamento é mantido por seu valor de sobrevivência em um ambiente específico. Mas, necessariamente estamos conscientes da função dos nossos comportamentos? Veremos que não.

De modo geral, quando as pessoas chegam a uma consulta médica ou a psicoterapia imediatamente passam a relatar o que sentem. Seja pela perda de

um ente querido, talvez discussões em ambiente de trabalho ou problemas conjugais, o fato é que naquele momento estamos relatando o que sentimos ao terapeuta – esse relato pode indicar contingências produtoras das respostas emocionais (sentimentos) e do próprio relato do paciente.

Skinner (1991) propõe, inclusive, que os sentimentos são sensações corporais e também produtos colaterais das contingências; por outro lado, a forma como percebemos, nomeamos e relatamos o que estamos sentindo, segundo ele, é de origem social e fruto da aprendizagem operante. No entanto, diferente dos behavioristas tradicionais a sua época, Skinner trata das emoções como eventos privados passíveis de estudo de modo indireto (SKINNER, 2003).

Um estudo conduzido por Serpa, Meyer e Del Prette (2003) apresenta evidências de que o ambiente social ensina o sujeito a reconhecer e nomear sentimentos ainda na infância. Isso significa que o modo como as pessoas relatam o que sentem vai depender do contexto em que estão inseridas ou, mais precisamente, do contexto que reforça, pune ou extingue esses relatos. Ou seja,

numa compreensão skinneriana, sentir e relatar o que sente são comportamentos diferentes e que, embora apareçam quase sempre ao mesmo tempo, podem ser mantidos por motivos (função) também diferentes.

Por exemplo, digamos que um menino de 5 anos é empurrado pelo irmão mais novo de 3 anos e cai do sofá. Provavelmente o irmão que caiu vivenciará uma sensação corporal desagradável, a qual nós chamamos de dor. Quando esta criança chora e olha para os pais, por outro lado, ela não está somente sentindo a dor, mas comunicando aos pais que essa dor é presente, seja através do choro ou do olhar.

Ao observar a história dessa criança em interação com seus pais, nota-se que sempre ao chorar e olhar para os pais ou avós, no passado, estes o envolvia nos braços, massageavam o machucado e permitiam que a criança adiasse tarefas de casa programadas para aquele momento. Nesse caso, embora a criança sinta a dor, o choro e o olhar não são apenas partes de uma sensação desagradável, mas comportamentos que podem ser mantidos pela atenção dos pais uma vez que estes abriam benefícios à criança como adiar atividades necessárias e ter a dor aliviada por meio de massagens.

Em outras palavras, Skinner propõe que comunicar um sentimento não é um comportamento fruto dessas sensações desagradáveis, embora estas sejam contexto para a comunicação. Mesmo que alguém se sinta desconfortável e relate o que sente, o relato constante sobre seus sentimentos só será mantido se o ouvinte o beneficiar fornecendo algo de seu interesse ou suprimindo temporariamente aquela sensação desagradável, tal como os pais o fazem com o filho que se machuca no exemplo supracitado.

Assim, o relato verbal não somente sinaliza sensações corporais das quais não temos acesso direto, mas também possibilita compreender o contexto antecedente e consequente em que estes relatos e sensações aparecem. Nem sempre relatamos e estamos conscientes do que de fato aconteceu porque estar consciente e relatar também são comportamentos modelados pelo seu valor de sobrevivência. Tal compreensão, portanto, reflete um avanço no estudo da linguagem até então de forte tradição representacionista. Nesse sentido, a descrição do contexto de emissão de um comportamento deve partir sobretudo de uma descrição topográfica plausível de ser mensurada, ou seja, é preciso literalmente transformar substantivos em verbos.

Skinner o fizera ao desenvolver trabalhos em instituições hospitalares na década de 1950 mostrando a importância de operacionalizar e analisar os comportamentos ditos psicóticos a partir da observação e modificação do contexto em que são emitidos (SKINNER, 1959; 1961). A operacionalização dos termos psicológicos representa um salto na análise uma vez que os retira da compreensão mentalista e inacessível do fenômeno e torna-os passíveis de mensuração (SKINNER, 1961).

Dizer que estamos tristes não necessariamente é evidência de que

vivenciamos sensações corporais desagradáveis, mas sinaliza contingências coercitivas ou perdas em vigor; além disso, evidencia uma história de reforçamento em que, ao relatarmos nosso mal-estar, provavelmente fomos beneficiados por aquele que nos escutou, ainda que ninguém nos tenha isso. Os sentimentos são agora compreendidos sob uma perspectiva interacionista,

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