• Nenhum resultado encontrado

Conceituando Confiança

4 CONFIANÇA INTERORGANIZACIONAL

4.1 Conceituando Confiança

A confiança é um componente essencial para a duração de todas as relações sociais (SELIGMAN, 1997). No entanto esse conceito tem sido empregado freqüentemente de maneira bem generalizada, além de que em algumas pesquisas empíricas é tratada como uma dicotomia, entre a existência ou não da confiança entre os parceiros (EBERS, 1997). A questão é que a confiança é um conceito amplo e complicado por várias conotações de uso comum, resultantes de pesquisadores que analisam gramaticalmente a confiança em uma variedade de informações (ZAHEER; HARRIS, 2006).

De forma geral, Child (2001) descreve que apesar das diversas definições de confiança, os estudos concordam que esse construto decorre da disponibilidade de uma pessoa ou grupo para relacionar-se com outra na crença de que as ações desse outro são mais benéficas do que prejudiciais, mesmo que isso não possa ser garantido. “A confiança é uma

expectativa “positiva” e “confiante” sobre a outra parte e uma “disponibilidade a aceitar a vulnerabilidade” nas relações, em condições de interdependência e risco” (LEWICKI;

TOMLINSON; GILLESPIE, 2006, p. 1014). No entanto, ter confiança em alguém não significa cem por cento de confiança de que a pessoa fará qualquer tarefa e em qualquer circunstância, mesmo porque os indivíduos entendem que não há nada que esteja totalmente certo neste mundo. Altos níveis de confiança subjetiva significam apenas que o sujeito percebe uma probabilidade elevada de ter o desempenho desejável pela outra parte (DAS; TENG, 2004).

A confiança tem sido utilizada de três maneiras diferentes, ou seja, como uma

percepção (“confiança subjetiva”), como vários fatores pessoais e situacionais que levam a

confiança subjetiva (antecedentes da confiança), e como as ações resultantes da confiança subjetiva (''confiança comportamental''). Com relação a confiança subjetiva, ela claramente se refere a um estado psicológico experimentado por um indivíduo e é nesse sentido, que a maioria dos teóricos concordam que a confiança é uma percepção sobre os outros em relação a si mesmo (DAS; TENG, 2004).

Na literatura organizacional, o termo confiança normalmente aparece com duas definições significativamente diferentes. Uma é a confiança como uma crença de que as partes não serão prejudicadas ou colocadas em risco pela outra parte. Outra definição é utilizada como uma crença de que a confiança reside na boa vontade da outra parte (COOPER; ARGYRIS, 2003).

Conforme esses autores, a primeira definição levanta a questão do risco de uma transação e, neste caso, as abordagens administrativas utilizadas recaem sobre a teoria dos custos de transação e teoria de agência. A segunda definição conota a questão da boa vontade, relacionada à questão dos vínculos sociais entre os parceiros em uma relação e neste caso, utiliza-se abordagens que contemplam a teoria institucional na sua vertente sociológica e a teoria da imersão social.

Seppänen, Blomqvist e Sundqvist (2007) descrevem a confiança como um conceito recíproco, conforme figura 03.

Figura 03 – Antecedentes, dimensões/componentes e conseqüências da confiança

Fonte: Seppänen, Blomqvist e Sundqvist (2007, p. 256).

A figura 3 apresenta uma síntese com os antecedentes, as dimensões/componentes e consequências descritas em quinze estudos empíricos realizados entre 1990 e 2003 sobre confiança interorganizacional a fim de avaliar a abordagem teórica, a conceituação e a operacionalização que foi realizada nos estudos dessa natureza. (SEPPÄNEN; BLOMQVIST; SUNDQVIST, 2007).

Das e Teng (2001) apresentam a confiança como um fenômeno de múltiplos níveis que existem no indivíduo, na organização, de forma interorganizacional, e ainda no nível internacional. No entanto, há poucos estudos que adotam uma abordagem multinível para estudar a confiança interorganizacional, na qual muitas vezes variam substancialmente na maneira como definem os níveis de confiança (JANOWICZ; NOORDERHAVEN, 2006).

Confiar em outras pessoas é uma decisão difícil. A confiança em indivíduos tem sido bem compreendida como sendo afetada pelas características, pelas relações interpessoais e pelo ambiente institucional, mas a confiança no contexto organizacional tende a ser mais complexa porque precisa considerar a confiabilidade dos membros organizacionais que são

moldados pelos processos, pela estrutura e pela cultura organizacional, implicando na necessidade de considerar os efeitos do contexto organizacional sobre o comportamento individual (PERRONE; ZAHEER; McEVILY, 2003).

Uma definição comumente usada de confiança interorganizacional é “a extensão com que os membros de uma organização retêm uma confiança coletiva orientada em direção a outra organização” (ZAHEER; HARRIS, 2006, p. 170). Nessa direção, para esta pesquisa a confiança nas relações de compras entre empresas significa que os membros (compradores e diretores) de uma organização acreditam, se sentem seguros em relação a empresa fornecedora.

Segundo Child e Rodrigues (2007), a diferença entre confiança interorganizacional e confiança interpessoal é muito tênue. A atribuição de confiança a uma organização somente reflete aquela que foi investida em seus membros, especialmente aqueles com poder de decisão. Quando se trata as organizações como uma coisa inanimada corre-se o risco de subestimar até que ponto a confiança entre elas depende da confiança entre os indivíduos que as representam. Entre micro e pequenas empresas investigadas, a confiança interorganizacional foi sinônimo de confiança entre os principais atores individuais, ou seja a confiança na colaboração entre as organizações envolvidas reflete a qualidade das relações entre os indivíduos (CHILD, 2001).

Um resultado importante confirmado na pesquisa de Ganesan e Hess (1997) foi que os compradores organizacionais fazem uma distinção entre confiança no vendedor e confiança na organização fornecedora. Segundo eles, esse achado é relevante porque valida a visão multidimensional da confiança.

Outro estudo, realizado por Tacconi, Lopes e Ramos (2009), apresentou que na percepção do gestor de compras de uma grande empresa no setor de alimentos a confiança interorganizacional está diluída igualmente entre a pessoa com quem ele se relaciona e a organização fornecedora. Contudo, quando perde a confiança interpessoal existe a possibilidade de contato com um novo indivíduo nessa mesma organização para realizar as negociações.

Na pesquisa desses autores, com relação ao desempenho no preço do fornecedor, verificaram que a diferença de preço entre os diversos fornecedores geralmente era mínima conforme descrita pelo gestor de compras, sugerindo que a confiança e o desempenho

processo produtivo. Uma vez que, segundo o comprador entrevistado, a empresa nem sempre escolhe pelo menor preço, porque muitas vezes é mais uma questão de confiança ou companheirismo que existe nas relações interorganizacionais. Entretanto, declarou que confia

nos fornecedores “com um pé atrás e uma bala na agulha”. Acrescentando que quando perde a

confiança interorganizacional com algum fornecedor, se possível, nunca mais compra com ele. A perda da confiança interpessoal possui a possibilidade de trocar o indivíduo com o qual a empresa se relaciona, mas a perda da confiança interorganizacional tende a extinguir as relações entre as empresas (TACCONI; LOPES; RAMOS, 2009).

A definição de confiança no contexto interorganizacional continua problemática. A dificuldade está relacionada particularmente a questão sobre o que seria o objeto confiança interorganizacional. Embora alguns autores atribuam confiança para uma organização como tal, outros argumentam que não se pode confiar em uma organização. Portanto, não se confia em uma organização, mas sim nos indivíduos que a constituem (JANOWICZ; NOORDERHAVEN, 2006). As pessoas que representam a organização é que podem ser depositárias de confiança. Dessa forma, quando se investiga no nível institucional é importante não desprezar o papel representado pela confiança entre os atores humanos que estão envolvidos (CHILD; RODRIGUES, 2007).

As relações de confiança nas organizações podem produzir aspectos positivos e negativos, conforme destacado por Ramacciotti (2007) no quadro 3.

Quadro 3 – Aspectos positivos e negativos da confiança

Aspectos positivos Aspectos negativos

Possibilita o respeito mútuo. O risco é aumentado. Gera boa reputação para clientes,

empregados, fornecedores e investidores.

Pode facilitar o oportunismo.

Diminui o controle. Gera camaradagem, favoritismo, personalismo.

Fortalece as relações. Facilita o abuso nas relações mais pessoais. Gera crença de boa conduta.

Melhora o processo de tomada de decisão. Une os empregados.

Transforma grupos em equipes. Gera lealdade, cooperação. Eleva a motivação.

No quadro 3 verifica-se que as relações pautadas no aspecto da confiança possuem muitas vantagens em virtude do fortalecimento das relações, da melhoria nos processos decisórios, do aumento na cooperação, dentre outros. Por outro lado, não são isentas de riscos porque apesar dos diversos benefícios a confiança pode gerar aspectos negativos como o oportunismo, o favoritismo e o personalismo.

Pesquisadores de correntes sociológicas sugerem que a confiança nas pessoas emancipa ou reduz a incerteza social, porque os relacionamentos são construídos sobre um comprometimento e uma confiança sobre o individuo, tais como os laços interpessoais. No entanto, ao passo em que a confiança sobre os laços nas relações interfirmas pode ser muito útil, pode apresentar inconvenientes. O comportamento desonesto é uma importante fonte de risco nas relações, na qual a má fé ocorre quando um stakeholder age em prol do seu próprio interesse em detrimento dos outros (ADOBOR, 2006).

Conforme Zaheer e Harris (2006) numerosos pontos de convergência existem entre pesquisas sobre confiança interorganizacional e pesquisas sobre rede interorganizacional. Contudo, pouco cruzamento fértil tem ocorrido entre esses dois campos. Para eles isso é uma surpresa, porque a confiança é reconhecida como um elemento de importância social e invocado freqüentemente como a lógica para os benefícios das redes coesas. Por isso, esses autores examinaram diversos trabalhos empíricos sobre confiança interorganizacional e os resultados dessa investigação foram sintetizados em quatro áreas primárias das investigações sobre confiança, conforme a figura 04.

Figura 04 – Modelo de estágios da confiança interorganizacional: quatro temas empíricos Antecedentes e Natureza Resultados e relações

O que é? Como é criado? Como trabalha? Que resultados?

Fonte: Zaheer e Harris (2006, p. 170). Desenvolvimento da confiança interorganizacional - Custo de criação da confiança; - Papel da confiança inter-pessoal; - Fatores institucionais Papel da confiança interorganizacional - Teoria dos custos e transação/ formas de organização; - Substitutos ou complementares?; - Alternativas a confiança. Natureza da confiança interorganizacional - O papel do horizonte de tempo; - Assimetria da confiança; - Confiança e exercer influência. Resultados da confiança interorganizacional - Resultados econômicos diretos; - resultados intermediários aparentes; - Efeitos indiretos.

As quatro áreas primárias do modelo de estágios da confiança interorganizacional são: O que é? Como é criado? Como trabalha? E que resultados? Essas investigações foram divididas em duas categorias, a dos antecedentes e natureza da confiança e a dos resultados e relações da confiança. Porém, em conformidade com esses autores é importante evitar tratar a confiança interorganizacional como equivalente a confiança de um indivíduo que confia em um outro indivíduo. Zaheer, McEvily e Perrone (1998) descrevem que a confiança interpessoal parece ser um ponto importante no desenvolvimento da confiança interorganizacional.