Concepção e validação da entrevista

Morse et al. (2002) referem a importância das estratégias de verificação da qualidade na investigação qualitativa, dado que existe a pretensão de assegurar a fiabilidade e a validade dos processos de recolha de dados60. De igual modo, Guba (1989) postula a necessidade de estipular (tal como na pesquisa quantitativa a validade interna, externa, a confiabilidade e a objetividade), estabelecendo conceitos equivalentes para as investigações qualitativas (por exemplo credibilidade, transferibilidade, dependência e confirmabilidade). É nesse sentido que Bisquerra (2009) organiza a proposta de Guba (1989), a qual pode ser visualizada na Figura 11.

Figura 11 Organização dos critérios de validação da investigação quantitativa e qualitativa, adaptado de Bisquerra (2006, p. 288)

Segundo Bartolomé (1986) citado por Bisquerra (2009, p. 289), a credibilidade consiste no valor de verdade da investigação, em que os resultados se ajustam à realidade, contribuindo com evidências de diferentes vertentes. A transferibilidade consiste em que os dados obtidos proporcionem conhecimento prévio noutros contextos de características similares. A dependência refere-se à consistência e à fiabilidade dos dados, enquanto o sentido de consistência reside na relação que se estabelece entre a descrição do contexto e o significado atribuído num determinado tempo e lugar. A confirmabilidade refere-se a

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A tradução destas estratégias foi realizada por Coutinho (2008, p. 12) foca ndo a) a coerência metodológica (methodological coherence); b) a adequação da amostragem teórica (theorical sampling e sampling adequacy); c) o processo interativo de recolha e análise de dados (analytic stance); d) pensar de forma teórica (thinking theorical ly) e e) o desenvolvimento da teoria (theory development).

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consensualidade da informação entre o investigador e os participantes.

De acordo com os estudos de Guba e Lincoln (1994) e de Coutinho (2008) foram aplicadas algumas estratégias de verificação de qualidade relativas à entrevista:

a) Coerência metodológica

A coerência metodológica pretendeu assegurar que a articulação entre a questão de investigação e os procedimentos metodológicos fossem os mais adequados. Para Coutinho (2008) “a natureza circular, iterativa e interativa da pesquisa qualitativa exige que o problema se adapte ao método que, por sua vez, tem que adaptar-se aos dados e ao processo de análise” (p. 112).

Os vazios e as não respostas típicos da natureza do próprio questionário (aplicado no primeiro momento do nosso estudo) potenciaram indicadores que foram integrados no roteiro de entrevista, através das reflexões ou de pensamentos pós-ativos (reflexão sobre a prática de Dança em contexto de sala de aula e na comunidade escolar) e de reflexões sobre as crenças do professor acerca da Dança.

b) A adequação da amostragem teórica

A segunda estratégia de verificação proposta por Coutinho (2008) diz respeito à adequação dos sujeitos da amostra, sugerindo que deva integrar participantes que conheçam a temática da investigação em causa, “sendo fundamental assegurar dados suficientes para darem conta da multiplicidade dos aspetos do fenómeno que se quer estudar” (p. 12). Neste estudo, para a constituição da amostra, utilizou-se um item específico no questionário, em que cada participante manifestava a sua disponibilidade para futura auscultação. Também, foram aceites como sujeitos do estudo professores que na sua atuação docente optam por não ensinar Dança e, daí, Coutinho (2008) sugerir a busca destes casos negativos. Disponibilizaram-se 63 professores de diferentes géneros e das diferentes direções regionais de educação, tendo sido possível entrevistar cada um deles.

c) Validação do roteiro da entrevista

À semelhança de outros instrumentos de inquirição, o processo de validação é fundamental para ajustar as questões ao público-alvo (Mertens, 2005). A fase de validação de conteúdo

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contou com a participação de três peritas em Dança e em Educação, sendo o seu principal propósito analisar e determinar o grau de coerência e de adequação entre os objetivos do estudo e as questões apresentadas no roteiro61 (Anexo 7 e Anexo 8). Assim, a coerência pode ser percebida como a congruência, o nexo ou a ligação harmónica dos itens, resultante da não contradição entre os diversos segmentos textuais que devem estar encadeados logicamente. Assim, considerando-se a observação crítica realizada pelas peritas, algumas questões foram reformuladas, procedendo-se à finalização do instrumento de inquirição.

d) Validação da situação de contacto entre a entrevistadora e o sujeito de investigação

De forma a garantir a fiabilidade do estudo, propusemos legitimar a forma como o entrevistador responsável recolhe e transcreve a informação, registando, em vídeo, duas entrevistas piloto. Com base nos estudos de Coutinho (2008), Duarte (2002), Guba e Lincoln (1994) construiu-se uma ficha de observação (Anexo 9) com o objetivo de analisar criticamente a postura e as formas de interação da entrevistadora, a qual comportou tópicos, tais como, o tipo de ambiente escolhido para a realização da entrevista, a gestão da conversação, o estado do entrevistado, a entrevista em si, a sua transcrição e as competências essenciais do entrevistador. Esta reflexão possibilitou ajustar o desempenho geral, melhorando os aspetos menos conseguidos.

É importante compreender que a finalidade da entrevista foi aceder a informações contextualizadas pelo professor, conforme os objetivos da pesquisa e do tema que subjaz ao estudo. Teve-se em conta as advertências de Duarte (2002), quanto aos contactos entre investigador e sujeitos da pesquisa, os quais se configuraram como parte integrante do próprio material de análise: registar o modo como são estabelecidos, a forma como o entrevistador é recebido pelo entrevistado, o grau de disponibilidade para a concessão do depoimento, o local em que é concedido (casa, escritório, espaço público), a postura adotada durante a recolha da informação, gestos, sinais corporais e/ou mudanças de tom de voz foram elementos significativos para a leitura e para a interpretação, bem como para a compreensão do universo investigado.

61 _{Cada perita atribuiu um valor quantitativo, utilizando a escala: (1) não é coerente; (2) É pouco coerente); (3) indeciso; (4) é coerente;}

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Para evitar um possível enviesamento despoletado pelo acento castelhano da entrevistadora, foram seguidas as recomendações de Sampieri et al. (2008), nomeadamente, sobre a importância desta falar sobre si, gerando um clima de confiança (rapport) para obtenção de respostas (mais) naturais e espontâneas.

e) Confirmabilidade

A transcrição das entrevistas foi posteriormente reencaminhada para os professores entrevistados para garantir a objetividade, a neutralidade e a consensualidade do material referencial (Coutinho, 2008). As vinte transcrições devolvidas foram aferidas e foram corrigidas algumas informações. Considerou-se que as transcrições não devolvidas sugeriam a sua conformidade. A transcrição das entrevistas encontra-se no Anexo 12 do CD-ROM.

f) Processo de validação da recolha de dados

Segundo Coutinho (2008), o processo interativo (analytic stance) é a interação entre os dados e a sua análise. Refere-se ao fazer fazendo, ou seja, “só recolhendo, analisando e confrontando dados concorrentes é possível conseguir uma interação mútua entre o que é conhecido e o que precisa de se conhecer” (p. 12). O resultado da investigação qualitativa evidenciou-se pela replicação das categorias (verificação da compreensão da multiplicidade dos aspetos do fenómeno em estudo) e pela saturação.

A transcrição e a análise das entrevistas foram verificadas por dois professores especialistas do estudo, como forma de garantir as características das respostas face à sua multiplicidade como estratégia do processo interativo de recolha e de análise de dados. A matriz e a sua subcategorização encontram-se no Anexo 13 do CD-ROM.

g) Pensar de forma teórica

Esta estratégia de verificação de qualidade da entrevista proporcionou sustentabilidade à interpretação dos dados recolhidos na dependência do aporte teórico e da capacidade do investigador pensar critica e constantemente, recorrendo à retrospeção e à prospeção da informação recolhida. Assim, a partir da sua triangulação através de diversas técnicas (questionários, entrevistas, análise documental referentes aos programas curriculares),

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considerou-se possível chegar a conclusões confiáveis e válidas sobre as concepções e a reflexão das práticas dos professores que ensinam Dança no 3.º CEB.